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O que de mais foleiro há em Portugal é a forma como olhamos para os cursos superiores. Vestimos uma gravata, conseguimos comer de boca fechada, temos assunto para além do futebol e lemos o jornal, logo temos que ser doutores. O ser doutor é como que um preconceito que nos foi incutido e que nos faz acreditar, muitas vezes inconscientemente, que ninguém é válido para fazer uma coisa se não o for. Muito pouco tempo deve faltar até que nos recusemos todos a ser servidos num restaurante por um não doutor, ou a aceitarmos ouvir um humorista na televisão que não seja licenciado em Novas Tecnologias da Comédia pela Universidade da Beira Interior - penso até que corremos o sério de risco de que se crie a licenciatura de Jogador de Futebol, onde as cadeiras vão da estética do brinco de brilhante até ao drible de mãos atrás das costas. Imaginem lá o Jorge Mendes a mostrar o catálogo dos seus jogadores ao Luís Filipe Vieira e a dizer: «olha que este é bom, veio da Universidade do Minho e tem uma pós-graduação em correr pelas alas. Muito melhor do que o outro que compraste ao Paulo Barbosa e que só tem o curso em cabeceamento pela Internacional». Genial, não vos parece?
Estou farto daquele discurso do «tens que ir fazer a licenciatura que é para seres alguém», ou o ainda melhor «tens que ir tirar um curso com saída, se não vais para a caixa do super-mercado». Ou seja, esquece lá isso de ser trabalhador, culto, inovador, empreendedor, responsável e sério. Alguém te vai dar um diploma por causa disso? Provavelmente não. No nosso pobre país o que interessa é a embalagem, o efectivamente importante é o título, é o diploma que temos na parede. O autarca da terrinha que recebe uma visita de José Sócrates trata-o por «senhor engenheiro», não interessa nada que ele seja Primeiro-ministro, o que importa é que é engenheiro, por isso é assim que o trata.
Entristece-me ver famílias pobres a matricularem os seus filhos em faculdades, em cursos supostamente com saída, sabendo praticamente de antemão que o destino deles será mesmo a caixa do super-mercado. Filhos estes que mais tarde se indignam e reclamam por um emprego, porque estiveram a estudar para isso. Ou seja, não estudaram porque queriam aprendar algo mais numa área que gostavam, estudaram porque a sociedade lhes prometeu duas coisas: um título e um emprego.
Meus amigos, sempre tive medo de uma coisa: morrer burro. Sempre tive medo de deixar boa música por ouvir, bons livros por ler e bons livros por escrever. Até já tive medo de deixar noites de copos e discussões por passar, amores por sentir e desilusões por sofrer. Sempre tive medo de muita coisa, menos de morrer sem um nobre «doutor» a embelezar o epitáfio da minha campa. Continuarei a estudar e a querer aprender, apenas aquilo porque me interesso e nas áreas em que sinto ficar menos burro, mas nunca julgarei ninguém por não ter um título académico, tal como Pessoa não tinha, tal como muitos outros que não estão no desemprego não têm.