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Não sou de fazer balanços do ano que se finda nem de pedir desejos para o ano que se inicia. Direi apenas que continuei e continuo a desenvolver a minha actividade académica, que em 2015 se reflectiu não apenas na redacção de boa parte da minha tese de doutoramento, como também na leitura dos vários autores que me proponho analisar no capítulo central, sobre a temática da tradição, razão e mudança. Costuma dizer-se que não é o destino que importa, mas a viagem, e esta está quase a terminar. Reservei os dias de férias de 2015 para agora, em Janeiro, terminar a tese. E isto é o que posso prometer a mim mesmo e também àqueles que têm contribuído para o crowdfunding destinado a financiar o doutoramento. Vou terminar a minha tese até 31 de Janeiro. É este o meu primeiro e mais importante objectivo em 2016.
De resto, aproveito para desejar um óptimo Ano Novo aos meus colegas de blog e aos nossos leitores.
Há umas semanas, num restaurante de Lisboa, tive o prazer de ter uma família numa mesa ao lado que não me tem saído da memória. Um casal, um filho e a sogra. A criança, de 5 ou 6 anos, passou o jantar colado a um iPad, a jogar uma porcaria qualquer. Não pousou por uma vez o aparelho, nem enquanto comia. Os pais e a avó não lhe dirigiram a palavra uma única vez. Reinou a harmonia familiar. Não é um caso isolado. Cenários deste género fazem parte do nosso quotidiano. E crianças como aquela são hoje a nossa realidade. Um iPad nas mãos e não me aborreças.
Este é um facto. Há uma geração de pais que está a criar monstrinhos alienados. É a geração que é incapaz de lidar com o sacrifício, com o sentido de dever, com a responsabilidade familiar, porque é fruto de uma época de paz e de prosperidade, porque é fruto da lógica de filho único e de infantocentrismo, porque foi moldada para o sucesso profissional e não para o compromisso familiar. Os novos pais não toleram crianças. Muito menos toleram crianças que se mexam. Ora, novidade das novidades, as crianças mexem-se. E falam. Muito. E gritam. E choram. E fazem birras. É assim desde que existe humanidade. O problema é que antes destes novos tempos, sempre que uma criança ultrapassava os limites da boa educação, do respeito e do sossego de terceiros, levava uma palmada. Bastava um olhar. Hoje damos-lhes iPads.
Quando uma criança deve ouvir um "não", hoje recebe um "sim" e qualquer coisa que a entretenha. Porque tudo é mais importante que educá-la para que possamos ter um ser humano decente em casa. Não há regras, porque as regras dão trabalho a implementar. Exigem paciência e nós não temos paciência. Podemos ter paciência para tudo. Para jantar fora, para trabalhar até à meia-noite, para ir de férias com os amigos, para jantaradas e noites durante a semana, para desportos radicais, para ir a todos os sítios fashion, gourmet e fancy da cidade, para estar no Facebook, no Twitter, no Instagram, no Whatsapp. Mas não temos paciência para chegar a casa e perder uma hora do nosso tempo a brincar com uma criança. Não temos paciência para ouvir os miúdos porque os miúdos, claro está, só dizem asneiras, não são racionais e não medem as palavras. E esperamos que eles cresçam sozinhos. Ou com uma caixa de jogos didáticos, para "aprenderem enquanto brincam", ou com filmes que os fazem "assimilar conceitos". Não os levamos para a rua porque a rua é um perigo. Há um mar de pedófilos nos parques. E os parques têm folhas e pólen. E o pólen faz mal às alergias e ao sistema respiratório. Não lhes dizemos "não". As crianças devem exercer a sua autonomia, a sua liberdade, como se um selvagem alguma vez fosse bom. Também não lhes podemos bater. As crianças têm direito à privação da palmada, porque nós vivemos num mundo pacífico, onde as pessoas se amam e se respeitam e a palmada incentiva o ódio e a invasão de países árabes, como se sabe.
Nós, a geração "mais bem preparada de sempre", temos a maior taxa de alfabetização de sempre. Nunca o mundo teve tantos diplomados como agora. Somos esplêndidos. Ensinaram-nos desde pequeninos que somos esplêndidos. Disseram-nos que tínhamos direito a ter tudo e queremos ter tudo. E disseram-nos que os sacrifícios não eram necessários. Estava ali tudo. E quando faltasse alguma coisa, ainda lá estavam os pais, para libertar algum dinheirito, para comprar um carro novo, para mobilar a casa, para uma beijoca, para mais um computador portátil. E agora temos filhos. Filhos, imagine-se! Uma geração de filhos que está a chegar, que ainda está nas barrigas ou que entrou agora para a escola. Uma geração de filhos que se enfrasca em anti-depressivos e em tecnologia para explicar à geração dos próprios pais esta coisa tão simples: a "geração mais bem preparada de sempre" é a geração mais incapaz de constituir família e de educar uma criança dos últimos séculos. E está a criar uma nova geração de pequenos e selvagens tiranos.
