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O que se seguirá?

por Nuno Castelo-Branco, em 23.11.08

 

Já suspeitávamos da amplitude, ainda que escondida de forma habilidosa, do gravíssimo problema de credibilidade em que o sistema  mergulhou há apenas algumas semanas. A História portuguesa tem  passado por períodos conturbados que viram ruir reputações e regimes, abrindo novos caminhos e formas de organização política, social e económica.

 

Em 1925, um escândalo de cariz financeiro - uma burla de proporções inéditas - que envolveu gente conhecida, responsáveis do regime de então e o Banco de Portugal, destruiu a pouca respeitabilidade que o regime da I república ainda beneficiava junto da já magra  falange de apoiantes, concentrados na sua maioria, na capital do país.  

 

Estávamos em 1925 e a imprensa servia de veículo de informação para os privilegiados alfabetizados. A rádio dava os seus primeiros passos e a televisão era um mero campo especulativo da ficção científica.  Sem o recurso da informática e da informação ao minuto proporcionada pela tecnologia dos nossos dias, as notícias do Caso Alves dos Reis envolveram uma muito desacreditada classe política que tanto prometera e que conseguira apenas, pouco pão, muito sangue, opressão e um caudal de lágrimas. Portugal estava farto e ansiava por uma verdadeira regeneração que encaminhasse o país para aquele destino que uma história velha de tantos séculos, parecia garantir:  o daquela grandeza que já fora nossa e que inexplicavelmente perdêramos nas vicissitudes decorrentes dos nossos erros, incúrias e sobretudo, falta de vontade.  O escândalo do Banco Lisboa e Metrópole acabou com as ilusões propaladas pelas "rajadas de luz da gloriosa manhã do 5 de Outubro" e apenas um ano decorrido, o regime desaparecia ignominiosamente, sem o mínimo simulacro de defesa por parte daqueles que outrora loucamente o haviam patrocinado. Foi a fuga, uma cobarde debandada jamais vista e o alijamento de responsabilidades tornadas insuportáveis por quem tudo teve nas mãos para o férreo exercício de um poder honesto, progressivo e patriótico. A I república morreu e deixou apenas algumas saudades entre um reduzido número daqueles que dela fartamente tinham beneficiado. A queda da Demagogia foi acompanhada por um sonoro suspiro de alívio de um Portugal maior, que naquele tempo ainda se encontrava presente em três continentes e oceanos. 

 

Hoje estamos no alvorecer de um outro sistema. As implicações da actual crise que esconde trabalhosamente um escândalo financeiro de proporções abissais, parece ir dia a dia, avolumando-se, colhendo a talhe de foice nomes sonantes,  temerosas reputações, tudo enodoando com a vergonha da directa ou disfarçada cumplicidade. O BPN passou a ser um assunto que interessa aos contribuintes e o povo descobre ou imagina conluios, troca freneticamente mensagens telefónicas e na internet, e, pasme-se, delicia-se com a evidente permissividade e sistema de vasos comunicantes que atinge toda a superestrutura do Poder. Ninguém escapa à suspeita e mesmo aqueles sobre os quais ainda não foram apontados os dedos acusadores da opinião pública - sempre ávida de sangue -, são exautorados por aquilo que em Portugal se chama compadrio. Hoje iniciou-se o clássico processo da emissão do comunicado público que normalmente será seguido por muitos outros nos próximos tempos. Até onde irá a realidade da suposição? Quantos culpados pagarão pelos seus crimes e quantos serão aqueles que escaparão airosamente? Pior que tudo, quantos inocentes serão também esmagados pela pesada roda dentada da fúria, que tudo esmaga e trucida, preferindo liquidar a eito, sem olhar à necessidade da calma ponderação de uma Justiça mais que nunca necessária? Até onde chegaremos?

publicado às 20:26


3 comentários

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De António de Almeida a 24.11.2008 às 18:11

A fraude de Alves dos Reis não foi em Angola? Sei que foi um grande escândalo à época, e pouco mais, desconhecia tivesse apanhado também a classe política da metrópole, excepção ao BdP .
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De João de Brecht a 24.11.2008 às 19:20

Apesar de ter mantido actividades ilicitas durante a sua estada em Angola, o auge das burlas de Alves dos Reis teve como auge a falsificação das notas de 500 escudos (Banco de Portugal).
No inicio do séc.XX (quando este viveu), grande parte da gestão económica colonial era feita na metrópole, sendo a "aristocracia" e a burguesia portuguesas grande parte dos detentores e investidores das empresas e todo o tipo de negócios no território colonial português. Apesar de ser um mercado diferente, qualquer disturbio financeiro (como é o caso da falsificação de moeda e títulos) afectaria certamente o país colonizador, seus governantes e "investidores".

Bem Haja.
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De Nuno Castelo-Branco a 25.11.2008 às 00:41

Isso mesmo e pelo que temos visto, as moscas mudam, mas ... é a mesma. Com uma agravante: agora não existem colónias para tapar buracos e ou muito me engano, toda esta cornucópia de "ajudas" aos bancos, beneficiará primeiramente quem prevaricou em grande. E o contribuinte anónimo lá vai colocar o seu óbulo para os "novos pobrezinhos". Irra, que é demais!

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