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Aviso desde já que vi bastantes segmentos da grande tertúlia promovida pela TVI e a anfitriã Judite de Sousa. Não escutei de fio a pavio o debate. Mas ligando os pontos, facilmente chegámos à conclusão que o Partido do Turismo marcou assento mesmo sem ter sequer um lider em estúdio. Fernando Medina, o único político não eleito dos presentes, não soube aproveitar essa condição. Não soube e não quis, porque sabe que qualquer tentativa de se apresentar como "independente", e herdeiro de um legado que não escolheu, cairia por terra num ápice. Assunção Cristas sintetizou - "Medina anda de braço dado com o governo" e "foi secretário de Estado sob a batuta de José Sócrates". Mas adiante, deixemo-nos do acessório e passemos ao essencial da noite. A questão das taxas turísticas parece estar envolta na mesma aura de mistério dos donativos de Pedrógão. Não se percebe muito bem para onde foi ou para onde vai o dinheiro. Não se sabe ao certo de que modo é feita a alocação das receitas. A taxa respeitante à Protecção Civil, a grande bandeira de financiamento das emergências da capital, afinal peca por inconstitucionalidade se for adoptada a mesma orientação jurídica que foi determinada em Vila Nova de Gaia. Cristas tem razão. A Protecção Civil não pode ficar dependente de mais ou menos meios angariados através de taxas ou taxinhas - é um encargo em relação ao qual não se pode abrir mão. João Ferreira do PCP esteve bem ao saber demarcar-se da expressão geringonçal que o define a si e ao seu partido. Soube fingir muito bem a sua irreverência, mas sabemos que nos bastidores os acertos serão determinados. Ricardo Robles do BE foi uma agradável surpresa - é uma versão diluída e não histérica da Catarina Martins. Parece ser alguém com quem se pode discordar sem levar com um compêndio moral em cima. Teresa Leal Coelho é um erro grosseiro de casting. Infelizmente não tem o que é necessário para o cargo em questão. É incapaz de estruturar um pensamento ordeiro e é péssima no contraditório. Se é para fazer escola aqui nestas andanças, sair-lhe-á caro. Adiante. A discussão dos metros do Metro coloca Lisboa numa posição incómoda. A cidade não pode ser pensada a partir do prisma da mobilidade, como se a mesma fosse a geradora de outras soluções estruturais. Nada de conceptual foi discutido. A saber; qual o conceito de qualidade de vida que define Lisboa e quais as ambições dos seus residentes? Que implicações terão as propostas dos candidatos no desenvolvimento dos concelhos adjacentes? Qual a abordagem inter-municipal para integrar as mais que expectáveis alterações que se farão sentir na periferia? Onde começa e acaba Lisboa, e como pode a mesma ser pensada a partir do prisma do Turismo? Será que são entidades exógenas que determinarão o curso político de acção? Se deixarem o Turismo ditar o rumo da capital, poderemos apresentar um novo conceito operativo político: a perda de soberania autárquica. A cidade de Lisboa não pode pertencer aos maltrapilhos dos turistas que apenas se apresentam por interesse hedonista. E os que residem ficam para segundo plano? Fico algo chocado que não tenha sido atribuída a ênfase devida à condição alfacinha. São os que cá vivem que mais importam. O turismo é um vento favorável que sopra, mas devemos temer furacões e aguardar as tempestades geradas por políticos que acreditam nas benesses das cirurgias plásticas dos canteiros de avenidas. Como em todos os outros processos eleitorais de Portugal, não me assiste votar. Não sou uma coisa nem outra. Não sou nacional, mas também não sou turista. Sou residente de pleno direito e estou alinhado com os da terra que merecem muito mais do que presentemente lhes é oferecido. E não me venham com essas histórias encomendadas pela geringonça de que Portugal é o 5º melhor país do mundo para se trabalhar. Não é assim que se faz. Não é assim que se faz campanha. A masturbar prémios em cascata.
As campanhas autárquicas aí estão em toda a sua força e esplendor. O surrealismo dada, dado, oferecido nos outdoors, de norte a sul do país reflecte uma constatação mais profunda - o modo artesanal como a política é exercida em Portugal. As agências de comunicação especialmente concebidas para criar as mensagens políticas acertadas são inexistentes, ou existem apenas para as cúpulas. Por outras palavras, significa que os partidos políticos não estão interessados em disponibilizar os seus meios numa base equitativa e coerente, de Coina a Manguito de Baixo. Mesmo as campanhas dos grandes como Costa, Seara ou Menezes estão pejadas de absurdidades e frases feitas a martelo - "Estacionamento gratuíto para residentes em toda a cidade" (atenção, será que a frase é mentirosa ou é apenas um encadeamento de palavras com sentido variado, caro Seara?). Significa que um residente de Benfica pode estacionar em Campo de Ourique à borliu? Não me parece, mas é o que diz o slogan de ocasião. O tutti-frutti de cores e gostos políticos duvidosos revela o falhanço cultural do país - a incapacidade de se rever de um modo crítico, com sobriedade e inteligência. A soma de todos os disparates que avistamos em cartaz, nas rotundas ou à entrada dos pueblos, nada trará a um país carente de uma solução integrada. A explosão de democracia, cujos estilhaços são agarrados por uma corja de desesperados políticos, apenas serve para diluir uma grande estratégia nacional. A Esquerda ou a Direita há muito que deixaram de existir, mas continuam a servir de poleiro para extravagâncias e reinvindicações furadas. O folclore das autárquicas não é apenas visual. Os chefes estão a perder as suas vozes e não apenas no sentido literal. Os argumentos são gastos, reciclados e pouco credíveis. Seguro e Semedo (a que se seguirão outros mais resguardados das correntes de ar) não aprenderam a colocar a voz. São cantores espontâneos, amadores que descuram detalhes e ignoram a técnica. É tudo feito às três pancadas e por isso não têm pernas para andar. Andam por aí, a fazer quilómetros em vão, porque os dados já foram lançados. Há eleições no domingo e essas não levam em consideração os arraiais de feira e os jantares-convívio. Seja qual for a expressão da vitória da Merkel, a Alemanha poderá retomar a política virada para o exterior. Durante os últimos meses, a chanceler alemã teve de demonstrar perante os seus eleitores que o seu "core-business" é germânico, mas com a sua reeleição, a política das periferias voltará a fazer parte da sua agenda de um modo intenso, com a Grécia à cabeça da lista das suas preocupações. A austeridade dos outros será um dos lemas despejados com a mesma intensidade de outros ciclos. Tempos difíceis avizinham-se para a Europa, porque o preço a pagar não será realizado integralmente pela centralidade, pelo norte. As agências de comunicação política na Alemanha sabem o que estão a fazer, mas isso é um factor que em nada ajuda Portugal. Pode parecer que a festa autárquica se encontra nos antípodas do que se passa na Alemanha, como se a dança de cadeiras acontecesse num mundo à parte e não tivesse importância. Mas não é bem assim, está tudo encadeado e interdependente. E nada disso está presente na consciência política de candidatos à freguesia ou repetentes de câmara. Os seus slogans políticos ficam-se pelos limites de um conselho pouco sábio. Tudo isto é fado, tudo isto é tão triste.