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Em nome da liberdade (XVI) - Coisas que vou escrevendo

por Samuel de Paiva Pires, em 08.12.09

 

Aqui deixo três parágrafos de um paper que estou a finalizar.

Só através da liberdade económica que uma sociedade liberal assegura, em que através do desenvolvimento das actividades económicas os indivíduos ganham a capacidade de poder decidir sobre as suas vidas, é que pode haver liberdade política. Na realidade, a liberdade individual assenta nestes dois tipos de liberdade que se influenciam mutuamente, como assinala Hayek ao afirmar que “the subsequent elaboration of a consistent argument in favor of economic freedom was the outcome of a free growth of economic activity which had been undesigned and unforeseen by-product of political freedom”[1].

A propriedade privada é, assim, um elemento fundamental para alcançar a liberdade individual, tal como Locke já havia teorizado, e como Gray assinala ao considerá-la como “an institutional vehicle for decentralized decision-making” em estreita ligação com a capacidade de um indivíduo dispor de si próprio, das suas capacidades e talentos. Isto só acontece, em termos económicos, num sistema de mercado, em que a coordenação sobre as actividades económicas não é coerciva, e num sistema político liberal, em que o Governo seja limitado, assegure o rule of law, e respeite as liberdades individuais – o que não significa que seja um Estado mínimo, como é geralmente confundido, e não defendido pela maior parte dos autores liberais[2].

Esta fórmula liberal do Governo limitado, não corresponde necessariamente a um regime democrático, até porque a democracia de matriz rousseauniana, baseada no bem comum, vontade geral e soberania popular, pode ser ilimitada, tirânica e totalitária, enquanto, por outro lado, é verificável empiricamente que a democracia de matriz anglo-saxónica obedece efectivamente aos preceitos do Governo limitado. Estes preceitos são o respeito pelas liberdades individuais, o constitucionalismo, o rule of law, e a limitação e difusão do poder, através de checks and balances que constranjam e diminuam o exercício arbitrário do poder. Estes checks and balances podem ser de diversos tipos, e incluem, por exemplo, a separação de poderes, o bicamaralismo ou o federalismo. Em resumo, a condição sine qua non para se considerar um Estado liberal é, segundo Gray, “that governmental power and authority be limited by a system of constitutional rules and practices in which individual liberty and the equality of persons under the rule of law are respected”[3].

 


[1] Cfr. F. A. Hayek, The Road to Serfdom: text and documents – The Definitive Edition, Bruce Caldwell (ed.), Chicago, The University of Chicago Press, 2007, p. 69.

[2] Cfr. John Gray, Liberalism, 2.ª Edição, Minneapolis, The University of Minnesota Press, 1995, p 70.

[3] Cfr. Idem, ibidem, p. 72. 

 

publicado às 16:57


6 comentários

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De Manuel Pinto de Rezende a 08.12.2009 às 17:36

Samuel,

mais um bom texto.
Quanto à importância da propriedade privada,escreveste tudo o que eu queria ter dito sobre a mesma neste problema dos "minaretes suíços". Gostaria da tua opinião sobre o assunto...

No tema da democracia, pergunto-me se a democracia anglo-saxónica não será dada a abusos tanto como a rousseauniana... haverá talvez um velo civilazacional, histórico e cultural, mas cada vez mais me parece que o famoso sistema de checks and balances inglês não é assim tão perfeito.
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De Samuel de Paiva Pires a 08.12.2009 às 17:51

Obrigado Manuel. Sobre o assunto dos minaretes, parece-me algo delicado tomar partido por qualquer um dos lados, porque creio que ambos têm razão e que, no fundo, como em comentário ao post da Cristina colocaste, teremos que concordar em discordar.

O problema da democracia liberal no que concerne à religião - e não só - é mesmo a distância que vai entre a tolerância e o relativismo, e quando defrontada por casos reais como este, o resultado nunca é óptimo. De um lado, pode-se dizer que não há verdadeiramente liberdade religiosa ao proibir-se a construção de um símbolo importante para uma determinada comunidade. Por outro lado, o simbolismo é interpretado precisamente em sinal contrário por outra parte da população. Bom, afinal onde fica separação entre as esferas religiosa e política no meio disto? Talvez não fique.

Em todo o caso, parece-me que seria de evitar a ditadura da maioria, porque aqui se trata claramente de uma formulação rousseauniana da vontade geral. E tratando-se de um assunto tão delicado, qualquer dos resultados teria sempre consequências indesejadas para um dos lados.

