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Ainda não consegui perceber todos os contornos do fecho da televisão estatal Grega, mas podemos começar a gizar implicações de tal medida decorrente das condições impostas pela Troika. Os meios de comunicação social, de um modo geral, e sem excluir os de origem nacional, exprimem o drama que representa o despedimento de mais de 2500 trabalhadores da empresa pública Grega. E ficam por aí. Nada mais acrescentam à cessação de um dos sectores com maior sensibilidade política. Sem dúvida que o despedimento em massa é uma tragédia para somar a tantas outras, mas o relato não pode ficar por aqui. Somos obrigados a analisar as implicações políticas que resultam do corte dos canais de comunicação. O assalto à tomada que faz desvanecer as imagens dos ecrans e que leva também as vozes de protesto, é um assunto de extrema gravidade. Por um lado, e de um modo genérico, os regimes totalitários caminham de mãos dadas como os media. As televisões e as rádios estatais sempre foram megafones de notícias oficiais, mensagens tratadas em sede de favorecimento político, por forma a que os governos possam manter a população açaimada, à trela curta de informação. Sabemos todos que a Grécia (ainda) configura uma democracia e que esta decisão não foi tomada sem razão aparente, sem terem pensado nas implicações. O governo Grego, muito provavelmente, quis antecipar a revolta interna da estação de televisão; a implosão operada por dissidentes, opositores ao regime da Troika. Deste modo, antes que houvesse um caos desordenado, o governo Grego terá avançado para a perda definitiva de sinal, invocando razões de natureza orçamental. E esta decisão foi tomada porque o governo Grego terá assegurado a sua capacidade de comunicar por outra via. Através de uma plataforma mais vantajosa disponível no sector privado. Não é possível governar, mesmo que negativamente, estando totalmente às escuras. Em relação a isso não tenhamos dúvidas. Houve aqui, sem especularmos muito, jogadas de bastidores que garantem a vantagem dos poderes instalados. Imaginem que por motivos análogos, Portugal faz o mesmo; coloca a mira técnica da RTP no ar? Fecha a cadeado o portão dos estúdios de televisão e rádio. Manda calar a Fátima Campos Ferreira e selecciona uma estação de televisão do sector privado. Contrata os serviços de uma SIC ou de uma TVI. Estão a ver o filme? Estão a perceber o que está em causa? Se extrapolarmos o suficiente e os deixarmos, em breve lançarão um concurso público por forma a seleccionar o agente privado que melhor sirva os interesses do governo. Acontece que, no contexto actual de descalabro e descrédito, de crise política e de confiança, os interesses do governo são os falsos gémeos do bem-estar dos cidadãos. Se os governos fogem ao escrutínio da Res Publica e se escondem por detrás de uma cortina de silêncio, o resultado será ainda mais avassalador. Todos sabemos que é ofensivo desprezar os interlocutores. Ignorar a importância do diálogo é algo que viola a ética do progresso e é profundamente imoral. O que estamos a testemunhar colide com a Agora, os Sofistas e a invenção da retórica e da argumentação, nesse berço civilizacional, cada vez menos berço e que vai pelo nome de Grécia. Esta questão dramática não pode ser resolvida num programa de prós e contras, mas em defesa de direitos de expressão adquiridos com sangue, suor e lágrimas, não devemos assumir uma postura conformista. Pela primeira vez na vida peço para que não desliguem a televisão. Não estamos a assistir a ficção. Mas também não é um reality show.