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A saída federal

por Samuel de Paiva Pires, em 15.05.12

(James Madison, imagem daqui)

 

Uma oportuna reflexão de Paulo Marcelo, sobre uma possível saída para a crise do euro e a União Europeia:

 

«Hollande prometeu um novo "quadro político europeu", mas o que quer isso dizer? Estou convencido que só saímos disto com uma profunda reforma institucional. Confirma-se que a esta união monetária (incompleta) não subsiste sem uma união fiscal e orçamental, legitimada por uma união política. Só isso convencerá os mercados e porá fim à turbulência que alastra da periferia para o centro. A união está coxa e só pode ser salva com um orçamento comum, aprovado por representantes eleitos, o que implica uma profunda reforma constitucional, ao estilo da Convenção de Filadélfia (1787), na origem do federalismo americano.»

 

Porém, dada a forte tendência racionalista construtivista da filosofia política continental, tenho sérias dúvidas que o federalismo europeu seja semelhante ao americano, isto é, que tenha no seu cerne uma concepção antropologicamente pessimista e metodológica e politicamente individualista da natureza humana e do exercício do poder, procurando fragmentá-lo e difundi-lo para evitar a perigosidade para o cidadão que resulta da sua centralização. É preciso não esquecer que através do método comunitário a União Europeia tem vindo a arrogar-se cada vez mais competências em cada vez mais domínios da vida pública e privada, ao passo que as principais prerrogativas do Estado Federal americano são nas áreas da moeda, política externa e defesa. Dificilmente Bruxelas abrirá mão do poder que tem. E há ainda dois obstáculos por ultrapassar: um, salientado recentemente por Robert J. Barro, é o custo potencialmente proibitivo e em grande parte desconhecido de juntar populações heterogéneas com diferentes culturas, línguas e histórias sob a égide de um só estado - daí ser necessário que a maior parte das competências na administração directa dos diversos países seja retida pelos estados federados; o outro, e que salta à vista de todos, é que não temos líderes com um mínimo de preparação para uma empreitada destas. Não digo que não possam aparecer, especialmente se for adoptado o estilo da Convenção de Filadélfia, em que não sejam os actuais governos automaticamente mandatados (por eles próprios, claro) para representar os estados, mas tenham lugar eleições para os delegados. Mas mesmo assim, será difícil que apareça alguém da craveira de Madison, Hamilton, Jefferson, Franklin ou Washington.

publicado às 13:00


14 comentários

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De Nuno Castelo-Branco a 15.05.2012 às 13:28

Decorridos mais de 200 anos desde a independência americana, o figurino não parece ser uma grande coisa. Para mais, não se encontram 50 milhões de francófonos num Estado, 90 milhões de alemães noutro, 10 milhões de portugueses ou gregos noutro. É um rotundo disparate. Nada de federalismos, nada de mais burocracia. Reconheçam que o delírio acabou e habituem-se à ideia da Europa das nações. 
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De Samuel de Paiva Pires a 15.05.2012 às 13:56

Estão bem melhor que a Europa...
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De Nuno Castelo-Branco a 15.05.2012 às 14:18

Há certos sectores onde estão muitíssimo pior. Tenta ser atropelado sem possuíres um seguro de saúde. Ao fim de minutos perceberás o que te estou a dizer.
Sou do contra. Nem sequer sou europeu e a "Europa" é coisa que não me interessa para nada. 
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De Samuel de Paiva Pires a 15.05.2012 às 14:37

Certo, mas nada é perfeito e essa situação tem muito a ver com a história e a perspectiva radicalmente individualista dos EUA, e acabará por vir a ser resolvida, de uma forma ou doutra. 200 anos depois, os EUA têm um regime estável, enquanto a Europa se arrisca cada vez mais a fragmentar-se novamente.
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De Nuno Castelo-Branco a 15.05.2012 às 17:01

