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A força dos caracteres e dos candidatos

por John Wolf, em 11.01.16

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Cada um dos candidatos presidenciais depende da força dos caracteres - a capacidade para formar palavras e frases que exprimam a força das suas ideias.  A força do carácter (que é uma coisa distinta) não chega, como julga Maria de Belém. Existe algo ainda mais importante. Os (stors) Rebelo de Sousa e Sampaio da Nóvoa, o (padre) Edgar, o Tino (de rãs), o Jorge (Sequeira, ou se quiser), o D. Henrique (o neto), a Marisa (que não é fadista), o Morais (de nome e de ética) ou o (cândido, doce) Ferreira disputam entre si o primado da palavra. A palavra é a trabalhadora da esquina política, amestrada pelos chulos que disputam territórios. Os proxenetas também tentam convencer os clientes da sua superioridade, do seu talento. Os candidatos presidenciais em cena, praticam a língua portuguesa de acordo com o seu património cultural (duvidoso nalguns casos), fazendo uso de um cabaz de chavões e frases-feitas. Arremessam versos sem que se possa descrever a sua origem ideológica, etimológica, alegriana ou não. No domínio do jargão propriamente dito estamos servidos. A tragédia que se apresenta aos portugueses é de outra natureza, mas igualmente nefasta. Onde estão as reflexões profundas que se exigem? Onde encontramos um conceito de presidência que oblitere a conversa de taberna a que temos assistido? O nível intelectual, o sentido de Estado, a cultura de um povo ou a visão estratégica que culminariam no refundar da missão da presidência, simplesmente não se avistam. Os debates havidos, a que se somará mais uma bela dúzia, continuará a confirmar os nossos piores receios. Portugal, na sua recente história democrática, não conseguiu produzir uma verdadeira escola de presidentes. Ou são ex-militares moderados ou já foram presidentes de câmara, ou primeiros-ministro, mas não parece ter servido para grande coisa. O casting de candidatos à presidência obedece à matriz tipicamente lusa - a arte do desenrascanço, do aproveitamento das sobras, do oportunismo do momento.  Nesta tosta-mista de considerações, somos servidos por mais chefes que índios. Não havia necessidade de lançar tamanha confusão. Até parece que as eleições vão servir para nomear um presidente para cada capital de distrito (?). E depois temos de levar com certas contradições de ordem filosófica. O carácter, essa dimensão de alma insondável pela estatística política, deve permanecer no seu silêncio sepulcral. O carácter não se comunica, embora se afirme. O carácter não se vence, e não pode ser sujeito a derrotas. O carácter não se confunde, portanto é singular. E o carácter não se hierarquiza e humilha o dos outros. Enfim, o carácter não se imprime em outdoors gigantes quando falta tudo e mais alguma coisa. Os homens e as mulheres por vezes também se medem aos palmos. E as palmas não irão abundar nos póximos tempos. Miséria.

publicado às 09:14

O sherpa social

por Fernando Melro dos Santos, em 10.01.16

publicado às 22:09

No seguimento dos meus anteriores dois posts a este respeito, gostaria de fazer novamente um ponto da situação relativamente aos trabalhos de doutoramento, bem como reforçar o apelo a todos aqueles que desejem apoiar a sua conclusão.

 

Conforme deixei patente no meu último post, estou, durante este mês de Janeiro de 2016, a terminar a tese de doutoramento, de forma a poder entregá-la em Fevereiro.

 

A todos aqueles que têm vindo a contribuir para esta iniciativa de angariação de fundos farei chegar a tese logo que esteja terminada. Existem, todavia, algumas pessoas que têm contribuído financeiramente e optado por permanecer anónimas, pelo que, se assim o desejarem, muito agradeço que me contactem para que possa fazer-vos chegar a tese, bem como os ensaios desenvolvidos no âmbito do doutoramento e os recibos de propinas que comprovam a aplicação dos fundos angariados.

 

Encontrando-me agora na derradeira fase do doutoramento, falta apenas reunir €1200 (€700 para a liquidação de propinas e €500 para a entrega da tese), sendo o valor remanescente dos fundos angariados o montante de €340. Assim, permitam-me aproveitar para renovar a mensagem, apelando a todos aqueles que queiram e possam colaborar nesta iniciativa, relembrando que o NIB para o qual podem ser realizadas as contribuições é o 0035 0150 0006 3680 5786 7, sendo também possível contribuir através do PayPal, para samuelppires@gmail.com.

 

Termino assinalando que o facto de ter chegado aqui se deve, no que ao pagamento das propinas diz respeito, ao esforço e dedicação dos que têm contribuído na medida das suas possibilidades. Assevero-vos que, para mim, todo o apoio é inestimável. Por isso, permitam-me, mais uma vez, expressar o meu sentido agradecimento a todos os que têm contribuído financeiramente para esta iniciativa, bem como aos que têm ajudado a divulgá-la.

 

Um excelente ano de 2016 a todos.

