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Salteadores da Arca Perdida

por Fernando Melro dos Santos, em 21.02.13

Muitas vezes, ouço esgrimido certo argumento popular em favor da manutenção desta paz podre que finalmente conduz os nossos descendentes - a parte de nós que passou ao longo das eras e se pretenderia que alcançasse, um dia, a imortalidade - ao exílio, à escravidão e à ruína.

 

Perante a miséria resultante do estado pútrido a que chegou a democracia, com o próprio "demos" à cabeça da lista no rol de culpados pelos abusos do "kratos", banalizou-se preconizar a irrelevância do Mal face à presença, ainda que em doses mínimas, do Bem.

 

Diz-se, encolhendo os ombros e estugando o passo para longe da conversa incómoda, que há duzentos anos estávamos muito pior, que andávamos descalços, que as crianças morriam à nascença, e toda uma pluralidade de mantras evocativos de quão bem estamos. 

 

É no fundo o mesmo que dizer: há cem anos uma carta demoraria três meses de Portugal à Índia, e pretender concluir: olha como estaríamos pior se não houvesse aviões.

 

Face à evolução da sociedade globalizada e aos avanços, igualmente globais, da ciência e da tecnologia, o transeunte mundano reage ao chamado da voz do dono, quando esta aponta a Lua, mas permanece fixado no dedo que a indica, sustido num transe hipnótico que só termina quando a idade e o fim iminente da vida o arrebatam desse estupor banzado.

 

Então é tarde demais.

 

As perguntas que importa fazer, assim, quase ninguém as faz, mantendo oleada a engrenagem carniceira que vai moendo gerações atrás de gerações e estupidificando, convenientemente, as vindouras. 

 

É disto exemplar o caso da realidade social Portuguesa, na medida em que o eleitorado é hoje uma coisa digna de figurar num manual de psiquiatria. Divididos em castas de mercenários sem espinha, apáticos a leste, totós da mamã, e pessoas normais perdidas no labirinto, os de cá desperdiçam o tempo que lhes foi emprestado, fazendo tabula rasa da incompetência, mediocridade, negligência e compadrio criminoso daqueles que, por serem eleitos, deveriam servir e não serem servidos. 

 

E invocam, à saciedade e à revelia da Razão, o tal algoritmo miserabilista: não importa que os políticos vivam como nababos à nossa conta ou que gastem brutal, estúpida e quiçá maldosamente a maior fatia dos dinheiros públicos, muito deles colectado a contribuintes estrangeiros que nada nos devem.

 

Mas porquê?

 

Porque há cem anos morria muito mais gente de infecções nas gengivas, olha como estaríamos pior se não fossem os antibióticos.

publicado às 08:50






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