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Sic itur ad astra

por Samuel de Paiva Pires, em 25.04.24

Passam hoje 50 anos sobre o 25 de Abril e 1 sobre a morte do meu avô, Carlos Armando de Paiva Rodrigues.

Muito poderia escrever sobre a história da vida do meu avô, que desde cedo foi pautada por difíceis provações e árduas lições que fizeram dele um grande homem. Tudo o que conseguisse reduzir a escrito, porém, não só não faria justiça à sua magnanimidade e nobreza de carácter, como desonraria a sua maneira de ser caracterizada pela reserva e discrição.

Limito-me, assim, volvido um ano sobre a sua morte, a reflectir sobre a sua importância e influência na minha própria vida. Todos os defeitos que possuo são inteiramente meus, mas o melhor de mim vem do meu avô. Tal como Marco Aurélio, também eu “Aprendi com o meu avô o carácter e a rectidão” e tive, aliás, a honra e o privilégio de com ele aprender muito mais.

Foi o meu avô quem fomentou em mim, desde muito cedo, o gosto pela leitura e o interesse pela política. Foi ele quem me iniciou na reflexão filosófica à maneira de Aristóteles, de forma peripatética, nos nossos muitos passeios em que me ensinou praticando um método dialéctico e conversacional que fácil e rapidamente atravessava vários assuntos, obrigando-me a pensar afincadamente para poder avançar como seu discípulo. Com o meu avô aprendi a distinguir os homens bons dos maus e compreendi que ser bom é ser justo, tendo o meu sentido de justiça sido gerado directamente pelo dele. Ao vê-lo lutar contra as injustiças que cometeram contra ele, compreendi as implicações práticas da afirmação de Albert Camus, em O Homem Revoltado, de que “É melhor morrer de pé do que viver de joelhos”. Devo o que sou hoje, também, à ética de trabalho de que ele sempre foi um exemplo ímpar.

Foram tantas as conversas que tivemos acerca dos mais diversos temas, que, para além de meu avô, foi o meu melhor amigo e o meu primeiro e principal mestre. Porque como também escreveu Marco Aurélio, “O aperfeiçoamento da leitura e da escrita requerem um mestre. A vida requere-o mais.” E o meu avô foi o melhor mestre que poderia ter tido.

Uma das suas mais importantes lições, transmitida ao longo de décadas, foi a respeito da morte. Ouvi-lhe frequentemente a expressão “Até amanhã, se a Providência deixar” e habituei-me a ouvi-lo ecoar a sabedoria dos clássicos gregos e romanos sobre esta questão. Praticou, no fundo, os ensinamentos de Montaigne em “Que filosofar é aprender a morrer”: “É incerto onde a morte nos espera; vamos esperá-la em todos os lugares. A premeditação da morte é a premeditação da liberdade. Quem aprendeu a morrer desaprendeu a ser escravo. Saber morrer liberta-nos de toda a sujeição e constrangimento. Não há nada de mal na vida para o homem que compreendeu bem o facto de que ser privado da vida não é um mal.”

Ao longo dos anos, ouvi-o falar recorrentemente deste tema com a naturalidade e serenidade que apenas está reservada aos grandes homens. Grandeza esta que ficou patente na hora da partida, após várias semanas de uma luta estoica que foi a maior carta de amor que o meu avô me escreveu e à Ana, a quem generosa e carinhosamente tratava por neta. Quatro dias após ter estado presente no nosso casamento, quis a Providência levá-lo na madrugada do dia 25 de Abril de 2023, em Santarém, precisamente a cidade de onde saiu a coluna de Salgueiro Maia pela qual o meu avô passou às primeiras horas da manhã do dia 25 de Abril de 1974, na Baixa de Lisboa.

Deixar-nos no Dia da Liberdade foi o último acto poético de um homem livre, bom e justo, que viveu como pensava, casando a honra com a inteligência e a justiça com a integridade, praticando o bem e evitando o mal.

Em todos os dias 25 de Abril, o meu avô saia à rua com o cravo na lapela. Hoje, por ele, pela democracia e pela liberdade, lá estarei a fazer o mesmo, na Avenida da Liberdade.

publicado às 10:16

No ano em que se celebra o 50 aniversário do 25 de Abril de 1974, o Centro de Administração e Políticas Públicas do Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas decidiu desenvolver um projecto de investigação "com o objetivo de mapear e descrever, a partir de um nível individual, como os portugueses percebem e compreendem as principais características da democracia".

A equipa responsável é liderada pelos Professores Pedro Fonseca (coordenação geral), Conceição Pequito (coordenação científica) e Manuel Meirinho (coordenação institucional).

São parceiros deste projecto a Comissão Comemorativa dos 50 anos do 25 de Abril e o jornal Público.

O website onde podem ser consultados diversos dados e recursos sobre a democracia portuguesa e no qual serão publicados os resultados da investigação já se encontra on-line.

publicado às 13:40

Capitães de Março

por John Wolf, em 23.02.24

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Foram os capitães de abril que tornaram possível a revolução de 1974. O seu descontentamento em relação ao "processo colonial" terá sido uma das razões que energizou reinvindicações mais profundas, nomeadamente o fim do Antigo Regime e a transição para um regime democrático em Portugal. Em poucas palavras, certamente insuficientes, resume-se a isto. Volvidos 50 anos, escutamos rumores de que os militares iniciarão ações de protesto após as eleições de 10 de março. Existem elementos de analogia política, económica e social que possam equiparar 1974 a 2024? Sim e não. Por um lado, a deteriorização das condições de vida dos portugueses é um factor a ter em conta — o povo não se encontra bem. De que servem todas as liberdades se as garantias no acesso à habitação e a cuidados de saúde são severamente postas em causa? Por outro lado, Portugal já não é um império colonial, mas foi colonizado. Primeiro pelas políticas definidas em Bruxelas e ainda pela febre alta do turismo que aprimorou Portugal para bem receber os estrangeiros endinheirados, deixando na sarjeta os cidadãos nacionais. No meio de este turbilhão de desavenças e desalinhamentos na capacidade de definir uma estratégia de progresso para Portugal, os militares também foram deixados na beira da estrada. Existe assim um elemento simbólico poderoso que emana da intenção dos militares, o protesto, a manifestação pensada para suceder às eleições de 10 de março. A caminho das comemorações de meio século sobre o 25 de abril de 1974, a voz dos militares não pode ser ignorada. Foram os militares de 1974 que interpretaram holisticamente o fenómeno do descalabro societário. Foram os militares que corporizaram a mudança de regime político. Foram os militares que sintetizaram e expressaram o mal estar de professores, de agricultores e de todos os trabalhadores de Portugal. As revoluções não vêm contempladas em constituições ou regulamentos, mas podem eclodir quando certos limites existenciais são postos em causa. Para bem e para mal, a reflexão que se exige em relação aos últimos cinquenta anos e às escolhas deliberadas de políticos deve ser realizada sem constrangimentos ideológicos ou sentidos de revanchismo. É uma questão de sanidade política e de visão prospectiva para um país. Capitães não há muitos, mas também podem ser de março.

publicado às 19:12

Macronóscopia

por John Wolf, em 24.04.17

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Arrisco mais uma vez com palpites sobre o resultado final das eleições presidenciais francesas. O meu track-record recente é deplorável. Enganei-me com o Brexit e estampei-me com Hillary. Ou seja, não ofereço garantias do que quer que seja. No entanto, avanço com alguns cenários conceptuais, com um modelo operativo ideológico questionável. Assumindo a vitória final de Macron devemos levar em conta o seguinte. O Emanuel tem de cantar uma parte da cantiga pop. Afinal foi mais de 20% do eleitorado que escolheu Le Pen nesta primeira ronda, e nessa medida, como em semelhante medida de um choroso socialista Fillon, Macron terá de acomodar vontades e desejos que não os seus. Nesse terreno alegadamente amorfo de centralidades ideológicas, se Macron for de facto o próximo presidente, terá de incluir uma parte da agenda patriótica de Le Pen, outra parte socialista-tributária-penalizadora de Fillon, e agradar ao firmamento financeiro de onde provém, onde fez escola na banca de investimento. O pilar de desmontagem da globalização de que se serve Le Pen não é totalmente descabido. Afinal, foi em nome da eficiência produtiva que a mesma avançou e simultaneamente cavou o fosso largo de justiça económica e social, entre abastados e nem por isso. Nesta panóplia de considerações a ter em conta, Macron formará a sua presidência numa espécie de geringonça atípica, ou, traindo os intentos enunciados, e nesta ante-câmara de derradeira campanha política, assumindo sem pudor o espaço ocupado por Le Pen. Os socorristas Fillon ou Hamon, ao fazerem-se ao piso de Macron, servem duas causas; por um lado procuram derrotar Le Pen, e por outro lado entusiasmam-se com a possibilidade de serem recrutados politicamente. Em todo o caso, devemos levar em conta que as ocorrências francesas determinarão novas ordens. No plano doméstico da nação gaulesa, mas sobretudo ao nível da arqueologia da União Europeia (UE) que ainda vive a ilusão das grandes famílias políticas europeias. Embora se sirvam com saudosismo de grandes chavões de referência e figuras abstractas, a verdade é que muitos terão de mudar de chip rapidamente. Portugal, mas sobretudo os socialistas cá do burgo, em vésperas de comemoração democrática-revolucionária, terão de encontrar figuras de referência no algo decadente quadro socialista pan-europeu - os socialistas franceses não estão disponíveis, não servem para grandes ideários. Não esqueçamos que existem muitos que desejam a eutanásia da UE, o desfalecimento endémico do projecto. Encontramo-nos sem dúvida num momento chave da história da Europa. Mas tardamos em encontrar a porta certa neste labirinto de possibilidades.

