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Os portugueses e as Rattazzis de sempre

por Nuno Castelo-Branco, em 23.07.11

Num excelente artigo hoje publicado pelo Expresso, Henrique Raposo explica com cristalina clareza, o porquê da aparentemente final eliminação do estudo da obra de Camilo nas escolas portuguesas. Mais que um incómodo para a corrida pela estatística da nota positiva, o escritor representa um Portugal que pouco interessa a quem do próprio país tem uma estranha ou avessa opinião, eximindo-se à própria pertença a esse todo a que chamamos de "nossa gente".

 

Jamais reconheceram o país que atirou Miguel de Vasconcelos janela abaixo. O Portugal da fraqueza, das lutas estéreis pela côdea do pão emprestado pelo vizinho, é o país que os decisores gostam de ver retratado como seu, único e intemporal. Como Henrique Raposo muito bem faz ver, o Portugal de Camilo é outro, bastante abrasivo, ousado e por vezes quixotesco, mas muito mais seguro de si próprio, impante de qualidades e de defeitos que aceita como passado e destino. O outro Portugal, o imaginado por alguns poucos que lá fora durante algum tempo viveram ou se limitaram à virtual convivência fora de portas nas páginas de umas tantas obras de situação, vive da negação da evidência de uma história que já era antiga, quando as vozes se ergueram no Casino que decretou um até agora ainda não cumprido Finis Patriae. Todos já escutámos com o relativo desinteresse que a habitualidade garante, longas tiradas que debulham o milheiral de defeitos, mesquinhezes e pequenas misérias vomitadas para as costas dos compatriotas. Tomam Lisboa, ou melhor, os clubezinhos de interesses que na capital decidem por milhões, pelo todo. O escusado refinamento chega sempre ao ponto estelar da prosa discorrer perante convivas estrangeiros, quase como se se tratasse de um auto-reconhecimento da absurda situação de diferença, do estar "mais próximo de ti e não dos de cá". Nada pode ser mais estúpido e estapafúrdio, confirmando-se aos olhos dos visitantes, os rezingados séculos de estereótipos que se foram avolumando através de viagens ou curtas estadias de comerciantes defraudados nas expectativas, de diplomatas fracassados nos apetites de submissão da periférica Corte de Lisboa, ou de serralhos de Madames Rattazzis de furores uterinos sem hipótese de atempada refrigeração. Pior ainda, os rosnadores de impropérios jamais serão aceites pelos estrangeiros como os iguais que julgam ser.

 

Estes pesporrentes parvos que gostam de se condecorar de europeus, como se os demais portugueses nunca o tivessem sido, cobrem-se com pífios galões do conhecimento e da reivindicação das "mentes abertas" sempre atribuídas a outras paragens, aquelas mesmo que no momento em que o português "grosseiro e ignorante de folhos e de espírito" colocava pé no Japão, se contorciam em europeias e épicas chacinas na ténue linha divisória que pouca destrinça faz entre a Alsácia, o Franco-Condado ou o Bade. Num pretenso continente onde 500.000 Km2 - menos de metade de uma Angola! - bastavam e sobejavam para se bater moeda com a declaração de Empire Français ou Deutsches Kaiserreich, o tal bisonho habitante do ocidente peninsular possuía fazendas açucareiras que no Brasil se mediam pela extensão de infindáveis principados europeus. Se atendermos à realidade dos factos como se apresentam, o lusomundo dos 200 milhões de falantes que corroboram uma História que é um libelo acusatório dirigido às abonadas barrigas sem fundo aconchegadas em Lisboa, torna-se cada vez mais, num reflexo daquele Portugal violento, endemoninhado e que não hesitava no ajuste de contas sempre que necessário fosse. O tal "espírito Eça" jamais teria permitido a arrancada para sul do Mondego e muito menos ainda, a travessia dos oceanos e selvas e quanto muito, esses portugueses pequeninos e ao gourmet gostame estrangeiro, teriam como gesta única, a simbólica ocupação das Berlengas. É o Portugal da ínfima chacota, da destruição do eu alheio, da invenção boateira e da baixa intriga que apenas avilta o mensageiro. Enfim, é um certo Portugal bastante lisboeta e que se noutras décadas percorria a pé o eixo Rossio-Chiado, entretendo-se nos cafés e diante dos escaparates das bancas de jornais, hoje coça-se em painéis televisivos. Estes selectos inteligentes não passam de terminais digestivos ambulantes, com esponjoso cérebro acoplado.

