Saltar para: Post [1], Comentários [2], Pesquisa e Arquivos [3]




Os americanos é que são racistas?

por Samuel de Paiva Pires, em 30.11.08

 

É um lugar comum dizer-se que os norte-americanos são racistas. Numa sociedade demograficamente vibrante cujo poder de adaptação e flexibilidade às condicionantes impostas pelo mundo em devir se devem em grande parte ao modelo cultural de assimilação e integração dos milhões de migrantes que têm acolhido ao longo da História, latinos e afro-americanos têm, com maior ou menor dificuldade, encontrado espaço para desempenhar cargos públicos e políticos, e Obama é a maior expressão disso mesmo. Pesem embora algumas tensões que assolaram os Estados Unidos, desde a abolição da escravatura que levou a uma guerra sangrenta, passando pelo episódio de Martin Luther King, chegando-se aos dias de hoje com alguns indivíduos a defenderem certos princípios como a supremacia branca (KKK), actualmente esse racismo não me parece ter expressão significativamente relevante na sociedade americana, isto é, para criar graves problemas de perturbação da ordem pública e, mais uma vez, Obama é a prova disso mesmo.

 

Lembrei-me disto a propósito deste post e mais especificamente destas palavras de Nuno Lobo:

 

Por outras palavras, Obama significa a vitória da europeização da América.

 

Pois bem, se os Estados Unidos da América, e o restante continente americano, são de facto, historicamente, um prolongamento da Europa, e se essa é que é supostamente, pelo menos partindo de uma perspectiva euro-cêntrica, a base da civilização Ocidental, quanto a esta questão do racismo, parece-me que talvez estejamos a ver as coisas ao contrário. E porquê? Perguntem-se quantos africanos ou descendentes de africanos exercem cargos públicos ou políticos em todos os aparelhos estatais dos estados membros da União Europeia e, em consequência, nas próprias instituições europeias? Pois, muito provavelmente poucos ou nenhuns. Basta olhar para o nosso próprio Governo, a Assembleia da República, os Tribunais e por aí fora. Sem esquecer ainda a recente expressão cada vez mais significativa da extrema-direita por esse velho continente fora ou ainda a tendência crescente para fechar fronteiras e impedir a imigração, a ilegal legitimamente, a legal sendo um tiro no pé que vamos pagar a longo prazo quando os sistemas de segurança social não conseguirem mais comportar o díspar rácio entre população activa e população reformada.

 

Além do mais, tal como referi no início deste post, e como refere Fareed Zakaria em O Mundo Pós-Americano, parte do segredo da regeneração dos Estados Unidos em face das diversas crises e da constatação de que continuarão a ser por muitas décadas a única super-potência no mundo tem sido a sua atitude perante a imigração. E depois os americanos é que são racistas...

 

No velho continente cá continuamos contentes e alegres com o nosso euro-centrismo e alegada superioridade moral, julgando que nos encontramos em posição de dar lições aos Estados Unidos, ou tentando ver em determinados acontecimentos nesses a expressão acabada dessa mesma nossa alegada superioridade. Daqui a umas décadas talvez vejamos como estávamos enganados... Europeização da américa? Posso estar enganado ou talvez não esteja a conseguir vislumbrar tal processo mas, não só quanto a esta questão do racismo ou da imigração, num espectro mais alargado, tal não me parece sequer uma ideia séria, pelo menos por agora. Esperemos pelo que irão fazer quanto aos sistemas de educação, saúde e segurança social, e aí sim, porventura poderemos assistir a algum tipo de europeização.

publicado às 17:23


3 comentários

Sem imagem de perfil

De João Pedro a 30.11.2008 às 18:46

Ultimamaente tenho ouvido essa crítica aos países europeus e parece-me que ela é feita com algum exagero (ou para mostrar a "superioridade americana"). Que o racismo nos EUA seja hoje em dia secundário, concordo em absoluto, excepto em algumas (poucas) comunidades. Disso mesmo se dava conta o mui europeu Bernard Henry Levi, no seu livro sobre os EUA.
Querer passar de imediato o exemplo para a Europa é exagerado. Os Estados Unidos são uma nação surgida "ex novo", formada por uma imensidade de emigrantes, raças e culturas, ainda que com predominância anglo-saxónica. Como tal, a representação ao mais alto nível de pessoas de raça diferente da que predomina é um dado absolutamente normal e com tendência a acentuar-se. Já na Europa, em velhas nações ou povos que há muito não recebiam vagas de emigração significativas, e que só há poucas décadas se habituaram a ver novas cores nas suas sociedades, não admira que muitos dos seus cidadãos de 1ª, 2ª ou mesmo 3ª geração de emigrantes não tenham ainda sobressaído. É bom ver que os seus pais tiveram de se habituar a culturas diferentes e a tarefas mais difíceis, que obviamente obstam a um entrosamento e a uma escalada social imediatas. Mas isso já se verifica, nos últimos tempos, especialmente em França, RU ou Alemanha (ou o caso do novo burgomestre de Roterdão) . Com o decurso do tempo, tornar-se-ão mais correntes. Mas lá está: é uma questão de tempo e não de se forçar a assimilação a qualquer custo das "minorias" ou pessoas de raça minoritária.
Imagem de perfil