publicado às 20:38

Empêssegamento de Dilma Rousseff

por John Wolf, em 18.04.16

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Este post é dedicado àqueles que acreditam nas virtudes da democracia, na voz da maioria, no slogan "o povo é quem mais ordena", na dinâmica que deve prevalecer nas sociedades, na busca do equilíbrio social e na clarificação dos desígnios políticos dos partidos e seus agentes. Este post não é dedicado a facções ideológicas que acreditam na prerrogativa do Estado e dos orgãos públicos enquanto reguladores do mercado e da verdade. Este post é dedicado não apenas ao povo brasileiro, mas ao povo que defende Sócrates, que tanto se tem esforçado para manter a imaculada virgem. Este post é dedicado aos amantes do golpe, da conspiração e da cabala. Este post não é dedicado àqueles que desejavam que tudo ficasse como está, que tudo não fosse mexido. Este post é dedicado às almas que se sentem perdidas, baralhadas pelos mais recentes eventos capazes de devolver uma réstea de esperança a um povo suprimido pelas promessas furadas de pão e justiça para todos. Este post é dedicado a todas as offshores do mundo que contribuíram para acelerar a inevitabilidade dos acontecimentos. Este post não é dedicado a quem não acredita no voluntariado e na acção humana que não conhece género feminino ou canino. Este post é dedicado a todos aqueles que diariamente contrariam as mentes parcelares que dirigem países inteiros usando a divisa da demagogia e proveito próprio. Este post é dedicado aos pêssegos do mundo e em particular ao impeachment de Dilma Rousseff. Este post é dedicado ao sumo que extrairemos de uma matriz de conluio e decepção que tem polvilhado a paisagem política um pouco por todo o mundo. Este post é dedicado à árvore de frutos, à natureza e ao bicho da maçã. Este post é dedicado aos pesticidas e os produtos biológicos. Este post é dedilhado por tantos que não encaixam numa coisa ou outra.

publicado às 09:52

Outra lei que a Esquerda vai contestar

por John Wolf, em 16.01.16

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Quando se trata de civismo, ou a falta do mesmo, todas as leis e respectivas sanções são mais que bem-vindas. Se não vai a bem, se o comportamento de cada um não é passível de ser auto-regulado (devido a carência ética ou a pobreza de princípios), em nome da comunidade e dos seus valores de agregação, o Estado deve intervir. O sociólogo Tonnies faz a destrinça entre as forças espontâneas que asseguram a coesão dos agrupamentos humanos (comunidades) e os vectores de dispersão que obrigam ao estabelecimento de contratos para evitar a desagregação irreversível (sociedades). Neste quadro de entendimento, que cruza a etologia (estudo do comportamento animaI) com a civilização, fruto da cultura humana, das regras adoptadas, dos costumes e tradições, os legisladores cumprem uma missão polivalente. Substituem a paternidade que não soube transmitir os valores que permitem a vida colectiva e interpretam o conceito de idealismo existencial, através do qual o respeito pelo próximo estaria salvaguardado pela acção individual. A nova lei, em vigor desde janeiro de 2015, estabelece coimas para utentes que demonstrem determinadas faltas de civismo ou incomodem outros passageiros. No meu entender, o âmbito de aplicação da lei deveria ser alargado a outros espaços públicos onde os indivíduos incomodam os seus concidadãos. Não é apenas na Carris ou nos Táxis que os fenómenos de mau comportamento se registam. Já sei que qualquer tentativa de ordenamento do território comportamental deste país choca de frente com os activistas das liberdades fundamentais, os obreiros do 25 de Abril, os pais da Democracia, aqueles que acham que a sua liberdade não pode ser condicionada por o que quer que seja, os delfins intransigentes de uma Esquerda questionável, libertários do Antigo Regime - aquele pau para toda a obra da desculpabilização política e sociológica. Enfim, um espectro alargado de gente que muito provavelmente não vê mal algum num conjunto de comportamentos primários que polvilham a paisagem deste país. A saber; os telemóveis que tocam incessantemente e que são atendidos (e a conversa que se segue em voz alta em pleno concerto de música clássica no CCB); o uso da faixa de emergência na via rápida para fugir à fila demorada ocupada por condutores que respeitam o código de estrada; as escarretas lançadas à porta da entrada do hospital; as beatas atiradas da janela de um terceiro andar para o passeio já de si manchado pelos dejectos de cão alheio (coitadinhos dos animais, criem mais uma petição) ou o cliente-amigo no balcão dos Correios que não tem senha porque apenas tem uma perguntinha a colocar e não demora nada (e passa à frente do freguês). Em suma, nos transportes públicos acontece muita coisa, mas se buscarmos a objectividade na análise do fenómeno do mau comportamento, não é preciso ir muito longe. Não sei se a lei funcionará nestes domínios de ética, porque em última instância o que impera é a tese voluntarista - ou se é educado ou se procura sê-lo.

publicado às 18:22

Do melhor regime que já experimentámos

por Samuel de Paiva Pires, em 26.04.14

Como alguém que ainda não era nascido em 25 de Abril de 1974, causa-me um certo tédio assistir às recorrentes e estafadas tiradas das barricadas que competem para sacralizar os seus heróis do período revolucionário e rebaixar os heróis da barricada adversária. Claro que se compreende, já que, não só o 25 de Abril é o elemento fundacional do regime como, ainda que de diversas formas e com experiências e influências diferentes, o período revolucionário terá constituído, como se diz em estrangeiro, a principal formative experience de boa parte da população, especialmente das gerações que estão ou já estiveram no poder. Não deixa, todavia, de ser aborrecido, mas sempre é um aborrecimento de barriga cheia, bem confortável, que abona em favor do regime democrático. É que se vivêssemos nas décadas de 1820, 1830 ou 1910, as coisas seriam bem diferentes. Transitámos e consolidámos a democracia, como se diz na literatura da politologia norte-americana. Institucionalizámos o conflito, à maneira de Raymond Aron. Mas, continuando a utilizar o jargão politológico contemporâneo, já vai sendo tempo de melhorar a qualidade da democracia. "Porque, o que estava antes, e o que nos ameaça sempre, é o despotismo, conforme a clássica definição de Montesquieu (...)." 

publicado às 17:18

Binóculos de Belém

por John Wolf, em 26.04.14

Fica bem a um presidente da república fazer uso de axiomas e máximas, floreados e bonitos - especialmente em dia de cravos. Mas tenho de discordar com a largueza das suas palavras. As vistas curtas não são de desprezar em política. Uma certa dioptria ou distância focal, até pode ser muito útil. Diria mais, a imagem focada talvez seja o mais importante quando navegamos em águas turvas. O que os governantes nacionais necessitam e sem mais demoras, é de uma lupa, o ampliador das evidências que tardam em ver, reconhecer. O raio de (da) acção dos governantes deve estar totalmente condicionado pela distância curta que vai da mão para a boca dos desempregados. Um país que se encontra em falência laboral com milhões de cidadãos a passar efectivamente mal, fome, deveria, na minha opinião, merecer a resposta imediata de salvação nacional. Cavaco Silva fala como se fosse um caloiro. Ele parece não ter entendido que a matriz política nacional assenta na discordância e no conflito. A dissensão faz parte da endemia política que tem arrastado e atrasado este país sem pudor. Estes chavões de ocasião poderiam ser debitados por uma porta automática, por uma máquina de tiradas avulso. Estas frases-feitas saem da ranhura como bilhetes reciclados e ninguém lhes presta atenção. São abstracções e generalizações que não servem os tempos difíceis que o país atravessa. O que as pessoas querem são soluções concretas e não vistas panorâmicas para um horizonte longínquo, maravilhoso. O presidente da república ao servir-se de binóculos, salta por cima das dificuldades do presente, e avista uma ilha de deslumbramento, ficção política da sua criação. O tempo da cegueira terminou abruptamente, mas os actores teimam em reconhecer o seu esgotamento, a sua inutilidade no mesmo palco que calcorreiam  há décadas. Iremos assistir, nos meses que se seguem, a mais reciclagens. A outros batidos no terreno a fazer uso de provérbios do mesmo arquivo político. As comemorações do 25 de Abril servem de estágio para estes políticos de carteira gasta - proponentes apelam à matéria plantada no imaginário colectivo. São noções poderosas, ligadas ao simbolismo político, às diversas religiões ideológicas - Liberdade, Justiça e Igualdade de Oportunidades -, e outros derivados com o mesmo enfoque. Mesmo aqueles que se encontram em coma despertam condicionados por esse reflexo de Pavlov, para mais uma vez, e invariavelmente, depositarem confiança no homens que proferiram aquilo que desejavam escutar. Nada mais.

publicado às 10:18

Sei que dois e dois são quatro

por Ana Rodrigues Bidarra, em 25.04.14

 

É confrangedor perceber que nem nas celebrações dos 40 anos do momento fundacional do regime, em pleno parlamento, a oposição aplaude o Presidente da República, que é suposto ser o símbolo máximo do Estado, independente da jogatana partidária, e cujo discurso, em boa parte crítico do actual governo, poderia até ter sido proferido por alguém como Jorge Sampaio ou Mário Soares. Os republicanos e os socialistas insistem que o Presidente da República é um símbolo apartidário mas só o é quando é de Esquerda? Ele há coisas que não percebo mas vou-me indignando, como Ferreira Gullar, sabendo apenas por certo o seguinte: " Sei que dois e dois são quatro, sei que a vida vale a pena, mesmo que o pão seja caro e a liberdade, pequena."

publicado às 12:38

Paródias no Teatro D. Maria II

por Nuno Castelo-Branco, em 24.04.14

 

Têm sido mornos, estes últimos dias de regresso a um passado já muito distante. Sempre há uma ponta de interesse nas palavras de protagonistas de momentos há muito vividos e sem surpresa deparamos com uma algaraviada de ses ou ameaçadores "agarrem-me!, senão". Senão, nada. Nem outra coisa seria de esperar.