 

Se atendermos bem ao cronómetro da nossa História, é precisamente o Portugal da República que verdadeiramente começou no tal Casino. Melhor teriam feito os comparsas da ora, se se tivessem perdido em bilhares, jogos da bisca ou umas tantas bebedeiras acompanhadas pelas Rattazzis a que pudessem ferrar a unha.

publicado às 18:10

Mais uma vergonha nacional

por Nuno Castelo-Branco, em 22.06.11

Foi decidida a remoção de Camilo Castelo Branco do programa do Ensino Secundário. Forçados à novilíngua e a um obrigatório facilitismo para adequar a estatística aos comparsas da U.E., aproveitam para suprimir Camilo. Politicamente, trata-se de um ajuste de contas, um daqueles desaparecimentos da foto e bem ao estilo da gente que se sabe.

 

Num país que hoje conta com uma "presidenta" (sic) do Parlamento e onde Sampaio dizia "véstoria", Soares "hadem" e "Húngria", compreendemos o incómodo.

 

Esta gente perdeu qualquer tipo de pudor. Esperemos agora uma adequada resposta de Nuno Crato, doa a quem doer.

publicado às 21:58

A ler uma novela do escritor de Valdevez,

por Cristina Ribeiro, em 01.06.09

 

não me resisto a aqui dela trasladar um niquinho, por tão delicioso o topar.

 

                               Deste contar do tio Cosme, singelamente lavado, fora tirando o lorde quanto é o povo fiel guardador da portuguesa linguagem, logo nisso encontrando a razão de o seu amigo Camilo tão asseadamente escrever.

 

E, bem se vê, esse assear  não iria cair em saco roto, pois que nele encontraria herdeiro, no seio de uma escola mais vasta começada pelo homem de Seide.

 

 

 

 

 

publicado às 23:23

Pronto! Cheia de boas intenções:

por Cristina Ribeiro, em 21.05.09

deitar cedo para começar o dia com uma caminhada, e...; uma porta que se abre, o bastante para me despertar...; e o que se faz quando surge uma insónia?

Começo por ler o post do João Pedro, assusto-me quando leio a palavra Federalismo, como um chocolate preto, na tentativa de afastar os fantasmas libertados pela dita, e continuo a lutar com a invasora recorrendo à leitura de umas páginas de  « Camilo Broca », de Mário Cláudio, como que uma biografia romanceada, agradável no recurso a uma linguagem quase poética, do que viria a ser marido de Ana Plácido, mas mais do que isso, o grande escritor que ainda hoje tem uma enorme corte de admiradores, entre os quais me incluo.

Recomeço, pois, onde tinha parado, e leio: Decorridos muitos anos, persistiria eu numa recordação da chegada à casa de Vila Real, em absoluto desaderida de toda a realidade,

 

E dou-me conta de que o sono fica adiado...

publicado às 02:21

Na véspera do aniversário de Camilo,

por Cristina Ribeiro, em 15.03.09

 

releio bocados de  « Estrelas Propícias », Romance quase integralmente passado nesta nossa Região mais a Norte - o Porto é um protagonista sempre presente-, num cenário mais bucólico do que nunca, com ponto de partida nas margens desse " rio das saudades e dos pavores da mitologia ", e digo como o meu outro autor de cabeceira " morro de amor pelo  meu pátrio Minho ", mas sem poder impedir-me de ter saudades desse Minho que foi o deles....

publicado às 17:28

Em «A Paixão de Camilo: Ana Plácido », Rocha Martins escreve que ' à porta de Camilo geraram-se sempre novelas: lá dentro do lar, passava-se o seu drama '  »

Leio, da Editora Opera Omnia, e de autoria de Secundino Cunha, « Casas de Escritores no Minho », e detenho-me nas fotografias daquela que melhor conheço -a de S. Miguel de Seide..