publicado às 20:23

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António Costa julga mesmo que manda nisto tudo. Quer mesmo ser dono disto tudo. Mas não quer transformar a presidência da república num consulado socialista, embora dê ares dessa graça. Quer imitar o modo como se apropriou do parlamento e formou governo, mas de um modo mais perverso, cínico. Ao lançar a aposta múltipla nas eleições presidenciais, apelando às f(r)acções representadas por Maria de Belém e Sampaio da Nóvoa, não esclarece publicamente qual a posição que assume. Ou seja, não se coloca inequivocamente ao lado de um dos seus candidatos, mas generaliza e não fala a verdade quando descreve a área logística da sua preferência. E isso não passa de areia atirada aos olhos de Soares e dos diversos barões do Largo do Rato. Se formos minimamente astutos, percebemos a rasteira num piscar de olhos. António Costa apoia, com esta jogatana de "apoio aos dois camaradas", a candidatura de Marcelo Rebelo de Sousa, porque este será o alibi ideologicamente perfeito para poder contradizer a acção presidencial quando esta começar a estrangular os seus intentos governativos. Não convém nada ao governo socialista ter um dos seus em Belém. Isso restringe a sua área de actuação. Se estiver lá o Marcelo é mais fácil ser extravagante e ousado. Convém a António Costa ter uma réplica, mesmo que mais colorida, de Cavaco Silva. Desse modo, o status quo das relações institucionais mantém-se sem grandes alaridos. O mauzão continuará a residir em Belém. Marcelo Rebelo de Sousa será a válvula de escape ideal, o embaixador do princípio do contraditório. Maria de Belém e Sampaio da Nóvoa bem que se podem queixar, mas por outro lado, como são politicamente dispensáveis, o seu afastamento serve preciosamente outras guerras. Mais cedo ou mais tarde, com as atribulações de um governo feito a retalhos do Bloco de Esquerda e do Partido Comunista Português, a sua liderança será naturalmente posta em causa, e a haver guerras fratricidas, são menos uns quantos para confrontar. Veremos, mais adiante, como António Costa afasta a Ana Gomes que está mortinha por realizar um "regresso auspicioso". Não se esqueçam que as legislativas ou as presidenciais, por mais mediáticas e nacionais que sejam, servem para arrumar as casas partidárias de Portugal. Os portugueses e o interesse nacional são meros pretextos de ocasião. Um festival a 9 ou 10 candidatos, ou um rancho folclórico presidencial, é um mimo para a realização política deste calibre. Aguentem. Ainda vão ter de levar com muitos debates nas noites quentes da sensacionalista TVI, da vendida SIC e da pobrezinha RTP - uma TAP que rasteja pela paisagem de oportunistas nacionais. Marcelo ainda vai agradecer a alguém.

publicado às 18:04

Reler ao Sábado

por Fernando Melro dos Santos, em 09.01.16

“Constantine, moreover, was not yet a Christian when he uttered the appeal to conquer in the sign of the cross; and while the warrior kings of Israel may have drawn strength from the old Covenant in their small and local wars, the Christians of the new Covenant were to agonise for centuries over the issue of whether warmaking was morally permissible or not. Christians, indeed, have never found unanimity in the belief that the man of war may also be a man of religion; the ideal of martyrdom has always been as strong as that of the justified struggle and remains strong to this day. The Arabs of the conquest years were not caught on that crux. Their new religion, Islam, was a creed of conflict, that taught the necessity of submission to its revealed teachings and the right of its believers to take arms against those who opposed them. It was Islam that inspired the Arab conquests, the ideas of Islam that made the Arabs a military people and the example of its founder, Muhammad, that taught them to become warriors.”

 

― John Keegan, A History of Warfare

publicado às 14:21

A noite da alma

por Fernando Melro dos Santos, em 09.01.16

à meia-noite em ponto, quando decido ir dormir porque estou satisfeito com o produto do dia, vejo que ninguem alem de mim parece achar latino-americana a aparicao de um PM na qualidade de comentador politico, a convite de um canal privado, o mesmo canal onde pontifica o irmao do dito PM e que em seguida nos brinda com uma parada de monstruosidades acefalas e iliteratas, debitando vituperios acerca "do cavaco". entao decido ficar acordado um pouco mais ainda. alguem tem de tirar sentido deste horror.

publicado às 00:14

 

Trinta anos volvidos sobre a adesão de Portugal à Comunidade Económica Europeia (CEE) foi a política doméstica que menos evoluiu. O arranque das vinhas, a construção de uma rede notável de autoestradas, os fundos comunitários e a chegada da divisa Euro, alteraram a paisagem geofísica do país, mas o padrão da política manteve-se, os mesmos vícios de comportamento mantêm-se e os partidos políticos não souberam acomodar a profunda mudança de mentalidade que a cedência de uma parte da soberania implica. Importa tomar nota que o número de detractores em relação ao projecto europeu tem vindo a crescer, e, embora pese o esforço da ficção idealista dos proponentes de Bruxelas, a União Europeia (UE), filha da CEE, enfrenta enormes desafios - endémicos na sua grande maioria. O palavreado da ocasião comemorativa, projectado por António Costa, cai numa espécie de vácuo ideológico da Europa. A revolução parlamentar levada a cabo pelos socialistas e os partidos intrinsecamente anti-integração, é apresentada como a bandeira de salvação da UE. O processo democrático supranacional, na acepção de António Costa, deve significar realizar o bypass às instituições europeias, para forjar soluções que escapam ao consagrado em tratados. Nem por uma vez sequer, o primado constitucional da UE é referido. António Costa lança postulados para o ar como se não existisse um Tratado da União Europeia. Não está mal vista a sua visão a partir dos cidadãos, mas depreendemos das suas palavras que o primeiro-ministro socialista sublinha as virtudes da Esquerda, quando, face aos factos incontornáveis da realidade política, é a Direita europeia (perigosa em muitos casos) que conhece a sua ascensão. Se levarmos à letra a alegada sinceridade política de Costa, quando este refere o primado do espírito dos povos, não devemos obviar o atestado político e as credencias que este concede à Direita destruidora dos princípios fundamentais da Europa trans-ideológica. Enfim, a Ode à Alegria de Beethoven não me parece ser a banda sonora mais adequada, assim como enaltecer os feitos integrativos de Mário Soares, que deve ser tido também como um dos concessionários de boa parte da soberania nacional. António Costa refere uma alternativa credível para a reafirmação da Europa, como se esta já não estivesse em marcha. Não foi a visão de Mário Soares que conduziu Portugal à adesão à CEE - ele que fique com o troféu do 25 de Abril. Foi o eixo de Berlim-Paris que abarbatou Portugal. Foi o Parlamento Europeu que minguou Portugal. E foi um comissário português que serviu os interesses alheios. Em suma, foram tantos e tão diversos que subscreveram o presente estado da arte em que se encontra este país. 30 anos deu para tanto e tão pouco.

