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Não existe tal coisa como a mudança que acontece com a passagem de ano. Não existe o virar de página para um mundo eminentemente novo. Não existe o balanço de algo que finda para relançar à virgindade. Não existe a tábua rasa. Vivemos aquém e além dos nossos desígnios. E nesta antecâmara onde refrigeramos o espumante da celebração, damos conta da continuidade. Não saímos dos nossos corpos, mas abandonamos uma parte das nossas convicções. Deslocamo-nos sem sair do mesmo cruzamento, onde habita um semáforo caprichoso, aberto e cerrado no mesmo instante, no embate coincidente. Em política sabemos de antemão que foram, e serão todos, vitoriosos. Que não admitem a derrota num concurso de penhoras, de expectativas e engodos, de talismãs e regressos triunfais. Em epígrafe, na margem rasurada da grande história, as assinaturas serão manchas menores, meras rubricas de um testemunho que passa pelas mãos de estafetas cansados. Os homens, os grandes, os pequenos, e aqueles que se arrastam como invertebrados, aprendem de um modo doloroso - a lição da inconveniência de um tempo prolongado, retardado, atrasado pelo destino que nunca o será. Um predestino que foi vilipendiado, assaltado por saldos de ocasião, palavras coniventes e verdades preteridas. Faça-se a lista do deve e haver, inscrevam-se nas colunas a soma e a distracção que a acompanha, e verão que a conta não passará na auditoria da consciência colectiva. Os contribuintes foram liquidados pelo depósito na falsa guarida, pela glória de um campeão que se anuncia redentor, na receita que morde a cauda do seu falso esplendor. As palavras, estas, aquelas e as demais, são um perfeito embuste que não nos servem, que não me servem. Existem como espuma bárbara de um delírio cronológico, das badaladas que ainda faltam, que servem para lançar figurantes em falsas estreias, repetidas à exaustão. Se há algo que aprendemos nestes anos que já são alguns, que já estão algures - é que os mesmos já não servem para contar. Façamos uso dessa sabedoria parcimoniosa para aceitar que nos encontramos no emaranhado de temporais. 2013 estará em 2014, e todos os anos que os antecedem e que se seguem estarão nessa volúpia que queremos amestrar para memória futura. Porque as recordações do passado não cabem na geometria de um relógio estilhaçado. Não percamos mais energia com ninharias, porque nada disto tem cabimento na simples batida de um pulso, no peito aberto vergastado pelos ventos que sopram.