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Lamego é uma cidade muito bonita. Tive a honra de a habitar durante cerca de 2 anos e de já há quase 20 anos trabalhar com e sobre o seu património. Não vou discorrer sobre a natureza das suas gentes, como faziam os panegiristas do Estado Novo, para quem a mulher e o homem do interior, na sua aparente bonomia, suscitavam elogios paternalistas dos próceres e intelectuais daquele regime enquanto modelos da nação pobre mas honrada.
Contudo, não posso deixar de assinalar a resistência deste paternalismo nos políticos de hoje, nomeadamente na figura do Senhor Presidente da República, que no seu discurso do 10 de Junho, dirigido em Lamego ao país e a muitos lamecenses, se referiu à «experiência destas terras do interior» como uma «lição para o país». Já não saliento, sequer, a forma distante, desapegada e quase depreciativa com que o nosso Chefe de Estado se dirigiu à região que o acolheu, mas à permanência daquele tópico saudosista do Estado Novo sobre a força e a honradez das gentes do interior. Aquelas gentes, daquelas terras, por oposição a um litoral (leia-se capital) ilustrado(a) e culto(a).
Fez-me pena o discurso e pena a reacção dos ouvintes e participantes. Pena pela incapacidade de um homem fazer-se líder inquestionável de um país democrático e democrata que, não puxando pelos seus galões patrióticos, já deu gente bem mais capaz; e pena por cada um dos que, em Lamego do dia 10 de Junho de 2015 ouviram e bateram palmas a um discurso que os diminuía ao tamanho de um rato.
Durante a monarquia constitucional ouvia-se e lia-se a crítica às benesses, mercês, títulos e comendas distribuídos, segundo os mais republicanos, a torto e direito, sem justificação e ou pena pelo erário público que as premiava a tença.
A República Portuguesa através do seu presidente distribuiu hoje comendas e medalhas, também sem justificação aparente em alguns casos, e recebe o silêncio de uns e palmas de outros.
Parece que antes de 1910 queria fazer-se crer a opinião pública que até os cães que recebiam as mercês. Hoje que os cães já são quase gente, quem as recebe?