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O Partido Socialista declara estar o presidente Cavaco ao serviço da oposição.
Diz-se que em política ou história, a memória é curta. Durante anos a fio, o país soube e gozou com as quase públicas desavenças entre o 1º ministro Cavaco Silva e o presidente Soares. No seu segundo mandato, Mário Soares tornou-se no promotor da alternativa ao desgastado governo do PSD e as "presidências abertas" nada mais foram, senão uma clara demarcação de Belém em relação ao governo de maioria absoluta. Inventaram-se direitos à indignação, Soares falou "privadamente em público" - até alto e em bom som diante de quem o quis ouvir, em pleno restaurante Bel Canto (1992, eu próprio escutei as suas palavras) - e todos conheciam a profunda aversão mútua que se foi criando entre os dois homens. Mais tarde, quando Cavaco quis tornar-se presidente - a velha historieta do grão-vizir que se quer tornar califa no lugar do califa - e alijou o PSD como ..." esse partido"..., Sampaio surgiu na corrida a Belém e proporcionou-se ainda a alegria a Mário Soares, de "acabar o mandato dando posse a um governo socialista". Assim, sem qualquer tipo de equívocos. É esta a alegada presidência de todos os portugueses.
O sr. Sampaio desautorizou as forças de segurança e os militares, publicamente humilhando-as quando não devia nem podia. Durante anos foi uma espécie de Marechal Carmona do governo Guterres, sem que as más políticas, o despesismo e a incúria nos mais diversos sectores, o tivessem alguma vez distraído dos seus afazeres num qualquer campo de golfe. Quando o governo passou a ser de maioria absoluta PSD-CDS, a deslealdade foi nítida, total e nem sequer valerá a pena referir o triste episódio do governo Santana Lopes, onde a reserva mental e o serviço prestado a terceiros vieram a produzir efeitos devastadores para a credibilidade do próprio sistema constitucional.
Cavaco faz agora a vontade à oposição, como durante alguns anos estrategicamente aquiesceu a tudo aquilo a que o governo do PS quis implementar. Nesta fase de maioria relativa, o governo teria forçosamente de negociar e fazer aquilo que os seus congéneres europeus normalmente praticam. Encontrar o rumo que lhe permita a obtenção de aliados no Parlamento, mesmo que pontuais.
É cada vez mais disparatada, esta tendência para os intervenientes da política se distanciarem do seu próprio passado como agentes responsáveis. Mudando de posto, julgam poder eximir-se a qualquer tipo de escrutínio.
Existem dois interesses em colisão. Um, consiste na almejada reeleição presidencial - para quê? Com que fim? -, embora o cargo surja aos olhos de todos desprovido de importância substancial e como mera trincheira de resistência de sector e mesa de banquete de vaidades. O outro, conduz ao sonho da reedição da maioria absoluta, também não se compreendendo qual o propósito da mesma. Numa situação gravíssima, pareceria normal que o governo e o PS se interessassem na obtenção de uma ampla frente de consenso que permitisse as reformas necessárias e que o país aguarda com resignação. Uma vez mais, o interesse nacional não parece sobrepor-se às ambições de facção e o passado já nos ensinou sobejamente, qual o final reservado à cegueira perante evidências.
Belém e S. Bento, duas faces da mesma moeda cujo valor facial é hoje tanto, como a do desaparecido Escudo.