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Portugal vive, hoje, mais um dia histórico. Alguns pressupostos do funcionamento do sistema político caem por terra. A força política que ganhou as eleições será derrotada no parlamento, apesar de ter ganho nas legislativas. E esse facto abre um precedente interessante. No futuro deixará de ter importância vencer eleições legislativas - o mérito eleitoral será um assunto dispensável. Contudo, a maioria dos menores não significa necessariamente que o Presidente da República emposse um governo resultante desse arranjo. Um governo de gestão não seria o fim do mundo. A Bélgica teve um durante dois anos e registou crescimento económico assinalável. Um governo de iniciativa presidencial parece estar fora de questão, porque qualquer que seja o seu programa irá esbarrar com a censura e a rejeição da maioria do parlamento. Se António Costa vier a ser primeiro-ministro, como tudo aparece apontar, terá de lidar com as mesmas condicionantes que afectaram os movimentos de Portugal. À entrada para a reunião do Eurogrupo, Schäuble e Dijsselbloem disseram que Portugal «vai continuar no bom caminho». Por outras palavras, não permitirão extravagâncias a Costa e seus colaboradores. Ou seja, de uma perspectiva externa nada pode mudar. Catarina vai ter de se dobrar, e mesmo assim nunca estará à altura do ministro das finanças alemão. Os socialistas já produzem afirmações como se o país fosse integralmente soberano, como se não fizesse parte da União Europeia e como se não existisse um diktat da Troika. Todas as premissas de libertação do jugo da Austeridade são falsas. Registamos, deste modo, elementos de desconexão com a realidade. Os próximos seis meses serão de tumulto governativo, de fissuras entre o Partido Socialista e os subalternos acomodados do Partido Comunista Português e do Bloco de Esquerda. A "nova oposição" deve, na minha opinião, ficar quietinha, nada fazer. As contradições de um menage político a trois falarão por si. Não faz parte da matriz cultural e ideológica da Esquerda ceder ad eternum no que diz respeito às suas premissas identitárias - hão-de querer voltar às suas casas. Os acordos de incidência comprados por António Costa são na sua essência a perfeita expressão do mercado que tanto abominam - houve manipulação, existe um cartel e confirmamos dumping ideológico. Ao que parece, António Costa terá feito uma proposta irrecusável aos partidos do barco de governação, mas não tarda nada irá meter água. A canoa está carregada com promessas obesas, passageiros do irrealismo que Portugal deveria deitar borda fora. Esperemos que não tenham sido quatro anos em vão.