Saltar para: Posts [1], Pesquisa e Arquivos [2]
Muitas vezes, ouço esgrimido certo argumento popular em favor da manutenção desta paz podre que finalmente conduz os nossos descendentes - a parte de nós que passou ao longo das eras e se pretenderia que alcançasse, um dia, a imortalidade - ao exílio, à escravidão e à ruína.
Perante a miséria resultante do estado pútrido a que chegou a democracia, com o próprio "demos" à cabeça da lista no rol de culpados pelos abusos do "kratos", banalizou-se preconizar a irrelevância do Mal face à presença, ainda que em doses mínimas, do Bem.
Diz-se, encolhendo os ombros e estugando o passo para longe da conversa incómoda, que há duzentos anos estávamos muito pior, que andávamos descalços, que as crianças morriam à nascença, e toda uma pluralidade de mantras evocativos de quão bem estamos.
É no fundo o mesmo que dizer: há cem anos uma carta demoraria três meses de Portugal à Índia, e pretender concluir: olha como estaríamos pior se não houvesse aviões.
Face à evolução da sociedade globalizada e aos avanços, igualmente globais, da ciência e da tecnologia, o transeunte mundano reage ao chamado da voz do dono, quando esta aponta a Lua, mas permanece fixado no dedo que a indica, sustido num transe hipnótico que só termina quando a idade e o fim iminente da vida o arrebatam desse estupor banzado.
Então é tarde demais.
As perguntas que importa fazer, assim, quase ninguém as faz, mantendo oleada a engrenagem carniceira que vai moendo gerações atrás de gerações e estupidificando, convenientemente, as vindouras.
É disto exemplar o caso da realidade social Portuguesa, na medida em que o eleitorado é hoje uma coisa digna de figurar num manual de psiquiatria. Divididos em castas de mercenários sem espinha, apáticos a leste, totós da mamã, e pessoas normais perdidas no labirinto, os de cá desperdiçam o tempo que lhes foi emprestado, fazendo tabula rasa da incompetência, mediocridade, negligência e compadrio criminoso daqueles que, por serem eleitos, deveriam servir e não serem servidos.
E invocam, à saciedade e à revelia da Razão, o tal algoritmo miserabilista: não importa que os políticos vivam como nababos à nossa conta ou que gastem brutal, estúpida e quiçá maldosamente a maior fatia dos dinheiros públicos, muito deles colectado a contribuintes estrangeiros que nada nos devem.
Mas porquê?
Porque há cem anos morria muito mais gente de infecções nas gengivas, olha como estaríamos pior se não fossem os antibióticos.