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Existem muitas e variadas razões que servem para explicar a demise de Portugal, mas a falência de lideranças e da governabilidade de um país tem relação íntima com a capacidade que os membros de uma sociedade têm de interpretar o mundo. A falta de ingestão de ingredientes culturais conduziu a uma espécie de consanguinidade intelectual - anemia crítica. Os parcos conhecimentos que circulam são os mesmos de sempre e não foram refrescados através do acto contínuo e interminável de leitura. A taxa de analfabetismo regrediu nos últimos 40 anos e até houve um concurso televisivo para apurar o uso da língua portuguesa (Sim, foi a Bárbara Guimarães que apresentou o programa, coadjuvada com trabalhos de casa administrados pelo Prof. Carrilho), mas isso não chega. Foi entretenimento de prime-time - mais nada. Por mais torres editoriais de marfim e escritores que nasçam, para gaudio de revistas literárias de elite, a verdade é que se a disseminação maciça da sabedoria não acontece, o futuro de um país torna-se refém da sua insuficiência intelectual. Para acompanhar as bancarrotas financeiras, a verdade vem agora ao de cima para revelar aquilo que muitos já sabiam - o estado da insolvência literária de um país. O Marcelo Rebelo de Sousa que passa os olhos sobre mais de 100 livros por semana, não é exemplo para ninguém. Não existe tal coisa como ler a correr (que é o que ele faz). A leitura é um processo que deve "atrasar" os processos mentais, que deve condicionar o leitor e obrigá-lo a paragens e retornos a diferentes análises em função do mesmo texto, idêntico parágrafo afinal distinto. Houve ao longo das últimas décadas uma festa incessante dos "produtores" de cultura. Tivemos festivais para aqui, capitais da cultura para acolá, mas tudo isso foi desenvolvido para os círculos de "iluminados", amigos e privilegiados que receberam convites para as vernissages. Os eventos mediáticos e cheios de glamour não serviram para apontar a luz da cultura na direcção do espectro alargado da população, daqueles que mais necessitavam. À semelhança de grupos de interesse económico e instituições financeiras que tomaram conta dos meios, houve apostas especulativas e operações de troca, um verdadeiro swap da missão cultural do país. E pode parecer que não há ligação entre tudo isto, mas desenganem-se. Um povo que não detém ferramentas de avaliação e interpretação da realidade, faz más escolhas. Por exemplo, elege representantes do poder político que são o espelho da sua precariedade, da sua ignorância - porque esses não lêem muito mais. Não têm tempo para isso. Estão nas comissões disto e daquilo e a passar os olhos na revista de imprensa para ver se ficaram bem na fotografia.