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O que faz mal à saúde é o absurdo em que se tornou Portugal. Numa das faces da excentricidade temos o desfalecimento dos estaleiros de Viana e, como mero apontamento de surrealidade, na outra bochecha levamos a estalada do insólito caso do ladrão de pizzas. O contraste entre uma coisa e outra demonstra a loucura que tomou conta da realidade. Quando se misturam ingredientes deste calibre no juízo do cidadão, este não pode bater bem da bola. Portugal está à mercê de uma tômbola de consequências nefastas. Não sabemos o que nos vai sair na rifa amanhã. Este estado de insegurança produz vários efeitos em simultâneo - provoca paralisia dos membros da sociedade e raiva. Quando estes dois se encontram está tudo perdido. A racionalidade deixa de ser guia, e os impulsos tomam conta do espírito.
Se Hayek tem razão quando considera que a vida não tem outro propósito para além da sua própria existência, então Camus terá razão em considerar o suicídio como o único problema filosófico verdadeiramente sério. Nestes estranhos tempos em que vivemos, o "perigo de todo os perigos", como assinalou Nietzsche, é "nada mais ter sentido." E talvez seja por a vida não ter sentido que, segundo Oscar Wilde, a maioria de nós limita-se a existir, não vivendo. Se assim é, só podemos escapar ao absurdo da existência da vida pelo suicídio ou pela esperança, como Camus aponta. Não lhe escapando, somos compelidos no sentido da revolta, que surge "do espectáculo do irracional a par com uma condição injusta e incompreensível." "Eu revolto-me, logo existo", escreveu o filósofo francês. Alguns dirão que calar a revolta será sinal de maturidade. A mim afigura-se-me antes como um suicídio do pensamento. E eu ainda prefiro continuar a viver, mesmo que tenha que me submeter para sobreviver. Até um dia.
Sartre, no prefácio a O Estrangeiro, de Camus:
"Certo é que o absurdo não está no homem nem no mundo, se os tomamos separadamente; mas, como é o carácter essencial do homem o «estar-no-mundo», o absurdo é, em suma, unitário com a condição humana. Por isso não é, em primeiro lugar, o objecto de uma simples noção: é uma iluminação desolada que no-lo revela. «Os gestos de levantar, carro eléctrico, quatro horas de escritório ou de fábrica, refeição, carro eléctrico, quatro horas de trabalho, refeição, sono, e segunda-feira, terça, quarta, quinta, sexta, sábado, no mesmo ritmo…» (Camus, O Mito de Sísifo), e depois, de repente, os cenários desabam e acedemos a uma lucidez sem esperança. Então, se sabemos recusar o socorro enganador das religiões ou das filosofias da existência, temos algumas evidências essenciais: o mundo é um caos, uma «divina equivalência que nasce da anarquia»; - não há amanhã, visto que se morre."