Saltar para: Post [1], Comentários [2], Pesquisa e Arquivos [3]




O peidódromo

por Nuno Castelo-Branco, em 29.03.11

Ontem, a noite de Prós e Contras (contra quê?) atingiu o seu pleno e Fátima Campos Ferreira não teve de poupar cordas vocais, coisa que honra lhe seja feita, raramente faz.

 

A RTP convidou umas tantas sumidades que nos betões daquilo a que se designa por "universidade", fazem render a faina da recolha do seu marfim. A palavra universidade é por esta gente tida como uma espécie de condomínio medieval e a posse de um testemunho de uma passagem por esse purgatório, permite o mastigar entre risos escarninhos, de nomes com Y, Th, K e citações a bel-prazer.

 

Refastelado no meu sofá e com a Luna ao colo, fui trincando umas bolachas ricanela, atentamente seguindo um concurso de basófias mais ou menos circunspectas. Abundaram os sobrolhos carregados, os esgares indignados e os sorrisos de contentamento pelo imaginado sucesso da auto-complacente empáfia. Uns tantos remoques "pró do lado" - José Reis e João Salgueiro - e um longo empanturrar de "sonhos, ousadias, quereres e paradigmas". É claro que não entendi patavina e o rebuscado das receitas era de uma ordem tal, que não se descortinava o peixe da carne, nem os nabos dos alhos e tudo isto condimentado com doses cavalares daquelas bem conhecidas especiarias descobertas algures no século XIX e que tão bons resultados deram nos ruminantes ocidentais. A prova disso, é o constante avolumar de gasosas barrigonas que de vez em quando, convém desaustinar através do pipo bocal que na melhor das hipóteses, evita a mais óbvia e usual válvula terminal do sistema digestivo. Para isso, temos as tv's da "tudoemaisalgumacoisalogia" actual. 

 

Vejamos. Se bem me lembro dos convivas do serão, retenho a voz contristada de um daqueles padres que já não fala "achim", rendido à avermelhada resignação pela pobreza alheia. Este bem prega frei Tomás, cozinhou uma autêntica spaghetinada a la putanesca, com os necessários picantes a sugerir o cilício em forma de quentinha barraca nacional colectiva, fazendo ressoar os versos daquela velha canção que gemia sob o modesto peso de um quartinho de primeiro andar, num lar pobre mas sempre a abarrotar de mais alegria. Também se escutaram os ditos de umas conhecidas sumidades de cátedras de outras décadas. Uma delas, "muito republicana" mas que ainda escreve Espanha com agá, traçou a pernoca e aproveitou o espaço para desenfardar uns eflúvios de annales, terminando com um infalível ditame da "óbvia proibição" da restauração da Monarquia, claro... Estranho, tal coisa não pareceu assim tão óbvia à atenta Fátima Campos Ferreira.

 

Também escutei um "filósofo" - são os meus favoritos - de fala tão arrefinfalhada de regueifas e retorcidinhos, que qualquer trabalho de talha rococó, parecerá um depurado artefacto saído do atelier de Saarinen. Trouxe-me logo à memória uma descontínua e um tanto ou quanto caótica melodia de outros tempos.

 

Podia dar mais uns tratos de polé à cachimónia, tentando recordar algo que tivesse absorvido de toda aquela libertação de gases raros, mas sinceramente, apenas retenho o apresentar de credenciais pela maioria dos pneumáticos presentes. As frases infalíveis em qualquer programa deste género, são aquelas em que o sapioso entrevistado aumenta o tom de voz e esclarece acerca da sua "gratificante experiência académica no E-S-T-R-A-N-G-E-I-R-O*", "o sentido prático anglo-saxónico que T-I-V-E* o privilégio de interiorizar" ou para os mais avaros defensores da sua torre natal, "os alunos que na  U-N-I-V-E-R-S-I-D-A-D-E* me têm P-E-D-I-D-O* orientação acerca das possibilidades de pós graduações, mestrados e doutoramentos, entre as quais o estudo da vida bissexual das amibas, consite num aspecto nada desdenhável da nossa plena integração na comunidade científica internacional". Todas estas maravilhas, pressupõem o "abrir de pernas" para a saída de pecúlios que até aos sessenta anos deidade, garantem a alguns, uma certa forma de se estar na vida.

 

Não temos arcaboiço ou clima para cortejos alegóricos de Fevereiro, nem mulatas semi-nuas de plumas e á borla pelas avenidas. Quanto a reis-momos, esses temo-los de sobra e pagamo-los em conformidade e à razão de centenas por Palácio. O Sambódromo é coisa tropical, valiosa para cativar turistas e libertar desejos e paixões. Infelizmente não possuímos a alegria e o saber-viver para tanto.

