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Irlanda Rosa, minha avó (e o meu pai), Lourenço Marques, Moçambique, 1936
Que ofereça um tacho ao João Miranda? O simplismo demagógico e o esforço são tão pronunciados, que de certeza encontrarão alguma coisa que lhe sirva na perfeição. Director de spin doctoring da São Caetano, por exemplo.
Um Governo que se caracteriza não por agir mas sim por reagir. Um Governo que lança medidas socialmente injustas ou verdadeiramente surrealistas (essa de taxar em 10% o subsídio de desemprego não lembrava ao diabo...). Um Governo que conseguiu que ninguém em Portugal saiba qual é a sua vida num prazo de 6 meses ou se tem emprego no dia a seguir, que torna impossível que um cidadão saiba se pode ou não fazer uma despesa extra porque não tem a certeza se a poderá pagar. Um Governo que expulsa os melhores do País. Um Governo que hoje anuncia uma coisa e amanhã faz outra bem diferente. Um Governo em que alguns depositaram esperança, deram o seu voto e que tem no seu seio, inclusive, alguns (poucos) bons ministros e secretários de Estado mas que é dirigido por dois incompetentes: a dupla Passos-Gaspar. Este é o Governo de Portugal. Para ajudar à festa, um Presidente da República acantonado em Belém e sem saber o que fazer, rezando diariamente para que "o tirem deste filme". Em suma, os agonizantes últimos dias da III República ao vivo e a cores. Na rua, porque o cinema, esse já fechou.
Roger Scruton, The Meaning of Conservatism:
«More importantly, however, we must remind ourselves that a right becomes political reality only with the power that is able to enforce it. Rights without powers are political fictions. Natural rights could only be enforced by the power of civil jurisdiction, which in turn exists in order to uphold the ‘positive rights’ of a given system of law. The all-important political task is therefore to erect such a legal system, and to guarantee that the state will yield to it any conflict. It is only on the assumption that we can succeed at this task that it makes sense to constrain our politics in obedience to natural law. The essential component of such a conservative legal system is judicial independence. A legal system founded in judicial precedent, operated by judges who are truly independent of all interested parties, will have a natural tendency to gravitate towards the ‘natural rights’ which ordinary people recognize. The true enemy of natural law, I argue, is not the judge, but the politician, and the greatest threat to just dealings between people is the attempt to remake society from above, in conformity with a conception of ‘social justice’.»
Num Bloco em claro declínio, olhou para o relógio no momento exacto. O meu vizinho Francisco Louçã saiu do Parlamento, regressando aos seus afazeres profissionais. Fica então o BE reduzido a uns tantos desconhecidos e pouco cativantes patuscos. Muito aqui se criticou o ainda chefe oculto do BE e tal se deve à persistência com que defende um modelo caduco e claramente opressivo que flagelou povos mundo fora. Esteve sempre do lado errado, procurando dourar a prepotência com palavras de uma pretensa igualdade que sem qualquer dúvida, sempre significou um tabelar por muito baixo, obrigando milhões ao livre arbítrio de uns tantos lunáticos.
Teve e ainda tem uma agenda oculta que todos conheciam? Decerto e sabendo bem os portugueses o que significaria uma sociedade organizada segundo os moldes exigidos pelo BE, a resposta chegou sempre através daquele exercício que assusta aqueles que muito falam de democracia, mas que odeiam a sua forma basilar de exercício: o voto.
Ao contrário dos ditirambos que hoje podemos ler online, Louçã nem sequer foi um Acácio Barreiros ou um grande orador comparável àqueles que durante o século XIX povoaram S. Bento, limitando-se O Coordenador a fazer a gestão ou contabilidade dos dizeres da mais clara propaganda, a panóplia facilitista do bota-abaixo populista. Nunca apresentou uma proposta credível para a resolução dos principais do país e consequentemente, daqueles que vegetam sem emprego e sem futuro. As frases há muito feitas e noutras gerações escutadas como promessa de apetitosos manás, a crítica pelo eterno convencimento da baixeza de outrem, o infalível apontar do dedo aos outros que arcam com as responsabilidades do exercício do poder - o famigerado arco governamental -, a farsa do amor à liberdade - enquanto na sede partidária se dependuram cartazes de facínoras internacionais -, a fria e ostensiva recusa do cumprimento das mais corriqueiras normas da cortesia institucional - até para com Chefes de Estado estrangeiros, tal como sucedeu com um grande amigo de Portugal, o rei de Espanha -, eis a verdadeira soma, o saldo da sua actividade parlamentar. Homem conhecedor das matérias em que profissionalmente se especializou, poderia ter oferecido um contributo positivo, definitivamente alijando a quimera de um sonho totalitário sem nexo e que roça a psicopatia. Em suma, o Louçã do cilício vermelho sempre pareceu garantir de existência de um inesgotável pote de ouro, deliberadamente escondido no outro lado do arco-íris pelo péfido "sistema liberal" que rouba por mero exercício da maldade, da avidez. Nada mais simples, nada mais fácil para convencer uns tantos.