publicado às 19:50

Posta Restante (08.I.2016)

por Fernando Melro dos Santos, em 08.01.16

 

 

 

Escrevia ontem Fernanda Cancio - celula individual na miriade de acoitados em hibernacao que se agitam novamente ao som das forquilhas com que o Estado envia prebendas - no Twitter que "so ha indignacao quando o assedio sexual parte de refugiados e africanos". Talvez a Cancio possa remeter-me para a ultima ocasiao em que um grupo organizado de mil homens brancos tenha saido lupinamente em demanda de mulheres para violar, ou talvez o problema seja dos proprios media que zelam pela higiene noticiosa, com criterio editorial urbano e hodierno, a bem do campesinato.

Seja como for, aquilo que deve ser feito acerca do problema supra mantém-se inalterado desde há mil anos: eles nao sao como nos, em tal grau que a nossa tolerancia resulta, assimptoticamente, no que se viu em Köln. Resta somente expulsar os que ja entraram, vedar as fronteiras, e metralhar sem qualquer contemplacao quantos tentarem, ao perto ou de longe, assolar o edificio da nossa cultura com o seu obscurantismo medieval.

 

Por outro lado, Cancio poderia sugerir à edil de Köln que criminalize o piropo, seguramente um acto de rasgo digno do proprio Grande Mufti, Barack, com o qual mostrariamos inequivocamente aos espoliados berberes novos e mirificos rumos na convergencia social.

 

Intramuros na paroquia, a farsa continua; o contribuinte aceita o cateter triplice de futebol, causas e cus desnudos, mas as interrupcoes na emissao arriscam a tornar-se mais frequentes e cromaticamente evoluidas, com ou sem corredores arboreos, aeroportos moveis, cidades andantes, linhas de metro aereas, ou expulsao e purga dos malvados investidores cuja ousadia em abarbatar companhias de bandeira e de bandeiro fariam do nosso querido Abril-Agosto um pesadelo neoconservador. 

 

A suivre, certamente. Lemmy está vivo.

 

 

publicado às 11:03

Caos em Colónia

por João Quaresma, em 08.01.16

A revista Der Spiegel noticiou ontem o relatório da polícia federal alemã sobre os distúrbios e ataques de muçulmanos contra mulheres na noite da passagem de ano em Colónia, que qualifica a situação vivida como caótica e vergonhosa, tendo as forças policiais sido completamente ultrapassadas pela dimensão dos acontecimentos e pela atitude desobediente e desafiadora dos desordeiros, e ainda a impossibilidade de socorrer pessoas que pediam ajuda. Citando:

"According to the report, officers encountered many distraught, crying, frightened pedestrians, particularly women and girls. They reported "fights, thefts, sexual assaults against women, etc." Groups of male migrants were repeatedly named as perpetrators.

(...)

The report lists several examples of police officers' experiences:

  • Officers were hindered from pushing their way through to people calling for help by tight clusters of men.
  • A man is quoted as saying: "I'm a Syrian! You have to treat me kindly! Mrs. Merkel invited me."
  • Witnesses were threatened when they provided the names of perpetrators.
  • People reportedly demonstratively tore up residence permits in front of the police, grinned and said: "You can't touch me. I'll just go back tomorrow and get a new one." The report did not, however, confirm the authenticity of the documents.
  • Orders for people to leave the premises were ignored; taking repeat offenders into custody was not possible due to lack of resources.
  • After track closures due to overcrowding, people simply forced their way over adjacent platforms and train tracks back to the closed platform.
  • Physical fights broke out as trains were being boarded; it was "every man for himself."

O artigo completo: Cologne Assaults: Police Report Outlines 'Chaotic and Shameful' New Year's Eve

 

publicado às 02:25

Excursões "Maria de Belém": inscreva-se

por John Wolf, em 07.01.16

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A madre Maria de Belém de Calcultá e arredores quer levar os chefes de Estado estrangeiros a visitar os lares de terceira idade para mostrar que Portugal é uma pobre vítima dos mauzões da Troika e do governo anterior. Por outras palavras já está a entornar o socialismo que lhe vai na alma e a culpar os que estiveram antes. É esta a imagem que Portugal deseja projectar? Não me parece que os portugueses queiram isso. Claro, ainda existem uns velhacos do Restelo, mas estou em crer que têm os dias numerados. Por esta razão, e tantas outras carregadas de disparate e narcisismo, Maria de Belém nunca será presidente da república portuguesa. Mas existe outro fardo um pouco mais penoso. Por mais que deseje sacudir do capote a ligação ao Grupo Espírito Santo, a verdade é que o caldo já se entornou sobre a sua saia. A senhora ainda não percebeu que há uma diferença entre aquilo que se pode fazer e aquilo que se deve fazer - força do carácter, uma gaita. Os chefes de Estado que visitarem Portugal não se devem quedar pelo Inatel, devem acampar em Monsanto, e pela mão da Maria de Belém devem visitar a Casa Pia para que nenhuma parte do roteiro de ascensão e queda de Portugal fique de fora. Não tenho muito mais a acrescentar. Apenas o seguinte; nutria um sentimento de "tanto me faz" em relação à senhora, mas agora não a posso ver pela frente. Não tem nada a ver com o candidato à nomeação republicana Donald Trump, mas a analogia do não-nunca serve na perfeição. Já basta termos um governo de repetentes, para termos de aturar alguém que afirma ter tido uma carreira gloriosa ao serviço da nação. Poupem-me a estas excursões. Não quero ver. Nem quero saber.