 

Resta-nos o Prós e Contras, cada vez mais o Peidódromo Nacional. 

 

* Não se assustem, pois as maiúsculas representam o súbito aumento de decibéis. 

publicado às 11:10


2 comentários

Imagem de perfil

De João Pedro a 30.03.2011 às 01:05

O tal "padre que já não fala achim" não é um mero fóssil universitário, nem um filósofo de opereta; Tolentino de Mendonça é o director do secretariado nacional da Pastoral da cultura (uma espécie de responsável da Igreja pelos assuntos culturais), um poeta de valor, um pensador da Igreja, que organizou, entre outras coisas, a sessão em que o Papa Bento XVI se encontrou no CCb com variadíssimas gentes da cultura.
Imagem de perfil

De Nuno Castelo-Branco a 30.03.2011 às 12:09

Pois sim, mas extremamente "secante". Pelo menos, foi o que vi na tv.

Comentar post







Arquivo

  1. 2025
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D
  14. 2024
  15. J
  16. F
  17. M
  18. A
  19. M
  20. J
  21. J
  22. A
  23. S
  24. O
  25. N
  26. D
  27. 2023
  28. J
  29. F
  30. M
  31. A
  32. M
  33. J
  34. J
  35. A
  36. S
  37. O
  38. N
  39. D
  40. 2022
  41. J
  42. F
  43. M
  44. A
  45. M
  46. J
  47. J
  48. A
  49. S
  50. O
  51. N
  52. D
  53. 2021
  54. J
  55. F
  56. M
  57. A
  58. M
  59. J
  60. J
  61. A
  62. S
  63. O
  64. N
  65. D
  66. 2020
  67. J
  68. F
  69. M
  70. A
  71. M
  72. J
  73. J
  74. A
  75. S
  76. O
  77. N
  78. D
  79. 2019
  80. J
  81. F
  82. M
  83. A
  84. M
  85. J
  86. J
  87. A
  88. S
  89. O
  90. N
  91. D
  92. 2018
  93. J
  94. F
  95. M
  96. A
  97. M
  98. J
  99. J
  100. A
  101. S
  102. O
  103. N
  104. D
  105. 2017
  106. J
  107. F
  108. M
  109. A
  110. M
  111. J
  112. J
  113. A
  114. S
  115. O
  116. N
  117. D
  118. 2016
  119. J
  120. F
  121. M
  122. A
  123. M
  124. J
  125. J
  126. A
  127. S
  128. O
  129. N
  130. D
  131. 2015
  132. J
  133. F
  134. M
  135. A
  136. M
  137. J
  138. J
  139. A
  140. S
  141. O
  142. N
  143. D
  144. 2014
  145. J
  146. F
  147. M
  148. A
  149. M
  150. J
  151. J
  152. A
  153. S
  154. O
  155. N
  156. D
  157. 2013
  158. J
  159. F
  160. M
  161. A
  162. M
  163. J
  164. J
  165. A
  166. S
  167. O
  168. N
  169. D
  170. 2012
  171. J
  172. F
  173. M
  174. A
  175. M
  176. J
  177. J
  178. A
  179. S
  180. O
  181. N
  182. D
  183. 2011
  184. J
  185. F
  186. M
  187. A
  188. M
  189. J
  190. J
  191. A
  192. S
  193. O
  194. N
  195. D
  196. 2010
  197. J
  198. F
  199. M
  200. A
  201. M
  202. J
  203. J
  204. A
  205. S
  206. O
  207. N
  208. D
  209. 2009
  210. J
  211. F
  212. M
  213. A
  214. M
  215. J
  216. J
  217. A
  218. S
  219. O
  220. N
  221. D
  222. 2008
  223. J
  224. F
  225. M
  226. A
  227. M
  228. J
  229. J
  230. A
  231. S
  232. O
  233. N
  234. D
  235. 2007
  236. J
  237. F
  238. M
  239. A
  240. M
  241. J
  242. J
  243. A
  244. S
  245. O
  246. N
  247. D

Links

Estados protegidos

  •  
  • Estados amigos

  •  
  • Estados soberanos

  •  
  • Estados soberanos de outras línguas

  •  
  • Monarquia

  •  
  • Monarquia em outras línguas

  •  
  • Think tanks e organizações nacionais

  •  
  • Think tanks e organizações estrangeiros

  •  
  • Informação nacional

  •  
  • Informação internacional

  •  
  • Revistas