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Enquanto Maria de Belém, Sampaio da Nóvoa ou Marcelo Rebelo de Sousa brincam às presidenciais, e António Costa e Mário Centeno jogam à apanhada do governo, algo muito mais avassalador está a fermentar no caldeirão da economia e do sistema financeiro internacional. Desde 2008 que os bancos centrais, um pouco por todo o mundo, mas em particular aqueles da Zona Euro e dos Estados Unidos, têm vindo a ser utilizados enquanto muleta das economias mais afectadas pela crise de crédito iniciada pela Lehman Bros., fazendo uso de munição mais ou menos convencional, na forma de injecção de liquidez nos mercados de dívida principais ou secundários, e contribuindo simultaneamente para a valorização ficcionada dos títulos transaccionados em bolsa. Findo este período de inflacionamento do valor das acções e a concessão de uma imagem de aparente saúde económica, e à medida que são removidos os mecanismos de estímulo iniciados pelos banqueiros centrais, os aspectos fundamentais da economia vieram à tona para revelar uma certa anemia, ou mais realisticamente, a sua genuína fragilidade. E é precisamente aqui que nos encontramos. As taxas de juro a zero, ou perto do mesmo, não permitem grande margem de manobra aos bancos centrais. Por outras palavras, a munição acabou, e o momento da verdade, do reajustamento da relação entre os mercados financeiros e a economia chegou com alguma intensidade para indicar a expressão de uma verdadeira tempestade de volatilidade. Para além destes dissabores, do domínio económico e financeiro, há que contar com medidas expansionistas e gastos desproporcionais da parte de governos de inspiração populista ou de Esquerda, como parece ser a troupe liderada por António Costa. E Portugal corre, deste modo, perigos reais; a ameaça de um desastre ainda maior do que aquele proporcionado pela natural apetência ideológica de um governo que sustenta a sua acção na ideia de rolling debt, ou seja, a ideia de que a dívida seguinte pode cobrir parte da precedente e assim sucessivamente. António Costa deve julgar que controla as operações, mas, efectivamente, não controla nada. Deve pensar que a época dos banqueiros centrais de mãos largas não tem fim, que representa um elemento crónico na condução da política monetária da Zona Euro. Estas considerações ingénuas e de índole socialista, colocam Portugal na mira de (des)investidores que pressentem a insustentabilidade do projecto governativo nacional. O que já está a decorrer nas bolsas de todo o mundo, indica, sem margem para dúvida, grande turbulência nos próximos tempos. António Costa pode ter conquistado o governo com artimanhas parlamentares, mas o que aí vem estravasa o tamanho da sua esperteza. Para fazer face ao que aí vem, é preciso bastante mais do que um ex-presidente de câmara.
No passado dia 15 de Setembro, aqui deixei um post em referência ao discurso de Bento XVI contra a plutocracia. Apenas duas semanas depois, chegamos a esta situação, com notícias de desastres a chegar hora a hora, quase nos remetendo para a Invasão marciana daquele programa radiofónico que tendo como base A Guerra dos Mundos de H.G. Wells, há décadas espalhou o pânico na América.
A crise que se vive era previsível e já muitos se tinham apercebido da total irrealidade de uma economia fictícia, feita de gases tão rarefeitos como aqueles encontrados na estratosfera. Especulação, manipulação de números não correspondentes à realidade material, eis o que temos há muitos, demasiados anos. As implicações são fáceis de prever e julgo que podemos esperar o seguinte:
1. Fim das ilusões quanto à descida de impostos, pois os Estados serão forçados a intervir, urgindo obter mais receitas.
2. Fim da grande farra dos empréstimos para fins tão relevantes, como aquisição de electrodomésticos, férias em resorts exóticos nas Caraíbas, automóveis de gama muito acima das possibilidades dos deslumbrados compradores, apartamentos que nada valem no mercado real e que mais que nunca precipitarão em breve a indústria da construção civil para o buraco da falência. Vão acabar os regabofes dos cartões de crédito oferecidos à porta de centros comerciais e aqueles termos esquisitos como leasings, spreads, etc, que serão aplicáveis a uma minoria.
3. As pessoas terão de viver de forma mais comedida, sem 4 televisões de ecrã plano-plasma em cada divisão da casa e uma infinidade de inutilidades como 6 play-stations, dois leitores de dvd - um antigo, com dois anos e um novo, comprado ontem . E poderiamos continuar indefinidamente.
4. No plano político, assiste-se hoje à inacreditável indignação dos comentadores televisivos da economia , que agora incrédulos pela alegada politiquice dos governos e parlamentos do Ocidente, se insurgem contra o laxismo, pois ... "os Estados têm mesmo de intervir!"... (SIC). São os mesmos que ainda há dias pretendiam a privatização de tudo o que resta do sector público e ..."deixar o mercado funcionar"... Obcecados com jogos virtuais de bolsa, agora não sabem o que dizer e pior, o programa a apresentar para a salvação do sistema.
Que bela oportunidade para os partidos dos extremos políticos. É que, ou muito me engano, ou dentro em pouco as eleições tornarão bastante audíveis vozes sieg heil! um pouco por toda a parte. Ditas com um fundo musical menos marcial, como na Rússia, mas sem dúvida não deixarão de se fazer escutar por muitos. Em Portugal, na melhor das hipóteses, voltámos a 1908, com a decadência absoluta e definitiva do rotativismo. Estamos a dois anos de 1910, ano de todas as oportunidades. Quem dará o primeiro passo?