publicado às 17:49

Por terras da Galiza

por Cristina Ribeiro, em 07.01.16

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Que procurasse pelo antigo Couto Misto de Rubiás, dissera-me o Duarte. E, de todas as vezes que voltei àquelas terras de Montalegre, este conselho não me largava. A oportunidade surgiu nesse fim-de-semana: era um daqueles dias soalheiros de Outono, o último do ano, que o Inverno já aí estava, com os dias cinzentos e chuvosos. Entrados em Espanha, foi coisa de poucos quilómetros até vermos a placa; então era ali que, até 1864 - data da sua extinção, por assinatura do Tratado de Lisboa ( sempre esse nome de má memória, a lembrar o que, muitos anos depois, em 2007, confirmava a cedência das soberanias nacionais, a pretexto de " intensificar a união da Europa ") - existiu esse Couto, onde qualquer documento se escrevia " em português e em castelhano "... Mas logo nos demos conta de que, porque tínhamos saído tarde de casa, teríamos de aí voltar, para melhor conhecermos as terras que, desde tempos medievais, haviam integrado um Estado Autónomo encravado entre Montalegre, do lado português, e a Galiza, do lado espanhol, que, por isso, era governado por leis próprias. É que o tempo fizera-se pouco, e o que entretanto aprendera sobre esse território privilegiado justificava maior demora. E o pouco que vimos prometia: em terras Galegas, era como se continuássemos o nosso périplo pelo Barroso.

publicado às 17:31

Forever Young

por João Almeida Amaral, em 07.01.16

 

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Tive ontem o grato prazer, de ler mais um belo texto de Nuno Gonçalo Poças "Na terra do nunca". 

Já tinha em tempos ouvido alguns comentários sobre essa "pipoca" e confesso que a curiosidade "mata o gato", resolvi por isso perder algum tempo para poder opinar. 

Com surpresa verifiquei que ela, vai ao encontro de uma teoria que há muito fermento;  a teoria dos "imbecis que ainda não perceberam que envelhecem como qualquer outro mortal".

Este grupo, de uma dimensão razoável, é composto por mulheres e homens, mas atrever-me-ia a dizer que maioritariamente por mulheres. Têm entre os 40 e os 50 anos, nascidos portanto entre os finais dos anos sessenta e setenta, são urbanos, com frequência universitária e com um nível de vida invejável.

 

Têm preocupações narcísicas acompanhadas de rituais mórbidos (tipo jantar only girls).

A imagem que tenho na cabeça é ; uma mulher de 45 anos que ainda não teve filhos ,solteira, com múltiplas relações, que tem como referencial televisivo " o sexo e a cidade"  , adora em termos automobilísticos o Mini (BMW) , usa imensas pulseiras feitas pelas sobrinhas de 13 (para ganharem dinheiro para as férias), roupa de adolescente e gostava de morar num loft, mas em casa da mãe, que é viúva é muito mais cómodo e barato, viaja imenso (porque não tem as despesas de um adulto tradicional)  e acha que a maternidade é só a partir dos 45. Têm todos os tipos de profissões , não dispensam umas tatuagens e mesmo se parlamentares vestem-se como se fossem para uma rave.

No fundo são caricaturas de adolescentes que chegam a inspirar pena. 

Não somos nós que estamos velhos, os que optamos por casar, ter filhos, comprar casa, e cumprir o ciclo de vida dito normal. Este grupo, os "forever young" é que não leram o livro até ao fim e por isso não perceberam que a partir dos cinquenta, a roupa de adolescente e o biquini brasileiro, geram pena. 

O envelhecimento é uma fase da vida e quando bem vivido é muito bom.

É a fase em que se começa a abrandar o ritmo e tudo passa a ser saboreado, com muito mais intensidade , porque se viveram as fase todas e tivemos assim a possibilidade, de ter vivido tudo o que a vida tem para viver. 

Tenham juízo, já é altura de enfrentarem os vossos medos.

Forever young é uma mentira. 

 

publicado às 11:45

(Tentar) falar (mais) claro

por Nuno Gonçalo Poças, em 07.01.16

A avaliar pelos comentários que recebi, parece-me que ontem não fui claro. Como não gosto de ter essa sensação, aqui fica uma tentativa de esclarecimento.

 

1. Eu percebi que a Ana Garcia Martins se limitou a constatar um facto: as mulheres (e os homens, já agora) têm total liberdade de querer ou não querer ter filhos. Não neguei essa evidência. Pelo contrário, até a reforcei. Mas também me parece que é preciso ir além do óbvio. A questão não é se as pessoas podem ou não querer ter filhos. Claro que podem. O debate deve ser sobre os motivos que levam a que uma grande fatia da nova geração opte por não ter filhos. E sobre esse assunto ninguém parece ter respostas, preferindo discutir a questão da liberdade de querer ter filhos ou não.

2. Se quiserem substituir a palavra "egoísmo" por "egocentrismo" têm-me do vosso lado. Não se trata de ser egoísta em relação a filhos que ainda não nasceram. Trata-se de colocar o ego, o "eu", acima de todos os outros interesses. Incluindo os de terceiros.

3. Também me parece evidente que alguém que afirma orgulhosamente que "detesta crianças" sofre de algum problema, nem que seja de formação. São livres de odiar crianças? São. Mas isso afecta valores de comunidade em que acredito e também sou livre de achar que isso é uma barbaridade.

4. Porém, é um facto que há pessoas que não gostam de crianças - e que, por isso mesmo, mais vale que não as tenham. Claro. Mas, mais uma vez, a minha pergunta é esta: porquê? Por que motivo há hoje, numa geração que por acaso é a minha, uma aversão mais aguda em relação ao sacrifício que significa na vida de uma pessoa o facto de ter um filho?

