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Blasfémia jurídica

por John Wolf, em 24.10.17

Eugenio_Lucas_Velázquez_-_Auto-da-fé_-_Google_

 

O bastonário da Ordem dos Advogados está a ser muito suave no tratamento que concede ao magistrado autor da blasfémia jurídica. A invocação de adúlterio para desculpabilizar a violência doméstica revela uma doença ética bastante mais grave. No entanto, o bastonário dos advogados Guilherme Figueiredo afirma que Neto de Moura não reúne as condições para voltar a julgar violência doméstica, mas concede ao magistrado o perdão no que diga respeito a processos de outra natureza. No meu entender, a prevaricação do magistrado é de tal ordem grave que deveria ser suspenso da sua função. O problema, embora resida na aprovação da violência doméstica por força da argumentação descabida e inaceitável da circunstância do adultério, tem ramificações diversas. A citação moral da Bíblia constitui em si um delito que lesa a constituição da república portuguesa. Que eu saiba, o Estado português é laico. Nessa ordem de ideias, colocam-se distintas possibilidades de execução análoga. Qualquer escritura sagrada poderia ser invocada e servir de fundamento para validar decisões judiciais. Teríamos de aceitar a fé budista do magistrado X ou a reverência protestante do magistrado Y. A contaminação moral a que assistimos pura e simplesmente não pode acontecer. A própria hierarquia da Igreja Católica em Portugal tarda em pronunciar-se de um modo categórico. Eu entendo que na mesma escala de valores que omite a pedofilia, nem sequer pestanejem perante o acervo do adultério que agora foi arrastado para o domínio da criminalidade, dos tribunais. Confirmamos, e tornamos a confirmar, que o próprio sistema jurídico, que deveria proteger os cidadãos, tal como a Protecção Civil, deve ser intensamente auditado e recalibrado. Não podemos admitir este atentado, como tantos outros ataques perpetrados pelos bastiões que deveriam ser o garante moral  da dignidade das nossas sociedades. Neto de Moura apela descaradamente à violência doméstica servindo de bandeja aos prevaricadores mais uma arma de arremesso. Regressamos aos tempos do Índice, para alargar o léxico e validar a  prática da violência doméstica - vergonhoso, inaceitável.

publicado às 07:34


10 comentários

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De Alain Bick a 24.10.2017 às 09:48

não sou crente. detesto o estado: local de inúteis como se verifica. mas não aceito o politicamente correcto. não sou A OPINIÃO.  o GULAG já se instalou.  ainda vão criar comissão social-fascista para corrigir os nossos comentários


nos anos 50 uma portuense capou o marido durante a noite com a navalha de barbear
título do jornal 
'cortou o mal pela raíz'
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De Anónimo a 24.10.2017 às 10:50

Por uma vez, discordo totalmente do autor (que leio diariamente, obviamente porque gosto e admiro): era o que faltava não poder citar-se numa sentença o texto fundacional da nossa civilização, e que é a matriz ética da quase totalidade dos Portugueses - crentes ou não crentes. Ser laico não é ser analfabeto, e se se pode citar Shakespeare ou os clássicos greco-latinos, certamente que se pode citar a Bíblia.  Dito isto, a Relação do Porto brinda-nos regularmente com acórdãos que parecem provir do abuso dos produtos da região, e é este é só mais um - na linguagem, que não necessariamente na substância. Com efeito, tendo uma sentença criminal que valorizar o maior ou menor desvalor da conduta do arguido (ou seja, o seu maior ou menor desvio relativo à conduta que é socialmente aceite ou querida) é evidente que um marido que ofende a mulher (ou a mulher que ofende o marido) - verbal ou até fisicamente - na sequência da radical violação, pelo ofendido, dos seus deveres conjugais (o adultério público) justificará, em princípio, uma atenuação da sua conduta (o que é diferente de uma despenalização). Mesmo sem recurso à Bíblia, é manifesto que "encornar" publicamente o cônjuge é uma ofensa à dignidade e ao respeito que lhe é devido, potencialmente causadora de grave instabilidade emocional - que o Tribunal tem de ponderar numa sentença.
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De Anónimo a 25.10.2017 às 19:31

100% de acordo com este comentário. 
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De Anónimo a 24.10.2017 às 13:46

Leu o acórdão? E sobre o que ele tratava?
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De pitosga a 25.10.2017 às 20:11

Claro que não leu. O autor não é burro. Mas, às vezes, faz-se...

