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Have a nice weekend

por Samuel de Paiva Pires, em 10.07.10

Fundamentar a monarquia através da doutrina do poder divino dos Reis é, no mínimo, anacrónico. Tal como recorrer à fundamentação de Bossuet. É que, absoluto é precisamente a mesma coisa que arbitrário. Desconstruindo, absoluto, do latim absolutus, significa à solta (*). Dizer que o Rei ou o Princípe está enquadrado pela Divindade é de uma arrogância suprema (que Saramago, em Caim, demonstra), e é abrir a porta à escravidão - para evitar o que o Manuel considera como democracia, a vontade das massas. A democracia rousseauniana, sim. Mas há uma Teoria e Prática da Democracia muito mais complexa que isso. Dahl, Sartori, Bobbio e Schumpeter são referências clássicas.

 

Aliás, o Manuel ao reduzir a democracia à tirania da maioria de que falava Tocqueville, cai no mesmo reducionismo dos republicanos portugueses para quem a chefia de Estado republicana é que é verdadeiramente democrática, porque assente no voto. A democracia é muito mais que votar. E por isso mesmo é que historicamente democracia e liberalismo se alinharam. Não sei se isto é um erro ou se é uma concepção que o Manuel tenta fazer passar deliberadamente. Seja como for, quem tem capacidade para mudar de opinião radicalmente - contra o que não tenho nada contra, muito pelo contrário - também presumo que tenha capacidade para aprofundar aquilo que diz, para não cair neste tipo de erros. Eu, como Conservador, continuo a preferir a máxima popperiana de que o que interessa em democracia é saber limitar o poder de quem manda, assumindo ainda a ideia de Churchill de que a democracia é o pior regime, exceptuando todos os outros.

 

A tentativa de procurar o Bem em Deus é a tentativa de sacralizar e tornar intocáveis valores que são terrenos e não divinos, para deixarmos de nos responsabilizar pelas nossas acções, ao externalizar para o transcendente as referências. Quando levamos isto para o campo das lideranças políticas, torna-se perigoso, dado que fundamenta fenómenos como os assentes no carisma dos líderes ligado ao transcendente, de que falava Max Weber. Fundamentar o Governo nisto é não só anacrónico, como o comunismo, como deixa antever todo um novo leque de idotices. Basta lembrar uma, a de George W. Bush que dizia falar com Deus e que as suas acções eram ordens deste.

 

Dito isto, e porque por ora não tenho tempo para escrever muito mais, deixo os caríssimos e caríssimas leitores e leitoras com um magnífico sketch de George Carlin. Bom fim-de-semana.

 

 

(*) inicialmente tinha escrito ab solus, para o que o Manuel me chamou a atenção na caixa de comentários. O significado é praticamente o mesmo, mas absolutus é mais correcto.

publicado às 14:34


22 comentários

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De Samuel de Paiva Pires a 11.07.2010 às 16:25

O carismo de que fala Max Weber tem a ver com uma ligação ao transcendente, que não é necessariamente religiosa. Elvis Presley, por ex, era um líder carismático do ponto de vista weberiano. Hitler também, e por outras questões relacionadas com a crença num indíviduo que periodicamente surge no seio da raça ariana. Hoje em dia, líderes carismáticos, do ponto de vista weberiano, de memória só me recordo da Rainha de Inglaterra, do Papa, do Dalai Lama e do Ayatola.

O conservadorismo padece de muita fundamentação, dada a sua diversidade, tal como o liberalismo. Ainda assim, em relação ao comunismo, sou um anti-comunista primário.

Quanto a Bush, não está em causa se eu acreditei ou não. Na realidade, claro que não acreditei, como obviamente se depreende do meu texto. O que interessa é que muita gente acredita. E muita gente se esquece que os ideais são muito bonitos, mas na prática a teoria é outra. E na prática muitos ideais representam, em termos processuais, a abertura à possibilidade de escravidão, intolerância, absolutismo e/ou totalitarismo.

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