           Se na primeira visita me encontrava totalmente alheada  deste tão grande drama, quando pela segunda vez fui à casa que testemunhou os seus males, mas onde escreveu páginas e páginas que para sempre lhe valerão a imortalidade estava já bem ciente desse drama pessoal...

publicado às 20:23

" Antes do mais, ler os Mestres "

por Cristina Ribeiro, em 04.12.08

                                        

 

  Casa de Casares- Arcos de Valdevez

 

«Tinha de escrever o romance, um provável novo Eusébio Macário, visto que de novo encarnara o sarrafaçal camiliano, lambendo botas, gastando quartilhos de cuspo em lambidelas de botas.

Na tarde em que tal decidira, relido o livro castigador, até só a espessura das paredes talvez houvesse tirado que de fora lhe ouvissem as gargalhadas. Relera e ria.

             Ah! Eusébios Macários reincarnados! »

                           ( Tomaz de Figueiredo, in «Fim » )

 

 

Sabia-o Camiliano.

Quando, logo no dia a seguir a ter ouvido falar, com tanto fulgor, daquele, até então  por mim desconhecido, escritor, me dirigi à livraria do costume, em busca dos seus livros,

                                        Casa  de Camilo-S. Miguel de Seide

 

  o amigo a quem peço conselho, na hora de trazer para casa novas leituras, esse seguidor de Camilo, recebeu-me com um "- Oh,esse!... Tenho um filho adolescente com pretensões literárias. Se um dia me disser que quer ser escritor, dir-lhe-ei para primeiro fazer cópias dos escritos de Camilo e de Tomaz".

publicado às 18:04

«Quando o coração

por Cristina Ribeiro, em 02.08.08

me falha neste dialecto de escrever livros, volto-me para Camilo, que é sempre rei mesmo em terra de ciclopes».

 

Vou a meio do livro, sugerido por João Marchante, mas, a cada passo, volto ao princípio,  para reler esta frase que tenho como emblemática.

publicado às 17:49

Os dois Grandes vistos por Ramalho Ortigão

por Cristina Ribeiro, em 20.06.08
"Pelo conjunto das exuberâncias e das deficiências da sua natureza de escritor, pelas suas qualidades e pelos seus defeitos, pelo seu temperamento, pela sua educação, pela sua obra, que é a imagem da sua vida, o nome de Camilo Castelo Branco representará para sempre na história da literatura pátria o mais vivo, o mais característico, o mais glorioso documento da actividade artística peculiar da nossa raça, porque ele é, sem dúvida alguma, entre os escritores do nosso século, o mais genuinamente peninsular, o mais tipicamente português"

 
"Superiormente instruído, versado em todas as coisas do espírito, equilibrado por uma alta cultura, de que ainda ninguém deu fé porque ele se empenha em ocultá-la sob uma superficialidadede "clubman", por um profundo requinte de mundanismo e de bom-tom, Eça de Queiroz reúne todas as capacidades de inteligência ao incomparável poder de expressão literária e de análise psicológica, que fez dele no mundo um dos primeiros romancistas do século"
 
 

