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Uma Verdade Demasiadamente Humana

por o corcunda, em 05.06.12

"Um grão de filosofia dispõe ao ateísmo; muita filosofia reconduz à religião."

 – Platão

 

O Samuel, que há tempos se afirmou agnóstico, tem escrito e citado muitas máximas curiosas e complexas sobre a crença e Deus. Infelizmente não tenho tempo para escrever com detalhe sobre estas, mas tento aqui escrever qualquer coisa sobre a relação entre filosofia e religião.

Há um erro que é evidente no agnóstico. E dois no filósofo que se diz agnóstico.

 

O agnosticismo, por se fundar numa concepção deformada do conhecimento, acredita que Deus (transcendente) não pode ser conhecido como as coisas do nosso mundo. Esquece que nos apoiamos na fé para conhecer tudo o que nos rodeia. Física, química, biologia, apoiam-se em crenças sobre elementos invisíveis e sobre um conhecimento que é indubitavelmente duvidoso. A física newtoniana, o modelo de Bohr, a fábula mecanicista de Darwin, eram infalíveis porque intramundanos, porque baseados no conhecimento experiencial e testado de elementos materiais. Todos já estão no cemitério das ideias, ou servem como meras bases rudimentares das teorias contemporâneas. O agnosticismo colapsa para o niilismo se se levar demasiado a sério. Geralmente não leva e é apenas uma fuga rápida para uma discussão que alcança profundidades inaceitáveis. 

 

Mas um pensador ou filósofo agnóstico ainda encontra um problema acrescido. Quando pensa, não pode duvidar do carácter da Verdade? Como pode acreditar chegar à verdade se não pode estar certo de que a mesma existe? É importante perceber como pode alguém dizer que o conhecimento humano é incapaz de vislumbrar a Transcendência e, no entanto, aceitar a Verdade, um subproduto do Divino, como algo inquestionável. Esta concepção, tão frequente no agnosticismo contemporâneo, é um reflexo da estranha inversão moderna, em que o conceito de Verdade é transformado numa mera percepção humana.

 

Sem a certeza de um ponto exterior , sem a presunção de uma ordem exterior de referência (e a verdade não é mais que o confronto do ser racional com um Ser que não é o seu), toda a discussão é meramente contingente, impossibilitando qualquer discussão sobre princípios, valores ou fundamentos. Toda a discussão e fundamento político passa a mero jogo de Poder.

 

A verdade regressa ao ponto de Trasímaco, a opinião do mais forte.

publicado às 22:54


4 comentários

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De Anónimo a 05.06.2012 às 23:21

Que perda de tempo passarem as vossas vidas a discutirem algo que NÃO existe.
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De Anónimo a 05.06.2012 às 23:27

Perda de tempo é viver como se não existisse
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De tomas a 06.06.2012 às 17:10

"Física, química, biologia, apoiam-se em crenças sobre elementos invisíveis e sobre um conhecimento que é indubitavelmente duvidoso."

Isto é a concepção popular da ciência, com a qual se pretende que ela substitua a religião, mas que é incompatível com o método do qual a ciência deriva.

A "crença em elementos invisíveis" em ciência não é crença nenhuma, os elementos invisíveis estão lá simplesmente como construções abstractas baseadas em objectos quotidianos (bolas em que podemos tocar, mas pequeninas e invisíveis) de modo a facilitar a memorização. É um processo utilitário - se o nome que damos às coisas é arbitrário, mais vale escolher o nome que melhor evoca as ideias que associamos a essa "coisa" : o elemento que encerra a electricidade chamamos electrão, o elemento que encerra a luminosidade chamamos fotão.

Existe uma noção popular de que a ciência "acredita" que existem entidades minúsculas chamadas partículas elementares e que um electrão é como um berlinde minúsculo com determinadas propriedades bem definidas, mas a verdade é que começando pela mecânica quântica no início do séc XX e cada vez mais desde então se tem tido cada vez mais dificuldade em descrever o que é que se sabe acerca do mundo físico em função do que se está habituado a tocar todos os dias.

Muitas partículas elementares a que hoje se convenciona chamar de "partículas" foram em tempos chamadas "ressonâncias", e passaram de uma para a outra com a mesma arbitrariedade com que plutão deixou de ser um planeta - foi uma questão de gestão de arquivos, não propriamente de alteração de paradigmas.

O facto de que a matéria exibe comportamentos a determinadas escalas que são incompatíveis com aquilo que nos é familiar elimina qualquer dúvida acerca da independência da ciência das tais crenças a que alude. Não só a ciência não precisa realmente delas, como a ciência no estado em que se encontra hoje já nem é capaz de fazer uso delas ainda que quisesse.

A ciência que resulta do método científico não produz certezas, porque não está ao seu alcance produzi-las, mas quando se fala socialmente, e se discute a "importância da ciência" às pessoas que votam ou que tomam decisões, é extremamente difícil fazê-las compreender como é que uma coisa que não produz certezas como a ciência pode "servir" para alguma coisa mais do que por exemplo o conjunto de certezas de pedra e cal que é uma religião, ou toda a mitologia New Age cheia de Grandes Verdades Espirituais. Por isso diz-se que se tem a certeza quando na verdade não se tem, e fala-se das partículas elementares como se fossem berlindes. É tudo no interesse da divulgação, e tem o mesmo valor que qualquer peça de propaganda tem.
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De JS a 10.06.2012 às 22:41

Ler "Da natureza dos deuses"
Marco Túlio Cícero

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