Saltar para: Post [1], Comentários [2], Pesquisa e Arquivos [3]




O que deitou Portugal abaixo

por John Wolf, em 26.03.14

Sabem o que deitou Portugal abaixo? Não foi a grande teoria política, a doutrina ideológica revanchista. Não, senhor. Foi o chico-esperto que estaciona em segunda fila porque se julga o primeiro. Foi o malandro que procura um jeitinho na repartição. Foi o primo que arranjou o emprego para o afilhado lá na empresa. Foi a comadre que abarbatou os lápis e os afiadores da despensa escolar. Foi o artista que viu a sua obra publicada pela ex que manda lá na editora. Foi o construtor que subtraiu o valor do SISA na assinatura do contrato de compra e venda. Foi o realizador que orçamentou muito acima do valor necessário e que me meteu muita fita no bolso. Agora multipliquem isto tudo por 100 e terão os políticos que governaram Portugal nas últimas décadas. É mais ou menos isto, não é?

publicado às 09:46


7 comentários

Sem imagem de perfil

De Mário Amorim Lopes a 26.03.2014 às 10:27

Passando ao lado dos argumentos económicos para a corrupção de primeira linha que começa com um pequeno favor — a descrita no artigo —, que são sobejamente conhecidos, considero esta abordagem [1] ao tema particularmente interessante. É uma perspectiva sociológica que enquadra a corrupção enquanto fenómeno institucional: se são criadas artificialidades, burocracias, regulações, interferências e intervenções que tornam o processo moroso, caro ou até impossível, porque não haveriam os agentes de as tentar agilizar?


É verdade. A corrupção começa no chico-espertismo. A questão é perceber porquê que se instituiu essa prática e se enraizou. Terá sido porque era essa a forma de contornar o regime? Colocar uma telha por cima da cabeça para acender um isqueiro era, para qualquer dos efeitos, chico-espertismo...


[1] - http://sociology.stanford.edu/people/mgranovetter/documents/gransocialconstruct_000.pdf
Imagem de perfil

De John Wolf a 26.03.2014 às 14:35

Caro Mário Amorim Lopes,
Muito obrigado pelo comentário e a partilha do documento que formaliza de um modo académico o que esboço de um modo empírico e "sensorial". Uma obra com o seguinte título: "Structures of everyday corruption" (à Braudel) seria interessante para mapear a origem  e a disseminação das práticas de desvio. São contributos como o seu que me aliciam a escrever e a "provocar" os outros.
Muito grato pela ampliação que nos concede e pelo link que partilha (já comecei a sua leitura).
Cordialmente,
John
Imagem de perfil

De FD a 26.03.2014 às 14:04

Existe um livro de um inglês residente em Portugal muito interessante. Chama-se "os portugueses". É um livro simples que nos leva a uma viagem sobre as nossas vitórias e desaires de uma perspectiva de quem nos conhece e vai conhecendo conforme o tempo vai passando. Nada do que está lá é novo, mas é uma boa forma de entender algumas coisas que aparentam óbvias, mas que juntando tudo nos dá uma ideia do que nos tornamos e de como não foi nenhum acaso o que nos aconteceu até agora. O autor curiosamente acaba por se "aportuguesar", mas isso já é uma opinião minha, o que tem o seu quê de ironia.

Isto para dizer que a falta de consciência e o messianismo do português comum está pouco saudavelmente de mãos dadas com o desenrascar, que na grande maioria dos casos faz por si e não pelo todo. Se o esquema, o favorzinho e a cunha são as únicas aparentes alternativas para o tal cidadão comum, é normal que as coisas raramente funcionem, pois são demasiados indivíduos contra a engrenagem que em qualquer outro país de sucesso estaria a funcionar na perfeição. Claro que a unica forma de se tentar controlar esta fuga constante à obrigação para consigo, com os outros e para com aqueles que este cidadão deve responsabilidades para depois exigir direitos, envolve regras, muitas regras, muitas leis, muita burocracia que depois terá efectivamente o efeito contrário ao pretendido. A solução? Mais esquemas e fugas, mais amigos no sitio certo, mas passar a perna aos impostos e ao Estado, aos cidadãos, a no fundo toda a sociedade que deveria esperar reciprocidade de todos para que funcione como um todo. Mas não o faz.

Num país onde isto está neste estado, é também normal que o produto-cidadão que daí advenha seja defeituoso, relutante, desconfiado, perante os cumprimentos, perante os outros, perante a "big picture" que é uma sociedade e a sua construção. O exemplo mais simples é o caso dos impostos, todos querem fugir mas espantam-se constantemente o porquê destes continuarem a aumentar. Não percebem que por cada acção sua há uma reacção oposta de quem (mesmo sendo seu par) tenta equilibrar uma equação à partida minada na fonte. Como se pode que a classe política esteja à altura dos desafios? Ou a empresarial? Ou (mais uma vez) o comum dos cidadãos na sua intereacção diária com os outros? Mais uma vez a falta de consciência impera. Para o cidadão "os outros" é que são ladrões, mafiosos, chico-espertos, não sequer equacionando que estes são o tal produto da "portugalidade" de que tanto se orgulham os portugueses, e que para estes mudarem de estilo tem de começar por algum lado, e não é com certeza lá em cima, pois outros virão para os substituir.
Imagem de perfil

