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O Conservador é um ser curioso. Ele olha para os homens de hoje como seres ingénuos, não sem alguma condescendência, e acredita essencialmente poder aplicar com sucesso velhas soluções para problemas novos. É desta forma que o Conservador procura que dos elementos da sociedade, da política, da religião, se conserve sempre tanto quanto se possa conservar, mantendo assim os hábitos e os costumes à sua volta com o mínimo de alterações possíveis.
Não menos curioso é o Progressista. Este olha para os homens de ontem, não sem alguma arrogância, como incapazes de compreender os problemas de hoje, e sente por isso a necessidade constante de inventar novas soluções e reinventar a sociedade em fantásticas utopias, frequentemente distópicas, como forma de lidar com os desafios com que se depara.
O Progressista tem “sede de inovações”; são os “espíritos apreensivos e numa ansiedade expectante” a que se referia o Papa Leão XIII [1], e de onde resulta a tendência de sobre-dimensionar os pequenos acidentes da espuma dos dias, dramatizando realidades que mais não são do que amálgamas de repetições dos acidentes de outros tempos que, já consumados na sua essência, podem sofrer maiores ou menores mutações, também elas acidentais.
Estas duas forças disputam entre si o domínio do espaço das várias esferas em que nos movemos em sociedade e, por uma questão de lógica, será o Progressista quem inevitavelmente levará a vantagem nessa disputa, desde que perspectivando um espaço de tempo suficientemente amplo. Assim é pela simples razão de que, enquanto que cada vitória do Progressista constitui uma derrota para o Conservador, todas as mudanças conquistadas pelos primeiros, partindo do princípio que constituem alterações a ser assimiladas pelos segundos, serão eventualmente defendidas por estes em disputas futuras pela conservação do novo status quo.
É neste contexto que surge a única alternativa real a estas duas forças: o Tradicionalista. O Tradicionalista não receia a mudança pois compreende a importância de rejeitar a conservação daquilo que lhe não convém. Por outro lado, ele deposita no homem de hoje uma fé total, recusando encarcerar-se na ilusão de um tempo que não é o seu. Ele compreende e aceita não só a dimensão espiritual do mundo, mas também a sua dimensão temporal, e é sob a luz destas duas dimensões que ele actua.
Dom Bertrand de Orleans e Bragança defende que “o progresso tem de ser necessariamente tradicionalista” [2]. O Tradicionalista recusa o saudosismo estéril e posiciona-se a uma distância suficientemente confortável do passado que lhe permita olhá-lo sem complexos. Diz Dom Bertrand que “quando se fala em tradição fala-se de aprender as lições do passado, analisar as do presente para projectar o futuro”.
Neste meu regresso ao Estado Sentido, procurarei submeter as minhas intervenções a este princípio de base. Será natural que algumas opiniões entrem em conflicto com a visão de vários leitores e mesmo a de alguns colegas do blog. Quando assim for, espero que possamos manter uma discussão cordial mas interessante, mas estou disposto a sacrificar a cordialidade se o interesse assim o justificar. E espero, acima de tudo, que encontrem algum interesse naquilo que eu tiver para dizer.
Agradeço o convite, mais uma vez, ao Samuel, e aos demais a simpática recepção.
[1] Carta Encíclica Rerum Novarum, 1891, sobre A Condição dos Operários
[2] A Revista de Portugal, nº11, Ano 1, Dezembro 1998