publicado às 01:35

Uma outra visão de Camilo

por Cristina Ribeiro, em 28.05.08
É de todos conhecido o mau feitio de Camilo, mas por muitos ignorada uma outra faceta do seu carácter, trazida até nós pelo camilianista, seu contemporâneo, António Cabral.
Tinha este acto abonatório de uma índole generosa vindo a público nas páginas d'«O Primeiro de Janeiro» de 3 de Junho de 1890, pouco tempo, portanto, após a morte do escritor.
"Foi há muitos anos, na Póvoa de Varzim.
Camilo achava-se naquela praia, para onde fora com os filhos, que iam fazer uso dos banhos do mar.
No mesmo hotel em que estava Camilo, achava-se um medíocre pintor espanhol, que perdera no jogo da roleta o dinheiro que levava.
Havia três semanas que o pintor não pagava a conta do hotel, e a dona, uma talo Ernestina, ex-actriz, pouco satisfeita com o procedimento do hóspede, escolheu um dia a hora do jantar para o despedir, explicando ali, sem nenhum género de reservas, o motivo que a obrigava a proceder assim.
Camilo ouviu o mandado de despejo, brutalmente dirigido ao pintor. Quando a inflexível hospedeira acabou de falar, levantou-se, no meio dos outros hóspedes, e disse: - a D. Ernestina é injusta. Eu trouxe do Porto cem mil réis que me mandaram entregar a esse senhor e ainda não o tinha feito por esquecimento. Desempenho-me agora da minha missão. E puxando por cem mil réis em notas entregou-as ao pintor. O Espanhol, surpreendido com aquela intervenção que estava longe de esperar, não achou uma palavra para responder. Duas lágrimas, porém, lhe deslizaram silenciosas pela faces, como única demonstração de reconhecimento".

publicado às 19:04

Camilo visto por

por Cristina Ribeiro, em 20.05.08
3. Fialho de Almeida

Ele mesmo um exímio escritor, tanto na faceta de ficcionista («Contos», «A Cidade do Vício»...), como nas de cronista e polemista mordaz, o que se espelharia na sua Obra mais conhecida, «Os Gatos», onde não poupa a sociedade do seu tempo, nem a "republiqueta"então emergente, na linha, aliás das «Farpas» de Ramalho Ortigão, este pessimista disse do homem de Seide :
"A mais bela luz do génio de Camilo faísca na sua obra sarcástica. Nada pode dar ideia da veemência e pujança desta prosa de Vulcano, batida na forja dos coriscos e dos raios, onde co'as asperidões e rudezas da antiga linguagem se entrelaçam os nervosismos elásticos e as graças subtis do mais refinado poeta cortesão do penúltimo século. Eu não sei de ironia que tenha mais causticidade, nem de imaginação onde se insculpam mais finas rendas(...).
Na caquexia das letras actuais, quando todas as energias parecem finar-se, e todas as originalidades irem adormecendo, a pletora deste homem faz medo, como em país de anões os 'grandia ossa' da fama primitiva."

publicado às 12:03

Camilo visto por

por Cristina Ribeiro, em 16.05.08
3. Silva Pinto

Ao mesmo tempo que dirigia os maiores encómios a confessos adversários de Camilo, como Teófilo Braga, este jornalista e escritor não desperdiçava uma oportunidade para tentar destruir a reputação daquele, tanto no plano literário como no da sua dignidade de homem.
Mas, após uma longa série de polémicas, iniciadas em 1874, em que nenhum dos dois foi parco no uso de uma linguagem virulenta, semeada de insultos e calúnias, a reconciliação viria cinco anos mais tarde, passando o que iniciara tamanha hostilidade,, de panfletário desbocado a admirador incondicional daquele a quem passou a considerar Mestre, e como tal se lhe dirigia, a ponto de escrever: "Era o mais completo e puro tipo de fidalgo, assim no aspecto como no trato, (...). O maior escritor de Portugal nunca me impôs, em convívio a sua opinião literária. Àquele vasto e poderosíssimo cérebro,,,"
Depois de ter começado a frequentar a casa de Seide, adquiriu na localidade habitação própria para melhor desfrutar "da sua genialidade".

publicado às 12:00

Camilo visto por

por Cristina Ribeiro, em 15.05.08
2. Alexandre da Conceição

Este poeta e ensaísta foi uma das muitas pessoas com quem Camilo travou acesas polémicas, género em que era temido, dados o seu agudo sarcasmo e não menos violenta agressividade. Mas tal como aconteceu com outros alvos da sua verve polemista, também Alexandre da Conceição se tornou num grande admirador do autor de « A Queda de Um Anjo», como nos dá conta José Viale Moutinho, o qual coligiu vários textos de contemporâneos do escritor.
"Camilo Castelo Branco é para nós um dos primeiros romancistas da Europa contemporânea. Não conhecemos em Nação nenhuma individualidade literária mais original, mais profundamente acentuada, escritor mais correcto, fantasia mais finamente engraçada, espírito mais vivo e sarcástico. (...) tem personagens cuja criação Balzac invejaria, Cherbuliez, Droz e Zola não seriam capazes de reproduzir mais vivos nem com mais relevo."

