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A triste história de Augusta Martinho

por João Pedro, em 11.02.11

A notícia da idosa encontrada morta em casa, após nove anos de silêncio, atordoou o país. Desgraçadamente, nem devia espantar muito. O abandono a que são votados os velhos e a enfastiada e emperrada burocracia a que estamos submetidos, os verdadeiros causadores desta descoberta terrível, levam a estes desfechos aberrantes. Não é a primeira vez que ouço falar de pessoas que morrem sozinhas e só tempos depois são descobertas. Mas nunca imaginei que alguém pudesse ficar tanto tempo ignorada para além da morte. O que choca mesmo é a indiferença e esquecimento total a que a idosa esteve votada, tirando uma vizinha ou uma outra pessoa mais escrupulosa.

 

Nesta nossa sociedade que despreza tudo o que é velho e "do passado" em detrimento do novo e "moderno", que cultiva a juventude esticada ao máximo e a devoção à saúde eterna, os velhos são um estorvo e não ficam bem entre a mobília. Algumas famílias tendem muitas vezes a esquecê-los, e noutros casos nem restam familiares próximos, tendo então de se entregar à sua sorte. Os poucos voluntários que propositadamente os visitam para aliviar a sua solidão não chegam. Muitos vivem no centro das cidades, em casas decrépitas, ou em subúrbios uniformizados e deprimentes, como a senhora deste caso. São apesar de tudo aqueles que vivem nas aldeias e pequenas vilas que recebem mais atenção dos que os rodeiam. Mas com o decréscimo da natalidade e o aumento da esperança de vida, a situação tende a piorar. No futuro haverá um batalhão de idosos a cuidar. Muitos dos que hoje desprezam os velhos muito provavelmente receberão a dobrar o mesmo tratamento. Só se deseja que daqui a uns anos não invente qualquer forma de "eutanásia involuntária" para impedir o colapso da segurança social que restar.

 

Espero contudo que esta notícia chocante possa servir para alertar para casos semelhantes e para a extrema solidão que acompanha tantos idosos deste país. Quem sabe se a mulher que nem depois de morta teve tratamento condigno possa afinal chamar a atenção pra a indignidade das pessoas mais velhas. E já que (quase) ninguém quis saber dela, ao menos que se recorde que era uma pessoa, e que tinha nome. Chamava-se Augusta Martinho.

publicado às 02:04


3 comentários

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De P.A.S. a 11.02.2011 às 08:40

A
morte indiferente da velha senhora salva pelo gong ao retardador do
fisco, o tal que nos acompanha do nascimento à tumba, agora mais
eficiente na avassaladora pena dos trabalhadores a prémio, que penhora
primeiro e pergunta depois, é não mais que a nossa própria morte.


Uma morte revestida a indiferença,
revestida a ouro de lei da lei sem senso, sem compaixão, cinzenta e sem
cor, uma morte de quem há muito cravou o destino de um Portugal
demasiado manipulado pelo vizinho e pelo outro.


Quando uma inteligência parda
resolveu distribuir prémios pelo funcionários do fisco para abocanhar
tudo o que pudesse em impostos, não foi a eficiência que se encontrou.
Foi a indecência de se pensar o país como um enorme alforge onde se
pudesse continuar a fazer o trade-off entre as pessoas e a manutenção
de ordenados, não só escandalosos mas impraticáveis para aquilo que é a
realidade económica. Muitos ainda não perceberam que governar é
manipular os dinheiros de todos mas na exacta medida que favoreça as
pessoas. Há muito já passamos esse tecto, o tecto do primeiro estão as
pessoas. O anel de frodo toca quem se põe em bicos de pés a pensar que
pode pensar pelos outros e destinar a nossa vida.



A morte desta senhora às mãos de uma sociedade cada vez mais desumana e
cruel, reflecte aquilo que já sabemos na prática. É a nossa morte que
está li reproduzida, a morte da indiferença, a morte dos braços caídos,
da aceitação de tudo com pouca acção, ou nenhuma, para além de um
encolher de ombros ou de um passo à frente.


As corporações então são o melhor.

Uma polícia que não existe em Portugal, não por falta de efectivos, mas
por falta de comparência na função. Antes os problemas pessoais dos
agentes não se resolviam nas esquadras, sendo a polícia como
corporação, ao contrário de outros países, invisível aos olhos dos
cidadãos, chegando invariavelmente atrasada aso locais das ocorrências.
A responsabilidade seguinte é a dos tribunais, de quem faz as leis e
estabelece uma burocracia sem senso e encerra a vida num emaranhado
complexo pouco próprio de qualquer simplex . O processo do simplex
tornou-se ele próprio o seu contrário. As leis em Portugal visam
normalmente criar mais um nível de dificuldade no acto simples que é,
ou devia ser, a vida de uma pessoa.


A seguinte a das famílias desprovidas de valores, de garra para
combater pelo seu país, de egoísmo exacerbado fechadas em Portugal nas
classes elitárias no eu e os outros, sendo normalmente os mais
responsáveis, os Pilatos de Portugal, os que mais vertem lágrimas de
crocodilo por situações que reflectem a miséria de um país sem rumo
dentro de cada um de nós.


É esta a imagem do desgraçado Portugal real do ano da graça de 2010?


É, mas podia ser outro, se cada um de nós quisesse mudar-se mudando colectivamente Portugal.
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De Rogério a 11.02.2011 às 12:50

Portugal no seu melhor! Este é o país que temos! Uma tristeza e uma vergonha! Pobre senhora! Se fosse algum ilustre político arranjavam a autorização para arrombar o raio da porta em três tempos! Que tristeza!!
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De Anónimo a 11.02.2011 às 15:15

Revoltante sem dúvida. Muito chocante. Triste.

O Estado só se lembra quando quer, de resto, é uma Pessoa esquecida e de má - fé.

Será que vão continuar a chamar a Senhora para pagar alguma coisa de ...finanças...hospital, quem sabe para uma consulta, uma operação, hábitos muito vistos na administração pública portuguesa.

Administração essa que não sabe que aqueles a quem nomeia advogado, já faleceram, aqueles a quem chamam para consultas e fisioterapias, já faleceram, que aqueles que não conseguem notificar estão presos, servindo pena à ordem do Estado.


 

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