" Todos os poetas cantam a primavera como o renascimento da natureza. Nessa risonha passagem da morte para a vida, nessa metamorfose vegetal, encontam eles uma mina inesgotável de inspirações. A sua voz, como a dos pássaros, reanima-se com a folhagem, e readquire o seu brilhantismo com as flores. Eu, porém, que desde a aurora dos meus dias tenho sentido na minha alma não sei que vago desejo... em todo o meu ser um insuportável mal estar...eu, semelhante à flor que, ferida pela tempestade, curva a sua fronte pálida, só me deleito com o luto e a tristeza! Longe...longe dos meus olhos esse sol de Maio, cujos raios vivificam a alegria do mundo, seu insaciiável folguedo, suas festas ruidosas "
Estava-se em 1853, e uma jovem mulher de 25 anos havia enviado o texto de onde foi retirado este excerto a Camilo Castelo Branco, para publicação no periódico que então dirigia, « O Portuense »; para tal tivera de recorrer ao anonimato: compreende-se, pois que a sociedade de então dificilmente admitia mulheres leitoras, quanto mais escritoras...
Inicia-se aí uma correspondência profícua, que iria inspirar um dos cativantes romances camilianos, « Memórias de Guilherme Amaral », e na qual o romancista reconhece um talento firme e original.
Chegámos ao princìpio do século XXI, sem saber o nome da dama portuense, não tendo sido poucas as suspeitas de tratar-se da futura esposa de Camilo, Ana Plácido, até que, e após aturada investigação, um camilianista, de nome Manuel Tavares Teles, vem a descobrir a sua identidade: chama-se Gertrudes da Costa Lobo, e das suas averiguações, e escritos da até então desconhecida, nos dá conta n« Os Manuscritos Gertrudes ».