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Penso sinceramente que uma grande oportunidade está a ser esbanjada. Mas antes de ir direito ao assunto, deixem-me afirmar o seguinte em relação aos princípios que determinam a minha postura política. Em primeiro lugar, a liberdade de expressão é um dos bastiões da Democracia que não pode ser posta em causa, e cantar ao vivo, com ou sem banda de suporte, tem de ser considerada uma forma de comunicação inalienável. Não há nada de errado na canção de intervenção Grândola Vila Morena da autoria de Zeca Afonso. A melodia e as palavras que se inscrevem na pauta, têm uma residência importante na história política e social de Portugal. Contudo, lamento que no momento actual, e no contexto específico que vivemos, nenhuma canção original tenha brotado de uma fornada de valentes músicos movida por causas maiores. E isso confirma alguns pressupostos endémicos. A incapacidade de Portugal para se reinventar e estabelecer um código de ruptura. Ao riscarem vezes sem conta o disco de Grândola, este perde a sua força anímica. Passa a ser um dois em um. Um head and shoulders do protesto, algo emprestado, à falta de melhor termo, de um vizinho simpático. Preferia que houvesse um concurso de televisão para eleger a melhor canção de intervenção. Eu sei que é uma contradição. Não existe tal coisa - a melhor canção de intervenção. Mas também não gosto da expressão, quem não tem cão caça com gato. A grande maioria daqueles que entoam a Vila Morena, e de quem se espera a verdadeira mudança, nem sequer viveram sob a alçada da restrição dos direitos e garantias. Não carregarem a intensa simbologia dessa luta. Vivem outra forma de castração, e a repressão que hoje sentimos deveria evocar um outro arranjo musical, uma outra lírica contestatária. Esta consanguinidade de recursos acaba por demonstrar que Portugal procura soluções diversas fazendo uso das mesmas ferramentas. Onde está a Mariza? Onde estão os Xutos e Pontapés? Onde estão eles? Sera que estão tão bem instalados que nem sequer lhes passa pela cabeça uma composição de resistência? Há ainda uma outra dimensão que se relaciona com esta canção. Ela circunscreve-se à cultura local. A luta e a contestação que une os irmãos Europeus, deveria dar azo a uma canção mais universal. Uma app para andróides e humanóides onde quer que estejam a agonizar.