 

Em boa hora feita a maior parte da reconstrução ainda antes da queda do anterior regime, o Teatro D. Maria II tem oferecido o seu discreto esplendor dourado sobre creme, a uma série de palestras protagonizadas por algumas personalidades hoje na retraite e praticamente desconhecidas por quem ainda não tenha completado meio século de existência.

Os oradores, normalmente leitores de folhas onde escreveram pontos de vista bastas vezes de difícil compreensão para quem assista às sessões, são agora gente absolutamente anónima, mesmo para quem dispense alguma atenção às coisas da política nacional. É confrangedor o espectáculo oferecido militares que tendo sido, sem qualquer dúvida, exímios no exercício do seu dever nas frentes de combate, são contudo incapazes de convencer o mais crédulo acerca das suas capacidades na gestão dos negócios públicos. A ignorância da história implica sempre uma errónea interpretação da mesma, até daquela que por ser comummente conhecida por factual, deveria implicar uma menção incapaz de ocasionar qualquer tipo de crítica. A sensação com que ficamos é sempre a mesma: pueris jactâncias próprias de repastos na messe, corridas verbais atrás de momentos históricos que surgem agora como lendas ao sabor da mais conveniente interpretação, deliberada e quase patética apropriação daquilo que todos julgamos ser A Pátria.

 

Segundo as palavras de um contra-almirante que ontem e a meio da leitura reclamou a imperiosa necessidade de meter água, tudo lhes devemos, desde o advento da independência no século XII, até ao 5 de Outubro que contou com a mais abjecta abstenção da esmagadora maioria dos militares no activo! A conhecida e apertadíssima aliança com a Coroa, os Descobrimentos e a Expansão, são tudo coisas próprias e justificam plenamente uma condição especial, de casta.  A partir da menção do tal 5 de Outubro que não foi de forma alguma obra dos dragonados mainstream, na ora surgiram uns tantos incómodos desajeitadamente mencionados à pressa, como se a imobilidade após a tragédia do 1º de Fevereiro de 1908, as desgraças da 1ª república, o golpe de Sidónio, o 28 de Maio e todo, repito, todo o regime de Salazar, não tivessem sido da inteira responsabilidade política dos militares. Não estando em causa a abnegação com que serviram o país nos momentos em que fomos confrontados com ameaças bélicas vindas do exterior, o desempenho político dos militares é confrangedor. Nem sequer os seus interesses corporativos têm sido capazes de defender e a abolição do Serviço Militar Obrigatório consiste num exemplo desse acatar de situações pouco claras ou de discutível conveniência para a defesa do interesse nacional. É a velha questão do oportuno laissez faire dos tempos de vacas gordas, Mercedes de matrícula MX ou ME com chauffeur feijão-verde à porta, Casão Militar à disposição e em exclusividade, etc. São muito liberais! 

Passando sobre a indecente mancha que na mente de muitos ainda resiste à passagem das décadas, como a rápida quebra da disciplina, a deposição das armas sem derrota, o imiscuir na extorsão e abuso de luso-africanos em praticamente todas as parcelas do antigo Ultramar, o abandono dos seus camaradas - os tais pretos que perfaziam a metade dos efectivos e que ficaram à mercê da violência dos "outorgados vencedores"-, os negócios empresariais cujos contornos são convenientemente abafados por uma imprensa medrosa, somos agora colocados perante um punhado de iracundos coronéis de sessenta panzers Leopard e contra-almirantes de quatro fragatas e dois patrulhões oceânicos.

 

E o que dizem eles? Falam de um país passível de ficar orgulhosamente só, talvez naquele mundo ideal que funcionasse num sistema de caixinhas autárcicas e onde não existisse qualquer tipo de interdependência. Quem escute as escassamente doutas opiniões, diria ser viável reduzir Portugal à dimensão da creche onde a rotatividade na desagradável mudança de fraldas e a indicação de voluntários para o ministrar da hora da mama, consistem nas mais importantes actividades que justificam a existência da organização. E assim por diante, desde a "escola autónoma", até à "rua organizada com comissões" e vigilantes, a "fábrica cidade", o "escritório cooperativa"... Todos eles têm exaustivamente mencionado a necessidade de uma sonhada democracia directa, sem que dela ofereçam um modelo compreensível em termos de organização constitucional. Paira sempre a absoluta certeza da tentaçãozinha totalitária, a rejeição do sistema partidário e das eleições que este implica - ou seja, os portugueses são estúpidos e precisam deles, de quem ponha e disponha -, alijando-se a vontade popular para o ecoponto de coisas dispensáveis e susceptíveis de pouco ecológica co-incineração. Às estultas cabeças, talvez jamais tenha ocorrido a mais ténue ideia daquilo que é a situação de Portugal neste mundo real, de nada lhes servindo a apresentação de números ditados pela opção de um modelo de desenvolvimento que a generalidade da sociedade reclamou como urgente e do qual os próprios têm sido claros beneficiários. A dívida, o aparelho produtivo e uma situação financeira tão diversa daquela existente nos tempos da juventude dos militares d'Abril, os vários sistemas que garantem o funcionamento do aparelho estatal, "tudo isto  será coisa de fácil resolução", enfim, aquele "vamos fazer a coisa, depois logo se vê" e que por infalível regra, sai sempre muito caro àquilo que eles próprios gostam de chamar de colectividade. 

 

Já tivemos um exemplo desse "logo se vê" que agora assumem como um facto por eles consumado há quatro décadas. Uma total inépcia na condução da sociedade civil num momento de transição de um regime para outro - que nem os próprios sabiam qual seria -, uma catastrófica impreparação para o exercício da política diplomática que teria evitado a desgraça, a desonra e a vergonha em África e em Timor, a súbita queda da disciplina nas hostes que afinal não controlavam.

 

É bastante evidente, esta calamitosa impreparação destes militares formados pelo regime da 2ª república. De todos eles, dir-se-ia que apenas um daqueles antigos capitães terá lido, aprendido e evoluído. Chama-se Ramalho Eanes. 

 

Imaginemos o que sucederia a Portugal, se amanhã acordássemos com blindados e festarola uniformizada nas ruas de Lisboa. Aceitam-se alvitres. 

publicado às 18:32

A Revolução da Mónica

por John Wolf, em 23.04.14

Antes de me acusarem de me colocar em bicos de pé, de mandar bocas do alto da minha torre de mármore, que fique bem claro: sou um mero soldado raso das fileiras da análise política, da pretensa avaliação sociológica. Em Portugal os deuses entornam o caldo vezes sem conta. Dizem coisas sem avaliar com temperança o valor das afirmações. Os profissionais do sector da intelectualidade parecem não medir as implicações das suas palavras. Diz Maria Filomena Mónica: (...) "O 25 de Abril é um golpe militar e isso entristece-me. Significa que não foram os cidadãos que deitaram abaixo o regime anterior". Excelentíssima senhora doutora Mónica, ainda bem que foram os militares a levar por diante a mudança. Foi a sua disciplina e o seu sentido de missão que fez com que a Revolução de Abril fosse um banho de cravos e não um banho de sangue. No livro Guinness das revoluções os capitães de abril lideram o ranking. Nunca por esse mundo fora havíamos tido o exemplo de como se faz uma revolução sem ferir, sem matar, sem lançar em polvorosa todo um povo. Percebe-se que a senhora não esteve efectivamente presente durante este importante capítulo da história de Portugal. Na entrevista que concede, Maria Filomena Mónica poderia ter dispensado o pedantismo do doutoramento em Oxford. E ainda diz que preferia que fosse o povo a fazer a revolução. Há qualquer coisa aqui que não bate certo. Que não me convence.

publicado às 10:41

Arnaldo Matos: saiu-lhes o tiro pela culatra

por Nuno Castelo-Branco, em 22.04.14

Como seria de esperar, têm sido bastante evidentes as acções que visam um aproveitamento situacioneiro do 25 de Abril, fazendo-o coincidente com a felicidade oferecida por um próximo momento eleitoral. No caso desta rollice sob a alegada orquestral batuta do Sr. Rosas e passando sobre as minudências que a ninguém poderá estranhar, o painel que hoje esteve na mesa de oradores do Teatro D. Maria II, valeu pela presença de Arnaldo Matos. José Ribeiro e Castro dissertou sobre a evolução do sistema partidário instituído em 1974 e de Marcelo Rebelo de Sousa, apenas há a recordar dois factos: o primeiro consiste no súbito esquecimento curricular da sua condição de actualíssimo dirigente da Fundação da Casa de Bragança, quiçá uma muito oportuna atenção amiga da moderadora Flor Pedroso. O segundo, o pleno reconhecimento dos artifícios que têm sido utilizados pelo cartel partidário - os famosos 4 + 1 - para a manutenção daquilo a que normalmente se designaria de partidocracia.