Algo vai mal no reino da Dinamarca, perdão, dinheiro. É isso, dinheiro. Algo vai mal no reino do dinheiro. Dinheiro marca. Dinheiro marca golos. E a festa está prestes a começar. Aquilo que está a acontecer com os contratos multi-milionários respeitantes à cedência de direitos às operadoras pelos três grandes do futebol, faz parte, na sua essência, da mesma matriz cultural que retrata este país. O vizinho do lado comprou um carro novo, então eu vou comprar um ainda mais novo. A vizinha do lado veste Prada, então eu visto Gucci. E aí por diante. É verdadeiramente escandaloso que um país estropiado económica e socialmente possa dar-se ao luxo, instigado pela ganância do negócio, de se vergar à luz do disparate dos valores em causa. A MEO, a NOS e os demais intervenientes neste espectáculo de centenas de milhões de euros, estão a encher uma bolha especulativa que não se coaduna com a dimensão do mercado nacional de futebol. A matéria extravasa por completo os limites dos relvados, e, na minha opinião, deveria ser tema de grande debate político. O presente governo, campeão do controlo do Estado, sacerdote da regulação bancária e eunuco da especulação financeira, deveria meter a pata nesta poça, mas por alguma razão celestial que nos escapa, não se escuta a sugestão de intervenção preventiva, de acompanhamento razoável do que está em causa. A entidade reguladora dos negócios do futebol (não sei se existe?) deveria medir os contornos destes negócios. Estamos a falar de quantias que certamente não resultam de "dinheiro em caixa", mas possivelmente de veículos de investimento complexos. Ou seja, os mesmos de sempre - os bancos. Nenhuma operadora guarda no bolso estes valores avultados. A haver desastre financeiro das operações em causa, já sabemos quem paga. Desconfio muito que os clubes de futebol e as operadores irão receber o mesmo tratamento distorcido concedido aos bancos falidos, caso as coisas dêem para o torto. Sim, o campo está inclinado. E muito.
O meu pai, ex-militante centrista, militar, ex-cavaquista e posterior eleitor de Guterres por uma única vez, foi - e é - um homem moderado no voto e nas opções políticas, apesar de ser radical no verbo. Talvez por isso tenha sido, durante os anos do reinado de Cavaco Silva, um alternado, mas assíduo, leitor d'O Independente e do Tal & Qual. Não sei. Mas como teve a ideia de me ensinar a ler precocemente, lembro-me de ler estes jornais desde sempre. Mesmo que não percebesse nada do que lá estivesse escrito. Como me habituei, também desde cedo, a admirar a figura de Paulo Portas, por influência indirecta do meu pai, primeiro, e por minha vontade, depois. Talvez isto explique alguma coisa. Talvez não explique nada. Explica, pelo menos, o legado de Paulo Portas enquanto grande - e única - figura da nova direita portuguesa dos últimos 25 anos, pelo menos. Primeiro nos jornais, depois no partido. E desde cedo na minha consciência política.
Por motivos profissionais e por interesse pessoal (re)li recentemente algumas peças d'O Independente. E li, há não muito tempo também, edições do Público de 1998 a propósito da eleição de Paulo Portas como líder do CDS. Admirei os seus diários de campanha de 1995, como repudiei a forma como venceu o Congresso de 1998. Admirei a sua influência ideológica no monteirismo, como repudiei a forma como tantas vezes derivou à esquerda para fins eleitorais. Admirei-lhe sempre o estilo ("o meu estilo é trinário - digo sempre três ideias fortes. O [Fernando] Nogueira é binário", dizia em entrevista a'O Independente) e a inovação que trouxe ao discurso político, como repudiei brutalmente a demissão irrevogável de 2013.
Vi sempre nele o melhor líder partidário do Portugal da minha idade adulta. Mesmo enquanto fui militante do PSD nunca escondi isso de ninguém - e votei CDS sempre que entendi fazê-lo. Paulo Portas tinha os defeitos de todos os outros. E tinha qualidades que nenhum outro tinha. Depois do intervalo na liderança, o seu regresso vincou essas qualidades. É por isso que, como dizia ontem o Bernardo Ferrão no Expresso, o CDS já não é o partido de um homem só.
O seu ritmo trinário deu-nos três razões para a sua saída: o tempo do passado, o tempo do futuro e o tempo de um novo ciclo político. A única coisa que eu desejo agora é que este novo ciclo nos traga uma direita conservadora, mas descomplexada, liberal, mas com sentido de autoridade, humanista, mas não assistencialista. Que saiba ser uma direita com agenda social. Que pense à direita, mas que fale à esquerda. Sendo certo que os novos ciclos não começam por outro motivo que não seja a vontade dos sucessores, este é, apesar disso, um novo ciclo que começa. Outro se iniciará depois deste. Um ciclo em que sejam os pais a votar nos filhos.
O que me interessa por agora é realçar um facto apenas. Paulo Portas não foi perfeito - e ninguém, excepto um louco, lhe pedia que o tivesse sido. Mas foi um líder. E a capacidade dessa liderança vê-se, em grande medida, na hora da saída. Para o caso de não terem reparado nela durante os últimos anos.
Não fosse Paulo Portas (entre outros, como Miguel Esteves Cardoso, mas com ele à cabeça) e ainda hoje a direita portuguesa vivia entalada entre socialistas cristãos e saudosistas do Estado Novo. Nem que seja por isso, julgo que todos lhe devemos um agradecimento. Eu devo.
