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A Espanha, um alvo para a escumalha

por Nuno Castelo-Branco, em 25.10.10

Quem escute o termo, de imediato pensará num preconceito dirigido aos menos bafejados pela fortuna e de facto, os bem instalados assim designavam uma mole informe de gente, onde se amontoavam os pobres, os malcriados, os violentos desordeiros e um ou outro desgraçado contra quem se alimentava um ódiozinho de estimação.

 

A palavra caiu em desuso, pois os novos tempos apontavam-na como labéu dirigido aos acima citados, muito bem limpando-os de uma injusta infâmia que provinha antes de tudo, da carência material dos visados. O aburguesamento desejável e de elementar justiça, parecia ter remetido a "escumalha", para aquele rol de expressões caducas e tão raras como retrosaria, escalfeta ou sanefa.

 

Uma injustiça, este desterro da "escumalha". Ela existe como "classe" e bem ao contrário daquilo que se pretendia, aí está, invadindo os nossos dias com a insofismável força do seu poder de adaptação às situações que se lhe apresentem, para eternamente vingar.

 

Vem isto, a propósito do que está a acontecer no Reino vizinho.

 

Em Espanha, os últimos trinta anos testemunharam um período de visível renascimento de uma certa ideia de grandeza.  Uma transição pacífica, a concessão de autonomia regional no seguimento da velha tradição interrompida quando no século XVIII Filipe V aboliu os antigos fueros, o ímpeto modernizador da economia e mais importante ainda, um ordenamento constitucional que permite a existência de um invejável modelo parlamentar. Em termos comparativos, aquilo que para a República Portuguesa significa o claro insucesso no seu edifício estatal, em Espanha isso quer dizer precisamente o oposto que se plasmou num êxito reconhecido em todo o mundo. De facto e apesar da crise, o Reino de Espanha está a viver os seus melhores dias desde os tempos do iluminado rei Carlos III. O monarca indicado pelo general Francisco Franco, apenas surpreendeu quem não consegue perceber o que está subjacente à própria ideia da Monarquia, aliás décadas antes imaginada pelo Conde de Barcelona, presuntivo sucessor do deposto Afonso XIII. João Carlos I foi exemplar na sageza das decisões tomadas durante o período de transição e ao casal real - a rainha Sofia é por si, uma verdadeira força - se deve em grande parte, a solidez de uma democracia de longe mais completa, que aquela que em Portugal insiste em permanecer atolada num imenso lodaçal de misérias várias. A simples constatação da duração dos mandatos governamentais num e noutro país, dispensa qualquer considerando supérfluo.

 

Em 1982, uma estranha conspiração tentou derrubar o novel regime e o papel do monarca revelou-se decisivo, granjeando-lhe a simpatia planetária. O desenvolvimento económico e as autonomias, normalizaram o país em termos institucionais, garantindo o progresso material e satisfazendo muitas das aspirações dos diversos grupos que compõem o Estado. Os chamados republicanos, ínfima minoria ridicularizada em cartoons e gags humorísticos nas variedades televisivas e anedotas de um público sempre en fiesta, viu diminuindo ano após ano, o número daqueles que saudosistas da quimera, nela insistiam. Carrillo da República se afastou e o mesmo se passou com o PSOE, onde nos seus comícios a roja y gualda ondeia de forma tão entusiástica, tal como a tricolor se expõe no Arco de Triunfo da Étoile. A Monarquia existe, porque representa a Espanha. De facto, a Monarquia é a Espanha que ainda surge em todos os mapas.

 

 

Todos os povos têm aquilo a que vulgarmente se chama de "os podres". Conhecêmo-los de ginjeira em Portugal. Há-os a puxar para o ordinarote de palito na boca, lançando tiradas reles a qualquer senhora que passa. Há-os medianos, passando fome em casa, mas conduzindo o carrito em primeira mão, símbolo de uma prosperidade apenas sonhada. Finalmente, existem aqueles muito mais perniciosos que os pretéritos e que adiante definiremos. No entanto, todos eles se mesclam facilmente, porque chafurdam nas mesmas pocilgas do desespero exibicionista, a tudo recorrendo para obter os seus fins, cujo interesse egoísta nada mais é, senão isso mesmo.

 

Passemos então, aos mais perigosos.