publicado às 12:02

Camilo visto por

por Cristina Ribeiro, em 14.05.08
1. Ramalho Ortigão

Nas últimas noites, antes de adormecer, tenho-me deliciado com a leitura de uns escritos de Ramalho sobre o homem de Seide:
"Pelo conjunto total das exuberâncias e das deficiências da sua natureza de escritor, pelas suas qualidades e pelos seus defeitos, pelo seu temperamento, pela sua educação, pela sua obra, que é a imagem da sua vida, o nome de Camilo Castelo Branco representará para sempre na história da literatura pátria o mais vivo, o mais característico, o mais glorioso documento da actividade artística peculiar da nossa raça, porque ele é, sem dúvida alguma, entre todos os escritores do nosso século, o mais genuinamente peninsular, o mais tipicamente português."

publicado às 12:01

Assim tento responder ao desafio do Nuno...

por Cristina Ribeiro, em 25.04.08


 

Comecei por socorrer-me do arquivo do Combustões, pois que tinha uma vaga ideia de um post em que versa esta matéria. Depois de uma busca, encontrei-o:" O Brasil de D. Pedro II e o Brasil de Lula", de 4 de Outubro de 2006; - aí diz o Miguel ser aquele "Homem de grande dimensão moral e intelectual(...)que sempre viveu de forma discreta" tendo sido grande amigo de Portugal e das letras portuguesas", referindo as visitas do Imperador a Camilo Castelo Branco. Mas os dois homens terão, além disso, mantido uma correspondência regular, como me dei conta ao consultar, entre outros, o «Boletim da Casa de Camilo.
Tê-lo-á visitado, também, na casa do escritor no Porto, na Rua de S. Lázaro, em 1872, quando este já se encontrava doente: "Tornou-se assunto de conversação a analyse de uns quadros que o senhor Camillo Castello Branco tinha na sala, mostrando o soberano vastos conhecimentos sobre pintura".
Depois de o escritor ter oferecido a D. Pedro um quadro com os vinte e um primeiros reis portugueses, tendo-se ele" comprazido de possuir umas lembrança de Camillo (...), fallaram de literatura, tanto portuguesa como brasileira, matéria sobre a qual o monarcha discursou largamente, com perfeito conhecimento de causa".
Finalmente, num dos volumes de "Dispersos de Camilo" , coligidos por Júlio Dias da Costa, encontrei uma carta dirigida a Tomás Ribeiro, na qual diz Camilo: "No « Livro de Consolação», pagina primeira, está impresso um documento que eu desejo fazer-te conhecido. É uma carta escripta a S. Magestade o Imperador do Brasil, dedicando-lhe affoitamente e audaciosamente, o meu livro. Essa carta manifesta o meu grande respeito e a minha profunda gratidão áquelle magnanimo homem, que não carecia de diadema para ser um dos mais veneraveis cultores das letras, e amigo dos operarios que vivem acorrentados á galé dos trabalhos do espírito, em que a alma, alando-se para altas regiões, vai deixando cahir em terra o corpo despedaçado».

publicado às 17:17

Duas visitas à casa de S. Miguel de Seide (1)

por Cristina Ribeiro, em 16.04.08


 

"A respeito do último discurso de Calisto Elói, as gazetas governamentais estamparam que a sala da representação nacional nunca tinha sido testemunha de insolências de tamanha rudeza e tão audaciosa ignorância" («A Queda dum Anjo», de Camilo Castelo Branco)

