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Impérios em Guerra,

por Nuno Castelo-Branco, em 24.07.14

 

A propósito de uma entrevista concedida por Filipe Ribeiro de Menezes à SIC Notícias, o historiador confirmou as minhas primeiras impressões acerca de um livro recentemente publicado e para o qual prestou a sua colaboração no que se refere à participação portuguesa na I Guerra Mundial (Impérios em Guerra, 1911-1923, Dom Quixote). Estava a obra exposta numa estante da Bulhosa do Oeiras Park (Park ou Parque?) e curiosamente, ao seu lado apresentava-se uma outra cuja capa talvez seja um perfeito contraponto: o livro evocador do "Soldado Milhões". 

 

O tema Grande Guerra consiste num daqueles incontornáveis buracos negros da nossa história, buraco esse capaz de sugar qualquer abordagem desapaixonada acerca dos factos e respectivas interpretações. Trata-se de uma matéria susceptível de plena integração no combate político e as ainda recentes e pífias comemorações do Centenário da República, foram demonstrativas do quão longe estamos do encarar da história como ela realmente foi. A I Guerra Mundial salpica a República, daí o tabu que desde logo se construiu, evitando-se o quadro geral dos acontecimentos e cingindo-se toda a atenção a casos isolados justificando a existência de uma meia dúzia de monumentos ao combatente e mais importante, as decisões e actos que levaram a Alemanha a declarar guerra a Portugal.

 

Filipe Ribeiro de Menezes pareceu ciente desta dificuldade de publicamente contrariar superstições e manipulações tecidas em torno do Portugal que foi formalmente beligerante a partir de 1916. O próprio entrevistador SIC-N estava claramente influenciado pela historiografia oficialista e o escasso tempo concedido para a exposição da obra e o seu objecto de estudo, implicaram  uma resenha que apenas aguçou a vontade de melhor conhecer este trabalho. 

 

 

Aníbal Augusto Milhais, o "Soldado Milhões"

Ainda temos bem presentes todas as estorietas que desde a escola primária foram incutidas numa população habituada a velhas glórias de capa e espada, glórias essas muito mais verdadeiras que outras apenas ocorridas na imaginação fértil de publicistas e demagogos que as usaram em proveito ou justificação da sua permanência no poder centralizado no Terreiro do Paço. Se vinte e quatro anos mais tarde Mussolini diria necessitar de "uns milhares de mortos para se sentar à mesa das negociações da paz como vencedor", em Portugal houve quem tivesse cultivado a mesma esperança em relação à contenda que defrontava os Impérios Centrais com a Entente. O prinicipal problema a considerar, consistia na desagradável evidência de nem os ingleses serem os abexins que o exército do Duce encontrou no Corno de África, nem os alemães louras réplicas dos vátuas que Mouzinho venceu. A entrada na guerra teve como sustento a esperança fundada no querer é poder e as publicações da época estavam cheias de evocações a Nun'Álvares, aos cercos de Diu, Colombo e Malaca, à Guerra da Restauração e outros episódios edificantes da nossa história militar. Por outras palavras, os portugueses de agora - do início do século XX -, não podiam ser diferentes daqueles outros que se bateram na Índia, no sertão brasileiro ou nas então ainda recentes campanhas de ocupação pós-Ultimatum. Contou-se como sempre, com o improviso que tão bem nos tinha servido em algumas ocasiões difíceis da nossa história. Tentar explicar a Afonso Costa e aos seus, o que significava uma guerra europeia com o seu complicado cortejo de dificuldades inerentes ao treino, fardamento e equipamento moderno e apropriado a cada teatro de operações, logística, retaguarda industrial, organização da sociedade civil em todos os sectores, transportes, serviços de saúde, coordenação inter-armas e com os aliados, era coisa impossível e Portugal bem cara pagou a aventura. Quanto à I Guerra Mundial, as megalomanias propagandeadas pela gente do poder vigente ou pela normalmente desnorteada Ilustração Portuguesa - apenas um exemplo entre uma miríade de outros -, seriam calorosamente adoptadas pelos seus sucessores da II República. Nada mudou no discurso oficial e nos programas didácticos. O combate do Augusto de Castilho, o soldado Milhais - o Milhões - arrastado até à ribalta da fama nos anos 20 e o sempre trombeteado Milagre de Tancos, confortaram os espíritos e procuraram esquecer vergonhas e abusos, o desleixo e a escandalosa incompetência, a deserção disfarçada "de licença de férias" e não nos esqueçamos, o absurdo papel desempenhado pelos militares na política partidária. A verdade é que os inimigos políticos do regime de Costa, Camacho, Bernardino e A.J. Almeida - os militares e os civis que lhes suceriam em 1926 -, faziam parte da mesma geração, não querendo por isso indirectamente deslustrar-se  pela previsível conotação imposta por aquele velho e conhecido princípio de também serem eles "homens do seu tempo", precisamente daquele tempo de baderna, desorganização e facilitismo.

