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Parece que existe um novo espaço na Blogosfera que promete picar em 2012 --
Eu estou por lá e o João Gomes de Almeida também, por isso, é de ficar atento!
Parece que começa hoje a escolha do adversário de Obama para as próximas eleições presidenciais no EUA.
Começam já as polémicas, as lavagens de roupa suja em público, as campanhas milionárias, enfim a telenovela do costume acompanhada 24h pelo resto do mundo - porque enfim, goste-se ou não, estas influenciam tudo o resto.
Podia começar agora a dissertar sobre os candidatos ou sobre os métodos de eleição ou ainda a influência que os resultados podem exercer na política mundial, mas para já vou limitar-me a observar e a guardar os meus comentários para mais tarde - não podia no entanto não deixar a nota.
Soube-se ontem que a Jerónimo Martins, através de um comunicado divulgado na página da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários, deu nota pública dos contornos do negócio entre as duas sociedades comerciais pertencentes a Alexandre Soares dos Santos: a Sociedade Francisco Manuel dos Santos, SGPS SA (com sede em Portugal) vendeu mais de 353 milhões de acções, correspondentes a 56,1% do capital do Grupo Jerónimo Martins, à Sociedade Francisco Manuel dos Santos BV (com sede na Holanda).
Apesar da sede passar a estar localizada na Holanda, o controlo do grupo continuará a pertencer à sociedade portuguesa através de um acordo parassocial também firmado. Na prática isto significa que as mais-valias e os dividendos são atribuídos à sociedade holandesa sendo que, todavia, o controlo continua a ser exercido pela sociedade portuguesa.
Muitos foram os comentadores que se apressaram hoje a criticar tal decisão. Sinceramente não percebemos o motivo. Na verdade, o facto de o nosso País pertencer à UE permite que, de acordo com a lei, as sociedades comerciais portuguesas, como as de qualquer outro Estado-membro, possam utilizar a legislação em vigor de acordo com os seus interesses comerciais. Não nos esqueçamos que o objectivo de uma sociedade comercial é precisamente a obtenção de lucro.
Num País como o nosso em que, ano sim, ano não, se assiste a enormes transformações no regime fiscal das SGPS, em que o Estado é o primeiro, através da legislação que cria, a não favorecer a estabilidade dos negócios, em que o Fisco apenas se preocupa com o saque fiscal e não com a durabilidade e a estabilidade dos contribuintes, sejam eles sociedades ou individuais, só um mau gestor não tomaria, ainda que a contragosto, uma decisão como aquela que Alexandre Soares dos Santos tomou. E Soares dos Santos não é um mau gestor, muito pelo contrário. É dos poucos que em Portugal tem sabido defender os nossos valores e colocar, de forma criteriosa, "o dedo na ferida". Mas a paciência tem limites e estes foram atingidos. Só o Governo não o compreendeu. E, com a miopia revelada, acabou por deitar tudo a perder.
De que serve o Governo anunciar que pretende ir buscar novos investimentos estrangeiros quando não consegue sequer cuidar dos melhores investimentos nacionais? Que lhes sirva de lição. Vamos ver é se dela retiram qualquer benefício útil para o futuro. No que me toca tenho as maiores dúvidas.
Este belo edifício que ainda está de pé na Rua de S. Lázaro - ao Martim Moniz/Hospital de S. José -, foi um motivo para auscultar a posição que os funcionários da Câmara Municipal de Lisboa têm acerca do património daquela prestimosa instituição. Ainda era João Soares Presidente, quando um dia, em conversa com um dos seus assessores, lhe falei na necessidade urgente de recuperar este prédio. A resposta sacramental tinha como formal desculpa, a ..."falta de verbas para a reabilitação" e assim contra-ataquei, dizendo disponibilizar-me para ficar com um dos pisos e restaurá-lo à minha conta. Restaurá-lo como deve ser, claro, respeitando o pé direito do apartamento, os tectos trabalhados, o soalho de madeira, a divisão interna e totalmente recuperando a cozinha, casas de banho, janelas, gradeamentos, etc. Mais ainda, disse-lhe que estava disposto a encontrar quem fizesse o mesmo aos restantes pisos. A única condição seria um contrato prolongado no tempo e uma renda que não poderia deixar de ser razoável, devido às despesas que as obras acarretariam.
Tive pronta resposta ao teste, a este "experimentar de coração de branco":
- "Aaaaah... não podemos fazer isso. Se ocorrer um sismo em Lisboa, teremos de colocar as pessoas em qualquer lado, não? Onde iremos então encontrar casas? A Câmara tem obrigações..."
Desatei a rir. Se a CML é um dos mais desleixados, arrogantes e incompetentes proprietários que arruínam a cidade, porque razão sobreviveriam a um cataclismo, as centenas, senão milhares de prédios que lhe pertencem?
Pois bem, passaram mais de dez anos e o prédio encontra-se totalmente abandonado e tal como convém aos "mesmos de sempre", de janelas escancaradas, para que se acelere o inevitável processo de demolição. Aqui está uma foto "salgada" para um vereador da pseudo-reabilitação urbana que também prazenteiramente carrega às "costas", um Presidente comentadeiro de quinta-feira à noite.
O Diário de Notícias diz que Isaltino Morais tem 369.000 Euros depositados na Suíça. Pffff... grande coisa! "Diz-se que", "consta que", "tem-se a certeza de que" há quem tenha 387.000.000 de Euros escondidos algures num paraíso fiscal das Caraíbas e ninguém faz grande caso disso. Por outras palavras, o preço de uma fragata ancorada em paragens de piratas.
A meio do segundo mandato de Franklin Roosevelt, os cérebros do New Deal começaram a preocupar-se com a crescente inquietação popular relativamente à dívida nacional. Naquela época, a dimensão da dívida estava na mente de todos. Na realidade, Franklin Roosevelt havia, em parte, chegado à presidência, em 1932, com a promessa de diminuir a dívida que, mesmo sob o frugal Sr. Hoover, as pessoas tendiam a pensar que tinha atingido uma dimensão ameaçadora. Os sábios do Sr. Roosevelt preocupavam-se profundamente com essa tensão crescente. E então, de repente, a comunidade académica acorreu em seu socorro. Um grande espectro de economistas foi electrizado por uma teoria da dívida introduzida em Inglaterra por John Maynard Keynes. Os políticos esfregaram as mãos em sinal de gratidão. Retratando as consequências políticas da descoberta inebriante de Lord Keynes, o cartoonista do Washington Times Herald fez um desenho inesquecível. No centro, sentado num trono em frente a um mastro, estava um FDR em júbilo, cigarro inclinado para cima quase na vertical, um sorriso no rosto de orelha a orelha. Dançando à sua volta num círculo, de mãos dadas, de rostos brilhando de êxtase, os cérebros, cobertos de vestes académicas, cantavam o mágico encantamento, a grande descoberta de Lord Keynes: "Devêmo-la a nós mesmos."Com quatro palavras talismã, os especialistas em planeamento tinham eliminado o problema da despesa sob déficit. Daí em diante, alguém que se preocupasse com um aumento da dívida nacional era simplesmente um ignorante da percepção central da economia moderna: que importa o quanto nós - o estado - devamos uma vez que o devemos a nós mesmos? Avante com a despesa! Impostos e mais impostos, gastar e gastar, eleger e eleger...
