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Os genitais da praxe

por John Wolf, em 21.01.14

As praxes universitárias não são um exclusivo de Portugal, mas isso não deve servir de alibi para os pseudo-rituais absolutamente vergonhosos que grassam pelas universidades portuguesas. Um pouco por todo o mundo, a patologia da humilhação, os insultos e as ofensas contaminaram os campus universitários, a baixa da cidade ou os polos suburbanos. Deixemo-nos de tretas e chamemos as coisas pelos nomes. Qual integração qual carapuça na vida académica. Os caloiros são admoestados pelos mesmíssimos "doutores" que foram sujeitos aos mesmos tratamentos uns anos antes - mas lamentavelmente nada aprenderam e pouco evoluíram. A coberto do convívio são e da alegria confraternizadora, outras motivações estão por detrás das acções levadas a cabo. E as  atrocidades são cometidas porque as frustrações vêm de longe, carregam o peso de problemas por resolver, personalidades por esclarecer. Reitero desde já a separação das águas; as tunas, e a música que nos dão, não têm necessariamente a ver com o desequilíbrio que aqui trago a discussão. Deixemo-las de fora por enquanto, as serenatas têm o seu encanto, mas desliguemos esse rádio por agora. O problema que temos em mãos relaciona-se com o conceito de poder, abuso do mesmo e, numa categoria ainda mais básica, com impulsos de ordem sexual e afectiva. Passei por duas universidades portuguesas (na qualidade de estudante). Uma pública e outra privada. O fenómeno acontece em ambas sem diferenças assinaláveis. Em primeiro lugar, tenho de dizer que nunca fui de "grupos" ou "clubes". Nunca procurei dissimular as minhas insuficiências no seio de uma cultura de tribo, com o sentido de passar despercebido, para me sentir maior, uma filiação de recurso onde impera o magistério de indiscriminados, vestidos com o mesmo traje e fazendo uso de um mesmo código, a mesma conversa. Nunca recorri a esse empowerment. Mas, durante esses períodos inaugurais, de acolhimento de recém-chegados à vida universitária, pude observar que os "superiores" que submetiam os "primeiro-anistas" a todo o tipo de malabarismos, agiam de acordo com um quadro psicológico de grande frustração sexual. Estava na cara que nunca tinham dado uma para a caixa da luxúria e desbunda. Eram, para todos os efeitos, virgens, e não apenas no sentido genital. Desse modo, e fazendo uso da posição hierárquica, os "machos alfa" procuravam colocar sob sua alçada as nubentes académicas mais jeitosas, ainda rosadas pelo ar fresco da montanha, apeadas dias antes do comboio regional. Para além da distorção das "relações hetero", também se verificava um forte preconceito em relação à homossexualidade, alimentado por ambos os géneros de mestres de cerimónia. Nesses casos havia ainda mais motivos para chacota, risota. Para além disto, basta analisar as "brincadeiras" gizadas por esses génios, para perceber onde queriam chegar. A espuma de barbear, metida ali mesmo, é quase sado-maso, mas não chega a ser nada - não passa de uma palhaçada de adolescente com hormonas ao rubro. Por outro lado, as gajas de perfil domina, também preenchiam os requisitos da frustração. Em linguagem crua e dura (perdoem-me a franqueza), deram poucas cambalhotas e andavam para ali encalhadas e, assim sendo, de um modo triste e infeliz, descarregavam a angústia naquelas jovens que sugeriam aquilo que nunca conseguiriam ser: libertinas ou sensuais - sexualmente emancipadas. Como podem verificar pelo meu tom agreste e pelas palavras saídas das minhas vísceras, assumo uma posiçao clara em relação a esta malta profundamente ignorante. Mas há perigos maiores; se deixarmos, estes indivíduos ainda chegam a mandar neste país. Primeiro vão para as jotas e passado pouco tempo tornamos a encontrá-los em secretarias de Estado. Portanto, o desafio das praxes de Portugal não se esgota na tragédia do Meco. Enfrentamos um problema ético, social, cultural e académico de grandes proporções. O silêncio, que agora parece ser conveniente, contrasta com a euforia dos copos e os preservativos que nunca chegaram a sair das caixas.

publicado às 18:35


14 comentários

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De yalolyalolyalol a 23.01.2014 às 23:33

A praxe tem diversos objectivos, sendo o primeiro a integração dos caloiros na vida académica. De que outra forma,conheceríamos os nossos colegas se estarmos na 'fila do amor'? De que outra forma nos uníamosúnico coro entoando as canções do curso? De que outra forma conhecíamos os locais emblemáticos das cidades, que para nós são completamente estranhas? Falo como caloira, orgulhosa de ter sido e continuar a ser praxada. Para além disso, a praxe ensina-nos vários valores importantes que nos serão úteis no nosso futuro enquanto estivermos a exercer a nossa profissão. Os 'olhos no chão' e não falar mal nem insultar um doutor diz-nos o que é o respeito, definição essa que cada vez mais está a desaparecer. Quando estivermos prestes a iniciar a nossa vida profissional irá sempre haver alguém superior que se arma em esperto, no entanto não lhe podemos responder da maneira que a nossa vontade nos dita, correndo o risco de perder a profissão.