Arnaldo Matos falou de história, alijando toda a aborrecida tralha de desculpas sem justificação que há umas duas gerações nos é ministrada de forma exaustivamente copiosa. O antigo dirigente do MRPP disse a verdade acerca dos muito difusos contornos do golpe de Estado de 1974 e pôs a nu a bastante discutível heroicidade daqueles capitães-panceiros que ultimamente e de forma teimosa, insistem em importunar-nos na hora das refeições. A assistência estava entre o siderada e o incomodada, sendo bastante evidente o embaraço causado pela audição de palavras que não cabiam naquele formato logicamente pré-determinado de preenche agenda laudatória.

 

As revelações do antigo dirigente maoísta, deixaram Rebelo de Sousa com um mal esgalhado sorriso afivelado à sempre desesperada procura do politicamente correcto para os senhores do poder. Doze minutos. Doze minutos foram concedidos a Arnaldo Matos, quando teria sido muitíssimo mais interessante ter sido ele o único convidado, desvendando situações desconhecidas pela imensa maioria dos portugueses. A crise que conduziu à sabotagem do reforço das guarnições militares no Ultramar; a tomada de assalto do aparelho estatal por forças em disputa e sob o controlo de militares que provavelmente muito interessados estariam em tutelá-lo num indefinidamente prolongado período temporal; o cerceamento da liberdade de expressão, claramente evidenciado pela inacreditável proibição da participação do PDC e do MRPP nas eleições constituintes; o abuso da recusa do regime em referendar actos transcendentes e de lesa-soberania nacional, como o ingresso na então CEE ou a adopção do ruinoso Euro.

 

A história mais relevante ficou por contar, reportando-se ao momento do golpe de 25 de Novembro. Durante décadas temos assistido àquilo que Arnaldo Matos bem evidenciou e que na liguagem popular se traduz na expressão "a culpa morreu solteira". Fracassada a tentativa putschista daqueles que protagonizaram o chamado Verão Quente de 1975, nessa mesma noite e de forma bastante elucidativa assistimos a uma absolvição em directo, pois Melo Antunes ressalvou o "papel essencial do PC" na consoldação da democracia. Enfim, sem jamais tal coisa ter sido formalmente reconhecida, o país ficou seguro do envolvimento daquele partido no último impulso para a prossecução dos fins a que se propunha. Se ainda poderá existir alguma dúvida, bastará aos curiosos uma sumária pesquisa nos jornais daquele momento, desde o Avante! e folhas anexas, até ao Diário de Lisboa e muitos outros. Já se julgavam senhores da situação, a meta era atingível e consideravam os demais como obstáculos ultrapassáveis pela dinâmica criada por quem se considerava experiente nestas lides revolucionárias. As emissões de rádio afinavam pelo mesmo diapasão, não esquecendo uma RTP demasiadamente colaboracionista. Quando Melo Antunes pronunciou a sentença que ficou famosa, soubemos a quem teria aproveitado o sucesso do golpe.

 

Arnaldo Matos afirmou saber quem no dia 25 de Novembro de 1975 terá solicitado asilo na embaixada checoslovaca em Lisboa. Não quererá ele saltar estas barreirinhas tão cómodas para os nossos donos, confirmando quem foi o excelso e improvável herói? Cinzas são cinzas, já não contam.

publicado às 17:30

Troika, please stay!

por John Wolf, em 22.04.14

Não sei que figura de estilo devemos escolher para explicar o significado da expressão "última avaliação da Troika". Não sei se se trata de um pleonasmo, de um eufemismo ou de uma sátira mais próxima da tragédia do que da comédia. A Troika pode ir embora, mas as avaliações são eternas. Os mercados que não arredam pé nem dormem, continuarão a exercer pressão sobre a economia nacional. Para todos os efeitos, Portugal ficará sob observação durante um período muito prolongado - décadas. De nada serve fazer publicidade à partida dos "malfeitores" estrangeiros se os "benfeitores" nacionais tardam em realizar as reformas estruturais apontadas como estando em falta pela entidade que assentou arraial em Portugal. No entanto, a estadia da Troika é coisa boa para o governo. Os argumentos apresentados pela mesma nunca seriam apresentados pela oposição liderada por Seguro. Se o secretário-geral do PS fosse intelectualmente honesto deixava-se do choradinho respeitante ao encolher do estado social e ao desaparecimento da função pública. A situação económica e social obriga os estrategas a congeminar um novo modelo de intervenção, um modo que equilibra a prestação social e a contribuição do sector privado. E esse conceito não entra na cabeça dos socialistas que ainda pensam à moda antiga. Os avaliadores da Troika não se limitam a observar. Propõem soluções e indicam medidas - muito mais do que a triste hoste de socialistas é capaz de fazer. A oposição em Portugal não passa disso. Reage, esperneia, grita e chora, mas não consegue apresentar uma alternativa de jeito. Os socialistas deveriam pedir à Troika para permanecer, e em especial se chegarem ao poder. Porque, se e quando lá chegarem, tiverem de apresentar a segunda edição de austeridade, desse modo sempre podem atribuir a culpa à Troika. Sem Troikas na casa não podem dizer que foram os outros que assaltaram a casa.

publicado às 09:32

Programa para amanhã

por Samuel de Paiva Pires, em 21.04.14

 

 

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publicado às 19:02

No Público

por Nuno Castelo-Branco, em 20.04.14

 

Vale a pena a leitura deste texto do Público. Aqui fica na íntegra, pois o jornal adquiriu o hábito de limitar o acesso online. Razões económicas, é o que se diz.

Além de alguns testemunhos que confirmam tudo aquilo que há muito sabemos - os tristes episódios protagonizados por Almeida Santos, por exemplo -, finalmente assumem-se decisões que hoje seriam consideradas como deliberados crimes: a deslocação e dispersão forçada de populações, o suprimir da cidadania nacional a uma enorme quantidade de pessoas que até ao momento dela legalmente auferiam - imaginem o que para nós, de 4ª geração, significou a "prova" de sermos portugueses! -, a entrega forçada de bens - o caso dos diamantes de particulares - e claro está, o escabroso abandono de metade do exército português que combateu em África. As Forças Armadas colaboraram nesta indelével nódoa no seu historial e já é tempo de uma pública reparação. "Eram soldados pretos" e os novos senhores do poder acharam por bem deixá-los à vingança que se confirmou na execução de muitos milhares. 
São apenas alguns aspectos a considerar entre muitos outros.

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"Chegaram em barcos e aviões num movimento que durou poucos meses. Ficaram conhecidos como os “retornados”. É meio milhão de pessoas que ajudaram a construir a democracia e o Estado social e cuja integração na metrópole é uma história de sucesso que a Revista 2 agora conta.

Meio milhão de portugueses foram integrados na sociedade portuguesa durante o período que vai do Verão de 1974 ao Verão de 1975, fruto da descolonização imposta pelo fim da ditadura do Estado Novo. É um movimento de integração populacional único que trouxe uma massa humana qualificada que contribuiu de forma decisiva para a construção do Estado democrático. Para a história ficaram conhecidos como os “retornados”. Na realidade, são a última geração de portugueses que viveram e cresceram na África colonial portuguesa.

“É um dos momentos mais extraordinários da história portuguesa do século passado, a capacidade de integrar 500 mil pessoas que chegam em poucos meses”, defende o empresário Alexandre Relvas, nascido em Luanda, para quem o movimento de integração dos retornados “correu tão bem que não é suficientemente valorizado, a sociedade portuguesa não valoriza essa capacidade enorme que teve”. Também o sociólogo Rui Pena Pires, nascido no Huambo (antiga Nova Lisboa), e autor da única grande investigação sobre o tema (Migrações e Integração. Teoria e Aplicações à Sociedade Portuguesa, Celta, 2003), sublinha que houve uma “boa integração”, uma vez que “não há marcas que se percebam”.

O sucesso de integração é identificado por Alexandre Relvas com a “extraordinária generosidade” da sociedade portuguesa e com o papel igualmente “extraordinário” que o Estado então desempenhou. Mas também a capacidade de iniciativa e de luta do conjunto de portugueses que regressaram e que trouxeram o conhecimento e a mais-valia de serem os últimos colonos portugueses em África.

“Um dos aspectos que eu valorizo fortemente é ter nascido em África, ser um dos últimos filhos do Império português e ter uma consciência forte de que isso tem consequências, que implica responsabilidades na forma como olho para o que foram os 500 anos de presença de Portugal em África”, assume Alexandre Relvas, frisando: “Somos os últimos portugueses do Império. A nossa memória é a última memória que existe do Império em África.”
Não questionando a justeza da descolonização, o empresário de espectáculo e de comunicação social Luís Montez, nascido em Luanda, sustenta que a descolonização e o regresso dos portugueses à metrópole foi um processo “duro e não foi muito justo”. Concretizando sobre Angola, considera que a descolonização devia ter sido feita “para lá ficar melhor, mas lá ficou em guerra”. Não esquecendo que “a história é o que é”, conclui: “Acho bem a independência, mas as coisas deviam ter sido feitas com mais método.”

Protagonista do poder do Estado na descolonização, António de Almeida Santos, ministro da Coordenação Interterritorial do I ao IV Governos Provisórios, de 16 de Maio de 1974 a 8 de Agosto de 1975, partilha da visão de sucesso em relação à forma como foram integrados na metrópole os portugueses vindos do então Ultramar, mas reconhece que “implicou muito sofrimento”. E sublinha que “a dificuldade criada pelos 500 mil portugueses foi um problema tão complicado para os governos dessa altura que diria que, tendo em conta o grau dessa dificuldade, o resultado final não esteve longe de ser o sucesso possível”. Mas reconhece que “é claro que foi um drama de todo o tamanho”, pois “as pessoas perderam tudo o que lá tinham, alguns eram bastante abastados”.