William F. Buckley, excerto de discurso de Maio 1958
Miguel de Unamuno, Portugal, povo de suicidas:
"Oliveira Martins era um pessimista, quer dizer, era um português. O Português é constitucionalmente pessimista; ele próprio no-lo repete. Não é acaso a poesia desesperada de Antero de Quental a flor amarga deste espírito? Acaso encontrou alguma vez o desespero acentos mais trágicos, mais profundamente poéticos na sua rígida estrutura metafísica, menos artísticos? Em Leopardi a poesia da dor está temperada pela arte, mas o Português não é artista."
Uma delas traduz-se na arrogância de subitamente alguém dizer a todos os outros: "Atenção! A partir de agora todos escrevem assim."
Um bom artigo, fundamentado, que expõe algumas das fragilidades do acordo ortográfico.
Na sua derradeira crónica de 2011, Miguel Sousa Tavares aponta a falta de um "grande homem", de um ..."grande Presidente da República" capaz de unir o país nesta hora de desespero. Não pensando no actual residente de Belém, todos sabemos a quem se quis referir, talvez precisamente àquele que de cedência em cedência e incúria em incúria, muito contribuiu para inaugurar pomposamente, o ruinoso ciclo da política marginal que apenas respeita à conhecida camada dirigente, sobrepondo-se ao interesse geral. Por interesse geral considera-se primeiramente, a obra que nas escolas defenderia o desde há duas gerações totalmente ausente legado histórico que faz de nós portugueses e no campo das actividades humanas - a exclusiva preocupação dos controladores de águas residuais -, grita-se agora por uma acção que defenderia os campos, as actividades da orla marítima, a das fábricas hoje fechadas e que durante duzentos anos produziram vidros de excelência ou pela azáfama da rede dos estaleiros que há muito lançavam navios ao mar. Tarde demais, pois tudo se desperdiçou na cata pela obtenção de "estatuto" há décadas sonhado pelos oligarcas e que estes decidiram chamar de "Europa". Uma Europa que para eles se limitava às intermináveis vénias em conferências, dinheiros vertidos nas respectivas contas bancárias, comezainas, viagens em jets privativos, trocas de barretes honoris causa e pouco mais.
Miguel Sousa Tavares poderá ter ficado momentaneamente envergonhado por aquilo a que além raia se assiste. Em Espanha, igualmente desesperada por uma crise que inevitavelmente se fará sentir e poderá ainda mais ser agravada pelo pulsar dos egoísmos regionalistas à mercê de aventureiros, agiganta-se uma figura que em si encarna o devir de dezenas de milhões. Trata-se de muito mais do que um homem, neste caso um conhecido mortal pouco dado a intelectualismos e que nem de longe cultiva os interesses de preservação identitária de um povo - isso nem sequer pode ele fazer no seu Reino - como em Portugal o Duque de Bragança há muito nos habituou. Mais que para esse homem, é para a Coroa - a entidade de vagos contornos, mas que no momento essencial a todos sintetiza numa vontade - para quem ansiosamente olham os deputados reponsáveis para o bem e para o mal, por tudo aquilo em que a Espanha se tornou. Enquanto nas Cortes muitos se sentam na "certeza de um republicanismo" com a irritante tendência para no momento exacto se evaporar numa estrondosa aclamação daquele que os pode livrar da ira dos "indignados" eleitores, em S. Bento impera o silêncio próprio dos sepulcros.
Cavaco Silva proferiu o discurso que se esperava e que encerra todos os temores dum sistema procurando tornear o óbvio, ou seja, a sua mais que perfeita caducidade sem remédio. Um bom discurso, há que dizê-lo, mas sem aquele pormenor essencial capaz de o tornar num momento de união neste tempo de todos os perigos. Falta a este sucedâneo de Regente, a legitimidade da independência e sem dúvida, a pertença ao elo essencial daquela corrente que em cada anel desfia as décadas que se multiplicaram em séculos. Por isso mesmo não invoca um nome, uma data, um exemplo do levantar nacional noutros sombrios tempos que ameaçaram a nossa independência. Simplesmente jamais o poderá fazer, sob pena de totalmente renegar aquela instituição por ele próprio encarnada. Contudo, se tivesse ousado, todos o teriam entendido.
A oligarquia da República encontra-se aterrada pela perspectiva das consequências que a sua obra poderá implicar. Como pode o Presidente do regime exigir - como, a quem, com que meios? - o crescimento económico, quando ele próprio foi um impiedoso agente da demolição de sectores sempre vitais para a sobrevivência de qualquer comunidade organizada em Estado? Como pode exigir a coesão, num momento em que ele próprio surge como uma parte interessada no bastante desacreditado jogo político? Tudo falhou, precisamente se começarmos pela miríade de institutos de fachada aparentemente generosa e em sintonia com um certo tempo, mas que mais não significaram senão um programa ideológico que confirma a usura dos bens comuns, em prol de uma ínfima minoria de guindados aos pequenos, médios e grandes poderes bem instalados a torto e a direito. Apela às "instituições civis (?) e religiosas" pelo pronto socorro, nelas reconhecendo uma superioridade que no Estado e nos seus agentes não pode encontrar.
Este bom discurso que não terá consequências ou impacto de maior, apenas confirma aquilo que todos suspeitam e abertamente já referem sem qualquer perigo de severa punição: eles sentem-se perdidos e têm razão para tal incómodo. Não perceberam que há que ousar, ir cada vez mais longe, cortar ou pelo menos afrouxar as amarras que se a alguns serviram de corda alçante, à maioria transformou em prisioneira na sua própria terra. O Presidente do regime continua a insistir na esfumada miragem da Europa, quando há poucos dias verificámos sem qualquer surpresa, na existência de muito mundo a redescobrir para além do da Ponta de Sagres ou do rio Niémen.