De John Wolf a 26.03.2014 às 15:15

Obrigado FD,
Julgo tratar-se da obra de Barry Hatton. Aproveito para divulgar a obra que escrevi a propósito de Portugal ainda antes da crise ganhar a sua actual expressão (escrita em 2006, publicada em 2008).
Cordialmente,
John


http://www.fnac.pt/Portugal-Traduzido-JOHN-WOLF/a98504
Imagem de perfil

De cristof a 27.03.2014 às 12:46

Bem apontado. Podemos incluir nos erros uma imprensa demasiado politicamente correta e até subserviente por vezes. Claro que até na informação alternativa se noat um acantonamento por simpatias de seita, incluindo o apagar os comentarios que não seguem a cartilha do blogue.
Só um aparte Cuba o país sem "liberdades" há blogs que atingem 3100 comentarios -como se calcula vão dum extremo ao outro mas nenhum é apagado. 
Sem imagem de perfil

De Carlos Faria a 27.03.2014 às 16:42

Por esse motivo há muito tempo que eu digo que numa democracia representativa não vale a pena dizer mal do povo.... pois os eleitos são o espelho do povo e saídos desse mesmo povo.
Sem imagem de perfil

De ALICE SAMORA a 27.03.2014 às 18:28


Ia apanhando um susto.
Não é que cheguei a pensar que, para além da cultura sócio-polítice e económica que nos vai dando sentido à vida, você ainda ia culpar os responsáveis por:
Estádios, aeroportos de Beja, auto-estradas, tjvs, park-expos, park-escolar, etc. e tal?
Assim é que é falar bem. Diz-se das culpas mas não se mencionam os culpados. Não vão eles ser chamados de novo para gerir a coisa.
Ainda há dias a procuradora geral acabou de explicar melhor que a lei das prescrições não carece de ser mexida.
Nós compreendemos. Pois se ela está a funcionar tão bem!

Comentar post







Arquivo

  1. 2025
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D
  14. 2024
  15. J
  16. F
  17. M
  18. A
  19. M
  20. J
  21. J
  22. A
  23. S
  24. O
  25. N
  26. D
  27. 2023
  28. J
  29. F
  30. M
  31. A
  32. M
  33. J
  34. J
  35. A
  36. S
  37. O
  38. N
  39. D
  40. 2022
  41. J
  42. F
  43. M
  44. A
  45. M
  46. J
  47. J
  48. A
  49. S
  50. O
  51. N
  52. D
  53. 2021
  54. J
  55. F
  56. M
  57. A
  58. M
  59. J
  60. J
  61. A
  62. S
  63. O
  64. N
  65. D
  66. 2020
  67. J
  68. F
  69. M
  70. A
  71. M
  72. J
  73. J
  74. A
  75. S
  76. O
  77. N
  78. D
  79. 2019
  80. J
  81. F
  82. M
  83. A
  84. M
  85. J
  86. J
  87. A
  88. S
  89. O
  90. N
  91. D
  92. 2018
  93. J
  94. F
  95. M
  96. A
  97. M
  98. J
  99. J
  100. A
  101. S
  102. O
  103. N
  104. D
  105. 2017
  106. J
  107. F
  108. M
  109. A
  110. M
  111. J
  112. J
  113. A
  114. S
  115. O
  116. N
  117. D
  118. 2016
  119. J
  120. F
  121. M
  122. A
  123. M
  124. J
  125. J
  126. A
  127. S
  128. O
  129. N
  130. D
  131. 2015
  132. J
  133. F
  134. M
  135. A
  136. M
  137. J
  138. J
  139. A
  140. S
  141. O
  142. N
  143. D
  144. 2014
  145. J
  146. F
  147. M
  148. A
  149. M
  150. J
  151. J
  152. A
  153. S
  154. O
  155. N
  156. D
  157. 2013
  158. J
  159. F
  160. M
  161. A
  162. M
  163. J
  164. J
  165. A
  166. S
  167. O
  168. N
  169. D
  170. 2012
  171. J
  172. F
  173. M
  174. A
  175. M
  176. J
  177. J
  178. A
  179. S
  180. O
  181. N
  182. D
  183. 2011
  184. J
  185. F
  186. M
  187. A
  188. M
  189. J
  190. J
  191. A
  192. S
  193. O
  194. N
  195. D
  196. 2010
  197. J
  198. F
  199. M
  200. A
  201. M
  202. J
  203. J
  204. A
  205. S
  206. O
  207. N
  208. D
  209. 2009
  210. J
  211. F
  212. M
  213. A
  214. M
  215. J
  216. J
  217. A
  218. S
  219. O
  220. N
  221. D
  222. 2008
  223. J
  224. F
  225. M
  226. A
  227. M
  228. J
  229. J
  230. A
  231. S
  232. O
  233. N
  234. D
  235. 2007
  236. J
  237. F
  238. M
  239. A
  240. M
  241. J
  242. J
  243. A
  244. S
  245. O
  246. N
  247. D

Links

Estados protegidos

  •  
  • Estados amigos

  •  
  • Estados soberanos

  •  
  • Estados soberanos de outras línguas

  •  
  • Monarquia

  •  
  • Monarquia em outras línguas

  •  
  • Think tanks e organizações nacionais

  •  
  • Think tanks e organizações estrangeiros

  •  
  • Informação nacional

  •  
  • Informação internacional

  •  
  • Revistas