 

Este grupo parasitário, consiste numa amálgama onde bóia o líquido viscoso da revolucionarite de sistemas ultrapassados pelos próprios crimes cometidos, nele boiando resquícios gordurosos de uma classe sem classe, muito ufana no escalpelizar da vida alheia. Esta gentuça pretende liquidar o status quo que tem garantido a tranquilidade de quarenta milhões de espanhóis. Uns lá terão como toca, o ersatz do PCE - a residual e grotesca Izquierda Unida -, enquanto outros, infinitamente mais letais e enraivecidos, tomam na desprezível carantonha de Carod Rovira, o modelo a seguir para a satisfação do ódio sectário, erguido como fatal argumento para o exercício da xenofobia entre próprios nacionais. Apesar do odor putrefacto desta mistura, há quem zele pelo seu ministrar a uma opinião pública cada vez mais preocupada com uma crise económica que é da responsabilidade geral, tanto dos políticos, como daqueles que se deixaram iludir por um improvável El Dorado sem fim.

 

Descobriram um novo ponto de interesse, talvez  o mais mesquinho e inesperado. Esse alvo chama-se Letizia Ortiz de Bourbon, nada mais, nada menos que a futura rainha de Espanha. No desesperado afã em encontrar algo que abale a solidez da Monarquia, ou melhor, do país como um todo, recorrem a preconceitos que da parte dos seus promotores, parecem totalmente descabidos ou pelo menos, exóticos. Na imprensa marginal, surgem cíclicas insinuações ou atoardas acerca de "desinteligências irreconciliáveis" na Família Real, como se este grupo de magarefes pudesse remotamente, ter qualquer tipo de acesso à sala de visitas de João Carlos I ou de qualquer um dos outros membros da sua Casa. Inventam se não sabem, mas a calúnia aí está, sempre omnipresente. Onde viram umas calças e uma camisa informal, adivinham uma nudez comprometedora. Estes progressistas de cloaca, levam as mãos à cabeça com qualquer indumentária que esta rapariga possa apresentar. Se aparecesse de negro e de mantilha, lá estava a chegar a Inquisição. Se a saia tivesse meio dedo a menos, já se sabe o que fariam circular. No fundo, o esquema já é antigo, pois outra ralé o fez em Paris, criticando Maria Antonieta pelos vestidos de veludo que indicavam a "riqueza ruinosa", ou por aqueles outros feitos em algodão e que também "garantiam a ruína", exibindo uma pobreza que desprestigiava os tecidos da indústria de Lyon. O mesmo se passou em Nápoles, na Áustria e noutros tantos países desta Europa que chegou ao século XX vigorosa, mas num acelerado processo de colossais mudanças que a industrialização e o surgimento das grandes cidades tornou inevitáveis.

 

Os chamados "revolucionários", contam com a colaboração daquele que é talvez, o mais improfícuo e detestável sector de qualquer sociedade: o dos alcoviteiros. Esta gente derrete a sua existência no coscuvilhar da vida alheia, sempre tendo como único objectivo, o destruir de qualquer vida que por obsessão mórbida, decidam detestar. Geralmente passam o dia ao telefone e fazem o seu período de labuta sem horas, porque a intriga é a tempo inteiro, numa roda viva de contactos com paparazzos, cocktails onde a vulgaridade apenas ombreia com o mais reles parasitismo e umas tantas vernissages ou festas de ocasião para encher páginas e páginas, com lixo pago a peso de ouro por vorazes mentecaptos. Pois bem, os apaniguados do cadáver embalsamado de Lenine, aliaram-se à corja que colectivamente se pode chamar prensa del corazón ou "cor de rosa", onde pontificam excelsos despenteados mentais, como é o caso de um paravalhão de primeira apanha, conhecido por Jaime Peñafiel.

 

Temem pelo advento de um novo reinado que mais tarde ou mais cedo, chegará. Filipe de Bourbon é de longe, o sucessor real cuja preparação foi mais longa, criteriosa e modelar. O homem é discreto, não se lhe podendo apontar qualquer falha no escrupuloso cumprimento dos deveres que a Constituição e a decência apontam. Quando se poderia prever uma discussão acerca da exequibilidade formal da Monarquia num século XXI cheio de interrogações, verifica-se precisamente o oposto.