Sendo também um retornado de Moçambique, o ex-governante adverte que, ao ser ministro responsável pela tutela do processo e ao “não ter podido garantir” aos retornados “o direito ao que lá tinham”, tal como “nenhum outro Estado colonial garantiu”, ele mesmo tomou “a atitude de não procurar salvar nada” do que de seu deixou em Moçambique.

A excepcionalidade do sucesso da integração é um facto que tem na sua origem uma multiplicidade de causas, algumas das quais fruto dos portugueses da metrópole, outros dos próprios retornados, afirma Pena Pires, sublinhando ainda que esse sucesso foi orientado e construído pelo Estado. Foi decisiva a atitude do Governo para a assimilação daquela que é a maior deslocação de populações na Europa no século XX. “Mesmo no pós-II Guerra Mundial, o repatriamento é de 2% a 3%, nenhum foi percentualmente tão grande”, lembra Pena Pires, exemplificando que “o Reino Unido tinha um Império maior e teve 500 mil também, sendo que a maioria foi para os Estados Unidos”, enquanto “em Portugal, poucos foram para o Brasil e os que foram, na sua maioria, fazem-no com carácter transitório, para depois virem para cá”.

Fazendo a comparação com “o caso mais parecido”, que é, nos anos 60 do século XX, o da integração dos pieds-noirs, os colonos franceses que regressaram a França após a descolonização da Argélia e outras colónias francófonas, sob o Governo de De Gaulle, Pena Pires salienta que há diferenças fulcrais: “A sociedade francesa estava estabilizada, por isso, surgem sindicatos e o movimento pied-noir.”

Ora foi a noção de que os pieds-noirs eram em si um movimento de segregação que se prolongou e dificultou a assimilação que em Portugal houve cuidado para não repetir erros. “O comissário para os Desalojados pôs como condição ir a França ver o processo dos pieds-noirs” e os responsáveis com quem se encontrou “aconselharam a dispersão e assumiram que um erro francês tinha sido a concentração em Marselha” das populações coloniais vindas da Argélia, refere Pena Pires.

Outra decisão que teve como referência os pieds-noirs foi a questão das indemnizações. Em Portugal foram poucos os “tinhas”, ou seja, aqueles que lamentavam o que tinham perdido (recorrendo à expressão “eu tinha”) — “eram minoritários e pejorativamente designados” pelos próprios retornados. “Em França, as indemnizações são centrais, cá não se falou nisso” — uma atitude do Estado que “foi premeditada e inteligente, porque enquanto as pessoas estiverem direccionadas para o que perderam ficam ligadas a isso e não se identificam com o resto”, afirma o sociólogo.

Houve assim uma política de integração dirigida pelo Governo que passou por medidas legislativas. Pena Pires refere que “Almeida Santos fez as leis que deram ao retornado um estatuto legal”. À cabeça refere a lei da nacionalidade, que anteriormente e de acordo com as concepções do Estado Novo previa que “todos os nascidos em solo português eram portugueses”. A decisão de Almeida Santos é a de fechar o acesso à condição de português. Para o conseguir, retira o direito à “nacionalidade portuguesa a muitos dos nascidos nas colónias antes da independência, se não tivessem ascendentes até à segunda geração no continente. É isso que distingue os retornados dos imigrantes que vieram então e depois”.

Paula Teixeira da Cruz, nascida em Luanda, critica a opção restritiva da lei da nacionalidade. “Deveria haver liberdade de opção, não gosto de restrições de liberdade”, diz a actual ministra da Justiça, que adverte: “Ainda ontem [entrevista feita a 26 de Fevereiro] resolvi questões relacionadas com a nacionalidade de uma senhora, e há muitas por resolver.” Não se revendo no argumento de que haveria mais de um milhão de pessoas para integrar, Paula Teixeira da Cruz afirma que “também se dizia que era impossível absorver 500 mil”. E lembra que muitos habitantes do Império colonial de origem africana vieram para Portugal continental sem verem reconhecido o seu direito a serem portugueses: “Houve pessoas que ficaram prejudicadas. Havia essa responsabilidade moral. Quando Portugal colonizou, não perguntou se podia entrar.”
Almeida Santos assume que a decisão foi deliberada. “Era tudo português. Mário Soares e Vasco Gonçalves pediram-me uma lei generosa. Respondi: ‘Não faço.’” E argumenta: “Só tinha nacionalidade quem pelo menos era bisneto de português pelo nascimento. Senão o país ia ao fundo.”

Tomou como referência o caso inglês. “A lei da nacionalidade inglesa [quando da independência da Índia em 1947] foi generosa de mais e Londres tornou-se a capital mais indiana”, o que fez com que a lei fosse revogada pouco depois. A estratégia em Portugal foi, segundo o seu autor, a de dar nacionalidade “só a alguns e evitar que viessem todos”, pois “metade do Exército, por exemplo, era africano, e esses soldados queriam ficar com a identidade portuguesa para não serem perseguidos por terem sido do Exército português”. Os que vieram e não conseguiram provar que tinham ascendência na metrópole até à segunda geração ficaram, assim, como imigrantes.

O sucesso da integração é, segundo o antigo ministro, potenciado pela rapidez com que teve de ser feito. Uma rapidez que foi motivada pela descolonização negociada pelo Governo português com os movimentos de libertação das então colónias, e mediante a dificuldade de garantir novas incorporação de novos militares.

É essa rapidez em sair de África que é ainda hoje questionada. Alexandre Relvas afirma mesmo que “sem pensar em pôr em causa a independência” dos novos Países de Língua Oficial Portuguesa, o que mais questiona na descolonização “é que ela devia ter sido tratada de outra forma política, não se pensou na história de 500 anos”. E sublinha: “Não me vejo circunstancialmente lá, os meus avós foram para lá, os meus pais nasceram lá. As negociações deviam ter tido essa noção histórica. As Forças Armadas, com enorme responsabilidade, não estiveram à altura. Foi a despachar o mais rapidamente possível.”

Almeida Santos procura explicar os motivos da urgência em descolonizar. “Sempre compreendi as críticas fortes à concreta descolonização conseguida, mas quem faz essas críticas nem sempre teve conhecimento dos factores que dificultaram e sujeitaram a uma enorme pressão temporal a necessidade de descolonizar depressa.”

E sublinha que “a guerra tinha durado dez anos em três frentes. Morreu muita gente e muita também ficou estropiada. Isso imprimiu uma urgência à necessidade de fazer a paz”. Até porque “o Exército português, que nunca compreendeu muito bem as causas daquela guerra, a partir do 25 de Abril passou a defender e a pressionar a urgência da paz”. Para concluir: “Daí que sempre tenho compreendido as críticas fortes à descolonização, incluindo à minha participação nela, mas nunca essas críticas me criaram um problema de consciência.”

Para muitos que fizeram parte da descolonização, foi um processo feito à pressa e de forma leviana. Mas também reconhecem que foi, de facto, uma história de sucesso e um processo único.

Muito desse sucesso deveu-se à forma como foi feita a monotorização pelo Estado. Uma das principais ferramentas foi a integração de 45 mil funcionários públicos coloniais na administração do Estado do Portugal democrático, através do “quadro geral e adidos”.

Mas também houve por vezes “soluções surpreendentes” e pouco institucionais. Refere Pena Pires que os portugueses “só podiam trazer 15 contos”, pelo que, em Angola, “muitos compraram diamantes e trouxeram”. A certa altura, “Lisboa estava em risco de ser considerada um centro de venda clandestina de diamantes, e Almeida Santos, por decreto, deu dois meses para os diamantes serem entregues na Sociedade Portuguesa de Diamantes”.

Almeida Santos reconhece que a gestão governativa do processo de descolonização e de retorno dos portugueses foi feita de uma forma que potenciasse a integração e beneficiasse o desenvolvimento económico de Portugal. Explica, por exemplo, que a decisão de colocar os retornados que não tinham família nem habitação em hotéis teve que ver com a dinamização económica: “Nessa altura, os hotéis estavam vazios, o turismo paralisou com a revolução. Aproveitei os hotéis e pensões para alojar as pessoas.”

A monitorização foi feita pelo então criado órgão de supervisão, o Instituto de Apoio ao Retorno de Nacionais (IARN). “Criámos um organismo destinado a apoiar economicamente os retornados e esse apoio, que não foi tão significativo como desejávamos, não deixou de ter algum significado”, diz Almeida Santos. O antigo ministro sublinha que, “de um modo geral, os retornados regressaram com uma experiência económica talvez superior à média dos portugueses do continente, de tal maneira que a partir de certo momento foram tantas as novas unidades empresariais, algumas delas na área do comércio, da agricultura e da pecuária e da hospedagem, que passou a haver produção a mais e consumo a menos para algumas espécies pecuárias, como o peru”.
Houve também medidas de discriminação positiva, como foi o crédito conhecido pelo nome da comissão que o geria, o CIFRE, “um crédito especial para retornados, que atingiu 18 milhões de contos” e que provinha de “doações internacionais do Governo sueco”. Um crédito que apesar de tudo não favorecia especialmente os beneficiários, já que tinham de apresentar projectos sólidos e viáveis, pois “os projectos eram aprovados pelos bancos privados através dos quais o crédito era distribuído”.

Outra preocupação que é identificável no comportamento do Governo de então é a de que as medidas contribuíssem para não criar irritação nas populações metropolitanas. “Foi pequena a reacção, porque a ajuda do Estado foi pouca e todos tinham um retornado na família”, explica Pena Pires. Por seu lado, Almeida Santos salienta que “o povo português do continente foi heróico na atitude com que se solidarizou com os familiares ou simples conhecidos regressados das ex-colónias praticamente de mãos vazias.”