Contudo, se tal fosse evitável, até que ponto a tal tolerância não permitirá repetidos avanços por parte do Islão opressor em relação à Europa?

Lá está, nada disto tem uma resposta única e simples. Qualquer partido que se tome, terá sempre vantagens e desvantagens.
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De Daniel Mateus a 08.12.2009 às 23:40

E o que não é a democracia senão o consenso geral? Falar em ditadura da maioria é puramente utópico, tendo em conta na complexidade e imperfeição em que assenta a sociedade. O caso dos minaretes só têm uma resposta: Foi a vontade do povo Helvético. Agrade ou não agrade têm de respeitar-se. Não acho bem é que critique-se a Suiça por proibir a construção de minaretes nas mesquitas.
Há o direito de criticar, tendo em conta que foi referendado? Se estivermos nos paises mulcumanos temos de observar uma série de perceitos por motivos culturais e religiosos. Se não for por nossa consciencia é nos imposto. Os mulcumanos deviam seguir o mesmo e não o fazem. Com que autoridade vejo mulheres de cabeça tapada e homens usando turbante no metro?
Aceitar é respeitar. Não é o que vejo. Por isso não admira-me que os minaretes sejam proibidos na Suiça. Agrade ou não agrade este meu comentário, a realidade é esta.
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De Manuel Pinto de Rezende a 09.12.2009 às 00:36

"Falar em ditadura da maioria é puramente utópico, tendo em conta na complexidade e imperfeição em que assenta a sociedade. O caso dos minaretes só têm uma resposta: Foi a vontade do povo Helvético."

Falar em ditadura da maioria é utópico, mas deixar que a Maioria fale pelo Povo já não é?

O facto de várias pessoas temerem uma minoria dá-lhes o direito de as expulsar da colectividade "Povo", impondo-lhes um conjunto novo de regras que as ponham à parte do "Povo"?

e depois fica tudo bem porque "O Povo Helvético falou"?

portanto, nós temos autoridade para proibir pessoas de construir minaretes porque... eles tapam-se?

ouve lá pá, de que planeta tu és?
ai, os democratas...
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De Daniel Mateus a 08.12.2009 às 23:29

Nunca como agora a História assume um papel essencial na teoria económica, para que o desenvolvimento das suas actividades signifique a liberdade do individuo de poder planear a sua vida como entender. Isso implica mais do que nunca a necessária articulação das várias ciências sociais: História, Direito, Ciência Politica, Sociologia....
Sem dúvida que a posse individual de bens materiais significa a liberdade do individuo face aos demais poderes institucionais.
Para isso ser possivel as actividades economicas têm de obdecer a um conjunto de regras e normas juridicas, para que a concorrencia e as transações comerciais sejam o mais justo possivel para quem vende e para quem compra.
A economia hoje assenta numa concepção anárquico-especulativa. Não há uma concepção de criar algo mas a obtenção de um lucro fácil, rápido e que não olhe a meios. Eis a razão dos recentes escandalos financeiros.
As consequencias a longo prazo é que as pessoas deixem de confiar no mercado, tendo consequencias graves.
A regulação das actividades economicas é legitima pois tudo na vida têm de ter um procedimento. E o ser humano procura a satisfação unica do seu interesse. Não acredito que um grande empresário ceda ao impulso de dominar o mercado por todos os métodos só pela sua consciência. É mentira! A História prova que o ser Humano é de base individualista.
O papel do Estado como regulador da Economia em articulação com a massa empresarial é importante, para evitar crises como a que vivemos.
A economia precisa de ser repeensada seriamente. E para finalizar: Os Estados Unidos não são um bom exemplo de democracia. Porque?
Os factos falam por si. Basta ler os jornais.
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De Manuel Pinto de Rezende a 09.12.2009 às 00:41

"A economia hoje assenta numa concepção anárquico-especulativa. Não há uma concepção de criar algo mas a obtenção de um lucro fácil, rápido e que não olhe a meios. Eis a razão dos recentes escândalos financeiros."

A crise que começou no sector financeiro, o sector mais regulado de toda a economia mundial?

"A regulação das actividades económicas é legitima pois tudo na vida têm de ter um procedimento. E o ser humano procura a satisfação única do seu interesse."

Nada na minha vida tem um procedimento, basta ver as minhas notas na faculdade, no liceu, no alemão, etc...

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