Ahh, além disso as praxes também podem ser solidárias, e bastante: https://fbcdn-sphotos-a-a.akamaihd.net/hphotos-ak-prn2/t1/1476671_424105307715647_823743908_n.jpg


Por isso, vamos não generalizar nem ser extremistas, sim?

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De Sofia de Landerset a 24.01.2014 às 09:17

A praxe ensina-lhe 'valores importantes'? 'Valores' como a humilhação, a sujeição cega, a falta de respeito que os seus 'superiores' têm por si? Através da praxe, apreende 'valores importantes' para o exercício da sua profissão? 'Valores' como a submissão a poderes vácuos, o silêncio cúmplice com criminosos, a impunidade com que os seus 'superiores' abusam de si?
O respeito, se não for mútuo, deixa de se chamar respeito. É abuso.
E para conhecer a cidade, há guias turísticos.
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De josefilreis a 24.01.2014 às 14:39

Querida  Sofia,


nos meus tempos de primeiro-anista, fui ensinado a respeitar os mais velhos que assumiam uma posição superior à minha, como uma espécie de comparação entre empregado e chefe numa pequena empresa. Cheguei à Universidade depois de três estágios profissionais e, portanto, falo com segurança relativamente a esta comparação, porque para mim tudo o que me foi ensinado pelos meus "superiores", serviu de algo. Penso que não vale a pena explicar o quê em concreto, ou o porquê em concreto, pois todos têm a oportunidade de se submeterem por um dia que seja à praxe académica, que resulta se for bem organizada. Repare, friso, bem organizada.
Existem universidades por esse país fora que desrespeitam a praxe a muitos níveis, e os caloiros deveriam "denunciar" essas pessoas perante o corpo máximo da praxe académica dessa determinada universidade. Muitas vezes não o fazem porque a submissão é grande, é abusa, confesso e concordo, mas é aqui que entram os "olheiros", aqueles que passeiam pela universidade nos seus tempos livres e que observam a execução das praxes. Se estas pessoas, que se ofereceram para o cargo, repararem que algo está errado, tomam a sua posição como superiores que são desses superiores. Em suma, isto é uma academia com a sua praxe bem organizada e estruturada. Não espero uma total compreensão do meu discurso, pois, e isto é conversa de totó, só sabe quem por lá passa.

Cumprimentos,
José Reis.
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De yalolyalolyalol a 24.01.2014 às 19:36

Nunca fui humilhada enquanto estava a ser praxada, disso posso ter a certeza! E como pode observar no link que eu postei a praxe não transmite valores vácuos, tal como erradamente a senhora refere. 
Para além disso, as vítimas do acidente da praia do Meco nunca poderiam, mas mesmo NUNCA, estar em situações praxísticas, uma vez que já se encontravam no  2º e 3º ano de licenciatura. E se foram para o mar, foram de livre vontade, pois só se submete às praxes quem quer.
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De ficaoquefui a 25.01.2014 às 11:42

A actividade de praxe nada tem a ver com este assunto.
6 pessoas morreram? 6 pessoas estavam no sitio errado à hora errada? 
Aproveito para declarar que a praxe é o letreiro de boas vindas à vida académica, também por isso só é praticada com alunos em que é a primeira experiencia nessa mesma vida, o que não era de todo o caso porque não havia caloiros entre o grupo.
Em segundo lugar, e passo a citar as palavras dos familiares:  Na carta, os familiares queixam-se de "injustiça", "especulação, notícias sem explicitação de fontes credíveis e construídas com base em comentários de quem nada sabe sobre os factos ou mesmo assentes em mentiras claras e contradições óbvias, que apenas criam alarme social".
 Deviam ter em consideração que nem tudo o que se diz é verdade. A comissão de praxes não é uma organização secreta com arquivos de todos os caloiros com informação potencial de exploração psicológica, como foi alvo em algumas noticias do momento, a comissão de praxes é um conjunto de alunos (poucos) que se fazem valer dos seus anos de casa para explorar ideias de ajudar os mais novos no processo de integração.

É de questionar a posição dos media em relação a este assunto, uma posição de ataque animal e de intervencionismo de carteira, pouco factual e puramente opinativo. 
O que encobre na perfeição a fraca jurisdição portuguesa para casos como estes. 
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De Artur de Oliveira a 24.01.2014 às 12:30

Querida, ainda estás sob o efeito da droga do amor que te deram na festa do caloiro? Image
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De Lucilia Fonseca a 13.09.2016 às 19:07

Por acaso os seus paisinhos não lhe ensinaram esses valores? O problema é que a maior parte dos jovens só sabem obedecer aos ditos "doutores" e provavelmente desobedeciam ostensivamente aos seus pais, por pura rebeldia, antes de irem para a universidade. Antes, perante os pais, têm muito querer e personalidade. Depois, perante os doutores, são autênticos cordeirinhos e rastejam na lama... 
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De omeunomeeteacher a 24.01.2014 às 15:04