De facto, a Europa é demasiadamente pequena, eles já não existem e há que disso mesmo avisá-los.
Agradecimentos e créditos ao Aventar e ao 5dias
(Ricardo Santos Pinto)
Resumo:
. A área de intervenção da Barragem afecta totalmente a Região do Douro Património Mundial.
. A construção da Barragem significaria um impacto muito grande na Região do Alto Douro Património Mundial que implicaria a perda do VEU (Valor Excepcional Universal) e sérias ameaças à sua autenticidade e integridade.
. Todas as outras estruturas, incluindo as linhas para o transporte de energia que não estão representadas nos projectos, têm um impacto muito negativo numa área classificada como Património Mundial.
. Medidas compensatórias, mesmo que tenham de ser revistas à luz do Plano de Gestão, não são o ponto mais importante, mas sim se a Barragem de Foz Tua deve ser construída de todo.
TRADUÇÃO (NÃO OFICIAL) PORTUGUESA
Id. N º: 1046
Coordenadas geográficas: N41 º 6 ’6”W7 º 47′ 56”
Data de inscrição: 2001
Data de consultoria do relatório da missão: 27 de Junho de 2011
Relatório elaborado por: Ana Luengo Añón, doutorada em Arquitectura Paisagista, ICOMOS-IFLA
Comité Internacional Científico sobre Paisagens Culturais
Relatório solicitado por: ICOMOS
1. Introdução.
2. História do local e descrição.
3. Descrição de alterações ou desenvolvimentos propostos.
4. Apreciação e avaliação do impacto global das mudanças propostas.
5. Plano de gestão.
6. Resumo e conclusões.
7. Bibliografia.
8. Agradecimentos e autoria.
9. Ilustrações adicionais e fotografias.
10. Apêndices:
Apêndice 1: Programa de itinerário.
Apêndice 2: Cronograma do Desenvolvimento da Barragem Foz Tua.
Apêndice 3: Declaração de Avaliação de Impacto.
1. Introdução
O Estado Português, através da sua representação na UNESCO, solicitou ao Comité do Património Mundial uma missão consultiva ao Alto Douro Vinhateiro, afim de avaliar o projecto de construção da Barragem Hidroeléctrica Foz Tua e o seu eventual impacto no valor universal excepcional da região, sua autenticidade e
integridade.
O cronograma da missão de aconselhamento ocorreu da seguinte forma:
Pedido de missão consultiva: 27 de Janeiro de 2011.
Aceitação de datas e de perito pelas autoridades portuguesas: 24 de Fevereiro de 2011.
Chegada de documentos para a missão: 7 de Março de 2011.
Datas da Missão: 4 a 6 de Abril de 2011.
Pedido de informações adicionais para o relatório: 07 de Abril de 2011.
Data limite para a informação chegar: 06 de Junho de 2011.
Data do relatório HIA: 27 de Junho de 2011.
A missão, conduzida pela doutora Ana Luengo Añón, doutorada em Arquitectura Paisagista e membro da ICOMOS-IFLA – Comité Internacional Científico sobre Paisagens Culturais, solicitou os seguintes dados:
A calendarização da visita tinha como objectivos:
Após a visita, foram solicitadas ao Governo as seguintes informações referentes à Barragem, fundamentais para uma avaliação correcta do projecto:
Os documentos indicados nos pontos 1 e 3 foram entregues, mas o ponto 2, relacionado com o Programa Nacional de Barragens, não foi entregue. Ao invés, foi entregue um Memorando sobre a construção da Barragem, que não acreditamos seja suficiente para avaliar plenamente as implicações deste Programa Nacional na paisagem do Douro.
2. História do local e descrição
O Alto Douro Vinhateiro, com o seu ambiente de tipo mediterrânico e de solos pobres e acidentados, que dificultam o povoamento e o desenvolvimento do Homem, é acima de tudo um excelente exemplo de uma relação única que foi estabelecida entre o Homem e o ambiente. Produz o Porto, um vinho cujas características foram definidas e reguladas desde 1756 e que é vendido em todo o mundo. Centrada no vale do rio Douro, agora inundado, a região é caracterizada por uma topografia em declive, sendo que as estão dispostas em socalcos. Estes foram construídos e aperfeiçoados ao longo dos séculos, permitindo ao Homem cultivar a vinha nas encostas mais íngremes e construir socalcos e mais socalcos – terraços sustentados por paredes de pedra xistosa. A maioria data do período que se seguiu à praga da filoxera em meados do século XIX, mas algumas são anteriores – o cultivo da vinha no Douro remonta pelo menos ao período romano – e o século XX assistiu à introdução de novos vinhedos e à construção de mais socalcos, de forma a responder às mudanças tecnológicas e às necessidades constantes de controlar a água e prevenir a erosão. As vinhas predominam, ao lado de oliveiras e amendoeiras, entre um mosaico de arbustos mediterrânicos e pequenos bosques. Culturas, bosques, cursos d’água, propriedades e construções agrícolas, organizadas em quintas ou casais, reflectem a contínua evolução da paisagem, contribuindo para que a terra mantenha um papel social activo e perpetuando uma economia próspera e sustentável.
Apesar das dificuldades de navegação no rio Douro, devido ao seu curso irregular, o vale do Douro constitui um corredor de pessoas que aqui se reuniram e se misturaram há milénios em vagas sucessivas. Estes trabalhadores anónimos criaram a paisagem existente, formada por declives íngremes e em vales que se encaixam em planaltos acima dos 400 metros. O Douro e os seus principais afluentes, o Varosa, o Corgo, o Távora e o Pinhão, formam a «espinha dorsal» do Douro Património Mundial, definido por uma sucessão de bacias hidrográficas em que o próprio rio está cheio por água proveniente de barragens: O vale contém hoje uma reserva de 100 – 200 m. No entanto, apesar desta mudança ser importante do ponto de vista ecológico e visual, a parte inundada do vale nunca foi ocupada ou cultivada.