Leia-se o Acórdão e, sobretudo, as notas de rodapé. Juridicamente sém nódoa, sem mácula.
Qualquer cidadão pode mencionar, por escrito, 'coisas'do passado'. Não é proibido. Proíbido será obrigar os outros cidadãos a comungar as ideias de 'coisas passadas'.
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De Piscoiso a 24.10.2017 às 18:06

Desculpabilizar uma agressão por adultério, é quase considerar a agressão como uma legítima defesa, quando esta deveria ser por adultério.
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De Nuno Castelo-Branco a 25.10.2017 às 16:46

Não tardou muito, John, fez o que devia e remeteu o cretinóide para a passagem bíblica do Novo Testamento, aquele que mais nos interessa neste âmbito civilizacional, no episódio referente a Maria Madalena. Ora, quem nunca pecou, que atire a primeira pedra.
Neste caso, a Igreja Católica esteve muito bem.

* Não sei o que se passa, subitamente todos os comentários terão forçosamente de ser anónimos?

Nuno CB
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De José Lima a 26.10.2017 às 10:46

O juiz foi canhestro na argumentação que utilizou, ainda que somente para enquadrar a matéria de facto que fundamentou a aplicação do direito ao caso concreto. Concordo.

Agora, não me venha a americanice de invocar constantemente o estado laico e a separação entre o Estado e a Religião, para legitimar políticas concretas de ateísmo prático que têm como objectivo final o banimento de qualquer manifestação de religiosidade da esfera pública, afinal, elas próprias uma forma distorcida e fanatizada de religiosidade.
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De Anónimo a 26.10.2017 às 12:20


A histeria à volta deste caso tem sempre duas ausências.
- O homem foi condenado pela agressão
- A mulher não sofre pena pelo adultério


A partir daqui, a um suspendem a pena por atenuantes,  à outra vão dizendo que desde sempre o adultério foi condenado.
Que o que se censura atenua a pena é evidência pela muito actual impopularidade em ser-se corno.
Mas não tarda que uma qualquer petição estabeleça o direito inalienável das mulheres ao corneanço.
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De Anónimo a 27.10.2017 às 21:39

Continua-se sem saber se o casamento celebrado entre os arguidos foi pela igreja ou pelo civil, e esta questão é extremamente importante porque a religião católica defende na sua doutrina, explícita na bíblia, que a agressão e violência conjugal em casos de adultério é legítima, o que, e caso os arguidos tenham celebrado o respectivo matrimónio sobre a jurisdição clerical, leva a legitimar a prática deste crime de agressão, de acordo com os ensinamentos bíblicos, levantando porém outra questão de extrema importância, pois se ao casarem sob jurisdição dos mandamentos da igreja católica, que promovem este tipo de comportamento, os arguidos estariam certamente conscientes das consequências dos mesmos, caso contrário, entra-se num misto de hipocrisia e aproveitamento da situação, por ambos os lados em confronto.

Caso o casamento tenha sido celebrado pela igreja católica, a decisão do juiz pode ser considerada válida, pois baseia-se naquilo que a doutrina clerical defende através da bíblia (a promoção da violência conjugal), sendo que todos aqueles que perfilham a religião em causa devem, aparentemente, estar cientes das práticas e valores que a mesma defende, a partir do momento em que pretendem celebrar o respectivo matrimónio sobre essa égide.

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