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A liberdade de imprensa tem sido uma das pedras fundamentais da legitimidade do regime. A censura do famoso lápis azul, pareceu concitar a unanimidade de todos os sectores oposicionistas da 2ª república e nos anos subsequentes ao 25 de Novembro de 1975, existiu uma efectiva liberdade de imprensa, embora esta fosse reservada aos signatários do ameaçador pacto que o MFA obrigou a sociedade civil a aceitar como condição sine qua non.
Assumindo a verdade incontornável dos grupos económicos terem desempenhado a necessária função de investimento para a garantia da influência na opinião pública, assistiu-se a uma apreciável pluralidade de publicações, desde A Rua de Manuel Maria Múrias, até aos abertamente comunistas O Diário e Diário de Lisboa. Embora o tom geral seguisse a quase obrigatória linha PS-PSD-PC-UDP conducente ao "socialismo da Constituição", assistia-se à influência que alguns jornalistas exerciam sobre os correspondentes sectores políticos. Por exemplo, seria hoje impensável a existência de uma Vera Lagoa que pelas arremetidas semanais em O Diabo trazia muitas dezenas de milhar de lisboetas à Avenida, manifestando-se no dia da Restauração de 1640. Um símbolo de resistência e de vitória sobre um PREC ainda bem presente na mente de todos, era olhada com o sobranceiro e auto-intelectualizado desdém pelos detentores da verdade daquele tempo, plasmada no eixo Expresso - O Jornal. Já o chamado centrão indicava a sua futura hegemonia nestes nossos dias, mas contemporizava fatalmente com os vencidos do pró-sovietismo que conquistara de assalto as redacções, editoras e casas de impressão. Quem não se recorda dos cortes ao subsídio do papel, ou da recusa da impressão, distribuição ou venda de alguns periódicos? Estas operações silenciadoras consistiram numa outra forma de censura, contornando um preceituado constitucional tornado vazio de substância e pior ainda, transmitiam a mensagem da necessidade do silêncio de alguns para a consolidação da democracia emergente!
Agora e em véspera de eleições, deparamos quotidianamente com uma outra versão censória. Se a omissão do noticiário inconveniente é impossibilitada por este ou aquele agente com poder para impor o seu ponto de vista à audiência, procede-se a uma rápida mas cuidadosa cosmética que perpetue a opinião única, sintetizada nas duas facções daquele que afinal é o mesmo partido, o buraco negro PS-PSD. Os painéis de comentadores - surgem como politólogos - , apesar de apresentarem a priori nomes que formalmente chegam de díspares sectores "ideológicos", obedecem todos, muito estranhamente, a uma certa padronização no que respeita ao apontar da conveniência de certa política, ou melhor - e isto é o que está em causa -, dos homens a escolher para a sua aplicação. Julga-se inevitável a resignação ao mal menor. A contemporização para com o estado de coisas e a difícil escolha entre dois mesmos, obedece então à lógica que fará prevalecer aqueles que melhor posicionados estão para a outorga da necessária recompensa pela colaboração. É esta uma forma de censura como qualquer outra, embora embalada numa artificiosa diversidade que apenas serve para apontar um só caminho. Torna-se este sonegar de notícias ainda mais grave, quando é evidente a absurda e acintosa intervenção que pretende coagir ou anular o princípio da separação de poderes, calendarizando o exercício daqueles, segundo a conveniência de uns tantos.
Consiste tudo isto, na plena confirmação dos velhos tiques autoritários herdados da república de 1910. Sendo impossível a destruição de jornais, o espancar de jornalistas e a censura prévia, o refinamento de processos confirma a adequação do modo ao tempo. Gente escolhida, perfeitamente industriada e paga. Nada de novo.