No entanto..., habituados como estamos à miséria franciscana dos nossos debates parlamentares desta 3ª república praticamente morta, o retintamente burguês Louçã prendia-nos a atenção, obrigava-nos ao por vezes irritado comentário e à adivinha daquilo que pretendia. Não era difícil imaginarmos o que verdadeiramente queria impingir, há muito todos o sabemos, mas insistíamos em lobrigar algo de diferente na sua ora sempre recheada de ditos espirituosos e fatalmente achincalhantes do adversário do momento, semeando a suspeita pessoal que mina as instituições. A "desonestidade dos outros" era a sua probidade quase ascética do "homem do autocarro" e essa mensagem foi incansavelmente difundida com o sucesso que se conhece. Um típico modelo decalcado da conhecida caixinha de exemplos dos anos vinte e trinta.
Num universo político de pataratas eleitos por lista, os círculos uninominais poderiam trazer-nos uma dúzia de Louçãs de vários cambiantes de esquerda e de direita. Um risco? Sim, mas demasiadamente valioso para ser desperdiçado.
Serei eu o único a ver - bem, talvez não, dado que o Pedro Lains concorda com este diagnóstico - que a colusão de interesses entre o Estado e a banca tem tudo para terminar num revés económico de grandes proporções? Não é surpresa para ninguém, pelo menos para os analistas mais cautos, que os bancos tentarão a todo o custo livrar-se dos títulos públicos que têm em carteira. A má notação da dívida pública, consequência óbvia do estiolamento da situação económica, traduzir-se-á em mais uma invocação ao já esmifrado erário público. Resta saber se ainda haverá dinheiro para acorrer a esse mais do que previsível desastre.
João Proença tem o péssimo hábito de, nas suas pomposas intervenções públicas, proferir dislates do tamanho da Sibéria. Descer o IRC para 10% é uma grande vigarice? A que propósito? É assim tão difícil entender que a redução da carga fiscal, mormente no que se refere à economia, é uma exigência nacional?
Em especial à atenção de governantes e defensores destes, um excelente post de Rui Rocha, de que transcrevo parte:
«Argumento nº 2 - Sim, sim, sim, existe um enorme desvio entre o que os portugueses querem do Estado e o que estão dispostos a pagar. Mais, quando perguntados, os portugueses pronunciam-se de forma esmagadora no sentido de preferirem cortes na despesa. Todavia, quando se trata de identificar cortes concretos, aparece sempre uma massa de lusitanos ingovernáveis que se opõe, contra toda a racionalidade, a cada um deles.
Comentário: Não foram esses que lançaram na discussão pública a ideia de que seria viável uma gestão eficiente de um Estado perdulário que permitiria equilibrar as contas públicas sem envolver corte nas remunerações e sem aumento de impostos. Não. Foi a maioria que sustenta o actual governo que prometeu exactamente isso a quem quis ouvir. Com tal eficácia que muitos acreditaram. E, se os portugueses podem agora ser acusados de alguma coisa, é de terem aprendido aquilo que lhes quiseram ensinar e de terem alguma dificuldade em desaprender. Por outro lado, o argumentário da oposição às medidas do governo só é utilizado para uma parte da realidade. Que diabo. Se existe uma grande resistência a cortes em determinado tipo de despesa, não existe menos em relação ao aumento de impostos. Todavia, este avança sem piedade, ao mesmo tempo que o governo se queixa da enorme oposição ao corte na despesa. Ora, e por incrível que pareça, a existência de um governo resulta precisamente da necessidade de decidir perante interesses divergentes. Se há interesses que se opõem ao que deve ser feito, pois que o governo os enfrente. Se não o faz, só há uma razão (que não uma justificação) possível: falta-lhe legitimidade por pretender executar o contrário daquilo que prometeu.
(...)