Não escutei a mensagem de Natal de António Costa. Nem precisava de o fazer, mas li as notas de rodapé coladas aqui e acolá. Já sei que o primeiro-ministro sublinha as virtudes da sua plataforma à Esquerda, mas não agradeceu a Direita "instransigente" que o PSD corporiza, pela ajuda dada na aprovação do orçamento rectificativo e da contribuição extraordinária de solidariedade. É apenas um pormenor, contudo revela que afinal António Costa não é o democrata de consensos alargados e entendimentos que tão vocalmente apregoa (para além de ser politicamente malcriado). António Costa repete vezes sem conta que vivemos um "novo tempo" em Portugal, ao que acrescenta que grandes dificuldades são de esperar no futuro que se avizinha. Então? No que ficamos? Vira a página ou reconhece que os portugueses ainda vão ter de suportar muitos (e mais) sacrifícios. Em vez de viver o presente, celebra antecipadamente os 30 anos de adesão à Comunidade Económica Europeia, os 40 anos da Constituição da República Portuguesa e os 20 anos dessa organização lírica conhecida por Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP). E ainda tem tempo para enviar um abraço às comunidades portuguesas no estrangeiro e aos militares em comissões além-mar. O que discorre em ambiente festivo soa a paleio de velho jarreta, quando o que se lhe exige é uma visão pragmática e assertiva respeitante ao novo ciclo que se lhe escapa ao controlo, e em relação ao qual Portugal vai beneficiar sem que este governo faça a ponta de corno. Será o Banco Central Europeu (BCE) a evitar o descalabro deste governo-soma de ocasião. A continuação do programa de aquisição de títulos de dívida da parte do BCE está prevista até Março de 2017. Ou seja, até lá, eventuais e mais que certas anomalias de tesouraria serão camufladas por este mecanismo monetário da Zona Euro. Na mensagem de Natal António Costa referiu isto e agradeceu os senhores da gleba monetária? Se alguém souber, e puder confirmar, por favor envie-me um telegrama. E ainda, na mesma senda de omissões e irregularidades, o que está a suceder em Espanha foi referido na mesma missiva natalícia como factor de volatilidade na cena política-económica nacional pelo primeiro-ministro? Se alguém ouviu alguma coisa a esse propósito, queira fazer o favor de me enviar um postal, para que eu fique descansado que este governo tem mais do que mãos a medir para a TAP, e tudo o que permeia os céus e a terra. Afinal o Pai Natal é socialista de gema - tem tudo e dá a todos.
As notícias sobre a morte do centrão foram manifestamente exageradas. Passos e Costa podiam fazer o jeitinho a Cavaco Silva e permitir-lhe terminar o mandato deixando o legado com que há anos sonha: um governo composto por PSD e PS. Sempre era mais "estável e duradouro" que a geringonça.
A árvore cresce, o espírito entra, a companheira acompanha, e vive-se a celebração do Natal como ela é e jamais deverá deixar de ser: Natalícia. Que é dizer, Cristã, ou vá - agnóstica, nunca "o passeio de inverno", a "estação do floco de neve" ou as ultra-pudibundas "férias da alegria" como nos territórios suecos abertos de esfíncter ao invasor intolerante investido da genuína farripa da barba do profeta, possa ele arder no aterro sanitário mais próximo.
Ontem, ao rever pela enésima vez Gran Torino, obra maior de um homem enorme, fui acometido por um torvelinho de sensações, esperanças, abismos e, nunca de somenos, esgares lupinos perante aquilo que a minha própria velhice me reserva.
Se vier referir Hannah Arendt e a banalização do Mal, ou se pender para a alusão à iliteracia dos jornais quotidianos, pecarei (não é um lapso Freudiano nem Jungiano, pecaria mesmo, escolhi a palavra e fi-lo de antemão) por extremismo - aquela radicalização que mais abomino, como quem se dá ao trabalho de ler-me desde sempre aprendeu a assumir: a de centro, da moderação. Porque aquilo que se banalizou não foi a cupidez, a raiva, o ódio; nem tão-pouco a estupidez ou a apatia. Vulgarizou-se o fado. O cancro que nos rói a Oeste de Praga vive na fase da aceitação tíbia, crepuscular, impossível de ombrear como, e tento fundir o Maio de 68 com a geração IMAX, o peso do Anel sobre a cervical de Frodo.
A minha velhice está povoada, nas vertentes mais a norte, onde a flora tende menos à ignição e se verifica uma maior presença de manta morta perene, por imagens de jovens adultos tíbios, incapazes de perceber para que serve um espelho, cujos anciões anciãos, anciães e respectivo legado de nada servem mesmo quando faltam a comida pronta, a roupa nova, as ferramentas - quase centenárias! - estimadas com brio e o espólio imaterial da conduta demonstrada, sem se eligir maior reacção do que um hodierno "meh".
A minha oficina está povoada de indómita raiva contra quem, fracção própria inclusa, deixou que as coisas, o envelhecer a Oeste de Praga chegassem a tal ponto. Está bem oleada, é alvo de manutenção periódica, não cresce lá musgo nem virei, em vida, a permitir que enferruje e de lá cesse o forjar de labaredas renovadas. A relva apara-se. Às perdas corta-se. E às crias desmama-se.
É isto o Natal, o meu ensejo para a Consoada: desmamem-se as crias de vícios, sejam elas pueris, extemporâneas, autárquicas, supranacionais ou arquetipais. Caia de uma vez a vergonhosa fantasia que transformou os nossos filhos em bolas de gel sem respeito nem escalas, e o futuro num marasmo medonho.
Mas para já, continuem a falar da bola, porque ainda não aumentou nenhum imposto.
Na política como na vida há Homens e homenzinhos.
Pedro Passos Coelho , ao abster-se no orçamento rectificativo , passou hoje a integrar o grupo dos homenzinhos, o grupo daqueles que hoje dizem uma coisa amanhã outra. O grupo de políticos que não nos interessa.
Julgo que o Dr.Passos Coelho, deveria fazer uma salto politico e passar a assessorar Costa(devem ter lá um lugarzinho para ele) uma vez que são as duas faces de uma mesma moeda, a palavra para estes dois não tem valor.
Infelizmente faço parte dos incautos que acreditaram que era um Homem, que tinha convicções, que honrava a palavra dada. Enganei-me.