5. Por que motivo há hoje uma tendência significativa de pessoas que não sentem o "apelo da maternidade ou da paternidade"? Mais uma vez: são livres de não o sentirem. Mas continuamos sem discutir as razões dessa escolha.

6. Também não acho que uma mulher ou um homem sejam heróis porque resolveram ser mães ou pais. Ser pai ou mãe não é um acto de heroísmo. É um decisão. Como é uma decisão não o ser. Ponto final.

7. Quando falei em "sociedade organizada" fi-lo de forma abstracta. Parece-me claro que só viu na expressão, no contexto da frase, uma alusão ao Salazarismo que vê o Salazar em todo o lado.

8. Quando disse que o meu pai sustentava, com 40 contos de rendimento, uma mulher, um filho e uma renda de casa que lhe roubava metade desse rendimento, não estava a defender nenhum modelo de sociedade em que o homem trabalha e a mulher é uma escrava do lar. A minha mãe arranjou trabalho pouco tempo depois. Novamente: alguém devia parar de ver o Salazar em todas as esquinas.

9. Claro que para não ter filhos, como para muitas outras coisas, todos os motivos são válidos. Não querer ter estrias na barriga, por exemplo, é um motivo válido como outro qualquer. Mas repito-me: por que motivo há hoje uma tendência significativa de pessoas que prefere uma barriga lisa ao sacrifício que é ter um filho e educá-lo?

10. Para que fique claro: eu não disse que a Ana Garcia Martins, o ser humano, era imbecil. Nem sequer disse que a Pipoca Mais Doce, a personagem, era imbecil. Disse, e mantenho, que a Pipoca Mais Doce é um ícone de um determinado tipo de mulher moderna e cosmopolita. E esta, sim, acho que é um bocadinho imbecil. Ou imbecilizada.

11. Se fosse preciso passarmos pelas experiências para falarmos sobre os temas, era bom que toda a gente passasse um ano a viver na rua antes de falar de pobreza, por exemplo. Não me excluí da geração que critico, mesmo que casar e ter filhos esteja nos meus planos para este ano.

12. Claro que ter filhos é uma despesa. Mas não é a despesa que muitos pais fazem crer. É tudo uma questão de opções. Umas são mais caras, outras mais baratas. E com todas se perde e se ganha.

13. Vou repetir-me pela enésima vez: eu não nego a liberdade de ter ou não ter filhos. Mas continuo a não perceber por que motivo hoje se considera que as pessoas não estão preparadas para os ter, que razão leva uma grande parte de pessoas a odiar crianças, etc.

14. Esta liberdade é individual. Claro. Mas não é um assunto que diga respeito apenas a cada um de nós. É um assunto colectivo. Da comunidade em que nos inserimos. E a renovação das gerações, a natalidade, é um problema sério com que nos confrontamos. Por isso, sim, eu tenho alguma coisa a ver com essas decisões individuais. Não as quero condicionar. Mas quero perceber o que as leva a optar por uma coisa (não ter filhos) em vez da outra (tê-los). E até agora ninguém (com a excepção, talvez do Bruno Vieira Amaral e da Susana Almeida, que abordaram alguns pontos interessantes sobre isto) me soube ajudar.

publicado às 10:12

Na Terra do Nunca

por Nuno Gonçalo Poças, em 06.01.16

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 A Ana Garcia Martins, também conhecida como a Pipoca Mais Doce, esse ícone da mulher moderna, urbana, cosmopolita e profundamente imbecil, escreve um texto de incentivo à liberdade da mulher. A liberdade de não ter filhos. E ilustrou livremente esse texto com a infeliz imagem que aqui reproduzo.

Não ignoro essas liberdade. É evidente que quem não quer ter filhos não os tem. Claro que quem não gosta de crianças não deve ter filhos. Como é evidente que quem pensa assim mais vale que não os tenha. Não é nada disso que deve estar em causa quando se discute um tema deste género.

Ninguém gosta de crianças a chorar, ninguém gosta de mudar fraldas, de ter as camisas vomitadas, de passar noites em claro, de gastar dinheiro com coisas que só as crianças usam. Mas quem disse que nós só fazemos coisas de que gostamos? Diz-nos a modernidade e o hedonismo dos tempos que correm.

A geração dos nossos pais, com a nossa idade, já tinha cumprido serviço militar, já tinha terminado os estudos, já tinha emprego, já tinha casa, já tinha casado e já tinha filhos. Não porque gostasse. Essa era uma questão que não se colocava. Este percurso natural da vida numa sociedade organizada não era uma questão de gosto. Era assim porque as coisas são mesmo assim. Porque as ambições pessoais e profissionais não atropelavam a constituição de família.

A nossa geração foi criada pela anterior, mas não pelo exemplo. Nós fomos criados numa época de paz, de prosperidade, do prazer. E levamos muito a sério o culto desse prazer. Tudo é feito e deve ser feito para ser do nosso agrado. Para sermos "felizes". É por isso que não suportamos o sacrifício, a renúncia, a dificuldade, a perda, o fracasso, a desilusão - ou, se quisermos ir mais longe, é por isso que não suportamos a velhice, o feio ou a morte.

Constituímos hoje uma sociedade Peter Pan. Não queremos atingir a maturidade - um processo que exige responsabilidade, compromisso, sacrifício. A sociedade moderna é uma sociedade adolescente porque é composta por indivíduos eternamente adolescentes – gente que atinge a puberdade cada vez mais cedo e que a abandona cada vez mais tarde.

Como disse aqui há dias, nós podemos ter paciência para tudo. Para jantar fora, para trabalhar até à meia-noite, para ir de férias com os amigos, para jantaradas e noites durante a semana, para desportos radicais, para ir a todos os sítios fashion, gourmetfancy da cidade, para estar no Facebook, no Twitter, no Instagram, no Whatsapp. Mas não temos paciência para chegar a casa e perder uma hora do nosso tempo a brincar com uma criança. Para mudar fraldas. Para não dormir por causa do choro de um bebé. Temos paciência para tudo menos para aquilo que nos tira a paciência. E o que nos tira a paciência é praticamente tudo aquilo que nos atinge o prazer.