 

Têm os autores o pleno conhecimento acerca de um conflito que de facto se iniciou logo no alvorecer do século. Se a guerra ítalo-turca de 1911 não chegar para demonstrar esse progressivo resvalar para o conflito global, também podemos então mencionar as gravíssimas contendas ocorridas no flanco sul dos Balcãs, opondo gregos, búlgaros e sérvios. Sem a participação de qualquer uma das grandes potências europeias - Alemanha, Rússia, Áustria-Hungria, Reino Unido e França -, a guerra balcânica serviu sobretudo para o delinear dos alinhamentos na grande guerra que as chancelarias julgavam inevitável. Os tratados estabelecidos nas duas derradeiras décadas do século XIX, não significaram uma perfeita correspondência às alianças que se verificavam a meio da Grande Guerra, pois as irredentistas Itália e Roménia, acabaram por coligar-se à Entente, enquanto a Bulgária, tão próxima dos russos, fez causa comum com as potências centrais, entre as quais figurava o Império Otomano, o seu secular inimigo. 

 

A questão britânica pode ser explicada não apenas pela tradicional política do equilíbrio dos poderes continentais na Europa, mas também - e principalmente - pela ameaça que a Alemanha passou a representar como perigosa concorrente industrial e naval. A partir do momento em que o governo imperial decidiu a construção de uma grande Frota de Alto Mar, teve em contrapartida a animosidade inglesa, obtendo a França a segurança que até ao momento lhe faltara: um essencial suporte naval - a Royal Navy - ao programa de cerco terrestre dos Impérios Centrais. A guerra europeia seria também económica e teria na logística um factor essencial à vitória de qualquer uma das alianças.

 

O longo período de paz entre as grandes potências que vingou entre 1871 e o início da segunda década do século XX, serviu sobretudo para a construção da esperada revanche francesa. A própria visita de Loubet a Lisboa, pode ser inserida nessa política de angariação de potenciais aliados contra a Alemanha e disso mesmo tomaram nota insuspeitas figuras como a rainha D. Amélia, falando-se abertamente na capacidade portuguesa de mobilização de efectivos destinados a combaterem numa guerra europeia. Paris foi incansável no preparar de uma coligação e de um exército capaz de vingar Sedan, o desfile dos hulanos prussianos Campos Elísios abaixo, a proclamação do II Reich na Galeria dos Espelhos do Palácio de Versalhes e sobretudo, o arrebatar das províncias da Alsácia e da Lorena. 

 

O caso português deve ser encarado sob o prisma de etapas por vezes contraditórias entre si. Se atendermos à situação da diplomacia e respectivo alinhamento nacional nos primeiros anos do século XX, teremos então a clara evidência de Portugal se encontrar então plenamente integrado - embora informalmente - no esquema da Entente Cordiale encetada pelo pragmático Eduardo VII. As privilegiadas relações estabelecidas por D. Carlos I ao longo do seu reinado, pareciam garantir o status quo imperial português ainda ameaçado por uma longa guerra colonial de consolidação da soberania nos recentemente reconhecidos territórios em África - o hinterland angolano e moçambicano. Há que reconhecer a realidade de uma certa pertença de todo o espaço imperial português à esfera de influência britânica e de forma um tanto abusiva, poderemos até considerar o facto de Portugal ter sido, de facto, um sub-Império da Commonwealth britânica. Na difícil relação com Estados de primeira linha, a situação portuguesa não era assim tão exótica ou embaraçosa, sendo tacitamente aceite pelas chancelarias europeias e sem que isso representasse qualquer tipo de vergonhosa submissão. Embora o país tivesse algum espaço para negociações com outras potências que não a Inglaterra, os essenciais interesses quanto à preservação do património ultramarino e a própria segurança e integridade territorial da Metróploe, dependiam da prossecução da aliança tradicional. Era esta a flagrante realidade e os governos de Lisboa durante muito tempo - após os acordos decorrentes do Ultimatum - puderam contar com a contemporização britânica, também temerosa do sempre problemático caso sul-africano. Tal como a Bélgica, Portugal significava a existência de possessões lusas que serviam de Estados-tampão em regiões vitais à segurança do império britânico, ao mesmo tempo que subtraíam importantes recursos materiais aos principais rivais dos ingleses, os alemães e em menor grau, os franceses..

