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O Henrique Raposo, que muito estimo e cujos escritos acompanho sempre com interesse, expõe numa carta aberta a Pedro Passos Coelho (aqui e aqui) as razões pelas quais entende que o PSD se deverá abster na votação do Orçamento do Estado (OE) para 2011.

 

Permite-me, e não me leves a mal, Henrique, na minha humilde condição de aspirante a politólogo e cidadão preocupado com o futuro do país, responder à tua carta, expondo a Pedro Passo Coelho (bem sei que este texto não irá para além das paredes deste blog ou do meu Facebook, mas enfim, são as vicissitudes de quem não tem, obviamente, a mesma influência e visibilidade que tu, o que é apenas natural), as razões pelas quais considero que o PSD deve chumbar o OE, se este for efectivamente um orçamento despesista e não cumprir os requisitos mínimos estabelecidos há muito pelo PSD como condição sine qua non para a aprovação. Provavelmente, incorrerei em alguns erros, fruto da juventude e da inexperiência. Desde já antecipo as minhas desculpas por tal, convidando todos os que leiam este texto a apontarem erros do mesmo.

 

Caro Pedro Passos Coelho,

 

A carta do Henrique parte do pressuposto que o chumbo do PSD ao OE espoletará, quase automaticamente, um cataclismo que obrigará à intervenção do FMI em Portugal. Esta intervenção advirá da falta de confiança dos mercados que, por sua vez, será originada na ausência de liderança política. Tal estado de coisas, na opinião do Henrique, associaria V.ª Ex.ª, ao descalabro socialista, ainda que não tenha culpa deste, permitindo ainda a Sócrates vitimizar-se, não vindo este a ser penalizado em eleições, como o Henrique deseja.

 

É que, o referido pressuposto, generalizado ultimamente por imensas personalidades da vida pública portuguesa, com o intuito de incutir medo nos portugueses, pode não ser necessariamente verdadeiro. De facto, estou em crer exactamente no oposto, e passo a explicar porquê.

 

Sócrates tem anunciado medidas de austeridade, precisamente com o propósito de acalmar os mercados. Contudo, nos últimos meses, a única vez em que tal foi um resultado visível imediato, foi quando Vª Ex.ª auxiliou Sócrates com o PEC. Mesmo as drásticas medidas anunciadas recentemente, tiveram pouco ou nenhum impacto nos mercados - aliás, os juros da dívida pública aumentaram. Isto advém, pelo menos segundo a parca compreensão que tenho do funcionamento dos mercados, da falta de credibilidade de Sócrates. Quer internamente, quer externamente, Sócrates tem pouca ou nenhuma credibilidade. Primeiro porque, mesmo anunciando as medidas de austeridade, não tem garantias de conseguir iniciar a sua implementação, visto que tem a vida no parlamento muito dificultada, quanto à aprovação do OE. Em segundo lugar, porque mesmo que consiga aprovar o OE, a falta de credibilidade da sua pessoa e da sua governação nos últimos anos, não gerarão qualquer efeito positivo nos mercados. Pelo contrário, dado que a sua prática política sempre foi a da ilusão e do despesismo. Embora possam ser algo impessoais e aparentemente irracionais, os mercados são constituídos, em primeira análise, por agentes humanos que analizam estas coisas e que, embora sejam normalmente jogadores de risco, são extremamente conservadores quando em jogo estão agentes com pouca ou nenhuma credibilidade.

 

Porém, especulemos que o OE é aprovado e as medidas anunciadas são tomadas. Continuaremos numa senda despesista, financiando o nosso défice com empréstimos a juros elevadíssimos, e não teremos quaisquer alterações de natureza estrutural no aparelho do Estado - dou de bandeja que, obviamente, não é num só Orçamento que se vai fazer o trabalho que vários deveriam fazer, quanto às necessárias reformas estruturais. Será, no fundo, uma fuga para a frente, em que o risco de Portugal sofrer uma intervenção por parte do FMI não será minorado e poderá, inclusivamente, ser aumentado.