O trabalho é horrível porque não tiramos dele qualquer prazer - mas temos de trabalhar para termos dinheiro para gastar em pequenos e grandes prazeres. A família é horrível porque nos rouba tempo, porque nos limita, porque nos condiciona o sexo, as saídas à noite, as jantaradas, as noitadas e as viagens.

E escudamo-nos em todos os argumentos. As despesas com os filhos são a maior das desculpas. Como se as gerações anteriores, mais pobres que a nossa, não tivessem tido filhos. "Ah, mas agora um filho é uma despesa muito maior". Pois é. Se quisermos que seja, claro. Se quisermos que o petiz frequente todas as actividades extra-curriculares lá do colégio caríssimo que frequenta, se quisermos gastar fortunas em roupas de marca que só duram um mês, se quisermos gastar rios de dinheiro em coisas que podiam sair muito mais baratas, ter um filho hoje é muito mais caro que antigamente. Ainda estou para saber como é que, por exemplo, o meu pai sustentava uma mulher desempregada, um filho e uma renda de casa de 20 contos quando ganhava apenas 40...

A Ana Garcia Martins tem razão: quem não quer ter filhos é livre de não os ter. E quando pergunta se isso é egoísta, a resposta é sim. E não é em relação a ninguém. É egoísta porque é uma escolha pelo amor-próprio, pelo prazer pessoal, pelo ego. Se é uma escolha livre? É - e não seria escolha se não fosse livre. Mas também é um sinal dos tempos. Da sociedade Peter Pan que estamos a construir. A Pipoca Mais Doce podia ter só dito que gosta desta Terra do Nunca. Pode ser que ela queira ocupar o espaço da Sininho. Eu prefiro ser o Capitão Gancho.

 

publicado às 16:38

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Esta é para aqueles que me acusam de estar sempre a bater no (mesmo) velhinho. Já disse, e torno a dizê-lo, a ideologia e os partidos, pouco ou nada têm a ver com a minha suposta acutilância crítica. Quando se levanta a poeira em torno da nomeação de assessores para o primeiro-ministro, devemos fazer uma pausa, respirar fundo e olhar à nossa volta. António Costa pode ser amigo de ocasião de Marisa Matias e companheiro de pesca de Jerónimo de Sousa, mas sendo astuto e realista, sabe que as propostas peace and love dos parceiros do tempo novo não servem os tempos perigosos que atravessamos. A segurança interna e a defesa são dimensões que exigem cuidados acrescidos. O primeiro-ministro está certo, neste caso. Contudo, esta decisão não fará descarrilar a inevitabilidade da torrente de ameaças que pairam sobre as nossas sociedades. As nomeações em causa podem contribuir para uma outra dimensão pré-conceptual - a agilização e a partilha de informação entre os diferentes corpos e entidades em causa. Eu teria ido mais longe. Teria constituído um conselho de segurança interna para agrupar em torno da mesma mesa as chefias das diversas polícias e organismos com vocação securitária ou não (ASAE, SEF, Protecção Civil e Polícia Marítima, a título de exemplo). Mas sabemos que muitos destes organismos não se entendem - há colisão das respectivas hierarquias e excessivas lealdades políticas. Basta ser um cidadão comum para perceber que a Polícia Municipal e a PSP não se embrenham de um modo fluente e natural. O polícia municipal é excelente a guardar a betoneira da obra na via pública, mas não me parece que esteja atento à missão policial no seu sentido mais abrangente. Se o trânsito estiver emperrado, este nada faz - não é com ele (pediram-lhe para guardar a grua). Em suma, falta a Portugal, um país pequeno e de fácil interpretação logística, a plena integração de todas as forças, a consubtanciação da reciprocidade de objectivos e missões. Não sei se António Costa tem noção destas disparidades e separação de águas, mas o ambiente geopolítico e a probabilidade da ocorrência de eventos fora de caixa, obriga o governo a pensar holisticamente. Sim, eles andam aí. Alguns políticos e uma mão cheia de terroristas.

publicado às 08:43

A pacifista Marisa Matias

por John Wolf, em 04.01.16

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Marisa Matias não tem a mínima ideia de como os EUA perderam a guerra do Vietname. Existe algo mais poderoso do que o financiamento de máquinas de guerra. Chama-se a isso a "vontade guerreira". Quando a candidata a presidente da república portuguesa se opõe veementemente à intervenção militar contra o Estado Islâmico (EI), esquece que militares nacionais já estão presentes em mais de 20 cenários de conflito. Por outras palavras, Portugal já é campeão da defesa dos valores democráticos, e, nessa medida, já está envolvido na derrota dos ideais totalitários do EI. Para se abster de participar na construção securitária do mundo livre, Portugal teria de se retirar de todos os cenários de guerra ou conflito em que participa, nas várias modalidades operativas ou de treino. Se existe país com um património militar assinalável, esse país é Portugal. Embora a lógica de remoção dos meios de financiamento do EI faça parte da grande estratégia, por si só não bastará. Não conheço a estirpe de idealismo perigoso que se infiltrou no espírito ingénuo da pequena Marisa, mas existe algo a que já assisti inúmeras vezes. Geralmente os pacifistas de inspiração woodstockiana são os piores quando a coisa corre mesmo mal. Viram o disco muito rapidamente para tocar outra música. Por outro lado, as revoluções de veludo do Leste Europeu, as transições de regime que ocorreram sem grandes incidentes com o descalabro da União Soviética, aconteceram desse modo suave com dinheiros. E não foi um dinheiro qualquer. Sabemos que o grande especulador George Soros esteve por detrás da construção democrática em países como a Húngria ou a República Checa. Talvez a Marisa Matias queira ir mais longe na exploração do seu conceito de saldo bancário nulo do EI. Talvez possa propor, quando não for primeira-dama, o financiamento da transição do regime de genocídio do EI para uma modalidade colectivista de Esquerda social. Marisa Matias esquece que foram guerras de libertação que lhe concederam o dom da palavra e da liberdade de expressão. Churchill não era membro do Bloco de Esquerda. Mas poderia ter sido.