Antes da construção das Barragens o rio Douro corria ao longo do seu leito rochoso irregular e ao fundo de um vale profundo de acordo com a época do ano: no verão o rio estava quase completamente seco e era responsável por epidemias frequentes de malária; no Inverno, violentas inundações, das mais fortes da Europa (superadas apenas pelos grandes rios do Oriente, como o Dniepre e o Volga), eram a consequência de fortes temporais. Havia muitos obstáculos naturais no rio, como rápidos violentos e estreitos ou bancos de areia que ameaçavam a navegabilidade. Durante o séc. XVIII, perante um aumento dos bens e dos valores que eram transportados pelos rios, as autoridades foram obrigadas a regularizar o seu leito. A construção de represas e barragens criou enormes bacias hidrográficas de águas calmas, que ofereciam grandes possibilidades para a modernização do rio, como as eclusas, suficientemente grandes para permitir a navegação de barcos de grande dimensão (até 83 m de comprimento). No início do séc. XIX, a melhoria das comunicações deu origem a um aumento do movimento no rio, sobretudo com a comercialização dos produtos agrícolas da região, especialmente vinho, que assim podia rapidamente entrar na rede de comércio internacional.
Até ao final do séc. XIX, o Douro era o único meio de transporte para a maior parte dos produtos da região (em especial o vinho), já que a via férrea junto ao rio foi construída apenas na década de 1870. Durante a primeira metade do séc. XX, esta via férrea foi estendida até aos estreitos vales dos afluentes do Douro. Hoje em dia, mantém-se ainda com mais de 50 túneis e 60 pontes.
Com o advento do caminho-de-ferro, a paisagem transformou-se, os produtos passaram a ser transformados com mais facilidade e o estilo de vida mudou, porque as pessoas passaram a poder viajar por toda a região vinhateira mais rapidamente e com maior segurança. A construção das Barragens – Pocinho, Valeira e Bagaúste – assegurou a navegabilidade no rio Douro e o fornecimento de uma quantidade significativa de energia hidroeléctrica para o país.
Melhorias na rede viária aceleraram o abandono do rio como uma via de transporte para pessoas e bens. Novas estradas ofereciam melhores acessos às regiões cujas paisagens, alteradas pela presença das reservas de água acima das Barragens, podiam ser vistas sob uma nova perspectiva. O resultado é uma paisagem visualmente dramática, ainda rentável e cultivada de forma tradicional pelos seus proprietários ancestrais.
A área do rio Tua é caracterizada pela existência de oliveiras, amendoeiras e plantações de vinho, com parcelas agrícolas a coexistirem com vastas áreas naturais cobertas por florestas mediterrânicas e galerias ripícolas. Na área específica da Barragem de Foz Tua, o rio Tua corta uma área de granitos, criando uma garganta profunda, no fundo da qual o rio corre sem qualquer barreira. É um habitat natural muito bem preservado, com parcelas agrícolas de reduzida dimensão e altamente interessante do ponto de vista de conservação da Natureza. Devido à sua singularidade, raridade e beleza, é considerada uma paisagem de alto valor e sensibilidade» (Estudo de Impacto Ambiental).
O trabalho do Homem pouco alterou a evolução natural nesta área específica. Basicamente, o Homem esculpiu na rocha a via férrea (1885-86) para a região interior de Mirandela, já que a extensão para Bragança foi suprimida na década de 1990, permitindo aos viticultores o desenvolvimento do Douro Superior. Esta é parte da via férrea principal acima referida, e os seus 133 km, com 5 túneis escavados na margem esquerda do rio, permitem alcançar paisagens espectaculares de dramáticas falésias.
O Comité inscreveu o Alto Douro Vinhateiro na Lista do Património Mundial, sob critérios(iii) (iv) (v).
Critério (iii): O Alto Douro Vinhateiro tem produzido vinho durante quase dois mil anos e a sua paisagem foi moldada pelas actividades humanas;
Critério (iv): Os componentes da paisagem do Alto Douro são representativos da plena gama de actividades associadas com a produção de vinho – terraços, quintas, aldeias, capelas e estradas.
Critério (v): A paisagem cultural do Alto Douro é um excelente exemplo a nível europeu de uma tradicional região produtora de vinho, reflectindo a evolução desta actividade humana ao longo dos tempos.
Nenhuma Classificação de Valor Excepcional Universal foi preparada até agora pelo Governo.
A Avaliação do ICOMOS incluiu o texto Qualidades e Declaração de Significado, que deverá contribuir para uma futura Classificação de Valor Excepcional Universal:
Qualidades
A paisagem é visualmente dramática, uma criação muito antinatural. É testemunha do grande esforço das muitas gerações de agricultores quase totalmente anónimos e enólogos para contrariar as limitações físicas de uma região, a fim de criar condições favoráveis para a produção de vinho (e outras culturas), cuja qualidade e características distintivas têm gozado da aclamação mundial desde o séc. XVII. A especialização na produção de vinhos de qualidade e a rápida assimilação dos vinhos do Douro pelos circuitos internacionais expôs a região, desde cedo, a um sistema de relações cosmopolita. O vinho do Douro, especialmente o Vinho do Porto, representa uma criação cultural colectiva. Durante inúmeras gerações, os habitantes do Douro desenvolveram técnicas específicas de cultivo e produção de vinho, muitos dos quais foram introduzidos pelos Romanos e aperfeiçoados durante a Idade Média por comunidades de católicos. Desde a Idade Média, o Douro atraiu muitos trabalhadores de fora. O papel do vale do Douro como destino e corredor de pessoas e produtos dura até hoje, mesmo na tradição visual e oral, forma de expressão deste povo.
Declaração de Significado
O vinho tem sido produzido desde há 2 mil anos e desde o séc. XVIII o Vinho do Porto é o produto mais importante, famoso pela sua qualidade em todo o mundo. Esta longa tradição produziu uma paisagem cultural de enorme beleza que é ao mesmo tempo o reflexo da sua evolução económica, social e tecnológica.
3. Descrição de alterações ou desenvolvimentos propostos
O Estado Português está a propor a criação da Barragem Foz Tua situada na paisagem cultural da Região do Alto Douro Vinhateiro e com esse objectivo apresenta um documento a explicá-lo.
O Douro tem sido um rio estratégico para a implementação do projecto hidroeléctrico em Portugal desde o seu início. Foi em 1894 que a central do Aguierinho sobre o rio Corgo foi inaugurada e começou a fornecer energia elétrica para iluminação pública na cidade de Vila Real, sendo assim a primeira central hidrelétrica construída para fornecer energia a uma rede pública de electricidade. Nos anos seguintes (1906), a central de Ribacoa, no Rio Côa, começaram a operar e é hoje a mais antiga central na Bacia do Douro com o gerador mais antigo em funcionamento em Portugal. A central Varosa, no Rio Varosa, foi inaugurado em 1909. Hoje em dia, podem-se encontrar na região do Património Mundial a albufeira da barragem de Carrapatelo (concluída em 1972), a barragem da Régua (concluída em 1973) e a barragem Valeria (concluída em 1975), com seus reservatórios correspondentes, bem como a barragem do Pocinho. Na figura a seguir mostram-se todas as centrais hidrelétricas na Bacia do Douro (Português e do Douro Internacional com a Espanha).