Felizmente que Paulo Portas mostrou que mantém a fibra que o caracteriza, que mantém a sua palavra.
Portas cumpre o que prometeu a Costa e o CDS vota contra o Orçamento Rectificativo. Mesmo que o PSD se abstenha ou vote a favor, pelo menos o partido que integro vota da forma mais acertada, o que me leva, hoje, a sentir-me plenamente representado pelos seus líderes.
Luís Aguiar-Conraria, “As finanças são uma arma. Política é saber quando puxar o gatilho”.
Luís Menezes Leitao, Oposição a sério, precisa-se:
Se, como tudo indica, o PSD viabilizar o orçamento rectificativo, acho que deve ser Passos Coelho a demitir-se da liderança. O país precisa de uma oposição a sério a este governo e não de partidos amorfos, que vêem o seu próprio governo ser derrubado e vêm logo a seguir oferecer a outra face, apoiando quem os derrubou. E não me venham com a treta do interesse nacional. O interesse nacional é precisamente que não sejam gastos os 3.000 milhões que se quer meter no BANIF, agravando o défice e a dívida. O voto do PSD a favor deste orçamento só demonstrará uma coisa: que António Costa tem todas as condições para ser primeiro-ministro. Pedro Passos Coelho é que não tem manifestamente condições para continuar a liderar a oposição.
Poucas semanas depois, CDS e PSD têm a oportunidade de cumprir o que prometeram a António Costa. Basta recusarem-se a aprovar o Orçamento Rectificativo. É o que Costa merece e, além disso, é o mais acertado perante a desastrosa solução encontrada para o BANIF. Veremos se mantêm o que Portas prometeu e não se deixam ficar reféns de Costa e de um alegado pragmatismo que habitualmente passa por responsabilidade e sentido de Estado, mas que frequentemente serve apenas para justificar más decisões.
Passa-nos um jornal pela frente e algum grémio de loucos fala em "festas sustentáveis" no mesmo ponto do espaço-tempo onde eleitores, os mesmos de sempre, elegeram labregos, também imutáveis ou imperceptivelmente diferentes das suas XX iterações passadas, que estoiram os impostos dos meus trinetos em ciclovias, penhores bancários assumidos por conta, a lavar a imagem de pedófilos gastricamente intolerantes ao segredo de justiça, e na colorização do sorriso sinistro que adorna as fauces do Costa.
O grunho 44, por seu turno, diz que foi preso unilateralmente; suponho que virá o deputado do PAN bramir por alterações à Constituicinha que previnam o perigo de um contribuinte, ora conviva nas casas de família da classe média rapidamente caminhantes para a condição de tugúrios espoliados em nome do interesse nacional, comer unilateralmente uma posta de bacalhau.
Não sei que diga. Gosto muito de estar novamente apaixonado, mas este país não é para pessoas de Bem. A única coisa que se sustenta, à conta de um número cada vez mais atómico de teimosos ou errantes sem esperança, é o bodo do Estado.
E isso preocupa-me.
1.Resenha histórica
No Outono de 1983, numa sala do hotel Altis, completamente esgotada após o anúncio que surgira na imprensa, procedia-se à apresentação do Movimento Nova Monarquia. Na mesa estavam monárquicos históricos como os Doutores Jacinto Ferreira, Mário Saraiva e João Taborda, este último sogro do Dr. Jaime Gama, um socialista que seria ministro dos Negócios Estrangeiros do governo português.
Coube a Miguel Castelo Branco, um jovem de vinte e um anos, a apresentação das linhas gerais do projecto. A organização do território, as premissas históricas que conformavam uma certa ideia do municipalismo, a percepção do já então claro declínio demográfico que deveria ser de imediato atacado em várias frentes, trouxeram à discussão pública algumas propostas inovadoras e por que não dizê-lo, revolucionárias – o salário a ser pago pelo Estado às mulheres que ficassem em casa a cuidar dos filhos -, para uma época em que a miragem europeia surgia como meta, um fim de história para o Portugal com mais de oito séculos de existência. Uma série de sugestões foram oficialmente apresentadas como programa, entre as quais, para o que ora nos interessa, estavam o convite, ditado pela necessidade da conjuntura internacional naquele momento, a fazer ao Reino de Marrocos, reforçando o flanco sudoeste da OTAN. Este ponto teria imediato reflexo na imprensa marroquina, exultante pelo reconhecimento da política de segurança do regime de Hassan II, um dirigente que na senda dos potentados muçulmanos de então, garantia uma certa estabilidade numa zona que era, tal como hoje, vital para a segurança da Europa.
Os comentários foram os esperados, desde umas tantas manifestações de agrado por parte de incipientes sectores ditos conservadores, até ao mais vivo repúdio por uma das sugestões apresentadas, considerada genericamente como uma tentativa de regresso ao enterrado passado colonial. E que proposta era esta? De facto, não só lançava as bases daquilo que hoje conhecemos pela sigla de CPLP, como ia mais longe, logo propondo a liberdade de circulação de todos os nacionais dos PALOP, aos quais se juntariam os brasileiros e numa ressalva considerada patética pelos inconscientes que durante largo período perduraram no controlo da opinião pública nacional, o já dado pela NM como futuramente garantido, Estado de Timor-Leste.
Foi o fim do mundo.
Choveram insultos de toda a ordem, numa …”incompreensível cegueira ditada pela necessária inclusão nacional no espaço da CEE” que o regime almejava, significando isto o ansiado remédio que num ápice transformaria um país desarticulado por uma longa Guerra em África e, sobretudo, pelos acontecimentos de 1974-75 que a par da liquidação de um espaço económico, significou um recuo sem precedentes do ocidente na África austral e, é impossível ocultá-lo, pela súbita chegada de algumas centenas de milhar de nacionais expulsos pelos novos poderes instalados: retornados que nada mais foram senão refugiados.
