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"A universidade está para os jovens como os anos estão para o vinho. Confere-lhes maturidade".

 

Pese a memória que me vai falhando, era mais ou menos assim que começava a primeira aula de apresentação no meu já longínquo primeiro ano de licenciatura, corria o ano de 2005. Sem nunca ter chumbado encontro-me juntamente com uma série de outros colegas na fase de transição do regime antigo para o novo regime de Bolonha.

 

Este ano, nós que estamos no quarto ano somos tão finalistas quanto os que estão actualmente no terceiro ano. Eles não têm culpa nenhuma, a culpa é do Estado que anda a enganar milhares de jovens que ao contrário de nós não têm que fazer estágio e relatório desse nem trabalhos de investigação nas cadeiras de seminário que ainda temos no quarto ano. Eu vou acabar a licenciatura com 22 anos, sem nunca ter chumbado, tendo parado um ano para trabalhar e pensar no que fazer da vida antes de me candidatar ao ensino superior. Fora isso teria acabado com 21. Hoje em dia acabam uma licenciatura de Bolonha em 3 anos com 19/20 anos.

 

Perdoem-me os meus amigos que estão abrangidos pela bolonhesa, especialmente os que sabem que não os incluo no rol do que comummente designo por geração "morangos com açúcar", mas a percepção que tenho é que na generalidade falta a esta geração da bolonhesa muita maturidade, em parte porque 3 anos não contribuem da mesma forma que 4 para a formação da personalidade e principalmente porque deixámos de ter licenciaturas para ter um prolongamento do secundário, um 13.º, 14.º e 15.º anos.

 

Tendo normalmente a achar que até não estão em grande desvantagem se tomar em consideração que durante o meu 2.º ano só fui às aulas de uma cadeira em sete que tinha para fazer, e que a generalidade dos meus colegas que iam às aulas concordam comigo quanto à inutilidade geral de 2 ou 3 cadeiras desse ano. Mas estive na Associação de Estudantes, fui eleito para os Órgãos de Gestão, e tudo isso é também uma forma de crescimento e de maturação pessoal, tal como o é fazer Erasmus (o que me levou a fundar este blog por exemplo). Mas mesmo assim são 4 anos durante os quais nos dedicamos à licenciatura e à universidade com tudo o que isso acarreta, desde os trabalhos, exames, frequências, orais, seminários, conferências até aos jantares e festas, tudo o que contribui para um saudável desenvolvimento pessoal de qualquer estudante universitário.

 

Porém, hoje em dia os estudantes universitários interessam-se cada vez menos pela academia, pelos eventos científicos, pelos seminários, pelas actividades extra-curriculares. 3 anos da bolonhesa são cada vez mais uma obrigatoriedade e um frete, um passaporte e rápido atalho para o título de Dr. que em Itália deu azo aos doctorini.

 

E agora coloca-se a questão, quantos destes estão dispostos a fazer mestrado? E será em Portugal, onde as universidades aproveitaram para aumentar os preços dos mestrados, muitas delas a quantias risíveis à luz da análise preço/qualidade? Além do mais, são tão enganados os que fazem licenciaturas de 3 anos como aqueles como eu e os colegas do regime antigo a quem lhes é oferecido 1 ano de equivalência ao 1.º ano de mestrado, sendo que para obtermos o grau de mestre basta fazer 1 semestre curricular e 1 semestre em que não temos aulas e durante o qual se deve elaborar a tese. 

 

A educação é a base do desenvolvimento e progresso de uma sociedade, dum país, duma nação. Temo que enquanto vamos aqui escrevendo neste cantinho de desabafos chamado blogosfera, lá fora o futuro de Portugal esteja cada vez mais em risco, pela educação primária e secundária cada vez mais facilitista e porque também o ensino superior se vai assemelhando tendencialmente a esse modelo de produção em massa de doctorinis para as estatísticas. 

 

Se já antes era o que era em que qualquer pessoa conseguia fazer um curso superior (doidos, bêbados, com Q.I.s que devem ser negativos, que não conseguem juntar duas palavras correctamente etc) então agora ainda é mais fácil, em nome de um qualquer paradigma da igualdade. Ainda hoje em conversa com uma amiga veio-me à ideia que deveria existir uma forma de diferenciação meritocrática, algo como por exemplo um sistema que no fim do 1.º ano colocasse os melhores alunos  numa espécie de turma à parte e que elevasse o nível de conhecimentos leccionados e de exigência em relação ao normal, com um foco mais acentuado na vertente de investigação.

 

Mas isso é elitismo e é politicamente incorrecto. Enfim, viva a igualdade e a massificação que isto da meritocracia e diferenciação é bom mas é para os outros que não percebem nada destas coisas mas que são os países mais desenvolvidos do mundo. Até porque se muitas autoridades cá do burgo propagandeiam discursivamente a meritocracia, neste nosso Portugal como em tantas outras coisas, na prática a teoria é outra

publicado às 00:46


5 comentários

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De Jorge Wahnon Ferreira a 20.09.2008 às 12:16

Gostei! Sim senhor, colocaste o dedo na ferida. Fala-se muito e diz-se pouco sobre o ensino superior e bolonha , textos desta natureza são bem vindos, especialmente o debate que os deveria seguir.

Agora, permite-me esta pequena reflexão relativamente à meritocracia e à tua proposta. Apenas pelo entretenimento do exercício teórico.
A meu ver, a meritocracia é tanto mais louvável quanto mais atrasada for a sociedade em questão (depois torna-se natural e irreflectida). E em Portugal então, faz todo o sentido. No entanto, querer fazer uma distinção dos melhores e piores logo na primária, para se precaver e preparar uma melhor elite para um melhor futuro não me parece razoável. Primeiro porque não é justo. E a procura da igualdade não é algo mau desde que seja dentro do razoável, mantendo-se claros os objectivos da procura dessa mesma igualdade. Segundo, como no outro dia comentávamos após observações empíricas, o ingresso no ensino superior com grandes notas pode não significar nada. Com um sistema semelhante ao que propões, que é o utilizado na Alemanha, Holanda e afins. Quantas grandes cabeças não se perderiam só por não terem sido bons alunos numa fase da vida na qual nada se sabe e o que se sabe é relativo?

Para terminar, e eu não sou propriamente marxista leninista, não estarias a condenar muitos a uma vida consoante a classe social dos pais, perpetuando o processo, e dando razão aos amigos de Estaline, Castro, Mao e por aí fora?

Talvez o método anglo-saxónico das provas de vocação, entrevistas e etc. , fizesse mais sentido. Ou mesmo aquele de certos países em que a segregação é feita apenas no primeiro ano do ensino superior e do curso profissional (isto num mundo sem bolonha , claro).

Abraço
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De Samuel de Paiva Pires a 20.09.2008 às 23:55

Jorge, de facto o post não é muito explícito mas quando eu digo 1.º ano queria referir-me ao 1.º ano de licenciatura, não ao 1.º ano da primária! De resto concordo em tudo contigo, principalmente quanto ao método anglo-saxónico. Mas se esse pode levantar dúvidas e confusões por reclamação contra alguma subjectividade que envolva o método da entrevista, creio que poderemos continuar todos a partir em pé de igualdade (com os exames nacionais) e depois já no ensino superior sim, no fim do 1.º ano, ser efectuada uma diferenciação meritocrática!

Já agora, gostei da tua tirada "após observações empíricas," :p) ehehe de facto...

Um abraço e até 2af!

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