Era muito pequena ainda quando meu pai me levou a casa de Camilo. Dessa visita guardo uma memória muito esbatida, tendo-me ficado na retina aquela cadeira de baloiço, muito provavelmente porque fiquei impressionada quando o guia disse que terá sido aí que o escritor se suicidou.
Cresci ouvindo falar nele com uma grande admiração: o seu busto estava num lugar de destaque, na estante que continha a camiliana.
Quando, timidamente, e com relativa desconfiança sobre o acerto de tal veneração, me aventurei na sua obra- creio que o primeiro livro que li foi «A Brasileira de Prazins», o qual só mais tarde abarquei no seu justo valor-, confesso que não fiquei logo cativada. Foi fora do tempo.
O encantamento viria mais tarde, com «A Queda dum Anjo», seguido de »Eusébio Macário» e «A Corja»: a escrita escorreita, a riqueza do vocabulário e a fina ironia, iriam fazer com que , de quando em quando, volte a eles, nem que seja para ler um trecho ou outro...

publicado às 17:38

Um poema de Gertrudes da Costa Lobo

por Cristina Ribeiro, em 02.04.08
As minhas últimas férias foram enriquecidas pela leitura de um livro, da autoria de Manuel Tavares Telles, que trata da paixão platónica que por Camilo Castelo Branco manteve, três anos antes do encontro deste com Ana Plácido, em 1856, uma poetisa portuense, a qual viria a traduzir-se numa razoável quantidade de cartas de amor e num diário íntimo, reunidos em «Os Manuscritos Gertrudes».
Começou Gertrudes por se dirigir ao escritor, solicitando a publicação de duas poesias, no jornal em que este trabalhava à época, 1853,- «O portuense». Seria a partir deste primeiro contacto que se iria desenvolver a dita paixão.

"Que sentes?" é o título do segundo desses poemas.


"Que sentes por mim? amor extremoso
Ou fria indif'ença tua alma gelar?...
E, quando meus olhos teus olhos encontram,
Não sentes mil chamas teu peito escaldar?

Se um brando sorriso de meiga ternura
Meus lábios agita, que sentes então?
Não sentes de orgulho, prazer e ventura
No peito agitado profunda emoção?

Se vai revelar-te furtivo suspiro
Esta ânsia d'amar-te, em vão reprimida,
Não sentes...oh! Dize...não sentes, qual sinto,
De amar um desejo, uma ânsia insofrida?

Se rápida foge uma hora a olhar-te,
Em êxtase ardente, em vago ansiar
De mil corações não sentes a vida
Nessa hora em delírio viver e gozar?

Se, às vezes,ao peso de mágoas ocultas,
Eu pendo a cabeça febril e cansada
Quiseras que eu fosse, buscando refúgio
Poisar-te no ombro a fronte abrasada?

Se, alegre me rio, se, triste, suspiro,
Não sentes, qual sinto, pesar ou ventura?
Se enfado, ou amor meus olhos revelam
Não sentes, não sofres, , enfado ou ternura?

Se olhando das nuvens as formas aéreas
Contemplo, absorta, do espaço a amplidão
Seguindo esse olhar, não sentes, qual sinto,
A mente confusa, turvada a razão?

E, quando se escuta do bronze a pancada,
Que à prece nos chama, e as mãos ergo aos céus,
Não sentes também de impulso suave
Tua alma elevar-se aos tronos de Deus?

Que sentes ao ver-me...que sentes oh! dize...
Por mim o que sentes?...não queiras calar...
Preciso que o digas...preciso...compreendes?...
Que a vida ou a morte me dês n'um olhar!

publicado às 18:43

Será?

por Cristina Ribeiro, em 30.03.08
A ler o primeiro romance de Camilo, «Anátema», que escreveu na verdura dos vinte e cinco anos (ou terá sido na dos vinte e dois, como diz no prefácio da segunda edição?), deparo, a dado passo, com a frase "Não pulsa um coração debaixo do céu, que não sofra"; e dou comigo a sair do universo da ficção para o da a realidade crua que nos cabe viver: será que tal se pode dizer daquela, para não ir mais longe, mãe, e do tio da pequena Joana, por eles barbaramente assassinada ,ou da avó e do pai da pequena Vanessa(?), que teve o mesmo destino, depois de arrepiantemente torturada?
Ninguém me convence de que em indivíduos assim, no lado esquerdo do peito não existe apenas um músculo que bombeia o sangue; não, debaixo deste nosso céu pulsam corações que não sentem nada...

publicado às 16:34






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