Fragmentar-se a Europa? Há 1600 anos que assim está. Quanto aos EUA, sabes perfeitamente como foi possível fazer essa dita Federação. No final de contas, talvez a "perspectiva" de Hitler acabe por colher algumas consciências, até porque esse tipo de união teve como base a invasão e o desapossar de terra alheia, o extermínio extensivo dos indígenas e logo, a total submissão dos Estados a Washington. Um programa que o III Reich procurou implementar na época industrial e com os resultados que se conhecem, mas no fundo, o princípio de padronização teria um resultado não muito diverso sob o ponto de vista de criação de um bloco continental. É uma enormidade? Talvez, mas as pessoas estão dispostas a aceitá-las desde que bem vendidas pela propaganda, coisa na qual os americanos são exímios. De facto, a autonomia dos Estados é bastante relativa e há perto de 140 anos quando foi posta à prova, viu-se como a Confederação foi eliminada. Claro que não estamos agora a discutir o móbil central da Guerra da Secessão - central ou simples pretexto, diga-se -, mas essa federação, a chamada União, nasceu e medrou num contexto completamente diferente. Hoje em dia, como reagiria Washington à rotineiramente ameaça de secessão da Califórnia, por exemplo?


Não sou simpatizante da causa americana e a simples visão do miserável e odioso trapo - na expressão feliz de um comandante da Royal Navy, a piece of pajama cloth - que lhe serve de bandeira dá-me náuseas. Compreendes bem, sou  um ultramarino e não lhes perdoo nem esqueço todas as traições e enormidades que contra nós cometeram, enquanto usavam e abusavam das facilidades que lhes concedíamos no Atlântico. Mesmo o balofo Kissinger - gostem eles ou não gostem, o tipo é completamente deutsch, pronuncia-se "Quissinga" -, estava pronto a sacrificar-nos aos bandidos do sr. Cunhal, como "exemplo" a  dar a essa mesma Europa. Nem sequer seria uma novidade, até porque durante a I Guerra Mundial subsidiaram e luxuosamente refastelaram outro crápula genocida, o Sr. Trotsky, atraiçoando o seu aliado de S. Petersburgo, o Czar, interessados como estavam numa Rússia fraca por mais umas tantas décadas. Viu-se no que deu.
 Por outro lado, também entendo a política da grande potência norte-americana que antes de tudo zela pelos seus interesses ou de certos amigos demasiadamente exclusivos, como aqueles que tem num certo país do Médio Oriente. Vai semeando focos infecciosos mundo fora, despejando as bombas onde bem lhe apetece, destruindo economias e moedas, fabricando dólares para obter quase de graça tudo o que quer e alegremente consumindo de uma forma que o planeta não pode permitir, a menos que os demais totalmente se rendam ao double standard ou acabemos por aceitar a inevitabilidade de uma guerra total.
Em suma, detestei a política deles durante os anos trinta, quarenta, cinquenta, sessenta, setenta e por aí fora. Isto, no que que se refere a Portugal. Quanto aos outros, cada um deverá ter as suas próprias contas. Casos como a felonia de Goa - Nehru foi acicatado à invasão -, Timor - Suharto idem, por G. Ford/Kissinger -, a pouca vergonha do financiamento dos turras na Guiné, Angola e Moçambique, etc, deixa-me completamente saciado quanto a yankismo. Contudo, sou totalmente favorável á manutenção da Aliança com essa gente, infelizmente a época dos couraçados da Royal Navy há muito terminou e não temos outro remédio. Os casamentos políticos não passam disso mesmo, de gestão de oportunidades e de interesses. Assim, tranquilamente continuarei a apostar nesta aliança. 