Por tudo isto, talvez fosse melhor investir menos tempo na construção de um universo paralelo em que receita e despesa vivem de costas voltadas e nunca se encontram, em que os compromissos eleitorais se varrem para debaixo do tapete e em que se usam as grandezas dos agregados que compõem a despesa para justificar a inaceitável complacência com práticas inadmissíveis em tempo de profunda crise. É que, antes de avançar com propostas de redução do valor mínimo do subsídio de desemprego e outras prestações sociais, há um mundo de caminhos que tem de ser percorrido. As folhas de Excel não têm em memória as propostas eleitorais e os programas de governo. E não atribuem qualquer valor à ética. É essa lacuna insuperável que os portugueses (des)esperam que possa ser suprida pela acção política e governativa.»
O alerta de Fernando Ulrich é assaz pertinente. Não tenho por norma concordar com as atoardas de Ulrich, mas desta vez sou obrigado a corroborar as palavras do banqueiro-mor da pátria. De facto, estamos perante o risco, sério e palpável, de cair numa "ditadura do Tribunal Constitucional". A propensão que alguns sectores do judiciário revelam pelo seguimento acrítico da horripilante lógica do activismo judicial é suficientemente esclarecedora quanto ao que nos espera. Como escrevi na minha última posta "o papel do Tribunal Constitucional não é, nem deverá ser a emissão de um juízo político acerca das grandes opções de política fiscal tomadas pelo legislativo". A insistência por banda dos juízes portugueses num justiceirismo inerme à realidade arrisca-se a lançar o país numa ingovernabilidade sem precedentes.
O Euro e o sistema financeiro europeu assentam em pilares políticos sem correspondência com a realidade económica, daí a crise que atravessamos. Durante cerca de 2 décadas, o sistema estimulou uma tragédia dos comuns, com os governos da Europa do Sul a endividarem-se insustentavelmente - Philipp Bagus explica detalhadamente o que aconteceu. Entretanto, «O World Gold Council sugere que Portugal tenha luz verde para emitir dívida com o ouro como garantia.» Vítor Gaspar, como bom tecnocrata obediente, vai atrás da voz do dono, e admite fazê-lo. Quando é cada vez mais evidente que vamos ter que renegociar a dívida, o que implica não pagar parte desta, e eventualmente sair do euro - embora concorde com Manuela Ferreira Leite quando diz que isto não faz sentido visto que ainda não foi colocada esta hipótese à Grécia - fica à vista de todos o que é que se pretende com esta matreirice. Há muito que os alemães querem o ouro português. Aguardemos para ver se, também nisto, o governo vai alinhar pela mera servidão ou se demonstra ter um pouco mais de sagacidade política que o que tem tido em geral. Paulo Portas tem o dever de fazer compreender a Passos Coelho e Vítor Gaspar o que está em causa.
Em primeiro lugar, convinha fazer notar a Vítor Gaspar que está a falar do país que tem uma das cargas fiscais mais elevadas e um dos Estados mais corruptos, despesistas e ineficientes da Europa. Em segundo lugar, como já bastas vezes escrevi aqui no blog, para reformar o Estado e efectivamente diminuir despesa seria necessário realizar um profundo trabalho de reflexão sobre o que é actualmente o Estado e quais devem ser as suas funções de acordo com as possibilidades dos contribuintes portugueses. Passos Coelho foi eleito prometendo que tinha feito isso mesmo. Afinal não fez. E já se percebeu há muito que não há ninguém no governo com capacidade e vontade para o fazer. Só assim se pode também perceber esta ânsia, apresentada com requintes sádicos e punitivos como se os portugueses fossem todos pecadores, em empobrecer violentamente os portugueses ao mesmo tempo que o Estado continua irreformável e se arroga cada vez mais poder e capacidade de interferir na esfera privada das famílias e empresas. Em terceiro lugar, para além de ser evidente que a segunda afirmação supracitada é um non sequitur, impõe-se perguntar sobre Vítor Gaspar, que tem falhado naquilo para que supostamente foi nomeado, não se distinguindo sequer de um Teixeira dos Santos, que competências é que tem para avaliar a qualidade e maturidade da democracia portuguesa? Na minha modesta opinião, poucas ou nenhumas. O que o Ministro das Finanças acaba, involuntariamente, por confessar, é a sua própria inabilidade para desempenhar o papel que os portugueses esperavam dele - mas também, e principalmente, do Primeiro-Ministro.