publicado às 09:05

A esquerda precisa de Cavaco

por Nuno Gonçalo Poças, em 03.01.16

Aníbal Cavaco Silva não nasceu no Restelo, não é filho de gente cosmopolita, não tem um passado de anti-fascismo militante, não descende sequer de gente burguesa. Cavaco nasceu numa aldeia do concelho de Loulé, filho de um homem remediado que vivia do cultivo de frutos secos e do comércio de combustíveis. Licenciou-se em Finanças, doutorou-se em Economia Pública em York, chegou a catedrático na Universidade Católica e na Universidade Nova de Lisboa. Cumpriu o serviço militar, foi Ministro das Finanças, Primeiro-Ministro durante dez anos, candidato derrotado numas eleições presidenciais e Presidente da República durante outros dez anos. É o maior exemplo de elevador social da história da democracia portuguesa: o filho de um gasolineiro de Loulé chegou à chefia do Governo e à chefia do Estado depois de ter construído uma carreira académica, tudo pelo seu pulso. Se há casos de mérito em Portugal, Cavaco Silva é o maior de todos eles.

Há, porém, quem não morra de amores por Cavaco Silva. Uns, à direita, que não lhe perdoam as opções políticas que fizeram crescer o monstro que é o Estado, que não lhe perdoam o socialismo disfarçado de ambiguidade ou o despojamento ideológico (que, de resto, sempre serviu de fertilizante no PSD a todos os seus líderes). Outros, à esquerda, escudam-se na alegada marca ideológica do cavaquismo para o odiar de morte, quando na verdade não o suportam porque Cavaco representa um fenómeno de ascensão social que a esquerda detesta. A esquerda soarista detesta Cavaco porque Cavaco não faz parte da elite lisboeta - apareceu sem prestar vassalagem e obteve quatro maiorias absolutas em seis eleições. E a esquerda à esquerda do soarismo (onde se situa o novel Partido Socialista) não suporta Cavaco porque Cavaco não tem passado anti-fascista, é filho de gente pobre e porque subiu na vida a pulso. Cavaco explicou à esquerda que era possível ter sucesso em Portugal fora das dinastias e das elites de Lisboa (como Sá Carneiro tinha já demonstrado) e que um filho de um pobre podia aspirar a subir na vida. É normal que a esquerda portuguesa, que vê na pobreza uma arma eleitoral, não tenha gostado.

Cavaco pode ter usado meias brancas, pode ter aprendido tarde a mastigar a comida, pode ver numa marquise um sinal de vanguardismo estético. Foi, de facto, um socialista que, como todos os socialistas, fez obra e deixou a conta por pagar. Foi um certinho e aborrecido democrata. Sem mundo, sem cultura, sem gosto. Mas foi, acima de tudo, um português como todos os outros. Ostentou a peúga branca com a mesma naturalidade com que afirmava desconhecer quantos cantos teriam Os Lusíadas. Orgulhou-se da sua marquise dos anos 90 com a mesma descontracção com que mastigou como um selvagem uma fatia de bolo-rei. Cavaco sempre foi Cavaco. Sem passado anti-fascista, um cumpridor de regras, um homem de estabilidade e de segurança. Como a grande maioria dos portugueses. Foi a sua portugalidade que lhe deu uma maioria relativa, duas maiorias absolutas e duas vitórias à primeira volta nas presidenciais. Foi esse lado de homem médio que me fez votar nele duas vezes sem que me arrependa, por exemplo. Pode odiar-se a substância de Cavaco - eu, por exemplo, não morro de amores por ela. Mas odiar Cavaco pelo estilo é o mesmo que odiar os portugueses por atacado. E isso é, infelizmente, insensato.

Mas mesmo em relação à substância de Cavaco Silva as opiniões vão sendo diferentes. A minha já a expliquei. Há mais. À esquerda criticam-lhe, agora, o compadrio com o Governo de Passos Coelho e de Paulo Portas, por exemplo. Acusam-no de ter feito dois mandatos presidenciais de parcialidade que mais não foram que favores e fretes ao PSD. E é preciso desconstruir isto.

Em primeiro lugar, Cavaco Silva deve ter sido o Presidente do PSD que mais desprezo nutriu pelos seus militantes e pelo partido em si. Imaginar que Cavaco esteve dez anos em Belém a fazer fretes ao PSD é um disparate de dimensões planetárias.

Em segundo lugar, é preciso não ter memória ou, tendo-a, estar inequivocamente de má fé. Cavaco Silva foi um dos responsáveis pelo desgaste causado ao Governo de Santana Lopes e Paulo Portas que acabou por conduzir à maioria absoluta de José Sócrates. Cavaco Silva foi o Presidente perfeito durante essa maioria absoluta e só fez abanar a estabilidade institucional quando se percebeu que o caminho que o País estava a tomar era insensato demais até para a insensatez de Sócrates. Cavaco Silva foi o Presidente que criou a expressão "espiral recessiva" para apontar o dedo ao Governo de Passos Coelho. E foi, depois, o Presidente que ofereceu de bandeja a chefia do Governo ao Partido Socialista, quando se disponibilizou a convocar eleições antecipadas no reinado de António José Seguro.