Em 1976, Electricidade de Portugal (EDP) foi criada em resultado da nacionalização das companhias nacionais de produção de electricidade, e assumiu a gestão do serviço público de produção, transporte e distribuição de energia eléctrica. Em 1989, foi elaborado o Plano Nacional de Energia pelo Departamento de Indústria e Energia, o Desenvolvimento da Barragem da Foz do Tua foi, de novo, considerado um estudo prioritário. Em 1999, o Plano da Bacia Hidrográfica do Rio Douro foi aprovado, e no mesmo o Desenvolvimento da Barragem da Foz do Tua era referido como candidato prioritário. Nenhuma menção destas questões pode ser encontrada no dossier de nomeação entregue em 2000.
Em 2007, Portugal lançou o Programa Nacional de Barragens de Alto Poder Potencial, onde a Desenvolvimento da Barragem da Foz do Côa aparece, uma vês mais, com um projecto prioritário. No mesmo ano, o Desenvolvimento da Barragem da Foz do Côa foi submetido a uma Avaliação Estratégica Ambiental. Em 2008, o Instituto Português da Água promoveu um concurso público – de acordo com o DL n.º. 391-A-/2007, de 21 de Dezembro, quer altera o DL n.º 226/2007, de 31 de Maio – o qual atribuiu à EDP Produção, entidade que então desenvolveu o Estudo de Viabilidade para três níveis de armazenagem (195, 180 e 170) e a correspondente Avaliação do Impacto Ambiental. Este documento deu origem à Declaração de Impacto Ambiental em 2009, condicionalmente a correspondente (Recape?) foram submetidos pela EDP Produção em 1 de Julho de 2010 e são regularmente avaliadas pelas autoridades nacionais do ambiente.
Muitos ensinamentos foram transmitidos pelas autoridades competentes com respeito ao projecto e localização do FTDD (Desenvolvimento da Barragem da Foz do Tua), assim como os projectos exibidos abaixo.
É nesta fase de integral execução do projecto – incluindo, planos, secções e construção e são submetidos à WHC (?) para avaliação. No que respeita a este projecto, o FTDD (Desenvolvimento da Barragem da Foz do Côa) é para ser localizado no Rio Tua, o qual está localizado a meio do Rio Douro, o qual nesta parte tem um fluxo na direcção Nordeste-Sueste, justamente em direcção perpendicular ao próprio rio Douro. O FTDD (Desenvolvimento da Barragem da Foz do Côa) colocará uma barragem a 1 km da foz confinante com o Douro e consequentemente criando um reservatório na Zona Tampão, tangencial ao limite do (WH) lado ocidental da Paisagem Cultural, a qual compreende uma superfície estimada de 421 Há. Esta mudança traduz-se numa perda da profundidade a montante da barragem, em adição dos efeitos consequentes da submersão de diferentes elementos e a transformação da torrente do fluxo fluvial.
A área envolvida cobre cinco municipalidades (Alijó, Carrazeda de Ansiães, Mirandela, Murça e Vila Flor), localizados na Região de Trás-os-Montes e Alto Douro. As principais estruturas do FTDD (Desenvolvimento da Barragem da Foz do Tua) são, contudo, concentradas no município de Alijó, na margem direita do Rio Tua. Estas estruturas principais Estas estruturas principais, além do reservatório acima mencionado, são principalmente:
O FTDD (Desenvolvimento da Barragem da Foz do Tua) apresentada por parte do Estado já inclui um Plano de Reabilitação Ambiental e de Integração Paisagística que toma “em consideração a combinação de aspectos ecológicos, ascéticos, funcionais e económicos”, apontando para uma correcta e eficiente recuperação e integração ambiental e paisagística de valiosas paisagens e ambientes de ‘habitats’ de comunidades de vegetação. Conforme apresentado no plano da próxima página, várias intervenções estão programadas para tratar de:
- Habitat de reservas de áreas ribeirinhas,
- Intervenção fluvial,
- Plantações de ciprestes,
- Plantações de oliveiras,
- Hidrosemeaduras
O FTDD (Desenvolvimento da Barragem da Foz do Tua) é justificado pelo lado do Estado em conformidade com diversas razões. Nomeadamente o progressivo aumento do consumo de electricidade, como resultado do desenvolvimento económico, a necessidade de assegurar um seguro fornecimento de energia nacional, menos dependente de outros países; e a necessidade de produzir energia ‘limpa’ não associada aos gases com efeito estufa. As vantagens deste projecto serão um aumento na capacidade de produção de energia com base em recursos endógenos e naturais, assim como na capacidade de produção hidroeléctrica. Isto aumentará significativamente a segurança funcional do sistema eléctrico Português. Por outro lado, reduzirá as emissões de dióxido de carbono e as importações de combustíveis fósseis.
4. Apreciação e avaliação do impacto global das mudanças propostas
O primeiro ponto a ter em consideração quando se aprecia o impacto global da Barragem Foz Tua proposta é a área de impacto ser inteiramente em terrenos inscritos no Património Mundial. Isto pode ser demonstrado pelo entendimento de:
O Estado tenta evitar esse problema, afirmando que “a intrusão na paisagem cultural da região demarcada do Douro no que respeita à sua inclusão pela UNESCO e os componentes do seu património pode ser considerada como marginal e de tamanho reduzido quando comparado à totalidade do terreno”. Igualmente, no Memorando do Programa Nacional de Barragens com Elevado Potencial Hidroeléctrico entregue pelo Ministério do Ambiente e Ordenamento do Território (2011), o Estado afirma que nenhuma questão sobre o património ou paisagistica são abordados no Estudo de Impacto Ambiental uma vez que a Barragem Foz Tua se encontra fora das fronteiras do terreno declarado Património Mundial. Não são encontradas referências expressas no documento acerca do facto da Região Alto Douro Vinhateiro ser parte da lista Património Mundial. Não podemos deixar de concluir que da barragem – incluindo o reservatório nas suas costas – até ao próprio Douro, se encontra paisagem do Alto Douro Vinhateiro, marcada pelos socalcos cultivados nas encostas, no qual diverso equipamento tal como a central eléctrica e os os circuitos hidráulicos de descarga, serão localizados em terrenos inscritos no Património Mundial.
