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É isto que interessa. E o resto são lérias - a competitividade da economia portuguesa. António Costa deve colocar de lado o circo das sanções e encarar a música. A tónica de Centeno tem sido o estímulo do consumo. Ou seja, começa pelo fim. Em vez de pensar em gerar riqueza e investimento (e depois o consumo), querem afagar o pêlo bronzeado dos portugueses, dando-lhes uns cupões para gastar na silly season. Atente-se no detalhe expresso pelo Fórum para a Competitividade: "os valores apresentados pela DGO não representam a verdade orçamental e que assistimos a uma repetição do que já se passou em 2001 e 2009“. Em suma, nada disto é novo. Que o diga José Sócrates que já se pôs de joelhos para ver se lhe continuam a dar de mamar vitaliciamente - as fotocópias já não são o que eram. Aliás, Sócrates é a perfeita imagem de um país destroçado pelos excessos. Se a crise fosse um país, Sócrates seria a mascote perfeita do desespero. Enquanto a bomba não rebentar, no leilão de resgate da Caixa Geral de Depósitos (CGD) discutem os milhares de milhões de euros como se de feijões inconsequentes se tratassem. Já que a pasta CGD está a ser discutida com o conhecimento (e aval) de entidades europeias, não vejo como tal colosso de berbicacho possa ser tratado à margem de considerações orçamentais genéricas. Por outras palavras, não acredito em sanções, mas que elas existem, existem. Têm outro nome - aumento de impostos, de IVA, de IMI, congelamento de salários, etc, etc. Em suma, anti-austeridade à moda antiga. 2011, não tarda nada.
Como diria o Dragão, "há marasmos mentais que eu, de todo, dispenso." Um deles, muito em voga, tem a ver com a tão propalada necessidade de aumentar a produtividade, que por sua vez contribui para aumentar a competitividade, o que levará, inevitavelmente, ao crescimento económico. Ora, na prática a teoria é outra, por uma razão muito simples: nós estamos inseridos numa zona monetária incompleta e frágil, na terminologia de Paul De Grauwe. Em qualquer zona monetária deste tipo, i.e., onde não existe uma união orçamental nem mecanismos que permitam, por via da redistribuição, disseminar a actividade económica de forma a corrigir desequilíbrios e a evitar ou, pelo menos, tornar menos dolorosos os choques assimétricos a que uma zona monetária destas está por defeito sujeita, a economia mais forte torna-se dominante e gera excedentes à custa dos défices das economias mais fracas. Tal como no Sistema de Bretton Woods os EUA tornaram-se o hegemon, e no Sistema Monetário Europeu esse papel foi desempenhado pela Alemanha, com o Bundesbank a definir as políticas monetárias que eram do interesse da Alemanha, obrigando os restantes países a ajustarem-se a estas, na União Económica e Monetária é novamente a Alemanha o país dominante, consequentemente, sendo o único país com uma política monetária autónoma - com a agravante de, na UEM, termos uma moeda única.
Ora, como ainda recentemente assinalou Andrew Moravcsik, o euro está subvalorizado em cerca de 40% em relação à economia Alemã. Quanto aos países da periferia, é razoável estimar que esteja sobrevalorizado também em cerca de 40%. As implicações da entrada do euro foram diversas nestes dois tipos de países. Enquanto na Alemanha aumentou muito a competitividade externa, no caso português diminuiu-a acentuadamente, conforme Luciano Amaral faz notar, colocando ainda a dívida externa portuguesa numa trajectória insustentável, como Ricardo Cabral evidencia.
O que é que isto significa? Que não há, por muito que queiram, reformas estruturais - por mais que estas sejam necessárias e devam ser encetadas, o que não contesto, bem pelo contrário - e aumentos de competitividade que nos valham se a UEM (e a UE) não for reformada ou pura e simplesmente dissolvida, ou se nós não nos retirarmos desta. Nem sequer uma reestruturação da dívida, mantendo-se tudo o resto igual, resolverá os nossos problemas, podendo apenas adiá-los e a uma nova crise por mais alguns anos. A Alemanha está muito confortável com a sua posição económica dominante, que Hans Kundnani caracteriza como narcisimo económico, e sendo também a potência que, como Ulrich Beck assinala, manda na União Europeia, não é de esperar que altere a sua linha política. Acreditar que, com estes apertados garrotes, é possível aumentar a produtividade e a competitividade e gerar um crescimento económico que leve a uma diminuição acentuada do nível de desemprego e a gerar excedentes que nos permitam pagar a dívida, ou seja, acreditar que podemos tornar-nos iguais à Alemanha, é apenas, como Peter Hall afirma, "outra daquelas miragens que se atravessa no caminho de soluções genuínas para os problemas."