 

O Regicídio terá sido um dos pontos de viragem da política de Londres relativa ao espaço português. Observadores estrangeiros das cerimónias fúnebres do rei e do príncipe herdeiro, acreditavam que naqueles dois ataúdes também iam a toque de finados, as colónias portuguesas. A coroa britânica encarou o assassinato de D. Carlos  como um agravo directo, conhecendo perfeitamente o tipo de propaganda veiculada pelos autores morais e materiais do crime, ou seja, os republicanos do PRP e organizações satélites (Dissidentes, a Maçonaria e Carbonária). Durante décadas foi a opinião pública portuguesa envenenada por uma campanha sem tréguas contra a Grã-Bretanha, campanha essa que chegaria a influenciar o imprevidente Barros Gomes, ministro dos Negócios Estrangeiros - procurando alianças pontuais com a França e Alemanha - da Monarquia Constitucional. A verdade é que na hipótese do movimento do 31 de Janeiro ter triunfado, bem diferente poderia teria sido o resultado do Ultimatum, pois Portugal não contaria com uma certa benevolência à qual não foi estranha a intervenção da rainha Vitória. Os ingleses sabiam quem eram e o que durante anos proclamaram as cabeças do PRP, subitamente alçadas ao poder através de um violento golpe sedicioso que profundamente desagradou as chancelarias europeias. Nem mesmo o rápido volte face empreendido pelos governos da República podia fazer esquecer o passado bem recente. Pior ainda, os republicanos acabaram por fornecer aos diplomatas britânicos, o argumento da "não confiança" que lhes permitia negociar abertamente com os seus colegas alemães. Em plena época de expansão industrial, comercial e colonial, os ingleses eram a principal potência mundial e nem sequer a França, mesmo que aliada à Rússia, tinha o necessário poder para os enfrentar. Quanto ao reconhecimento do novo regime, sabe-se que Londres pediu a Paris para tomar a dianteira, mostrando assim as claras reticências quanto à nova situação estabelecida após o golpe subversivo de 3-5 de Outubro de 1910. 

 

A posição da República era difícil, senão desesperada. Conhecem-se as negociações estabelecidas entre Londres e Berlim acerca da partilha das colónias portuguesas da África austral, talvez a derradeira tentativa britânica de encontrar um modus vivendi com a expansionista Alemanha do Kaiser Guilherme II. Atendendo à situação interna portuguesa e à imprevisível evolução da mesma, a Londres pode ter parecido aconselhável o encetar de negociações que pelo menos salvassem o essencial da segurança do império britânico naquela parte do mundo onde os alemães pareciam decididos a obter um quinhão relevante e mais valioso que o semidesértico Sudoeste Africano e o insuficiente Tanganica. A Alemanha era uma potência colonial de segunda ordem e nenhuma das suas possessões tinha a potencial importância económica e estratégica de Angola e Moçambique. Todos os crimes, golpes de mão e flagrante inépcia que os governos de Lisboa não conseguiam ocultar, mais convenciam uma boa parte dos políticos britânicos da necessidade de uma modificação da forma como o Reino Unido encarava a sua aliança com Portugal e nem mesmo os protestos de fidelidade manifestados pelos sucessivos governos republicanos, conseguiram convencer homens como Eduard Grey e Winston Churchill - que se relacionavam com D. Manuel II, já exilado em Londres - e muitos outros nomes de relevo da política, finança, economia, cultura e imprensa. Não será muito arriscado afirmar-se que o magnicídio de Sarajevo terá contribuído para a não realização do plano de divisão do nosso património ultramarino, até então completamente à mercê da resolução dos diferendos anglo-alemães. Na sua Legação londrina, o representante do governo do Kaiser, o príncipe Lichnowsky, julgava já praticamente consumada essa partilha que também contribuiria para a resolução de algumas rivalidades entre a Alemanha e o Reino Unido. A Portugal bem serviu a consciência que os ingleses tinham acerca do pesar dos riscos que essa partilha implicava e mesmo nas vésperas do estalar do conflito, talvez já encarassem a soberania portuguesa sobre todo o espaço moçambicano, como o menor dos males, simultaneamente contrariando alemães e sul-africanos. 