Completamente de acordo. Não são precisas praxes para integrar e dar as boas vindas aos caloiros. Em todos os graus de ensino há caloiros e não são necessárias cenas de humilhação e de sujeição, como as que proliferam no ensino superior. Nunca hei-de esquecer a imagem grotesca de "veteranos" a molhar à mangueirada caloiros de joelhos num pátio magnífico, como era o do ISCSP na Junqueira. Nunca praxei nem me deixei praxar e não tive problemas nenhuns de integração.
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De josefilreis a 24.01.2014 às 15:26

Porquê imagem grotesca? Não se preocupe tanto com os outros, que outrora quiseram participar em actividades de praxe. Sim, porque todas as pessoas que têm alguma ligação com a praxe, têm-na porque quiseram. Lembrem-se que a praxe é uma actividade onde só participa quem quer. Quem participar e não gostar, está livre de sair a qualquer momento. E quem nunca participou, não deve dar a sua opinião sobre esses assuntos alheios às suas vivências académicas, porque na maior parte das vezes o tiro sai ao lado.
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De saraifrias a 24.01.2014 às 18:07

Querendo apenas comentar como testemunho de um pequeno semestre de caloira pela 1a vez, primeiro ano de caloira, cidade nova, pessoas desconhecidas e longe da família eis que no primeiro dia com receio do que poderia ser a praxe e porque já na altura como é obvio existiam opiniões muito diversas, decidi tirar as minhas próprias conclusões por experiência própria, e ao longo de um semestre de praxes reflito na seguinte conclusão: na minha integração foi fundamental a praxe, com esta cimentei amizades, e muitos outros conceitos que agora entendo o que na prática significam, alguns foram devidamente apurados com a praxe passo a citar o respeito não só pelos mais velhos, mas também pelos colegas mais novos, aprendi o verdadeiro sentido da expressão "a união faz a força", o conceito de humildade que por leigos que não o viveram devidamente possa ser confundido com humilhação, de experiência própria orgulho-me de ser praxada, e nunca em momento algum me senti humilhada ou rebaixada, contudo sei que existem casos em que as praxes, que nem deveriam ser denominadas como tal, não são executadas no verdadeiro ambiente académico, concluo o meu testemunho apenas para reforçar a ideia de que a praxe não é humilhação, e numa verdadeira praxe num verdadeiro ambiente académico isso não acontece! Comigo não o sucedeu, contudo e como tudo existem pessoas, casos de pessoas, mal formadas, em que a praxe não tem a mínima culpa, essas mesmas pessoas devem ser denunciadas e punidas pelos seus atos, contudo acredito que cada vez mais a praxe desempenha um papel importante, não só na integração mas bem como a cimentação de valores que cada vez mais são mais escassos nos nossos dias.

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De yalolyalolyalol a 24.01.2014 às 19:36

completamente de acordo!
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De ficaoquefui a 25.01.2014 às 11:29

"Enfrentamos um Enfrentamos um problema ético, social, cultural e académico de grandes proporções.e académico de grandes proporções."
Parece-me que a comunicação social, passando um jornalismo de intervenção de carteira, tem muito mais de ético!?
Passo a relembrar que artigos como estes, artigos completamente opinativos e de pouco carácter investigativo trazem o que de novo à cabeça das pessoas, para além de reforçarem uma revolta contra o traje e a tradição que a comunicação tende a reforçar de modo a encobrir?  É certo e sabido que tentam cobrir a fraca investigação do caso ou a fraca jurisdição portuguesa que impede de fazer justiça junto dos derradeiros responsáveis.
O unico "problema ético, social, cultural" a que assisto nos ultimos tempos é sem mais assunto a supremacia e domínio dos media. 
No meu tempo ver um trajado na rua era motivo de orgulho, o trajado é aquele rapaz/homem educado, com boas maneiras, que estuda e luta para poder dar algo mais ao país do que uma mera opinião consumida de frustração. Mas agora, mal pode andar de autocarro sem ser visto como um assassino.
Agora sim, podemos dizer sem orgulho que estamos em Portugal, onde o povo acredita mais no que se diz do que no que se vê.

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De John Wolf a 25.01.2014 às 14:27

Os comentários aqui reproduzidos são da exclusiva responsabilidade dos seus autores.
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De Patrícia Oliveira a 17.04.2015 às 15:32

Se acha que as TUNAS são algo mais agradável que a praxe, então claramente temos visões muito diferentes. Por onde eu passei, defendo a pés juntos A MINHA PRAXE, mas condeno todas as práticas feitas pela TUNA. Têm belissima música, mas são uns autênticos palhaços chovinistas que só querem saber da sua autoridade, não querem ensinar ninguém, não querem integrar uma pessoa que só quer aprender música: se gostares de beber, óptimo, junta-te meu camarada!. Se não gostares de beber: ou bebes ou levas com a capa.
Há visões e visões, a minha é defensiva, mas da minha praxe, do meu curso. Cada um critica o que conhece, e não se pode condenar uma coisa que só se sabe pela metade (:

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