De Samuel de Paiva Pires a 30.11.2008 às 18:54

De acordo João, mas, ainda assim, pegando no exemplo português, um país de emigrantes e de imigrantes, com uma histórica relação com África, não deixa de ser de dar que pensar. Não é minha intenção passar o exemplo para a Europa, até porque sou completamente contrário a quotas e afins artifícios com que se tentam incutir determinadas alterações nas sociedades, mas, isso sim, pretendia demonstrar a falta de visão de muitos europeus que acham que a Europa é superior aos Estados Unidos ou, como no caso, que Obama significa uma europeização da América. Não só não o é no que concerne a esta questão do racismo, como ainda teremos que aguardar para ver se o será noutros campos.
Imagem de perfil

De Nuno Castelo-Branco a 30.11.2008 às 21:51

... e ainda por cima, o ÚNICO partido de que tem um "deputado de cor" é o CDS! Deve ser por causa do fascismo, dirá o BE e o PC. Que idiotas, meu deus...

Comentar post







Arquivo

  1. 2024
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D
  14. 2023
  15. J
  16. F
  17. M
  18. A
  19. M
  20. J
  21. J
  22. A
  23. S
  24. O
  25. N
  26. D
  27. 2022
  28. J
  29. F
  30. M
  31. A
  32. M
  33. J
  34. J
  35. A
  36. S
  37. O
  38. N
  39. D
  40. 2021
  41. J
  42. F
  43. M
  44. A
  45. M
  46. J
  47. J
  48. A
  49. S
  50. O
  51. N
  52. D
  53. 2020
  54. J
  55. F
  56. M
  57. A
  58. M
  59. J
  60. J
  61. A
  62. S
  63. O
  64. N
  65. D
  66. 2019
  67. J
  68. F
  69. M
  70. A
  71. M
  72. J
  73. J
  74. A
  75. S
  76. O
  77. N
  78. D
  79. 2018
  80. J
  81. F
  82. M
  83. A
  84. M
  85. J
  86. J
  87. A
  88. S
  89. O
  90. N
  91. D
  92. 2017
  93. J
  94. F
  95. M
  96. A
  97. M
  98. J
  99. J
  100. A
  101. S
  102. O
  103. N
  104. D
  105. 2016
  106. J
  107. F
  108. M
  109. A
  110. M
  111. J
  112. J
  113. A
  114. S
  115. O
  116. N
  117. D
  118. 2015
  119. J
  120. F
  121. M
  122. A
  123. M
  124. J
  125. J
  126. A
  127. S
  128. O
  129. N
  130. D
  131. 2014
  132. J
  133. F
  134. M
  135. A
  136. M
  137. J
  138. J
  139. A
  140. S
  141. O
  142. N
  143. D
  144. 2013
  145. J
  146. F
  147. M
  148. A
  149. M
  150. J
  151. J
  152. A
  153. S
  154. O
  155. N
  156. D
  157. 2012
  158. J
  159. F
  160. M
  161. A
  162. M
  163. J
  164. J
  165. A
  166. S
  167. O
  168. N
  169. D
  170. 2011
  171. J
  172. F
  173. M
  174. A
  175. M
  176. J
  177. J
  178. A
  179. S
  180. O
  181. N
  182. D
  183. 2010
  184. J
  185. F
  186. M
  187. A
  188. M
  189. J
  190. J
  191. A
  192. S
  193. O
  194. N
  195. D
  196. 2009
  197. J
  198. F
  199. M
  200. A
  201. M
  202. J
  203. J
  204. A
  205. S
  206. O
  207. N
  208. D
  209. 2008
  210. J
  211. F
  212. M
  213. A
  214. M
  215. J
  216. J
  217. A
  218. S
  219. O
  220. N
  221. D
  222. 2007
  223. J
  224. F
  225. M
  226. A
  227. M
  228. J
  229. J
  230. A
  231. S
  232. O
  233. N
  234. D

Links

Estados protegidos

  •  
  • Estados amigos

  •  
  • Estados soberanos

  •  
  • Estados soberanos de outras línguas

  •  
  • Monarquia

  •  
  • Monarquia em outras línguas

  •  
  • Think tanks e organizações nacionais

  •  
  • Think tanks e organizações estrangeiros

  •  
  • Informação nacional

  •  
  • Informação internacional

  •  
  • Revistas