 

Bem sei que, para muitos dos notáveis do regime que nos últimos dias se têm manifestado, a estabilidade é um valor importante. Contudo, a estabilidade no despesismo e na má governação tem que ser contrariada o quanto antes, mesmo que seja por uma forte ruptura. Mais importante do que manter esta estabilidade, é romper com este historial que tem levado o país ao abismo e gerar indicadores de confiança. E é precisamente quanto a esta confiança que me quero focar, em termos consequencialistas, quanto ao que acontecerá com o chumbo do OE.

 

Imaginemos então, que o OE é chumbado. Primeira reacção, terá que ser de Sócrates. Vislumbro, pelo menos três opções. Primeira:  tomando consciência de que os seus recorrentes números de ilusão, chantagem e vitimização não resultam com V.ª Ex.ª, apresenta outro orçamento, mais realista e adequado aos compromissos que o Governo deve estabelecer com a oposição e o problema mais imediato fica resolvido. Segunda: agarrado como está ao poder e mostrando a falta de sentido de Estado que é seu apanágio, governa por duodécimos, pelo que, passada a reeleição de Cavaco, muito provavelmente será forçado a ir a eleições - o que só agrava o problema do país dada a já referida falta de credibilidade de Sócrates, e só demonstra que estamos reféns de uma eleição e de premissas constitucionais que só prejudicam o país. Terceira, e espero que mais provável: cumpre o prometido e demite-se.

 

Foquemo-nos na terceira opção, que julgo ser a mais provável. O Presidente da República terá que propor um Governo de iniciativa presidencial. Com Sócrates fora de cena, as personalidades que no PS se têm preparado para o suceder (assim de repente, surgem no horizonte António Costa e António José Seguro), terão muito mais facilidade para conseguir um entendimento com o PSD. O Governo de iniciativa presidencial será um Bloco Central, eventualmente estendido ao CDS, e provavelmente até com notáveis independentes - muito gostaria de ver Medina Carreira e Êrnani Lopes nas pastas da Economia e Finanças. Governando por duodécimos, não se aumentam impostos que com toda a certeza vão levar à  recessão e pode-se começar a cortar na despesa. Após a reeleição de Cavaco, as eleições legislativas servirão para legitimar aquele que será um Governo consensual, dadas as circunstâncias de necessidade excepcionais. E este conseguirá aprovar um Orçamento adequado à conjuntura.

 

Aliás, no ponto de cortar na despesa, importa referir-me a uma passagem da carta do Henrique: "Pois muito bem: diga onde é possível cortar (a lista de Marques Mendes?) e responsabilize o PS pelo aumento de impostos. O PS é que é Governo". Acontece que, o PSD não é Governo e não tem a informação que o PS tem. Ademais, o PSD já deu a entender que vai acabar com imensos institutos com funções sobrepostas, contratos com interesses pouco transparentes e "tachos" que vão alimentando muitos parasitas no aparelho estatal, cuja sobrevivência advém da extorsão aos contribuintes, que agora o Governo pretende agravar - e sobre a qual o PSD não conseguirá ter um grau desejável de informação enquanto não for Governo.

 

Caro Pedro Passos Coelho, permita-me que humildemente esteja em crer que esta é, na minha opinião, a melhor solução para o futuro do país. A sua credibilidade e o facto do Governo a formar resultar de um consenso alargado no sistema político-partidário, actuarão, com certeza, como geradores de confiança - a tal de que os mercados são tão ciosos. Que Sócrates não seja penalizado em eleições, e que este se vitimize - como tantos parecem recear -, parecem-me questões que não têm, neste momento, qualquer importância, se comparadas com a urgente necessidade de conduzir o país com sentido de responsabilidade, com sentido de Estado, com sentido de pilotagem de futuro.

 

Um aviso, contudo: há uma lição que se pode retirar do consulado de José Sócrates. É preciso saber comunicar com os portugueses. É preciso que os portugueses entendam a situação, a conjuntura, e as medidas que terá que tomar. Estou esperançado que o seu realismo assim o providenciará.

 

Com os melhores cumprimentos,

 

Samuel de Paiva Pires

publicado às 22:44


10 comentários

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De Fernando Santos a 13.10.2010 às 00:11

o que eu queria dizer ali no fim é que se for para lá o Passos Coelho, não é por isso que as taxas de juro deixaram de aumentar.

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