Estudo de Impacto Ambiental
Tal como referido acima, a Barragem Foz Tua sofreu um complexo estudo de impacto ambiental. Como resultado disto, na Declaração de Impacto Ambiental (DIA) um Plano de Reabilitação Ambiental e de Integração da Paisagem (PRAIP) foi preparado para a área de construção da Barragem Foz Tua, este plano foi necessário como componente do Relatório de Conformidade Ambiental para o Projecto de Construção. Embora o Estudo de Impacto Ambiental seja um documento complexo, nenhum estudo foi feito em relação aos valores património cultural, na documentação apresentada pelo Estado e, em particular, não há nenhum estudo do impacto no Valor Universal Excepcional. As directrizes do ICOMOS para Estudos do Impacto no Património não são referidas e não foi preparada nenhuma declaração sobre o Valor Universal Excepcional o que teria sido uma pré-condição essencial para um estudo adequado.
Na Declaração de Impacto Ambiental escrita pelo Ministério do Maio Ambiente para permitir o licenciamento da Barragem Foz Tua, (Apêndice 3 deste documento) não há uma única frase que faça referência ao facto da área afectada ser parte de um terreno classificado como Património Mundial e não há uma única palavra para expressar a sua preocupação em assuntos relacionados com o património. O Valor Universal Excepcional não é mencionado. A única informação tocando nestes assuntos tem a ver (ponto 1) com a submersão de 15,9km da Linha de caminho de ferro do Tua e mesmo nesta questão não tem em conta o património perdido mostrando-se mais preocupado com a mobilidade das pessoas. É sem dúvida um Estudo de Impacto Ambiental detalhado, como as páginas aqui incluídas deixam claro, focando-se até em espécies específicas da fauna e flora, mas não faz trata de forma nenhuma de assuntos relacionados com o património ou com o Valor Universal Excepcional do local.
O mesmo pode ser afirmado acerca do Memorando do Programa Nacional de Barragens com Elevado Potencial Hidroeléctrico, onde se afirma que quando foi feita uma análise de 25 locais possíveis para centrais hidroeléctricas, em referÊncia à Barragem Foz Tua, a paisagem da Região do Alto Douro Vinhateiro é classificada como tendo uma grande identidade e raridade. Inexplicavelmente, quando analisa os pŕos e contras das opções estratégicas, parece não haver conflito entre o uso hidroeléctrico e os valores do património cultural. Estes valores não são expressos em nenhum lado no dossier.
Os documentos consideram, no entanto, o impacto visual. Na “Síntese da Análise Visual” entregue pelo estado, toda a área de intervenção (Douro Vinhateiro, Baixo Tua e Terra Quente Transmontana) é dita constituir uma paisagens de elevada qualidade visual. Na tabela resumo mostrada a seguir, o Baixo Tua é a unidade de paisagem que apresenta ter a mais alta qualidade visual.
ATRIBUTOS ESTÉTICOS | VALORES VISUAIS | INTRUSÕES VISUAIS | CAPACIDADE DE ABSORÇÃO VISUAL | FRAGILIDADE E ACESSIBILIDADE VISUAL | QUALIDADE VISUAL | |
---|---|---|---|---|---|---|
REGIÃO VINHATEIRA DO DOURO | 3 | 3 | 3 | 2 | 2 | 2.6 |
BAIXO TUA | 3 | 3 | 3 | 3 | 3 | 3.0 |
TERRA QUENTE TRANSMONSTANA | 2 | 2 | 2 | 2 | 2 | 2.0 |
A Barragem de Foz Tua apresentada também incluí uma série de ante visões do projecto com as estruturas que lhe estão associadas. Uma selecção destas é mostrada nas páginas seguintes e dá uma correcta indicação de quão dramaticamente estas intervenções vão impactar na paisagem. O padrão das sementeiras vai ser modificado, a geomorfologia da paisagem vai ser alterada e, embora a subestação seja parcialmente escavada na encosta, o seu volume rectilíneo, massivo, irá criar uma ruptura na composição harmoniosa dos elementos na paisagem. As linhas de transporte de energia vão mesmo reforçar este efeito. Surpreendentemente, a barragem em si não é muito grave do ponto de vista visual, mas a marca que vai deixar é das mais dramáticas na generalidade da paisagem cultural.
Na ausência de um estudo do impacto sobre os atributos do Valor Universal Excepcional, uma avaliação pode ser sugerida seguindo critérios de avaliação já estabelecidos no planos de gestão submetido pelo Estado a quando da nomeação. Estes critérios para avaliar o impacto negativo no Plano de Gestão são baseados nos princípios de conhecimento, conservação e avaliação dos valores patrimoniais da paisagem. Seguindo esta metodologia há uma série de impactos negativos na paisagem que são o resultado de uma actividade na paisagem que cria uma perda no metabolismo e ordem da paisagem. Isto é interpretado como uma perturbação endógena e abusiva da presente situação. A sua magnitude é medida na escala cronológica (temporária, com efeitos prolongados ou permanente), na escala física (pontual, local ou regional) e na suas possibilidades de mitigação (fácil de mitigar, com dificuldades para mitigar e impossível de mitigar). Neste Plano de Gestão, mesmo que não tenha em conta a construção de novas barragens, os arredores das existentes já são considerados impactos permanentes, locais ou regionais que são difíceis de mitigar ou impossíveis de mitigar.
O impacto directo na Região do Alto Douro Vinhateiro, Património Mundial, ergue-se como principal consequência da construção da Barragem de Foz Tua resultando na perda física de parte da paisagem, modificando a forma em que a paisagem é apreciada dado que afecta o padrão, contexto e enquadramento do território Património Mundial. Este impacto vai resultar numa perda permanente e irreversível, de acordo com o Guia Exemplificativo de Determinação da Magnitude do Impacto do ICOMOS, uma vez que serão feitasgrandes modificações aos atributos históricos da paisagem que implicam “efeitos visuais extremos, grande mudança do ruído ou mudança na qualidade do som, mudanças fundamentais no uso ou acesso [...] resultando na mudança total da unidade do carácter da paisagem histórica e perda do Valor Universal Excepcional”.
Em suma, temos de dizer que tanto o Estudo de Impacto Ambiental como o Plano de Gestão fornecido pelo estado considerou a área de intervenção como uma paisagem de alta qualidade visual na qual a construção da Barragem de Foz Tua terá um impacto regional permanente que será difícil de mitigar. Se o Valor Universal Excepcional desta paisagem for tido em conta a Barragem de Foz Tua significará um grande impacto na Região do Alto Douro Vinhateiro o que implica uma séria e irreversível ameaça ao Valor Universal Excepcional.