A estreiteza de vistas dos responsáveis politicos de então era muito evidente e a comprová-lo, ainda hoje pagamos da pior maneira os chamados Tratados assinados de cruz e que o Dr. Soares – que durante alguns meses encontrou na expressão Constat d’Accord o pretexto oratorio para todo o tipo de excitados e diluvianos manás - pretendia transformar no mecanismo de segurança que garantia a sobrevivência de um regime que considerava naturalmente seu, propriedade de uma oligarquia que bem vistos os factos ao longo destas quatro décadas, em pouco ou nada se distingue daquela que manteve a 2ª República ao longo de duas ou três gerações. Os nomes são os mesmos, a base financeira – à luz do dia ou oculta através de artificiosas congeminações - é demasiadamente idêntica, os círculos de influências e tráfico de favores entre famílias e amigos são notórios. Eram e ainda são as Corporações – os poderes fácticos, sucedâneos da Casa dos Vinte e Quatro - quem dita a política geral e deste atoleiro de cumplicidades parece difícil saírmos, até porque encontra correspondentes além-fronteiras. Bem vista a coisa pública, o sistema vigente conformou-se ao legado do equilíbrio de poderes deixado pela cúpula do Estado Novo, conseguindo o clamoroso sucesso de arrastar para a área corporativa, de organizações aparentemente tão insuspeitas e adversas como o PC e entidades anexas. O colaboracionismo atingiu verticalmente toda a classe política, seja ela de esquerda ou de direita.
A apresentação desta proposta de organização de um espaço lusíada era então considerada como inoportuna, num país cujos dirigentes ansiavam antes de tudo, definitivamente enterrar o processo histórico formalmente iniciado com a tomada de Ceuta no já longínquo ano de 1415. A criação de um espaço jurídico, cultural, politico e económico de expressão portuguesa, era apodado de neo-colonialismo mal disfarçado.
Pouco depois, S.A.R. o Duque de Bragança, começou a insistir junto da imprensa, na necessidade do regresso a uma nova forma de colaboração com os países de expressão portuguesa, nunca abandonado a causa timorense, aliás considerada por todos os responsáveis do regime …”uma ilha indonésia, tal como Goa para sempre integrada no grande país com quem faz fronteira”. Foi esta a tese que a par dos rotineiros agendamentos para discussão da invasão (1975) na ONU, a superestrutura do poder politico de Lisboa fez circular como inevitabilidade. Sempre pensaram que a passagem do tempo resolveria um assunto degradante e espinhoso que o país da rua jamais aceitou como concluído.
Ao longo dos anos a ideia de um grande espaço lusófono foi criando raízes e um antigo Chefe de Estado de Cabo Verde, S.E. o Dr. Aristides Pereira, declarou publicamente ter sido um erro a independência daquele arquipélago, um marco histórico que num dado momento afastou as ilhas do desenvolvimento – que tiraria os Açores e o arquipélago madeirense de um atraso secular - e segurança internacional garantida pela união federal com um Portugal integrado em múltiplas organizações internacionais, fossem elas económicas, culturais ou militares. Estas eram as explicações de índole mais imediata e compreensível, baseadas naquilo que obsessivamente poderia interessar a amálgama de interesses mediáticos, politicos e económicos. A portugalidade – e tudo o que significa em termos de solidariedade e comunhão de destinos - ficava assim relegada para um jamais tido em conta e para eles displicente plano dos afectos sempre presente como recurso oratório.
2. A proposta do governo de António Costa
É sempre comovedor assistirmos ao refazer da história, principalmente quando são protagonistas aqueles que mais se opuseram a um certo número de princípios que consideramos tão básicos como a soberania, independência nacional, herança e partilha de culturas e experiências entre povos diversos, mas unidos por uma já longuíssima convivência nem sempre pacífica e que pelas vicissitudes internas ou impostas pelo exterior, permaneceram ligados. Portugal, um pequeno país estrategicamente colocado no centro do mundo que à Europa deveria interessar, conseguiu a proeza de manter um vasto património dito imperial que sobreviveu às lutas da Restauração, às guerras europeias que devastaram a Europa durante todo o século XVIII, ao ímpeto napoleónico e à cristalização dos nacionalismos oitocentistas que fariam eclodir duas guerras mundiais.
Parece ser este, o momento azado para a prossecução desta ideia. Vinda de quem vier é válida e não só necessária, como urgente. Numa Europa em aparente crise demográfica, logo económica a longo prazo, recorre-se a todo o tipo de oportunidades que visem o adiamento de um declínio que já conta perto de um século e cujos sintomas, de tão evidentes, apenas passaram despercebidos a quem julgou possível manter um status quo ditado pelo resultado da II Guerra Mundial.
O Império Soviético ruiu e subitamente a Europa sentiu-se livre de peias, consciente da posição subalterna de primeira linha de frente da superpotência tutelar que gostosamente tomou conta da segurança colectiva. A verdade é que conscientes da sua fraqueza, os Estados europeus desinvestiram na Defesa – em termos demasiados latos, chegando ao ponto de duas gerações terem sido desadestradas quanto ao serviço militar -, não se concebendo qualquer tipo de conflitos fronteiriços entre países historicamente desavindos – Alemanha, França, Reino Unido, Grécia, Turquia, Portugal e Espanha -, delegando nos Estados Unidos da América as tarefas de polícia e agente de controlo de fronteiras onde hoje se vão erguendo muros.