 

O ataque é vergonhoso, cruel e abaixo de qualquer consideração classificável por qualquer normal cidadão. Atacam-lhe a mulher. Não a atacam por "ser estúpida", porque não podem. Letizia é reconhecidamente inteligente. Não a podem atacar por "reaccionarismo", por conhecidas razões. Não a podem atacar por frivolidade, porque tal não se coaduna com a sua personalidade. Atacam-na, porque instintivamente sabem que consiste na derradeira possibilidade de provocar uma sensação de instabilidade na mais segura instituição do Estado. Sem Monarquia não existe Espanha, fragmentando-se o país num certo número de republiquetas à jugoslava, desde logo dispostas a discutir fronteiras, mercearias de beira de estrada, águas e pior que tudo, gentes e dinheiros.

 

Os reservistas mentais da "esquerda profissional", encantaram-se com os perliquitoques floreados dos sectores mais pirosos das inutilidades bric-a-brac do "social" revisteiro. Se o tal ondulante e gesticuloso Peñafiel guinchava por uma "princesa de sangue" para rainha, aqueles querem-na apenas como um transitório Cavalo de Tróia que um dia, entrará na Zarzuela. Assim, espiolham o seu "passado", como se de uma criminosa em fuga se tratasse. Inventam-lhe "camas", "nudezes" e sobretudo, homens, muitos, muitos e muitos homens. Publicam livros em busca do dinheiro fácil, mas depois, apertados com a crítica, confessam ... "não existirem provas para as alegações". Estão perante um dilema que não passará despercebido a ninguém e muito menos ainda, aos estrangeiros. Aquela meia dúzia de vozes que no Parlamento se dizem a favor de causas que de fracturantes, afinal pouco têm, são precisamente aquelas que na praça pública, vociferam contra a "baixeza de nascimento" de Letizia, correndo a morder-lhe a bainha das calças ou o imaginado decote na praia. Subitamente desfalecidos por "escrúpulos morais", grasnam todo o tipo de sandices próprias para consumo em qualquer bodegón rasca, propiciando uns dedos de conversa enquanto devoram umas sofríveis tapas e se engole um vinhito a martelo. Não tardará muito, até que esgotado o armário de sandálias, o guarda-roupa, ou os "homens extra-terrestres" que teimam em não aparecer, decidam imaginar uma Letizia ao serviço de uma qualquer sacerdotisa de Lesbos. Em Portugal já passámos por um processo semelhante e a destinatária, foi uma mulher que ficou para a história como um exemplo de decência, dignidade e de serviço escrupulosamente cumprido. Por sinal, a até hoje última rainha de Portugal.

 

Esta "esquerda profissional", onde os comensais sushis se aliam aos devoristas da minguada e arquiseca patanisca soviética, andam de braço dado com aquela ralé perfumada e vestida de "marcas" pagas - quando pagas! - a prestações.

 

É esta a nova escumalha, bem identificável. No entanto, não deixa de ser irónico, o facto desta gente ser o pasto favorito para as manicuras, enroladoras de caracóis e... intelectuais de grave barbicha e mansa fala. Pobres diabos, não há quem os cape de vez?

publicado às 08:00


3 comentários

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De Anónimo a 25.10.2010 às 20:52

Letizia não é nada amada em Espanha....se o Rei não se poe a pau!
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De Nuno Castelo-Branco a 25.10.2010 às 22:34

Não sei se é ou não. O que está em causa, é o vergonhoso método que a canalha usa para o descrédito.Miseráveis, é o que são.
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De Anónimo a 25.10.2010 às 23:56

Nuno, até poderá ser, porque muitos estão mais interessados em descredibilizar. Sem dúvida. Apenas por acaso, li algo sobre o que alegadamente se passa na Casa Real e o que li não foi nada agradável. Note, porém que quem chega a um determinado meio deve cingir-se a regras, a etiqueta, e assim rezam as «crónicas», há botas que não batem com as perdigotas... Seria uma pena ver um regime ser estragado pelo deslumbramento de quem trata a monarquia - dizem como um trabalho! Não é.
Fala-se inclusive que o Rei pondera a mudança da Constituição para efeitos de sucessão ao trono e aí teríamos a Infanta D. Helena, que parece solidária, caridosa...mas estes adjectivos parece que não são reconhecidos na dita Letízia....

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