(imagem picada daqui)
Não é por nada, mas esta história toda em torno dos feriados já chateia. Não há nada mais importante para discutir? O défice, a dívida externa, por exemplo. O verdadeiro problema não é a existência de feriados a mais ou a menos. O verdadeiro problema do país é o mesmo desde há 900 anos: falta de produtividade. A juntar a outro relativamente mais recente: Estado a mais. Podíamos não ter feriado algum, nem férias, que mesmo assim não conseguiríamos pagar o despesismo estatal. E não é a cortar em feriados que se vai aumentar a produtividade. Essa passa pela mudança de mentalidades, por maior liberdade económica e, por conseguinte, menor peso do Estado na economia e no bolso dos trabalhadores e empresas.
A única razão por que se discute esta questão é apenas para continuar a manter um Estado que promove a desigualdade em favor dos bolsos de milhares de "boys" e funcionários públicos que pouco ou nada fazem para além de serem fantoches de jogos eleitoralistas dos primeiros - aliás, não é por acaso que a proposta vem da bancada socialista. Porque, perguntem a qualquer pequeno ou médio empresário, não há horários, feriados ou fins-de-semana quando se tem um negócio próprio. E eu sei do que falo, pois exemplos de pequenas empresas na família não me faltam.
Deixem-se desta discussão de um fait-divers e lembrem-se do essencial: reduzir o Estado e aumentar a produtividade (do sector público principalmente, que o privado está cada vez mais desmoralizado e em crise pelo agravamento de impostos com o objectivo de pagar as asneiras dos (des)governantes - e a concorrência que gera aumentos de produtividade no sector privado também só se consegue num ambiente em que os impostos não penalizam demasiado as empresas). Pelo caminho, concentrar os esforços do Estado naquelas que devem ser as suas tarefas primordiais - saúde, educação, segurança e justiça -, também não era mal pensado.
(imagem picada daqui)
A respeito do PEC e, especialmente, do plano de privatizações da EDP, REN, Galp, CTT, Seguradoras da CGD, Zon etc, a concretizar-se, parece-me que o mais importante é a transformação que ocorrerá ao longo dos próximos anos quanto ao papel que o Estado ocupa na sociedade portuguesa.
Obviamente concordando com o enfraquecimento do peso do Estado na economia - quanto maior esse peso, maior a servidão e menor a liberdade, e a mera lógica indica que a tendência para que as empresas privadas sejam melhor geridas é muito maior do que com gestões ou participações/intervenções estatais, já que o Estado está sempre segurado pelo erário público, tornando-se, por isso, descuidado e despreocupado - o que importa perguntar é se estamos prontos para esta transformação.
Esta transformação implica que o Estado vai deixar de ser tão interventor para passar a assumir funções mais prementes no que à regulação diz respeito. E, sendo assim, haverão reguladores à altura? Isto é, haverá gente capaz de criar condições para o funcionamento competitivo do mercado, evitando e/ou eliminando e punindo distorções como os monopólios, oligopólios e concorrência desleal que normalmente prejudicam os consumidores finais (com preços demasiado elevados para os serviços prestados, por exemplo)?
Quanto ao resto, é esperar que o Estado se concentre naquelas que devem ser as suas funções primordiais - educação, saúde, segurança e justiça. Por último, importa realçar o impacto que estas medidas têm na redução da dívida pública. Provavelmente não havia alternativa - senão, mais tarde ou mais cedo, correríamos o risco de ter o FMI ou a UE a governar-nos -, e é bom de ver, aliás, irónico até, um governo socialista pautar-se por lógicas liberais quando em estado de necessidade. A necessidade obriga ao pragmatismo e à recusa de ideais e retóricas em clara falência teórica e prática.
P.S. - Frequentemente lê-se e ouve-se por aí que cabe ao Estado definir sectores estratégicos da economia e, dizem até alguns, nacionalizá-los. Normalmente até concordaria que o Estado deve definir sectores estratégicos. Contudo, quando não há um Conceito Estratégico Nacional, querem definir o quê? Não sabem o que querem fazer ao país e à nação, não há um projecto de fundo de desenvolvimento do país, e aquilo que é mais básico para tal, i.e., o planeamento territorial, é um caos. Portanto, querem definir que sectores como estratégicos se não há uma estratégia que sirva de base teórica a essas escolhas e definições? É ilógico. Só quem tem preconceitos contra o sector privado e acha que o Estado é sempre um bom gestor pode acreditar nisto. São caprichos de ideais ultrapassados que têm custado muito caro aos contribuintes. E isso, é uma falta de bom senso e de pragmatismo que já foi contrariada várias vezes pelos ventos da história do século passado. Não aprenderam nada, claro está.