Os alargamentos económicos, politicos e militares a leste, a radical mudança na correlação de forças internacionais, a ascensão imparável da China e os, digamos desta forma, erros crassos na avaliação dos regimes antecedentes às chamadas Primaveras Árabes, criaram uma situação inextricável e extremamente volátil, onde a Rússia pretende recuperar um mínimo do seu tradicional espaço de influência que não irá muito além da Ásia Central e das fronteiras encontradas em 1945, excluindo-se os três países bálticos, já anexados à U.E. e à OTAN. Esta é a realidade dos factos que nem as novas tecnologias protagonizadas urbi et orbi por diversos tipos de peritos da cibernética e incontornáveis hackers, poderá num futuro ainda incerto, contestar.
A ameaça terrorista – real ou pré-fabricada em geografias insuspeitadas -, pode ser um desafio de difícil resolução com vantagem pelos europeus, sejam eles alemães, gregos, franceses, britânicos, belgas ou outros, amedrontados pela perspectiva da massiva violência urbana executada através de atentados a que hoje nem sequer escapam as linhas aéreas, as escolas, os machimbombos e as esplanadas das capitais europeias. Em suma, a subversão está há muito tempo bem firmada dentro da U.E., num processo de voluntária e assumida não-integração que já dura cinquenta e poucos anos. Da marginalização económica e social, passou-se ao patamar do confronto civilizacional. Num espaço onde o sempiterno politicamente correcto impõe-se à necessidade imperiosa de agir para evitar profundas perturbações no sistema politico e social, estamos de súbito perante realidades às quais não conseguimos dar uma resposta válida e que não contrarie os princípios que construíram a Europa do pós-guerra. Portugal encontra-se assim, pese a sua situação de desastre financeiro provocado pelas paralelas e bastas vezes confluentes oligarquias que têm conformado o Estado, no momento ideal para fazer algo à revelia dos seus tutores internacionais, sejam eles europeus ou não.
A histórica chantagem sobre as possessões ultramarinas nacionais já não existe, apenas permanecendo o arquipélago dos Açores como potencial alvo de pressão cuja posição geográfica e adivinhados recursos económicos na zona marítima circundante, poderá servir de motivo para algumas preocupações.
Temos então um país esmagado pela dívida para com estrangeiros e amarrado por tratados que fizeram em grande medida volatilizar o que nos restava da soberania: não podemos bater moeda, não podemos gerir as alfândegas, não podemos controlar as fronteiras (Schengen continua em vigor para grande comodidade de uma minoria percentual de viajantes e sobretudo, de empresas) consideradas agora como relíquias de um passado sem retorno. Nesta época de livre circulação de capitais no éter informático, os off-shores da corrupção generalizada e a subversão de princípios mais básicos é avassaladora, corroendo entidades de toda a ordem, num aparentemente inesgotável processo que está à vista dos mais distraídos.
Não é preciso indecentemente emoldurar evidências com citações de autores conhecidos e consagrados, justificando assim com testemunhos de outros tempos, aspectos que abrangem alargados sectores da vida política, económica, financeira e social de uma infinidade de Estados, hoje na situação de meras pastagens de uma globalização que no termo one world parece ter criado mais uma inevitabilidade histórica. Não é.
"Sou a favor do livre trânsito, mas não me parece ser uma medida possível no atual contexto europeu, levando em conta que Portugal não está considerando sair da UE nem do Espaço Schengen. Se esta livre circulação acontecesse, o resto da Europa acabaria por reinstaurar as fronteiras com Portugal"
Esta parece ser a esperada posição de quem julga inevitável a situação sem retorno criada por tratados que antes de tudo confirmam as vulnerabilidades a que a Europa gostosamente se sujeitou e que o ano de 2015 plenamente confirmou. O actual primeiro-ministro declara que …"Portugal tem toda a liberdade para negociar com os demais países da CPLP tratados de liberdade de residência e o deve fazer. A exigência de vistos de entrada na UE é no âmbito europeu. Outra coisa diferente, é o direito de residência em Portugal, que podemos garantir a todos, na base da reciprocidade, de forma a também garantir a todos os portugueses direito de residência nos Estados da CPLP. E com a autorização de residência, os vistos estão dispensados".
Independentemente de todas as considerações que possam ser feitas a respeito de controversos métodos de conquista do poder – até nisto é um politico -, A. Costa não deixa de ter razão. É indiferente considerarmos ou nos preocuparmos com quem está ao leme, desde que o rumo seja o correcto.
Para os esbracejantes obcecados pelo mercados - o fatal argumento -, os horizontes são os que bem conhecemos.
Não tenhamos muitas ilusões quanto a rápidos resultados neste capítulo, pois Portugal para tudo depende da ajuda externa e essa é a ameaça, a chantagem mais premente que defrontamos. Contudo, a volatilidade da situação internacional poderá permitir o surgimento de algumas oportunidades no âmbito político, para mais tratando-se de países extra-europeus que correspondem grosso modo à ideia que na Europa e nos EUA os histéricos – habitualmente warmongers a soldo de departamentos de estado - das campanhas hate apontam como coisa louvável, porque inevitavelmente “colorida”. Ora, para a esmagadora maioria dos portugueses, o facto de se ter nascido no Rio, em Luanda, Maputo-Lourenço Marques, Goa, Macau ou Timor, é coisa considerada como natural, como parte de mais de cinco séculos da nossa história. Há que permanecermos atentos e não desperdiçarmos esta hipótese que além de significar a salvação nacional como entidade política no conjunto das nações, poderá também abrir uma perspectiva infinitamente mais proveitosa do que o humilhante e vergonhoso alinhamento com potências dominantes que por nós falam e decidem.