Afirmar agora, como alguns candidatos presidenciais têm feito, que Cavaco foi um Presidente de facção só é digno de alguém que perde braços quando diz verdades. Acusar Cavaco Silva de ter sido o Presidente da direita não é melhor.  A esquerda não percebe isso porque precisa de bodes expiatórios em todo o lado. Precisa de Cavaco para falar do bafio e do cinzentismo como contraponto ao colorido dos amanhãs que cantarão. A esquerda precisa da marquise de Cavaco para nos explicar que não tem grande apreço pelo povo. A esquerda precisa de colar Cavaco à direita porque a verdade se estraga sempre por causa de uma boa história.

Cavaco é um caso de sucesso pessoal. Mesmo que algum do insucesso do País se deva a esse sucesso, isso não deixa de ser um sinal positivo. Um sinal de que a democracia, mal ou bem, funciona. E é só. Trinta anos de Cavaco depois, é só. Não precisávamos era de tanto tempo para perceber isso.

publicado às 19:21

O orçamento que salvou Portugal

por John Wolf, em 03.01.16

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Sabemos, lamentavelmente, que estamos na presença de alguém com um nível intelectual e cultural questionável, quando escutamos a seguinte afirmação: (este) "orçamento vai reverter empobrecimento". António Costa parece não saber que um orçamento é uma mera ferramenta operativa, e pouco mais. Se fosse estadista, saberia beber em fontes mais profundas. Saberia iniciar um processo de refundação das premissas que enquadram sociedades. Se fosse um pensador pensaria para além dos benefícios de um alicate que serve para reparar o arame da vedação gasta. Existe algo muito familiar na toada deste governo socialista. Algo ironicamente semelhante a regimes que os socialistas tanto abominam, por se perfilarem como sendo os defensores da individualidade que caracteriza os espíritos livres. Regressamos ao registo cómodo da ideologia do conforto. Ao agradar das hostes para que estas se tornem estáticas e não perturbem o reset da canalização do Estado, assente no corporativismo partidário, claramente dependente de obras públicas, fundos comunitários e a quase total desregulação dos meios para atingir esses fins duvidosos. António Costa não pode oferecer mais. Não leu muito, certamente. Mas escutou os versos de um poeta menor, quando outros maiores poderiam ter servido de provocação. Sérgio Godinho certamente que prefereria não ter sido requisitado à força toda para este frete populista. Contudo, é essa a matriz cultural de onde provém Costa. Não é capaz de pensar Portugal para além do seu quintal de amizades. A neuro-política - disciplina instável que acabo de cunhar-, serviria para investigar as propriedades dualistas que Descartes "angariou", e para determinar os obstáculos cognitivos que o primeiro-ministro enfrenta na leitura da relação entre o corpo (país) e a mente (governo). Infelizmente, os atributos que assistem o seu conceito de desenvolvimento, assentam em elementos operativos pueris. Da história não rezam os orçamentos. 

publicado às 17:55

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Não existe tal coisa. Não existe ano novo e outro velho. Existe um continuum. E pelos vistos a estrada também é a mesma. O flagelo da sinistralidade nas vias rodoviárias é um inferno, uma patologia que parece não ter cura. Mas o que se passa nessa dimensão da deslocação sobre rodas não é diferente do que se passa com a governação em Portugal - as derrapagens e os embates não são a excepção, são a regra. Os fundos atirados às campanhas de prevenção rodoviária provam que existe gestão danosa. Os resultados positivos simplesmente não aparecem. E os cidadãos-condutores são os principais arguidos desta modalidade de criminalidade colectiva. Repetem o comportamento que realça o desprezo pela própria vida e a dos seus compatriotas. Os números que a Brigada de Trânsito apresenta respeitantes a feridos graves e mortos, são equivalentes às quantias da falência do Banif. Ou seja, vão servir para justificar ainda mais despesa, para passar um atestado de desresponsabilização aos governos (o anterior, o presente, assim como aquele que estará para breve). Ainda assim, a lenga-lenga mais usada pelos condutores é aquela "da curva mal concebida, da falta de sinalização", quando sabemos que é tudo menos isso. Enfim, um conjunto de artefactos para sacudir a água do capote. Lidamos, lamentavelmente, com a expressão de uma mentalidade colectiva que tarda em agarrar o  destino com as próprias mãos. O governo, fruto dessa congregação hiper-democrática da maioria de razão de Esquerda, tem a obrigação moral de agarrar o bicho nacional pelos cornos. O bicho que anda nas estradas, assim como o monstro da realidade nacional de orçamentos correctivos e sevícias fiscais. Não existe um tempo passado. Existe um agora irreverente, encerrado na justificação plausível de um sentido ético. A patente do "tempo novo", registada pelos novos lideres nacionais, deve corresponder ao assumir da responsabilidade pelos actos e as decisões tomadas. A fragmentação da coligação PSD-CDS deve ser vista como coisa boa, mas não pelas razões invocadas pela Esquerda redutora dos factos. Esses partidos sabem que existe um momento para pensar a solo e outro para encarnar premissas doutrinárias que possam ser partilhadas. No fundo, Portugal encontra-se na intersecção de estradas, no cruzamento repartido por vias de acesso independente, mas comprometidas. Ninguém está com alguém. Alguém já esteve algures. Mas todos se encontram nenhures. O PS, o PCP, o BE, o PSD e o CDS são condutores avulso, preparados para alvitrar a ideia de autoestrada, de desígnio trans-ideológico. É assim que eu vejo Portugal. Muitos condutores dispostos a cometer a fracção da sua parte, desalinhados quanto baste para transformar autoestradas em caminhos de cabras. Peço perdão pela franqueza, mas é o que eu sinto. E ontem à noite nem por sombras pegaria numa viatura. Mas vi o triste espectáculo.

publicado às 19:14

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