Bem, não sendo propriamente um fulano "de esquerda", imagina então o que os tais terão a dizer dos EUA. Não estou a referir-me aos gauche-caviar que fazem o seu shopping em NYC, mas aos outros que têm na Bola o farol do mundo.
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De monge silésio a 15.05.2012 às 15:16

Samuel,

Pode-se chamar o que quiser, mas...só o protecionismo nos salvará...ou investimento na Força Militar Europeia.
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De Samuel de Paiva Pires a 15.05.2012 às 15:18

Discordo totalmente, de um e de outro, meu caro. O primeiro tem efeitos nefastos a nível económico e social, e quanto ao segundo, já existe a NATO e não vale a pena duplicar esforços (políticos, económicos e humanos).
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De monge silésio a 15.05.2012 às 15:50

Certo. Então ...então baixar rapidamente o esforço estatal na saúde, na educação e extinguir as prestações sociais...e aumentar o investimento na policia (acho que ainda há contribuintes para a pagar...)
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De Samuel de Paiva Pires a 15.05.2012 às 15:55

Estado Social não é sinónimo de estado socialista e socializante. Antes de chegar à saúde e às prestações sociais, há muito por onde cortar (14 mil organismos que recebem verbas do OGE, parece-me um manifesto exagero dada a dimensão do país e da economia). Mas para isso era preciso que se fizesse um trabalho prévio de reflexão sobre o que se pretende que o estado seja. Logo por aí também se poderia começar por baixar os custos na educação, nomeadamente descentralizando a pesada burocracia do ME e dando mais espaço aos privados - que em termos de resultados são, regra geral, consistentemente melhores.
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De Nuno Castelo-Branco a 15.05.2012 às 17:07

O que também me parece indecoroso é no sistema americano certos tipos de doentes terem de se submeter à charity - entendida esta na Europa como solidariedade, claro pois nenhum "seguro de saúde" - uma vergonhosa roubalheira que enche contas a empresas de extorsão - lhes cobre o custo dos tratamentos. Podíamos continuar por aí fora, desde as dezenas de km de cidades de roulottes - vivi 1 ano com a minha família dentro de uma coisa destas e não gostei nem quero repetir - onde às portas de LA vivem exércitos de pessoas, até ao completo despojar de propriedade pelo exercício de poder de entidades financeiras. Ora, Samuel, já estou a ficar velhote e não tolero aquilo que por lá vi. Em 1995, detestei. 
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De monge silésio a 15.05.2012 às 16:15

Samuel,

Descentralizar, desconcentrar, adaptar são coisas de um Estado que ainda pensa que tem contribuintes para o suportar.

Eu vou-lhe dar um exemplo: a carta de condução e o sistema rodoviário. Há o IMTT e a ANSR. Centenas de pessoas trabalham nisto. Bastaria 25, com o circuito informático existente, reduzido a um programa informático.
São dezenas de pessoas que vão para a rua...
Outro exemplo: a segurança social. Sabe quantas doninhas ali trabalham? Bastaria acabar com a maioria de prestações e a burocracia envolvente: cerca de um milhar viriam para a rua.

Cortar o que diz, não é descentralizar, pois isso é manter sob outros titulos, é retirar, extinguir postos de trabalho.

É gente a mais para os contribuintes que temos...
*
*
Num outro plano:
 ...diria que o Estado rouba a acção caritativa, rouba-lhe o meio e o fim: o alcance do Reino dos Ceus. E rouba a quantidade de gente que podiua realizar os seus talentos...chama-se secularização.

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De Nuno Castelo-Branco a 15.05.2012 às 17:09

Pois, quantos funcionários públicos existiam em 1974, quando Portugal geria um império que ia dos Açores a Macau e Timor? 140.000. O que se passou então? Perguntem aos srs do PC, a Soares, Cavaco e outros mais ou menos douradamente exilados ailleurs.
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De Anónimo a 17.05.2012 às 20:55

Boa Nuno! É exactíssimamente como diz. Primeiro pôr os pontos nos ii. Depois mostrar por A+B a total  degradação económica, social e moral para a qual um bando miserável de traidores auto-proclamados 'democratas', perfeitamente conscientes dos seus actos criminosos, arrastou Portugal do Minho a Timor. Trata-se de um dever patriótico, tão imperioso quão obrigatório, que lhes deve ser lançado à cara por todos nós portugueses de bem com tanta mais assiduidade quanto aquela de que formos capazes e até à última gota de força anímica que nos restar.
Maria 

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