O que é facto é que há um contraste entre o que é a memória do sofrimento pessoal e o reconhecimento à distância histórica do sucesso global da integração. O basquetebolista Carlos Lisboa, nascido em 1958, na Cidade da Praia, em Cabo Verde, e que, em 1961, foi para Moçambique, lembra que “a palavra retornado era, na altura, demasiado agressiva”, e sublinha que “houve famílias que passaram maus bocados, principalmente as que vieram de Angola a fugir à guerra”, além de que “havia famílias que tinham mais dificuldades porque não tinham ligações profissionais a entidades estatais”.
Por muito que seja o sucesso global da integração dos retornados, de acordo com os entrevistados neste trabalho e de acordo com o estudo académico de Pena Pires, o lado negativo do processo de descolonização e o que implicou na ruptura da vida de meio milhão de pessoas é lembrado pelos que a viveram. A cineasta Margarida Cardoso, filha do oficial da Força Aérea Adelino Cardoso, que em 1965 foi colocado em Moçambique, sublinha que a descolonização representou “uma revolução e que houve pessoas que deixaram a sua vida”. Estas “criaram um movimento bom na sociedade para Portugal, conseguiram superar dificuldades e fizeram negócios, reconstruíram a vida”, frisa, mas adverte que “isso não faz esquecer que as pessoas deixaram lá a sua vida de uma forma injusta. Para Portugal, foi bom mas à custa de muito sofrimento das pessoas”.

Margarida Cardoso conclui sobre o lado mais dramático e pessoal da descolonização: “Não sou nostálgica, mas o empurrar as coisas, ver as nossas mobílias a ir para os barcos, marca. Pensaram que iam ter um lugar na sociedade, que não tiveram. A História é assim, é má e injusta. Há um trauma interno que é hereditário, que passa de pais para filhos. É uma mágoa que não passa, que não está resolvida.”

Uma experiência traumática que em muitos casos deixou marcas para a vida. “Leva a que muitos pensem que isto não é a terra deles, há um desprendimento, ainda que com percepções diversas. Eu, emocionalmente, continuo a ter uma coisa difusa, não era de lá, nem sou daqui”, confessa a cineasta.

O sentimento de não pertença é partilhado igualmente pelo escritor Valter Hugo Mãe, nascido em Saurimo (antiga Henrique de Carvalho), na Lunda Sul, no Norte de Angola. “Sinceramente, genuinamente, tenho dificuldade em lidar com os que desprezam a magnificência de África, mas também com aqueles que dizem a palavra África e choram e têm associações e objectos. Estou entre as duas coisas. Tenho dificuldade em dizer que não sou angolano, mas não posso falsear quem sou, não posso de repente ser mais angolano do que sou”, reconhece.

O escritor não hesita mesmo em assumir como a sua condição de retornado foi pessoalmente traumática. O pai foi um antigo militar que ficou em Angola como funcionário do Banco Nacional Ultramarino. Estava de licença, em Lisboa, quando se deu o 25 de Abril. “Ficámos cá, perdemos todas as coisas, a relação saudosista é feita pelos meus pais de forma magoada.” E explica: “Cresci com a percepção de que era nascido em África, mas nada em nossa casa contava aquela história. Percebi que era retornado com o preconceito em relação a mim. Por exemplo, uma empregada na escola primária dizia que os meus pais tinham vindo ocupar empregos e dava-me menos leite. De princípio, pensei que fosse eu um miúdo esquisito. Ela dizia que as mulheres em Angola tinham os filhos como as galinhas, punham ovos. E chamavam-me preto. Conscientemente, não tinha visto uma pessoa africana. Quando tinha oito anos, um miúdo disse-me que a tia tinha vindo de Angola e que o filho era escuro. Eu perguntei à minha mãe se ia escurecer, porque se escurecesse podia ser melhor.”
Esta discriminação em relação aos retornados é salientada por Paula Teixeira da Cruz. Embora garanta não ter tido “nenhuma dificuldade de integração”, pois a família em Luanda “periodicamente discutia o regresso” — que foi preparado previamente pelo pai”, permitindo que a sua família não passasse “por um processo de reconstrução material” —, a ministra assume que viveu “uma reconstrução emocional muito difícil”.

E afirma que acompanhou “muitos” processos complicados de sofrimento quando fez voluntariado, no Campo do Inatel, na Costa de Caparica, um dos campos que acolheu retornados. “Houve pessoas em campos, houve pessoas que foram para o interior e desenvolveram projectos, não podemos esquecer o sofrimento de cada um, foi um mudar completo de vida, um sofrimento cultural, um sofrimento de perda, foi uma experiência emocionalmente traumática.” A que se somou ainda “um anátema, que era o retornado que, por natureza, tinha de ser fascista”.

O biólogo e especialista internacional em morcegos Jorge Palmeirim nasceu na Guiné e viveu com a família em Moçambique e em Angola. Em 1974 veio para se instalar com a família, num total de sete pessoas, numa tenda de campismo gigante num terreno no Carrasqueiro, em Sesimbra, que era de uma avó. Também ele recorda que “havia uma tensão muito grande entre retornados e os portugueses” da metrópole e “havia a sensação de ter a vida desmoronada”. Este cientista sustenta mesmo que se mostrou a “face de uma esquerda cega, as pessoas pensavam que os retornados eram coloniais e fascistas”, enquanto “os retornados viam a sociedade portuguesa como responsável pelo desmoronamento das suas vidas”. Exemplificando: “Eu, nessa altura, andava com um emblema que dizia Angola. Agradava-me irritar as pessoas, era uma afirmação da minha identidade.”
Jorge Palmerim defende que “a maior parte dos retornados, na primeira fase, se deu mal, mas que depois se integraram”. E também ele salienta que “Portugal tem uma capacidade de integração fantástica, ao contrário dos pieds-noirs em França que levaram décadas a adaptar-se”. Em Portugal, sublinha, “três ou quatro anos depois, os retornados tinham conseguido integrar-se, o que é quase um milagre, integrou-se meio milhão de pessoas, também porque essas pessoas foram capazes de construir as suas vidas, abriram lojas, fizeram negócios, foram para as suas terras”.

O jornalista Emídio Rangel, nascido em Lobango (antiga Sá da Bandeira), em Angola, afirma que “a integração é uma história de sucesso”, porque, por exemplo em Angola, havia “uma aprendizagem em que as pessoas que tivessem capacidade se evidenciavam, conseguiam ter sucesso”. Por outro lado, salienta que com a revolução houve “uma paralisação da actividade económica” na metrópole que “beneficiou com a chegada de elementos que na região A ou na região B se propunham fazer iniciativas com sucesso”. Essa atitude “criou um clima que ajudou o país a desenvolver-se”, afirma, recordando que essa realidade foi divulgada, nos anos 1980, pelo “trabalho jornalístico do Fernando Dacosta n’O Jornal, que mostrou como as regiões se foram modificando por acção dos retornados”.

A integração dos retornados “teve um impacto muito grande no interior, que estava paralisado”, diz Pena Pires, mas ela foi potenciada pelo contexto revolucionário: “Eles mudarem para um país em mudança, o que facilitou a integração.” Há então um espírito de recomeço que Paula Teixeira da Cruz sintetiza ao dizer: “Importa que para quase todos era preciso começar de novo, o ter de começar de novo obriga a ter de inventar um novo espaço de intervenção. Lembro-me de ver nascer gelatarias abertas por retornados pelo país. Foi um movimento que renovou o tecido técnico e económico.”

Um dos exemplos desse espírito de iniciativa é a vivência da família de Tomaz Morais, presidente da Federação de Râguebi, seleccionador e treinador nacional de 2001 a 2010, campeão nacional e ibérico, nascido no Huambo (antiga Nova Lisboa). “Foi tudo muito rápido. O meu pai tinha uma posição forte na Fina, a empresa dos petróleos, e ele não podia sair de África. Nós estávamos no Lobito. Em 1975, a guerra pressiona e o meu pai começou a ser perseguido. Fugimos de um dia para o outro do Lobito para Luanda de traineira”, lembra, prosseguindo: “O meu pai foi à Bélgica, mas não conseguiu manter a situação na Fina, pois não estava disponível para voltar a Angola. Achou ofensiva essa exigência e deixou a Fina. Tentou o Brasil, não achou acolhedor. Veio para Portugal e com o meu tio Eduardo Salvação Barreto, que é pintor, abriu um take-away em 1976. O negócio envolveu a família. Todos tínhamos uma tarefa. Eu tinha seis anos e andava na rua a fazer recados. Era um projecto de sobrevivência.”

Muitas das pessoas que vieram contaram com a rede familiar de apoios ou com a solidariedade da sociedade, para além do Estado. “A capacidade extraordinária é do cidadão anónimo, como actualmente. É o avô, é o irmão, é o pai, é o tio, que dá uma mão, que dá um apoio financeiro, que ajuda a encontrar casa, que ajuda durante um período, e isso foi extraordinariamente marcante nesse tempo. E é tão extraordinário o que se passou que nem nós valorizamos, é como se fosse normal, é normal neste país ser-se solidário”, defende Alexandre Relvas.
E insiste: “Há uma coisa notável, a capacidade deste país de evoluir em termos sociais com a brutalidade com que é confrontado. A resposta que as pessoas dão ainda hoje ao desemprego, tal como na altura a forma como é assimilado meio milhão de portugueses, a capacidade de organizar as pontes aéreas, de instalar as pessoas em hotéis, que é uma capacidade do Estado, mas não só do Estado.”