Para cúmulo da felicidade, não poderão acusar os portugueses de racismo.
Sem demoras e sem rodeios: quem controla a estrutura accionista do Santander? Quais as ligações dessa instituição financeira ao PSOE (Partido Socialista Obrero Español) e ao Partido Socialista cá do burgo? Por que razão António Costa decreta tão celeremente o apoio a esta causa com o dinheiro dos contribuintes? Por que razão, em nome da ideologia anti-especulativa, a Catarina Martins ou o Jerónimo de Sousa não nomeiam directores-executivos para o conselho de administração do Santander Totta? Como é possível António Costa ser igual aos ex-governantes que ele tanto criticou? E por último; quais as novas medidas de Austeridade para fazer face às novas despesas de tesouraria? Talvez os socialistas do Rato possam pedir um empréstimo aos de Moncloa, se estes chegarem a mandar naquela casa. Como vêem, nem sequer foi necessário usar a palavra Banif uma vez sequer. As eleições em Espanha já sopraram os seus ventos para o largo do Rato.
Bem-vindos à República Venezuelana Socialista de Portugal. O que António Costa acaba de proferir em jeito de ameaça revolucionária diz respeito à credibilidade de um país. Fere mortalmente a palavra de uma nação. Viola a legimitidade privada no exercício da liberdade de expressão económica. Mata Adam Smith, desonra os irmãos Wright, a iniciativa privada, assim como as ideias e os valores consagrados em qualquer contrato social, o respeito mútuo e as garantias dos cidadãos na prossecução dos seus interesses. O mercado, a entidade amorfa, para bem e para mal, não pode tornar-se refém do revanchismo ideológico de um partido que confunde Governo, Estado, legitimidade parlamentar, iniciativa privada e economias de direcção central. António Costa, que nem sequer é velho, confirma que é do Restelo. A denúncia de uma acordo desta magnitude, levada a cabo por um governo, envia um sinal poderoso e negativo para os radares daqueles que ainda entendem Portugal como destino de investimento. O que significa o domínio do Estado? A continuidade de uma companhia aérea a qualquer preço, sejam quais forem os prejuízos e as perdas? O processo TAP vai servir na perfeição enquanto exemplo do extremismo do governo socialista. Não há nada que impeça Costa, a não ser a sua própria agenda de acomodações sindicais. Porque é disso que se trata. Não se trata de transformar a dinâmica de uma empresa com potencial e alcance globais. Não se trata de interpretar as oportunidades lançadas nos últimos anos para captar novos mercados de turismo. Não se trata de elevar o nome de Portugal por via de uma companhia aérea. Trata-se simplesmente de pequena política por outros meios - a enunciação de Clausewitz por via do desvirtuamento do verdadeiro interesse nacional. Os satélites que giram em torno deste negócio dizem mais respeito ao folclore político nacional do que a uma visão estratégica e de longo prazo. Prevejo uma feroz batalha jurídica que irá certamente sugar ainda mais recursos a Portugal e aos seus contribuintes. A Lusitânia não ficará bem na fotografia, mas António Costa quer lá saber. O que deseja é o reforço da sua liderança governativa aludindo a uma nova figura: a legitimidade sindical. De uma assentada cala uma camada larga de avalistas. Trabalhadores que ainda não foram convencidos pelas promessas eleitorais, e que podem destronar António Costa. É disso que se trata. Mais nada. Vergonhoso. Lamentável. António Costa serve-se inequivocamente de José Sócrates e Nicolas Maduro como modelos de inspiração - ambos recusam encarar a verdade e atirar a toalha ao chão. Não faz parte do seu quadro ético. E pelos vistos do dele também. O que António Costa promete fazer é precisamente o oposto de apertar o cinto. Mas a obesidade ideológica não será servida fria. Os portugueses irão pagar esta taxa de aeroporto.
Dar um pontapé num cão é crime; abandonar um velho num lar ou num hospital é normal porque quem o faz é pobre e os pobres não têm consciência. O casamento é uma abominação que restringe a liberdade do indivíduo; mas os casais homossexuais podem casar e são os únicos que dão dignidade à figura do casamento. O divórcio deve ser facilitado; as relações poliamorosas devem ser reguladas. Um casal de homossexuais pode e deve adoptar uma criança; um casal de heterossexuais que decida ter 4 ou 5 filhos é uma parelha ridícula e beata que ainda não descobriu a pílula, o preservativo ou o sexo oral. Um homem que não aspire a casa mais que 5 vezes por semana é um chauvinista; uma mulher que tenha um marido que faz tudo em casa, excepto limpar a sanita, pode gritar à vontade porque está a lutar pela causa feminista. Pagar taxas moderadoras por abortar ofende a dignidade da mulher; pagar taxas moderadoras porque se está doente é a vidinha, tivesse usado um agasalho. Um polícia que dispara sobre um assaltante está a abusar da autoridade; um terrorista que se faça explodir num concerto está a explicar-nos que somos uns imperalistas e que até merecíamos mais. Organizar manifestações de iPhone em punho para pedir mais apoios sociais é a luta; ajudar o Banco Alimentar é fomentar a caridade e gozar com os pobrezinhos. Ser o Cajó mas usar vestidos com folhos é ser moderno - o Cajó está a contribuir para a regulação do terceiro género; ser Padre da Igreja Católica é viver na Idade Média. O mundo perfeito chegará, enfim, quando o Papa for africano, muçulmano, gay, casado, com filhos adoptados, fumador de marijuana e usar unhas de gel. Até lá, seremos uma sociedade antiquada.