 

É ainda hoje muito comum justificar-se a participação nacional na Grande Guerra, com a necessidade da defesa do Ultramar. Parece evidente o alinhamento português com os Aliados, embora essa colaboração seja passível de ser julgada de diferentes formas, estando cada uma delas até agora dependente do alinhamento político dos interessados pela matéria de estudo. Aos saudosos da I República, a Flandres surge como o destino lógico, embora trágico, de uma beligerância que devia plasmar-se no principal cenário da guerra, mesmo que tal tivesse significado um esforço insuportável para este país devastado pelas querelas políticas, violência pública e incapacidade administrativa de um regime fraco e desprovido de confiança interna e externa. A história alternativa ou virtual, parece a todos indicar uma mais conveniente fixação da intervenção portuguesa no norte de Moçambique, aproveitando a experiência do escol de africanistas que tinham consolidado a soberania, submetendo gentes e fixando as fronteiras da África Oriental Portuguesa. Muitos dos oficiais fiéis ao regime da Carta foram expurgados das fileiras e outros tantos decidiram afastar-se das mesmas, opondo-se à nova situação política. Entre estes, contavam-se muitos dos que bem conheciam as colónias africanas, facto que mais tarde pesaria tremendamente nos erros crassos cometidos quando foram enviados os corpos expedicionários para Angola e Moçambique: desconhecimento do terreno, do clima e das populações, uniformes desadequados e serviço logístico miserável, desde a alimentação, até ao essencial aspecto sanitário. Os próprios planos de batalha eram desajustados à realidade, sendo impraticável qualquer tipo de guerra que de longe se assemelhasse à que acontecia nas frentes da Flandres, do Trentino e Venécia, nos Cárpatos austríacos ou na Masúria prussiana. Por muito fértil que fosse a imaginação das autoridades de Lisboa, estas deviam ter tomado boa nota do material humano com que contavam para o travar da primeira verdadeira guerra moderna onde a técnica e a indústria eram decisivas. Ornelas, Couceiro e tantos outros especialistas em combates em África, talvez tivessem sido elementos preciosos de aconselhamento, mas eram ostensivos inimigos do PRP e com eles estavam muitos oficiais do corpo intermédio. O espectáculo oferecido pela tropa era horrendo, participando activamente nos golpes e contra-golpes que se sucediam entre o Terreiro do Paço, a Rotunda e Monsanto, não nos podendo esquecer da inimaginável quantidade de uniformizados que se sentavam nas incandescentes bancadas parlamentares de S. Bento. Tudo isto prenunciava o desastre que inevitavelmente aconteceu.

 

A própria política interna sobrepôs-se sempre ao império da razão que aconselhava a concentração de esforços na frente do Tanganica, algo que nem sequer teria exigido um gigantesco volume de efectivos, mas tão só uma força armada móvel, bem armada e assistida por serviços de manutenção militar, fossem estes de saúde, alimentação, fardamento, instalações adequadas, etc. Há que dizer que a República teve bastante tempo para se preparar para uma intervenção militar deste tipo, pois a tensão na fronteira norte de Moçambique era permanente, servindo Quionga como aviso. Em suma, também havia que atender à evidência de os askaris do general von Lettow-Vorbeck não serem cópias das hostes de D. Reinaldo Gungunhana. A política de Defesa da República era outro daqueles capítulos de um compêndio de ilusionismo, colocando sempre à disposição da opinião pública, projectos desadequados às possibilidades nacionais. Todos pareciam contentar-se com as aparências. A verdade é que os republicanos desde há muito viviam obcecados com a França enquanto modelo a copiar, tendo chegado ao ponto de logo após o golpe do 5 de Outubro, pretenderem uma reforma dos uniformes do exército, tornando-os idênticos aos dos franceses, exotismo que não foi adiante devido ao incomportável preço a pagar. O mesmo poderemos dizer quanto ao extraordinário programa naval, totalmente desfasado da realidade financeira e do interesse nacional. Pretendiam uma frota que batesse a espanhola, imaginando três couraçados e uns tantos cruzadores modernos ancorados diante da estátua de D. José, não esquecendo navios de escolta, submarinos e um grandioso complexo de construção naval militar na zona de Cacilhas. A posse de um vasto domínio colonial implicava antes de tudo, a organização de uma frota de escolta que mantivesse as ligações entre a Metrópole e o Império - ilhas adjacentes incluídas -, não esquecendo navios comerciais e de transporte, precisamente o programa naval que nos anos trinta o novo regime saído do golpe do 28 de Maio procurou realizar. Nada disto foi previsto, as intenções atendiam sempre ao contentar das parangonas dos jornais sofregamente lidos nos cafés do Rossio. 

