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Há muito pouco a fazer a não ser continuar, socraticamente, a conduzir as pessoas a perceberem o que está mal, a parirem raciocínios e a fazê-las tomarem consciência das múltiplas formas pacíficas que têm ao seu dispor para, nas suas condutas diárias individuais, fazerem a diferença que querem ver no mundo. É um processo lento por natureza e que exige paciência de santo. Pelo caminho, vamos sendo roubados. É aqui que entra uma qualidade imprescindível para o processo de transformação: a abnegação. Talvez faça algum sentido, afinal, o ensinamento de Cristo, ao render-se à injustiça e à bruteza, deixando-se matar na cruz. Revelou com este acto aparentemente incompreensível, uma forma pacífica e inovadora de fazer uma revolução. O esbulho fiscal e a opressão pelos políticos talvez seja a cruz, a crença na justiça e liberdade, a salvação. Pelo meio morre o corpo mas fica o ideal.
Durante a pausa "sabática" que fui forçada a usufruir observei, com uma certa frieza, os muitos episódios saloios da vida política portuguesa. Vou abster-me de quaisquer comentários porque, tendo falado com novos e velhos, instruídos e analfabetos, a maioria deles analisa, de forma acertada, a actual situação portuguesa e diagnosticam com um rigor por vezes surpreendente a raíz do problema. Esta crise tem pelo menos este grande mérito: pôs a generalidade dos portugueses a pensar. Aqueles que são independentes do estado são muito clarividentes quanto às razões que nos trouxeram e mantêm neste lodaçal. No fundo todos sabíamos que chegaria o dia de pagar a conta das obras públicas, do “investimento” do estado e dos muitos excessos socialistas da esquerda e da direita ao longo de quase duas décadas: todos esperávamos o dia do acerto de contas. O que os portugueses não esperavam era que a Justiça deixasse escapar por entre as malhas da sua inoperância os responsáveis máximos por esses excessos; e o que os portugueses também não esperavam era ver os bancos enfileirarem-se para recolher os frutos de tantos anos de amizade promíscua com o estado.
Tivessem os portugueses de pagar apenas e só o que devem - vendo fazer-se em praça pública uma reflexão profunda da importância de um sector público reduzido em tamanho e poder - e tudo estaria menos mal.
E é tudo o que me apraz dizer neste sábado chocho. Estou sem forças e sem crença. Sinto que o vigor e ânimo que outrora habitaram o meu espírito me são sugados pela energia negra do aparelho do poder. Continuarei a pregar, junto dos que me querem ouvir, o valor da verdade e da justiça. Continuarei a apontar soluções, continuarei a fazer "partos difíceis", ficarei por cá, resistirei à tirania, enfrentarei a perda, a mágoa, a dor. Perante o tamanho do problema em que Portugal está metido, há muito pouco que possamos fazer. A classe política portuguesa (e a europeia) está empenhada em destruir a vida dos seus cidadãos. Só o sonho, a ideia e a palavra conseguirão sobreviver à ruína final.