Fico furioso quando me mentem. Não me refiro a esse caso patológico cujo nome recuso escrever. O actual governo da República Socialista de Portugal não fala a verdade. Em vez disso lança uma neblina para confundir os mais incautos. A aprovação do aumento de dois milhões de pensões não passa disso mesmo. Não é preciso ser um astrofísico-financeiro para perceber o truque. O tão aclamado aumento está, efectivamente, indexado à inflação, e acontece que na Zona Euro não se avista uma pontinha da mesma. O Banco Central Europeu confirma esse facto ao manter a sua posição de expansionismo monetário. Nesse medida, o pensionista nacional não deve morder este isco. A linha populista que atiram, tem, além do mais, um peso-morto no seu fim. A ficção monetária e a alegada reposição do poder de compra terá de ser compensada com mais medidas trans-demagógicas. Ou seja, o softcore desta medida fácil e aparatosa terá de ser contrabalançado por medidas XXX. Para cada decisão sexy do governo, terá de haver outra sado-maso. Onde é que o Vieira da Silva pensa que está? Nos EUA? Aí sim, já há sintomas de erecção inflacionista, e a domina Janet Yellen, ciente dos perigos que espreitam, começou ontem a fechar a torneira da liquidez ao subir a taxa de juro de referência. "Indexado à inflação" é como oferecer preservativos a um náufrago que se encontra a solo numa ilha selvagem.
Ontem escrevi no Facebook que gostei de ouvir Sócrates falar sobre política, especialmente quando iniciou essa parte da entrevista, porque se notou que percebe tanto de teoria política como eu de crochet. Hoje escrevo porquê.
Em primeiro lugar, porque Sócrates acha, com o intuito de defender a investidura do governo de António Costa, que em política só existe a legitimidade formal, constitucional, como se não existisse uma legitimidade material derivada do sentido de voto expresso nas urnas, que indicou claramente, à luz da tradição do nosso regime democrático, que seria a coligação Portugal à Frente a formar governo.
Em segundo lugar, para procurar refutar o argumento ancorado na tradição, o mestre pela Sciences Po aproveitou a ocasião para dar o exemplo de Robert Walpole, Primeiro-Ministro britânico entre 1721 e 1742, que teve de enfrentar uma Motion of No Confidence no parlamento e perdeu, demitindo-se, consequentemente, do cargo. Isto, para Sócrates, consubstancia uma tradição de não governar contra o parlamento. Ora, Sócrates esquece-se que não estamos no Reino Unido do século XVIII nem sequer no dos dias de hoje, mas na III República Portuguesa, na qual a tradição tem sido sempre a de que forma governo quem ganha as eleições, contando com a abstenção do ou dos partidos do arco da governação que estejam na oposição aquando da aprovação do Programa de Governo. E isto serve também para aqueles que, pateticamente, procuram argumentar dando o exemplo da Dinamarca e da série televisiva Borgen (a que nunca assisti). A este propósito, é particularmente útil a explicação de Miguel Morgado:
Um regime político depende sempre da experiência cívica dos seus cidadãos. No caso português temos uma tradição política democrática de 40 anos, de experiência cívica. As pessoas sabem, ou sabiam até António Costa perpetrar esta fraude, para que é que estavam a votar. No caso de outras experiências democráticas que muitas vezes se anunciam só há um país, em vinte e oito democracias, um país apenas onde o primeiro-ministro é proveniente de um partido que foi derrotado nas eleições: a Dinamarca. Os outros casos, que não são assim tantos, onde se fala de primeiros-ministros provenientes de partidos menos votados constituem coligações formais de Governo.
Em terceiro lugar, Sócrates repudiou a interferência da moral na política, qual Maquiavel de vão de escada. A interpretação mais corrente da contribuição de Maquiavel para a teoria política afirma que este operou a separação entre a moral e a política, quando, na verdade, parece-me bem mais verdadeira a interpretação de Isaiah Berlin, que em "The Originality of Machiavelli" afirma que o que Maquiavel alcança não é a separação entre a política e a moral, nem sequer a “emancipação da política em relação à ética ou à religião,” mas algo mais profundo, a “diferenciação entre dois ideais de vida incompatíveis e, portanto, duas moralidades.” Uma é a moralidade pagã cujos valores são “a coragem, vigor, força na adversidade, reconhecimento público, ordem, disciplina, felicidade, força, justiça, acima de tudo a afirmação de revindicações próprias e o conhecimento e poder necessários para assegurar a sua satisfação;” e a outra é a moralidade cristã, com os ideais da “caridade, misericórdia, sacrifício, amor a Deus, perdão aos inimigos, desprezo pelos bens deste mundo, fé na vida depois da morte, crença na salvação da alma individual como sendo de valor incomparável,” e, portanto, “superior, e até incomensurável em relação a qualquer outro objectivo terrestre, social ou político, ou qualquer consideração económica, militar ou estética.”(1)
Por último, na sequência das declarações do ponto anterior, Sócrates afirmou ainda que a moral é a relação de cada um com a sua consciência. É incrível que esta suprema idiotice subjectivista, que qualquer estudante de filosofia do secundário pode refutar facilmente, não tenha sequer sido questionada pelo entrevistador. Que Sócrates se vanglorie de ter obtido a melhor nota no seu mestrado só torna tudo isto ainda mais caricato.
(1) Isaiah Berlin, The Proper Study of Mankind, ed. Henry Hardy e Roger Hausheer (New York: Farrar, Straus and Giroux, 2000), 289.