É esse carácter de proximidade familiar e de solidariedade que é uma das razões do sucesso da integração dos retornados. Do meio milhar de portugueses que veio, “metade ficou na região que equivale hoje à Área Metropolitana de Lisboa”, e concentraram-se também bastante no Nordeste transmontano, explica Pena Pires. Apesar desta concentração tendencial, a “integração portuguesa é pulverizada”, porque a colonização tinha sido feita de “emigração recente” e assim “a maioria dos retornados vai para concelhos onde nasceram ou onde nasceram os pais ou os avós. Só os alentejanos não vão para a terra de origem e vão para Setúbal, que é para onde no século XX emigram os alentejanos”.

Outro factor decisivo foi a alta qualificação dos retornados. “No início da democratização, os retornados estavam em desvantagem quanto ao património, mas em vantagem nas qualificações”, afirma Pena Pires. “A ideia de que agora, pela primeira vez, há emigração muito qualificada não é verdade, as colónias eram o destino da emigração mais qualificada. Não era preciso mão-de-obra barata, havia isso lá, havia o colonialismo, por isso a população branca nas colónias era mais qualificada percentualmente do que na metrópole”, sublinha este sociólogo.

Do estudo que efectuou concluiu que, segundo os dados do Censos de 1981, “cerca um terço dos adultos com mais de 30 anos eram analfabetos”. No total da população de Portugal, os analfabetos eram 28,3%, enquanto 35,4% tinham a primária. Já os licenciados atingem 11% entre os retornados, mas apenas havia 2,3% de licenciados na população de origem metropolitana. Esta alta qualificação, em conjunto com a “convulsão política”, facilita que as pessoas que chegam aproveitem o facto de não haver “hierarquias estabilizadas” para ascenderem e se afirmarem socialmente.

Por outro lado, é esta população altamente qualificada, que está disponível e desejosa de se integrar, de encontrar o seu novo espaço, que permite “a expansão do Estado social, que foi facilitada pela vinda dos retornados altamente qualificados”, sustenta Pena Pires: “O Estado social pôde ser construído rapidamente porque havia uma reserva de professores e de médicos vindos de África.” O próprio crescimento do ensino universitário beneficiou, pois “os estudantes retornados não entram nas universidades clássicas, vão ocupar as universidades que estavam em formação fundadas pelo ministro Veiga Simão”, explica Pena Pires. Ou seja, o fenómeno dos retornados teve um peso específico na construção do Estado democrático. E embora reconheça que “já foi maior o peso dos retornados” na sociedade portuguesa, Pena Pires sublinha que “hoje são os filhos que têm peso e o terem vivido lá não é indiferente para explicar o seu percurso”.

Todos os aspectos da sociedade portuguesa foram atingidos por este fenómeno, incluindo a construção da democracia política. A integração dos retornados no sistema político geral “esvaziou a criação de movimentos de retornados, porque os que podiam preencher a liderança desses movimentos estavam ocupados noutros lugares” de liderança política. No plano autárquico, “foi grande a sua influência”. Isto porque “os retornados, sobretudo a norte, podem candidatar-se politicamente porque não há líderes”, frisa Pena Pires. “O ser de fora ajudou a fazer carreira política. A direita tinha pessoas muito conotadas com o fascismo.”

Este sociólogo relata que no inquérito que fez para o seu estudo “aos titulares das câmaras, no início dos anos 1980, 8% deles eram retornados”. Candidataram-se e foram eleitos pelo CDS e depois pelo PSD. “Pelo CDS cumpriam um mandato, depois candidatavam-se pelo PSD.” A sua opinião político-partidária “era mais contra a esquerda, marcada pela descolonização, eram contra Mário Soares, que era olhado como quem traiu.”

O facto de ocuparem o espaço político-partidário à direita contrastava com a abertura das suas posições em questões de costumes e civilizacionais. “Eram, por exemplo, a favor da despenalização do aborto, sei porque os interroguei na altura do primeiro debate [sobre despenalização em 1982] e eles eram favoráveis, tinham uma mentalidade mais liberal”, explica Pena Pires, que usa a sua própria experiência para exemplificar. “Eu vivi no Huambo e depois em Luanda, a vida era mais liberal, os liceus eram mistos, não tinham muros”, conta, prosseguindo: “Os funcionários públicos tinham férias graciosas. Fiz o primeiro período do 5.º ano do liceu no Porto, no Liceu Alexandre Herculano, e tive um choque, eu fui olhado como o terrorista que saltava os muros. Essa liberdade de vida marca a personalidade e a opinião sobre casos como o aborto.”

A diferença de mentalidade entre quem veio de África e quem vivia nas colónias era de um contraste imenso. O empresário Luís Montez não hesita em dizer: “O retorno foi notável. Sinto gosto de ter vindo de Angola, também para abrir a cabeça às pessoas, que atrofiavam. A sociedade portuguesa é mesquinha e pequena. Como já perdi tudo, se calhar sou mais atrevido. O essencial é ter princípios e educação, isso ninguém nos tira, agora perder o Mercedes e a casa na praia, arranja-se de novo mais tarde.”

A diferença de mentalidades e a abertura de espírito levavam a um maior liberalismo político. Emídio Rangel sublinha que “a democratização começa com as pessoas com formação, o que lhes permitiu entrar na discussão e serem elementos úteis”. E Alexandre Relvas lembra que “as pessoas que viviam em África sabiam dos movimentos de libertação, os que eram de segunda e terceira geração conheciam a situação, tinham feito o liceu com a geração de nacionalistas, não se conhecia Agostinho Neto, mas conheciam-se os primos”.
Também Paula Teixeira da Cruz depõe no mesmo sentido. “Em minha casa discutia-se política, trazia-se livros de fora, eu tinha mesada para comprar livros na Livraria São Luís [em Luanda], não havia limitações. Essa vivência cultural era extremamente importante. Li o primeiro livro de Marx aos 13 anos no liceu. Havia em Angola uma discussão que do ponto de vista cultural não havia aqui. Era uma mentalidade mais aberta. Havia PIDE mas havia debate.”

A actual ministra da Justiça cita mesmo a diferença de costumes e de mentalidade que transparece no quotidiano e no vestuário. “Lembro-me de vir de férias e sentir um país muito mais escuro e mais limitado, até na forma como as pessoas se vestiam.” Também Margarida Cardoso sorri ao lembrar: “Quem vivia em África tinha hábitos de roupa com cores, padrões, quadrados. Éramos apontados como vindos das colónias por causa das roupas.”

Já Carlos Lisboa sustenta que “as pessoas que viveram em África têm uma mentalidade diferente, pelo tipo de vida, por terem melhores condições de vida, tinham uma relação diferente com os outros”. E exemplifica: “O relacionamento com amigos em África deu-me uma visão de estar em grupo, de partilhar emoções, a vida colectiva era mais intensa.”

Por seu lado, Tomaz Morais garante: “O espírito alegre e de convívio tem que ver com as pequenas vitórias que vamos alcançando. Vejo isso em nós e nos meus primos. Foi a estrutura que ganhámos. Não há grandes egoísmos, há muito sentido de partilha e somos batalhadores por natureza.” E atribui essa característica à vivência africana: “Isto tem que ver com a vida em África. Nós vivíamos de portas abertas, os amigos entravam e saíam, eram quase irmãos. Chocou-me que cá era diferente, era fechado. A minha mãe diz que isso é de África, as pessoas eram optimistas por natureza e isso foi muito importante para a reintegração. A capacidade de liderança e o espírito de missão que os portugueses tinham em África trouxeram quando voltaram.”

Alexandre Relvas vai mais longe e afirma que o sucesso da integração dos retornados se deve à “própria personalidade portuguesa”. E explica: “Nós integramo-nos e sentimo-nos bem onde estamos, fazemos do mundo onde passamos a estar o nosso mundo com uma enorme facilidade, é este sentimento que me levou a integrar aqui, que levou o meu avô a integrar-se em África e que levou os avós de milhares de portugueses a integrarem-se bem e a viverem felizes em África.”

publicado às 19:46

A memória de Abril

por João Quaresma, em 17.04.14

«Património tanto individual como colectivo, a memória constitui a seiva das civilizações, pois sem ela "não há pensamento, sem pensamento não há ideias, sem ideias não há futuro", repetia, insistia Natália Correia, uma das figuras que mais se bateram pela sua dignificação.

Significando conhecimento, a memória pressupõe capacidade crítica e intervenção, o que incomoda todos os poderes, sejam eles ditatoriais sejam democráticos, de direita ou de esquerda, nucleares ou periféricos.

As ditaduras tentam controlá-la pela censura, pela violência; as democracias pela inflação dela até imporem, através da propaganda, da sedução, a que mais lhes convém. O objectivo é, porém, o mesmo: arrancar a memória que somamos (individual, colectiva, cultural, identitária) e substituí-la por outra única, inquestionável.

