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A TVI/CNN quer ajudar o Pedro Nuno Santos, e as emoções são um potente catalisador quando a razão e a inteligência são insuficientes. As lágrimas vertidas em directo são genuínas. Não foram provocadas pela cebola do medo associado à extrema-direita. São pingos da mercearia local. Confecionadas com recurso a aditivos mediáticos cedidos a título de empréstimo pela estação de televisão. Quando a cabeça não tem o juízo suficiente, há que sacar da manga truques para cativar os mais vulneráveis — eleitores e espectadores, e espectadores-eleitores. Pedro Nuno Santos, mais um produto da casa socialista, sabe quão poderoso pode ser o apelo à flor da pele da irracionalidade primária. Ainda faltam mais de duas semanas até ao período de nojo da campanha. Não havendo mais debates ao cronómetro, este é o momento para dar largas à choradeira. Quando desmoronam os putativos edifícios políticos, por assentarem em frágeis pilares de argumentação, nada melhor do que apelar aos instintos animais, ao espírito selvagem, o mesmo devaneio que alimenta a corrupção ("não vim para a política para enriquecer"). Porque sim; trata-se de uma corruptela de alguidar dos princípios essenciais que devem nortear a intelectualidade política — a força de axiomas racionais que sirvam para sustentar indivíduos, comunidades e sociedades. As lágrimas salgadas que escorrem pelo desnível facial de Pedro Nuno Santos desaguam no farto pasto da pilosidade onde tudo se mistura no engano. E são corrimentos incomparáveis ao verdadeiro luto dos portugueses, aqueles sem médico de família ou casa onde morar. Quando um pretenso gerente chora, quebra o contrato social, readmite o principe e sugere as mesmas lágrimas esguichadas por tantos lideres questionáveis ao longo da história — para défice de indivíduos e nações inteiras. As lágrimas confirmam a falência ética e moral da política. Estar mais longe de estadista e mais perto do estúdio da TVI não é possível.
Após um interregno de quase seis anos, por razões de ordem académica, tenho alguma dificuldade em reintroduzir-me neste ambiente e redigir um texto digno deste blog. Paradoxalmente, estive ocupado durante este tempo todo com a redação e a entrega da minha tese de doutoramento que espero poder defender em breve. Ou seja, fartei-me de escrever e não menos pesquisar. Mas isso não me habilita particularmente para a tarefa do escrutínio analítico do estado da arte do comentário político em Portugal. As campanhas seguem a todo o gás e os comentadores da praça (com rarissímas exceções) não são mais do que filiais falantes dos partidos de sua eleição. Ou seja, perderam, se é que alguma tiveram, a equidistância analítica objectiva que se exige na e da ciência do comentário político. De um modo despudorado inclinam os pratos da balança, servem-se de figuras de distorção ou simplesmente deixam-se guiar pelas emoções da ideologia desenfreada que os cega. O apelo às emoções que afirmam representar um perigo para a democracia são precisamente as mesmas que já os contaminaram. Se a democracia corre sérios riscos, o comentário político não. O comentariado político já caiu no marasmo que dá azo à perda da credibilidade, que apunhala a objectividade e destrói a possibilidade do contraditório. A espécie de ultra-ortodoxia de género ideológico que destilam não tolera o contraditório e aniquila a possibilidade de estabelecer pontes e consensos. Mas os comentadores não têm culpa. Foram doutrinados pelos gurus que seguem na bruma que tolda o pensamento e a reflexão. Resta saber quais são as contrapartidas esperadas ou os favores que ainda são devidos. Tenham medo, muito medo. O extremismo do comentário político já se encontra entre nós. Está vivo e é pouco recomendável. Não sei o que é preferível: comentário político que não é comentário político, ou silêncio total.
Durante a última campanha eleitoral nos EUA, foram surgindo muitos apoiantes e acólitos de Donald Trump que, de certa maneira, se assemelhavam aos apoiantes de Obama que acreditavam que o primeiro presidente americano negro seria uma espécie de enviado divino com a missão de resolver todos os males no planeta. Claro que o entusiasmo pueril em torno de determinados líderes políticos (numa linguagem weberiana, alguns podem ser classificados como carismáticos), assim como a diabolização de outros, fazem parte da essência das campanhas eleitorais. Passada a campanha, quando o eleito é confrontado com a realidade política da governação, muitos dos seus eleitores acabam, inevitavelmente, por ver as suas expectativas frustradas, ao passo que muitos dos seus detractores, mesmo que não o admitam, acabam por perceber que o mundo não acabou e que a vida continua. Como ninguém está imune a este tipo de emoções, uma certa dose de pessimismo é, portanto, uma saudável recomendação para quem prefere afinar pelo diapasão da temperança. Por isto mesmo, não acreditei que Trump fosse um anjo ou o diabo, preferindo aguardar para ver no que resultaria a sua presidência. Quem tem acompanhado a política americana ao longo dos últimos meses reconhecerá que talvez fosse difícil fazer pior, salvando-se, no campo da política externa, como honrosa excepção, a mensagem que enviou à Rússia e à China por via do ataque lançado contra a Síria. Mas após o polémico episódio de há uns dias, em que Trump tweetou um vídeo de si próprio a esmurrar alguém com o logo da CNN no lugar da cabeça, estou convencido de que, embora não seja um anjo nem o demónio, Trump será, provavelmente, o mais patético líder político contemporâneo, um adolescente que, para mal dos EUA e do mundo, se encontra no mais poderoso cargo político existente.