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Por estes dias, falham alguns em entender o mito que é a pátria enquanto, nas palavras de Karl Deutsch glosado por José Adelino Maltez, "uma comunidade de significações partilhadas" e, nestes tempos de paz na Europa, como esta se reflecte numa ligação emocional entre um povo e os seus representantes em actividades onde exista representação nacional, como o caso do desporto - em concreto, nestas últimas semanas, o futebol. Lembrando que a pátria é, como escreveu Miguel Torga, "o espaço telúrico e moral, cultural e afectivo, onde cada natural se cumpre humana e civicamente. Só nele a sua respiração é plena, o seu instinto sossega, a sua inteligência fulgura, o seu passado tem sentido e o seu presente tem futuro", vale bem a pena ler o Filipe Nunes Vicente e o Carlos Guimarães Pinto:
Filipe Nunes Vicente, O futebol e os intelectuais:
«As vitórias da selecção nacional suscitam orgulho aos portugueses porque o EURO 2012 é um parque de diversões para os símbolos nacionais. Nenhum problema nisto. Nas guerras, as acções dos soldados, dos generais e dos políticos suscitam o mesmo espírito e ninguém pensa que essa inflamação patriótica oculta atraso económico, maus hospitais ou insucesso escolar.
A ligação de um povo com a sua selecção não passa pela leitura de Píndaro ou pela exegese de Heidegger: é simples, directa e dura pouco. Como o sexo.
Os que contam bandeirinhas, se incomodam com a cruz ou anotam os minutos imbecis dos directos, racionalizam o que não é racionalizável. Nunca tiveram um ataque de pânico ou uma obsessão?»
Carlos Guimarães Pinto, Os ateus do Futebol:
«Os ateus do futebol já fazem parte do folclore das competições internacionais de futebol em que Portugal participa. Para quem não sabe o ateísmo futeboleiro foi inaugurado por Pacheco Pereira e, entre coisas, consiste em passar todo o período das competições de futebol a falar sobre o quão irrelevantes elas são, da irracionalidade do gosto pelo futebol e sobre a forma como estes eventos distraem as pessoas dos assuntos importantes (por assuntos importantes, entenda-se, a política, a troika, o défice, o sacana do Sócrates e o demagogo do Louçã).
Tenho que concordar com eles: a devoção irracional pelo futebol contribui de facto para que muitas pessoas se esqueçam por um período de tempo destes assuntos. Mas não é só o futebol: um bom livro, as séries de televisão americanas, as quecas, os bikinis, os jantares de amigos, um bom cabrito, o sorriso dos filhos são tudo aspectos da vida que, sem motivo racional, nos fazem esquecer desses assuntos “importantes”. Os ateus do futebol estão certos relativamente à relação causal, têm é as prioridades de vida trocadas.»