 

Embora muitos prefiram esquecer, sabemos o que sucedeu em todas as frentes de combate. O improviso e adaptação no terreno que tão bem nos serviria cinquenta anos mais tarde, manifestou-se totalmente inútil num conflito com uma grande potência europeia. À distância de um século, ainda é fácil cair-se na tentação da justificação da história, recorrendo aos mesmos argumentos que apenas procuraram legitimar uma situação política há muito desvanecida, por sinal totalmente oposta à que hoje vivemos. É este mais um daqueles paradoxos em que a nossa inteligentsia se esmera, sempre num anseio de justificação da sua proeminência. Por muito surpreendente que isto possa parecer, a dicotomia amigos-inimigos da República ainda existe, estando o sector de militantes desta estranha causa, firmemente encafuado na sua trincheira de incertezas e de heroísmos contabilizáveis pelos dedos de umas dezenas de mãos. 

 

Há quem erga como pilar essencial da intervenção, a segurança das colónias e o frustrar dos desígnios expansionistas da Espanha de Afonso XIII, a quem um político inglês diria ..."tem V. M. dificuldade em visitar Barcelona e mesmo assim pretende anexar Lisboa?" É indubitável a longa vigência da estratégia britânica quanto à necessidade de manter a costa portuguesa - somada às ilhas atlânticas e ao porto de Lisboa - como essencial área amiga e vital para as comunicações marítimas que garantiam a segurança do Império Britânico. O que era válido em 1808, 1834, 1870 e 1908, continuou a sê-lo em 1914 e mais tarde, em 1939-45. A conservação da independência e do Império, sempre foi um secular jogo de equilíbrios e de aproveitamento de oportunidades em que os estadistas portugueses aperfeiçoaram os seus dotes diplomáticos, também sabendo aproveitar contingências de cada momento. Esta linha condutora da política externa já corre há mais de sete séculos e não consta que mesmo hoje, nos "dias da globalização", algo de muito sensível haja a modificar, apenas parecendo ser necessária mais uma daquelas adaptações que outrora sempre conseguimos sem perder o norte.

 

 

O Monumento aos Combatentes da Grande Guerra, Praça Mac-Mahon, Lourenço Marques (Moçambique)

 

Teria sido possível Portugal manter-se neutral durante a Grande Guerra, conservando a integridade do Ultramar? Teria sido suficiente a garantia da impenetrabilidade das nossas fronteiras do Rovuma e do Cunene, evitando a dispersão e desorganização de forças que prejudicou para o campo dos Aliados, a rápida resolução do problema apresentado pelo Tanganica alemão? Como teria sido a participação de Portugal na Grande Guerra, se em vez de Afonso Costa, Brito Camacho, Manuel de Arriaga ou Bernardino Machado, tivéssemos podido contar com D. Carlos ou D. Luís Filipe - logo, com a plena confiança britânica - e com um exército que desde o início do século se encontrava numa fase de modernização e ainda relativamente afastado das corrosivas paixões partidárias? O que teria sucedido se em vez das ilusões de uma "Flandres em África", Portugal tivesse podido contar com militares experientes  e conhecedores daquele teatro de operações na África Oriental, optando-se por uma guerra de movimentos e por contingentes mais reduzidos, bem armados, abastecidos e adaptados ao combate imposto pelo grande militar que era von Lettow-Vorbeck? Aqui ficam interrogações que jamais terão resposta.

 

 

publicado às 09:00


3 comentários

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De David Alves a 24.07.2014 às 12:38

Belo Post!
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De c. a 25.07.2014 às 02:13

Interessante, o "post". O suficiente para estar agora a ver a entrevista. 
Escreve "rectaguarda" mas está errado: é retaguarda. Vem do latim retro (do vade retro, para trás). Não publique mas emende. 
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De Nuno Castelo-Branco a 25.07.2014 às 08:46

Caro c., não posso deixar de publicar a chamada de atenção ao erro que apontou, pois não faço censura, a menos que alguém seja muito insistente em palavrões e insultos indecentes.. Este tipo de asneiras são infelizmente muito frequentes. Para cúmulo, tenho o péssimo hábito de não rever textos. 

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