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Geórgia (7) - George W. Bush

por Samuel de Paiva Pires, em 15.08.08

 

Tomemos em consideração as mais recentes afirmações do cowboy texano, especialmente esta pérola:

 

Mr Bush demanded that Moscow respect Georgia's territorial integrity and withdraw the troops it sent in a week ago - or risk international isolation.

 

Para além de me parecer que Putin e Medvedev devem andar por ora a brindar com champanhe enquanto vão colocando a sua brilhante estratégia em prática, que de espontâneo parece ter muito pouco, até porque o frio daqueles lados não permite rasgados laivos de espontaneidade, faço apenas uma analogia ao chamado fast track ou mandato negociador, mecanismo do Congresso norte-americano que permite ao Presidente e à Administração negociar em determinadas matérias sem que seja necessário o Congresso aprovar o resultado final, desde que caiba dentro dos parâmetros definidos no mandato antes sequer das negociações. Foi o mecanismo utilizado para granjear maior legitimidade a Bush e garantir a coincidência entre discurso e acção no que respeita às negociações da Ronda de Doha. Quando a validade desse mandato se esgotou, com reflexos evidentes na legitimidade de Bush, por mais que esse prometesse mundos e fundos aos seus parceiros internacionais não tinha qualquer garantia de que conseguiria implementar as medidas negociadas. É mais ou menos o que acontece agora, em contagem decrescente para o fim do seu mandato e tendo em apreço as confusões que gerou em todo o mundo, já ninguém se importa muito com o que diz, é um menino rabugento completamente desorientado porque desta feita sabe que não pode resolver a situação através do seu instrumento preferido, ou seja, o mecanismo militar, uma das suas poucas prerrogativas exclusivas.

 

Além do mais se há alguém que pode eventualmente agir no sentido de um isolamento internacional da Rússia é a União Europeia, pela proximidade geográfica e pela inevitável interdependência entre os dois actores. Mas essa mesma interdependência é a que os europeus sabem que teria custos muito superiores se incorresse em relações conflituais em determinados campos ou sectores de cooperação,como os sugeridos neste artigo da The Economist (via O Insurgente):

 

The European Union, which has too often split into camps of appeasers and tough-talkers over Russia, should drop negotiations on a new partnership and co-operation agreement. Visa restrictions should be tightened, and the personal finances abroad of top Russian officials probed more carefully. The EU should work harder at reducing its dependence on Russian energy imports and improving internal energy connections—and EU countries should stop striking bilateral deals with Russia.

 

Só que a Rússia está a fazer com que os europeus reaprendam a equacionar mais estrategicamente e menos moralmente a sua política externa. Não me parece sequer viável entrar em conflito com a Rússia seja em que campo for (vistos, acordo de cooperação, vias diplomáticas etc.), principalmente devido à questão da dependência energética. E por mais que se clame pela diversificação de fontes e de tipos de energia, no curto e médio prazo isso não vai acontecer pelo que teremos de saber enfrentar e jogar com essa dependência dentro do quadro da interdependência.

 

Já agora, só para finalizar quanto a Bush, mais uma vez recorro a um artigo indicado pelo Henrique Raposo:

 

At the Beijing stadium this week, George Bush came off as the most wretched American president in history. A president who needlessly provoked the Russians, but ultimately did not withstand them. A president who brandished the flag of human rights and democracy, but ultimately kowtowed to a world power that tramples human rights - China - and abandoned the brave little democracy of Georgia.

The Bush era came to an end this week, but with it ended two decades of America being the sole superpower. The Pax Americana that maintained global stability for a generation has run its course.

 

O mesmo artigo termina da seguinte forma bem esclarecedora quanto ao impacto daquilo a que estamos a assistir:

 

August 8, the day the Olympics began and the fighting in Georgia erupted, will be remembered no less than 9/11. When the history of the 21st century is written, it will view this past week as the week that symbolizes the rise of two new world powers: China and Russia. It will be decades before China surpasses the United States economically. It will be years before Russia goes back to being a Tsarist power. But August 8 marked the way.

The question now is not what sort of world we are heading toward. The question is how fast we will get there.

publicado às 17:50


2 comentários

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De Nuno Castelo-Branco a 17.08.2008 às 00:00

Vejamos, Samuel. Não me parece muito boa ideia usar a "UE" como arma de arremesso contra a Rússia, pois o isolamento será um gravíssimo erro que decerto contentará certa gente próxima daqueles que perderam o poder político há cerca de 15-17 anos. Precisamos de uma Rússia poderosa e confiante, que não se sinta ameaçada por mais hipotéticas secessões. Os inimigos reais da Rússia são os mesmos inimigos da Europa. Não sendo possível a sua adesão à NATO - até por uma mera questão de dignidade nacional e de interesse material no que diz respeito à sua indústria de armamento -, há que cooperar. Se não for ameaçada de "balcanização" por parte de uma "Europa" hostil, não tomará medidas tendentes a um isolacionismo que infalivelmente voltará a fechar o país num totalitarismo de contornos indefiníveis.
Quanto ao sr. Bush, creio que se exagera quanto ao seu real papel, pois o que nos EUA verdadeiramente interessa, são a administração permanente e os interesses indústrias na sua multiplicidade mais lata. Bush é um peão e a conjuntura internacional - com uma China emergente e uma Rússia a sacudir de vez o comunismo - que desta vez e ao contrário da impunidade americana nos tempos dos Clinton, não ajuda em nada Washington. Há que esperar e sobretudo, não alienar uma vez mais o colosso do leste.
Apenas uma pergunta: como reagirá a administração americana se num futuro mais ou menos distante, um Estado com uma "nova maioria" étnica - hispânica, por exemplo -, formular exigências inaceitáveis para a Federação?
Basta de erros e repetir o que aconteceu em 1916-18 - quando o czar foi deixado à mercê das derrotas infligidas pelos germano-austríacos, pode desta vez ser fatal, até porque os alemães, talvez até tenham a tentação em repensar a sua missão na Europa e reiniciar a ostpolitik que lhes é tradicional. E quem lhes fará frente? A Carla Bruni ou o sr. Berlusconi?
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De Samuel de Paiva Pires a 18.08.2008 às 02:30

Concordo plenamente contigo Nuno, como de resto é habitual!Também acho que necessitamos de uma Rússia forte que coloque em prática o conceito do complexo securitário regional no seu near-abroad, principalmente naquelas republiquetas instáveis que se tornaram santuários para terroristas e actividades ilícitas. Quanto a Bush, nesta altura do campeonato já tem de facto muito pouco espaço de manobra! E por último, até que seria engraçado, do ponto de vista da análise politológica, assistir a exigências por parte de uma maioria hispânica nos Estados Unidos. Especialmente se tiverem a ver com aquele belo conceito que é a auto-determinação...era ver muito boa gente a espernear eheheh!

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