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Já suspeitávamos da amplitude, ainda que escondida de forma habilidosa, do gravíssimo problema de credibilidade em que o sistema mergulhou há apenas algumas semanas. A História portuguesa tem passado por períodos conturbados que viram ruir reputações e regimes, abrindo novos caminhos e formas de organização política, social e económica.
Em 1925, um escândalo de cariz financeiro - uma burla de proporções inéditas - que envolveu gente conhecida, responsáveis do regime de então e o Banco de Portugal, destruiu a pouca respeitabilidade que o regime da I república ainda beneficiava junto da já magra falange de apoiantes, concentrados na sua maioria, na capital do país.
Estávamos em 1925 e a imprensa servia de veículo de informação para os privilegiados alfabetizados. A rádio dava os seus primeiros passos e a televisão era um mero campo especulativo da ficção científica. Sem o recurso da informática e da informação ao minuto proporcionada pela tecnologia dos nossos dias, as notícias do Caso Alves dos Reis envolveram uma muito desacreditada classe política que tanto prometera e que conseguira apenas, pouco pão, muito sangue, opressão e um caudal de lágrimas. Portugal estava farto e ansiava por uma verdadeira regeneração que encaminhasse o país para aquele destino que uma história velha de tantos séculos, parecia garantir: o daquela grandeza que já fora nossa e que inexplicavelmente perdêramos nas vicissitudes decorrentes dos nossos erros, incúrias e sobretudo, falta de vontade. O escândalo do Banco Lisboa e Metrópole acabou com as ilusões propaladas pelas "rajadas de luz da gloriosa manhã do 5 de Outubro" e apenas um ano decorrido, o regime desaparecia ignominiosamente, sem o mínimo simulacro de defesa por parte daqueles que outrora loucamente o haviam patrocinado. Foi a fuga, uma cobarde debandada jamais vista e o alijamento de responsabilidades tornadas insuportáveis por quem tudo teve nas mãos para o férreo exercício de um poder honesto, progressivo e patriótico. A I república morreu e deixou apenas algumas saudades entre um reduzido número daqueles que dela fartamente tinham beneficiado. A queda da Demagogia foi acompanhada por um sonoro suspiro de alívio de um Portugal maior, que naquele tempo ainda se encontrava presente em três continentes e oceanos.
Hoje estamos no alvorecer de um outro sistema. As implicações da actual crise que esconde trabalhosamente um escândalo financeiro de proporções abissais, parece ir dia a dia, avolumando-se, colhendo a talhe de foice nomes sonantes, temerosas reputações, tudo enodoando com a vergonha da directa ou disfarçada cumplicidade. O BPN passou a ser um assunto que interessa aos contribuintes e o povo descobre ou imagina conluios, troca freneticamente mensagens telefónicas e na internet, e, pasme-se, delicia-se com a evidente permissividade e sistema de vasos comunicantes que atinge toda a superestrutura do Poder. Ninguém escapa à suspeita e mesmo aqueles sobre os quais ainda não foram apontados os dedos acusadores da opinião pública - sempre ávida de sangue -, são exautorados por aquilo que em Portugal se chama compadrio. Hoje iniciou-se o clássico processo da emissão do comunicado público que normalmente será seguido por muitos outros nos próximos tempos. Até onde irá a realidade da suposição? Quantos culpados pagarão pelos seus crimes e quantos serão aqueles que escaparão airosamente? Pior que tudo, quantos inocentes serão também esmagados pela pesada roda dentada da fúria, que tudo esmaga e trucida, preferindo liquidar a eito, sem olhar à necessidade da calma ponderação de uma Justiça mais que nunca necessária? Até onde chegaremos?