Daí os políticos, os intelectuais, os comentadores do regime se comportarem como se o país tivesse nascido com eles, esvaziando-o de quase mil anos de existência»

 

Fernando Dacosta, hoje no Jornal I

publicado às 16:15

Os inquéritos de opinião, as sondagens e as estatísticas são primos da mesma distorção. É possível, se assim o desejarmos, fabricar resultados e influenciar juízos e percepções. Provavelmente o que resulta deste estudo não andará longe da verdade, mas, na minha opinião, para se comparar a qualidade de vida registada no antigo regime com a do pós-25 de Abril, os únicos que poderão cabalmente responder a esta pergunta já estarão mortos e enterrados. Ou seja, descartemos o que pensam ou deixam de pensar os que se encontram na faixa etária dos 18 aos 34 anos. Esses indivíduos nem sequer eram espermatozóides antes de 1974 - nem sequer sonhavam com a sua própria existência. São dispensáveis para efeitos deste estudo. Quem deveria ser consultado (em dia de visita ao lar de terceira idade), são aqueles cidadãos que efectivamente viveram quarenta anos sob um regime autoritário e outros tantos sob o sol democrática. Esses séniores é que têm autoridade para fazer o boneco de uma coisa e de outra. Os outros têm umas noções e formaram juízos a partir de estudos como estes. Os factos palpáveis na primeira pessoa são escassos. Os sobreviventes de Salazar serão os únicos com credibilidade estatística para avançar com respostas. No entanto, pela amostragem e método empregue na recolha de informação, provavelmente não haveria muito sucesso nas entrevistas telefónicas realizadas aos visados com mais de 100 anos de idade. A probabilidade de serem cegos, surdos (e mudos) é, de facto, muito elevada. Dito de outro modo, não se pode comparar cravos com bugalhos, pelo menos deste modo cru e insonso. Há que cozinhar as percepções com ingredientes de qualidade. 

publicado às 07:41

a pátria
os camões
os aviões
e os gagos-coutinhos
coitadinhos [...]
Mário-Henrique Leiria

 

É verdeiramente epidémica a apologética que grassa entre a sociedade portuguesa pedindo o regresso de um Salazar. O que é notável nas vésperas de mais um 25 de Abril! Já não se trata, apenas, de uma conversa entre velhas alcoviteiras de autocarro ou reformados que jogam a bisca no jardim, mas de uma autêntica histeria que cresce progressivamente de dia para dia em blogues, jornais e espaços públicos. Salazar é que faz falta, dizem e escrevem. Impressiona como a memória não é só curta, mas ingrata. Gente que grita insultos gratuitos nos fóruns e nos jornais contra os políticos actuais, resguardando-se na figura do inviolável, casto e probo Salazar - como é possível se afinal estes são o produto daquele?

Tudo isto é tolice, como é óbvio. Quem viveu durante o Estado Novo sabe perfeitamente que aquilo não era mau, era péssimo. Até posso compreender a nostalgia de infância, o colorido dos brinquedos de lata, as brincadeiras junto ao lavadouro enquanto a mãe esfregava os lençóis de estopa - pobre mulher que, chegando a casa encontrava provavelmente um marido analfabeto e, tendo sorte, sóbrio. A maioria que clama pelo regresso desta austeridade, queixando-se da de hoje é ainda desta geração que rapidamente esqueceu as limitações (ou então não) de um país de brutos, em que o marido punha os olhos no chão quando falava ao patrão e a mulher pouco mais personalidade tinha do que um saco de batatas atilhado por uma Constituição nada favorável.

Por outro lado, para a classe alta (aquela que bajulou Salazar até ao tutano), constituída por labregos burgueses e aristocratas falidos os tempos deviam ter sido de glória e até podem ter razões para querer o regresso daquele regime catolaico, de recato público e deboche privado. Em todo o caso, não deixa de ser uma incongruência que num mundo em que se ganha dinheiro com a exploração do cidadão global se queira fechar num país orgulhosamente só. Só posso compreendê-lo à luz do estatuto e daquela noção de respeito que faz o tópico da conversa salazarista: antes do 25 de Abril é que era!. Era o quê? Não se roubava? Ninguém morria? Não se mentia? Não havia clientelismo? A política era sã e filantrópica? Poupem-me.

Salazar era um misógino ressabiado, filho de caseiros que viveu entre hortas e quis aplicar este modelo de ordenamento de quintal de Santa Comba ao resto país. Criou a ideia do doutor formado a pulso que degenerou numa coisa sem espinha dorsal nem ossos chamada boy do partido. Provinciano, o senhor Presidente do Conselho, achava que o país era um imenso potencial de força braçal movido a vinho. E, estupendamente beato e cínico, julgava os seus amigos pelas aparências, cumulando-os de prebendas em troca de silêncio e lealdade hipócrita. Salazar é o pai desta gente que construiu a III república: medíocre, saída dos bancos de escola estado novistas, da cartilha do Deus, Pátria e Família, do pobrete mas alegrete. Estes dizem repudiá-lo. Muitos gritam fascismo nunca mais, mas entregue-se-lhe o facho nas mãos e verão o mesmo modus operandi, os mesmo tiques e desejos. E isto não é sequer uma questão de democracia ou ausência dela. Efectivamente não tivemos um estado fascista, mas tivemos com certeza um regime que estimulava a mediania ou a inferioridade, em troca de valores inócuos. E isso é transveral na nossa política, da Esquerda à Direita.

A única coisa verdadeiramente trágica não é brincar à liberdade de ano em ano pelo 25 de Abril (ainda assim perdendo tempo precioso a não habituar-se a ela) nisto tudo o que é verdadeiramente tenebroso é que o Salazar-Cronos, na hora de tragar os filhos, morreu. E as crianças, hoje com 40 anos, estão aí a brincar aos cravos...

publicado às 21:36

Instituto Libera Ratio

por Samuel de Paiva Pires, em 06.04.14

Num ano em que se celebram os 40 anos da Revolução dos Cravos, quando, de acordo com o estabelecido com a troika, se finalizará a 3.ª intervenção financeira externa da III República e quando se aproximam as eleições europeias, um grupo de jovens decidiu promover e desenvolver um espaço de pensamento, reflexão e formação política norteado pelos valores do conservadorismo, democracia cristã e liberalismo. Este terá o nome de Instituto Libera Ratio (ILR) e realizará a sua apresentação pública no dia 22 de Abril, pelas 18h, no auditório do piso 1 do Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas da Universidade de Lisboa.

 

Após a sessão de apresentação pública seguir-se-á uma conferência subordinada à temática "Os 40 anos do 25 de Abril e os desafios que Portugal enfrenta", que terá como oradores convidados o Professor Doutor José Adelino Maltez, o Professor Doutor João César das Neves e o Dr. José Manuel Fernandes.

 

publicado às 22:34

Auto-indulto de Cavaco Silva

por John Wolf, em 05.12.13

Faz parte da tradição natalícia e em nome dos mais dignos valores da humanidade, o presidente da república fazer uso de uma das suas prerrogativas. Assim sendo, à medida que se aproxima a época do perdão e da compaixão, um assinalável número de processos são colocados sobre a mesa comprida da sala de juntar de Belém. Os processos-crime aterram na presidência com a esperança de serem analisados e obliterados do sistema de justiça. E os sentenciados regressam consolados a casa a tempo da consoada. Muito bandido condenado e residente atrás das grades, já está a esfregar as mãos para ver se lhe sai a fava da dispensa antecipada. O indulto, funciona assim como um mata-borrão, uma apagador de ardósia gasta, para dar uma segunda chance aos prevaricadores. Nestes últimos tempos, Cavaco reinterpretou o significado e âmbito do conceito de indulto, para aplicar indultos sucessivos ao governo da república e fora da época festiva. Têm sido tantas as situações em que Cavaco Silva vira a cara, para não ver as borradas. O indulto deixou de ser uma excepção. O indulto, nos termos em que disserto, tem a ver com a desculpa em demasia praticada pelo chefe de Estado. São tantas as situações políticas que exigiriam precisamente o oposto de amnésia sazonal, esquecimento. São tantas as transgressões que deveriam requerer acção vigorosa do presidente da república, mas não tem sido esse o caso. A cultura do indulto e esquecimento, não é porém um exclusivo presidencial. O cidadão nacional, movido pela sua alegada vocação distraída, tem tendência a indultar e esquecer de um modo leviano tantos e tão bons. Cavaco Silva já colocou no sapatinho de 2014 as comemorações dos 40 anos sobre o 25 de Abril e a conquista da Democracia em Portugal, mas seria mais útil rever o percurso realizado, e sem pudor, realizar um exame de consciência política para tentar explicar como o sucesso da instauração da Democracia se divorciou da salvaguarda dos mais basilares fundamentos de sobrevivência económica e social da população portuguesa. A Democracia, nos termos propostos, parece uma coisa muito distante das dimensões substantivas que regem a vida das pessoas. Podemos ter opinião, falar alto em público na companhia de mais convivas na esquina do bairro, podemos escolher as nossas orientações sexuais, podemos arrastar-nos para a igreja da nossa preferência, podemos criticar a torto e a direito os poderes instalados, podemos contestar as decisões dos governantes, mas, nos dias que correm, tudo isto é feito na penúria, muito perto da miséria e na residência da indignidade. Cavaco Silva, que tem de preencher a agenda de 2014, e apresentar-se como abrilista, parece não querer ver a situação em que se encontra o país. O presidente que já foi presidente, primeiro-ministro e ministro das finanças, entre outras titularidades, parece estar a aproveitar a ocasião para se indultar, para se branquear da neve de responsabilidades. Eu sei que é Natal e em breve terão passado 40 anos sobre a revolução do cravos, mas convém não exagerar as virtudes, elogiar os triunfos e as conquistas das liberdades e garantias, quando a realidade demonstra algo diverso. Que a Democracia de nada serve se os cidadãos são os derradeiros da cadeia política de interesses particulares. Venha de lá o ano novo, que a vida nova geralmente segue-lhe o rasto.

publicado às 18:07






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