Todo o projecto da Barragem de Foz Tua deveria ser reavaliado. Isto significa que os instrumentos legais que o governo Português tem à sua disposição para conservar a Região do Alto Douro Vinhateiro deveriam ser postos em prática, nomeadamente:
5. Plano de Gestão
Tal como indicado no processo de nomeação celebrado pelo ICOMOS, um dos elementos-chave para a gestão do local do Património Mundial proposto é o Plano de Gestão para a Região do Alto Douro Vinhateiro, direccionado para conservar e melhorar os padrões de vida, envolvendo a paisagem cultural. Os seus principais objectivos são melhorar a paisagem e os seus activos patrimoniais, minimizar a interferência com essa mesma paisagem, e elevar a qualidade do ambiente e do padrão de vida daquela área. Inclui esquemas, por exemplo, melhorar características da paisagem, tais como muros e terraços para supervisionar o património, estimular actividades rurais tais como o artesanato, facilitar a recepção de visitantes, […]. O Plano também implica os Serviços de Gestão do Alto Douro, a implementação de mais actividades específicas de gestão e conservação, incluindo a monitorização. O Plano de Gestão para a Região do Alto Douro Vinhateiro estabelecerá e formulará uma série de fases relevantes para monitorizar o estado de conservação da natureza. Entre os principais indicadores, os de natureza física são os mais notáveis: os muros e o seu estado de conservação, os métodos para a criação de vinhas, o planeamento associado das culturas, as árvores que são usadas na extremidade das propriedades com as vinhas verticais, a eliminação ou redução de intrusões na paisagem e o registo e conservação do património genuíno.
As linhas de orientação do desenvolvimento estratégico deste Plano de Gestão:
No Artigo 1 das suas “Linhas de Orientação Normativas” a alteração da morfologia das margens dos rios e a destruição parcial ou total da vegetação ribeirinha são consideradas acções proibidas, e no Artigo 2, o cruzamento de linhas de energia ou comunicação e a criação de estações de rede energética, assim como quaisquer intervenções com repercussões directas na paisagem devem ser divulgadas e avaliadas antes de se concretizarem.
Portanto, quando avaliado o FTDD (Desenvolvimento da Barragem da Foz do Tua) como tratado pelo Estado, e mesmo embora o documento estipule isso, ignora os impactos na paisagem em conformidade com os princípios estabelecidos nos requisitos da UNESCO ou mesmo no Plano de Gestão que do lado do Estado deveria ser seguido. Isto parece poder atribuir-se às linhas de orientação do Plano de Gestão que deveria ser entregue para os Planos Directores Municipais, os instrumentos de gestão local principal dos solos, mas não sucedeu assim. Hoje, a jurisprudência Portuguesa, os instrumentos regulamentares do uso da terra e da protecção da paisagem pertencem aos Planos Directores Municipais, criados ao abrigo do Decreto-Lei n.º 69 de 1990. Todos os PDM (Planos Directores Municipais) para todas as municipalidades na RDD (Região Demarcada do Douro) foram publicados no jornal oficial do governo, Diário da República, e ficaram, portanto, em vigor na altura em que a Região do Alto Douro Vinhateiro foi inscrita no Património Mundial Paisagístico.
Desde então, e tendo em conta que os Planos Directores Municipais têm uma validade de 10 anos, após os quais necessitam de ser aprovados de novo, os mesmos deveriam, todos, ser incluídos agora nas linhas de orientação estabelecidas no Plano de Gestão. Como fomos informados durante a missão, muitos dos municípios NÃO têm os seus planos aprovados ainda.
A tabela seguinte foi incluída ao tempo da Nomeação de Património Mundial, e o plano exibido abaixo mostra o estado dos diferentes Planos Directores Municipais (a verde estão assinalados os que foram aprovados; fora do local do Património Mundial apenas um).
Mesmo que o Plano de Gestão não tenha sido transposto para Planos Directores Municipais, parece ser vontade de algumas agências do governo empenharem-se na conservação da paisagem, como é o caso da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte (CCRD-N). Esta instituição esforça-se por:
A CCRD-N colocou em prática um projecto direccionado para a conservação das vinhas e seus terraços. Todos os projectos têm de seguir um esquema geral que assegure que os mesmos devem ser construídos de forma a manterem os perfis topográficos tão característicos da paisagem do Douro e manter os sistemas de drenagem necessários para o correcto funcionamento do ecossistema. Muitos dos projectos, cujos dados referentes à área da superfície que beneficiou deste processo, e a concessão económica disto teve custos, parecem bem instrumentalizados e o trabalho feito de acordo com o Plano de Gestão. Interessante, muitos destes estão localizados na área de reserva e mesmo para além destae aqueles que foram aprovadas: fora do local do Património Mundial, uma apenas).
(Em actualização)
6. Resumo e Conclusões
1) A afirmação do Estado de que a transformação da paisagem proposta é idêntica a outras no vale do rio Douro, embora com uma dimensão muito menor, não pode ser tida em conta, porque acções passadas não podem de forma alguma justificar acções presentes.
2) A afirmação do Estado de que a área de intervenção da Barragem de Foz Tua está fora da Região do Douro Património Mundial é falsa: nós demonstramos acima que não é assim e que a área de intervenção da Barragem afecta totalmente a Região do Douro Património Mundial.
3) A afirmação do Estado de que a Barragem não é considerada intrusiva visualmente, porque a morfologia do vale permanecerá, enquanto que a forma «elegante da Barragem de larga escala / monumental, vai criar uma marca impressiva no horizonte visual do observador, que atenuará todos os impactos visuais negativos. Nós demonstrámos acima que a construção da Barragem significaria um impacto muito grande na Região do Alto Douro Património Mundial que implicaria a perda do VEU (Valor Excepcional Universal) e sérias ameaças à sua autenticidade e integridade.
4) A afirmação do Estado de que a Barragem de Foz Tua é considerada bastante contida devido às características morfológicas e fisiográficas desta parte do vale do Tua, assim garantindo uma bacia visualmente restrita que não provoca qualquer alteração no uso da terra nas proximidades do rio Douro. Mesmo que pudéssemos concordar com esta afirmação, todas as outras estruturas, incluindo as linhas para o transporte de energia que não estão representadas nos projectos, têm um impacto muito negativo numa área classificada como Património Mundial, como demonstrado nas fotomontagens que apresentamos acima.
5) O projecto contempla um grande número de medidas mitigatórias e compensatórias para compensar os efeitos ambientais da construção da Barragem de Foz Tua, que visam manter o vale do Tua em boas condições ambientais e aumentar as oportunidades, nomeadamente no que diz respeito ao desenvolvimento sustentável na região. Medidas compensatórias e de potencialização da região incluem a criação de projectos que mantenham a memória do património cultural e natural afectado pela Barragem, bem como o desenvolvimento de equipamentos para influenciar o desenvolvimento económico a nível local (um museu em Foz Tua, uma Agência de Desenvolvimento Regional, e um Parque Natural Regional). Medidas compensatórias, mesmo que tenham de ser revistas à luz do Plano de Gestão, não são o ponto mais importante, mas sim se a Barragem de Foz Tua deve ser construída de todo, já que o próprio Estado afirma que «de acordo com os resultados da análise visual e ecológica, a paisagem apresenta um alto valor.» (Estudo de Impacto Ambiental).
É reconhecido que o Estado, em conjunto com a EDP, mudou várias vezes o projecto da Barragem de Foz Tua, de forma a reduzir o impacto ambiental detectado no Avaliação de Impacto Ambiental. No entanto, como a avaliação de impacto não considerou o impacto no património cultural activo ou nos atributos do VEU (Valor Excepcional Universal), os novos projectos não podem, por todas as razões acima mencionadas, ser considerados como respeitadores da paisagem do Alto Douro Património Mundial. Esta parte do Vale do Tua «tem um alto valor cénico e valores ecológicos relacionados com parâmetros culturais e biofísicos que caracterizam a sua estrutura e dinâmicas» (O Projecto Hidroeléctrico da Foz Tua e a Paisagem do Alto Douro Património Mundial»), os quais contribuem para o seu VEU (Valor Excepcional Universal). A construção da Barragem de Foz Tua terá um impacto prejudicial e irreversível nos valores de autenticidade e integridade e VUE (Valor Excepcional Universal) da Região.
Por outro lado, embora notemos os esforços feitos pelo Estado na elaboração de um projecto para minimizar os impactos da Barragem de Foz Tua, estamos em crer que as Directrizes da UNESCO sobre «Relatórios e Estudos de Impacto Específicos de cada vez que ocorram circunstâncias excepcionais» (pág. 169 das «Directrizes Operacionais»), não foram cumpridas – a UNESCO deve ser avisada logo que possível (por exemplo, antes de redigir documentos básicos para projectos específicos) e antes de serem tomadas quaisquer decisões difíceis de inverter posteriormente, de forma a que o Comité pudesse ajudar na busca de soluções adequadas para assegurar que o VEU (Valor Excepcional Universal) da Região fosse totalmente preservado». (pag. 172). Para além disso, uma avaliação de impacto devia ser realizada para avaliar o impacto potencial de projectos sobre o VEU (Valor Excepcional Universal) da Região, de acordo com as Orientações sobre as Avaliações de Impacto Cultural nas Regiões Património Mundial, 2011.
Nós consideramos que o Estado deve rever seu Programa Nacional de Barragens de Alto Potencial Hidroelétrico, levando em consideração ao avaliar os possíveis 25 projectos as questões que estão em jogo a nível do património e qualquer impacto potencial sobre o Património Mundial da Humanidade. Qualquer outro desenvolvimento da futura barragem na bacia do Douro incluído neste Programa Nacional que possa ter impacto sobre a Região Património Mundial deve ser igualmente revisto.
Esta classificação para a Região deve ser preparada de forma a poder actuar como base para qualquer futura avaliação de impacto.
O Plano de Gestão entregue para a nomeação do Património Mundial (2000) não está a ser posto em prática, porque é «uma ferramenta que dificilmente coordena a acção das entidades públicas, da mesma forma que as suas directrizes, para serem eficazes, devem ser transpostas para os Planos Directores Municipais. Para além disso, no caso específico da Barragem de Foz Tua, o Plano não previu o retorno para os projectos das barragens, especialmente após os eventos associados à barragem do Côa que causou a suspensão do trabalho como resultado de grandes descobertas arqueológicas. Portanto, as diretrizes estabelecidas não estão a ser cumpridas, uma vez que não é operacionalizável e está desactualizado. Isto significa que, embora o estado de conservação geral seja bom, isso deve-se às directrizes de outros organismos governamentais, aos proprietários privados que estão conscientes de sua herança e graças a uma espécie de «inércia de conservação». Como não há Plano de Gestão operacionalizável, nem um organismo que o coloque em prática, a conservação do Douro Património Mundial não é um dado adquirido. Portanto, a revisão do Plano de Gestão(actualizando-o para que ele se torne uma ferramenta de gestão) deve ser uma prioridade, bem como a criação de um organismo de gestão com competência para dirigi-lo.
Neste Plano de Gestão, disposições especiais devem ser feitas para a protecção da configuração, como já afirmado na avaliação que o ICOMOS fez do Plano de Gestão que “refere-se apenas à zona central proposta para inscrição e não faz nenhuma provisão para protecção e gestão da zona tampão [...], o que nos leva a abordar o controle do desenvolvimento da zona-tampão.»
7. Bibliografia
ICOMOS, Guidance on Heritage Impact Assessments for Cultural World Heritage properties, Paris 2011.
Electricidade de Portugal, Aproveitamento Hidroeléctrico de Foz Tua: Relatório de Conformidade Ambiental do Projecto de Execuçao (RECAPE), June 2010.
Estrutura de Missão do Douro, The Foz Tua Hydrolectric Project and the Alto Douro Wine Region Cultural Landscape, November 2010.
Estrutura de Missão do Douro, Estudo de Impacte Ambiental do Aproveitamento hidroeléctrico de Foz Tua,
Ministério do Ambiente e do Ordenamento do Territorio, Memorando of the Programa Nacional de Barragens com Elevado Potencial Hidroeléctrico, Portugal 2011.
Ministerio do Ambiente e do Ordenamento do Territorio, Declaração de Impacte Ambiental, Lisboa, May 2009.
Nomination of Alto Douro Wine Region for the WH List, June 2000, English resume.
Plano Intermunicipal de Ordenamento do Território do Alto Douro Vinhateiro, handed in by the State Party of Portugal for the Nomination of the property, Oporto 2000.
World Heritage Centre, Committee Decision (Decision -25COM X.A ), 2001.
8. Agradecimentos e autoria
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