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A sobrevalorização da forma sobre a matéria, do método sobre a teoria, da comunicação sobre a substância, é sintomática de sociedades permeadas pela superficialidade e efemeridade associadas à modernidade líquida. Nesta, com a relevância assumida pela “empresa” e pelo “mercado” em resultado da globalização económica a manifestar-se na forma como a governação política é encarada e exercida, o poder político vê-se na contingência de poder mudar, frequentemente de modo autoritário, sem uma discussão alargada, características identitárias patentes nas formas comunicacionais, como se um Estado ou um Governo fossem uma qualquer empresa privada. Tratando-se de alterações cosméticas a que subjazem disputas estéticas e políticas, não existe, neste ambiente social e cultural, qualquer possibilidade de arbitrar tais contendas por referência a critérios racionais e comunitariamente partilhados, com as preferências a residirem somente em gostos individuais. O que é feito encontra justificação apenas na força, na vontade de quem temporariamente exerce o poder político. Quem vier a seguir pode sempre fazer como quem veio antes, voltando a mudar a identidade visual, que com tantas variações acaba por erodir o seu próprio significado e, consequentemente, a identificação da comunidade política com o Governo. Nesta matéria, os diferentes governos têm-se comportado como um novo conselho de administração que opera um “rebranding” para se distinguir do anterior. Que as elites governantes não se apercebam do processo de desinstitucionalização do poder político associado a tal comportamento, não é surpreendente. Mas nem assim tudo isto deixa de ser lamentável.
O Bloco de Esquerda (BE) interpretou magistralmente o enunciado de Fernando Pessoa: "a minha pátria é a língua portuguesa". Deve ter sido por essa razão que descurou o primado da língua alemã no cartaz que grosseiramente mandou imprimir. Mas há considerações que transcendem os erros tão gratuitamente expostos. Não é suposto os partidos políticos dependerem de comunicações acertadas (escrevi acertadas e não assertivas!)? Não são as mensagens o seu principal veículo de doutrinação? O que aconteceu no BE também sucede no quotidiano profissional português - a falta de rigor. A Catarina Martins e a sua equipa de copywriters procurou desenrascar a coisa à Lagardère. Provavelmente existem no bloco uns quantos germanófilos não assumidos que emprestaram a sua mãozinha barata - sim, as traduções pagam-se. As revisões de texto também. Uma outra possibilidade que se lhes apresenta é terem tido a intenção de denegrir o acervo linguístico da Alemanha, corrompendo as regras de gramática. Mas essa hipótese é excessivamente rebuscada. Enganaram-se sem o saber, porque não quiseram saber. E podem tirar o chevalinho da chuva, esse grau de incompetência nada tem a ver com preferências ideológicas. Desta vez foi o BE. Poderia ter sido outro grémio literário-partidário. Ando eu a esforçar-me para aprender o idioma alemão (sim, estou no nível B1) e vem esta malta baralhar-me ainda mais a cabeça que já não anda boa com o apanágio das declinações). No entanto, dou o dicionário a torcer à Katrin Martins. Os erros impressos em tamanho de outdoor relacionam-se com a complexidade do tema gramatical que tem ocupado os alemães desde que Goethe saiu de Weimar. Eu sei que errar é humano. Mas quem não sabe deve perguntar. Quantas vezes me confronto com dúvidas respeitantes ao correcto uso da língua de Camões? E o que faço? Em alguns casos, se o virus persiste na minha narrativa mental, pego no telefone e falo com uma profissional que tão bem conhece a língua portuguesa. Admito que não o fiz no decorrer e discorrer deste texto. Agradeço que me indiquem onde estão as calinadas e num passe de mágica editorial procederei à correcção do texto que aqui vos apresento.
Antes de mais quero agradecer ao Samuel pelo simpático convite para me juntar à equipa do Estado Sentido. Espero que enquanto aqui estiver possa trazer contributos interessantes, vocês saber-me-ão dizer se o consegui.
Não é a minha primeira experiência na blogosfera, mas para já fiquemos por aqui. Como o Samuel disse trabalho na área de comunicação, embora, neste momento, não esteja ligado à comunicação política, mas sim, empresarial. Nos próximos tempos irei andar aos encontrões e apalpadelas, à procura do meu estilo, espaço e tempo.
Espero que tenham paciência e que caso queiram rebater algo, façam-no na certeza de que só vale a pena partir para uma discussão se estivermos dispostos a mudar de opinião. Prometo fazer o mesmo. Não responderei a comentários anónimos.
Para começar queria chamar a atenção para um pormenor interessante que li no outro dia, sobre a crise na Ucrânia. Não é de todo o mais relevante aqui, nem procura ser um ponto de partida para qualquer teoria que explique os acontecimentos que dominam a agenda mediática, mas interessou-me...
Falo de comunicação num lugar aparentemente improvável, a Praça Maidan. Segundo um trabalho bem interessante do Público, uma das prioridades de quem lutou contra o anterior governo ucraniano é a criação de um gabinete de relações públicas.
«Michailo reconhece: “A nossa prioridade agora é criar um departamento de Relações Públicas, para controlarmos o que se diz nos media. Isto é uma guerra da informação. E nós perdemos a guerra da informação com Putin”.»
Os acontecimentos na Crimeia foram rápidos a desviar atenções da Maidan, impondo-se na ordem do dia por si próprios, mas também pelo facto daquela ter conseguido o que se tornou no seu objectivo primeiro- a destituição do Presidente Viktor Ianukovitch.
Um “departamento” de Relações Públicas pode ser sem dúvida uma boa ideia embora duvide da sua utilidade dado o timming. Porém como se pode ler na mesma peça do Público «a Maidan não está satisfeita com o Governo. E uma segunda vaga da revolução pode começar a qualquer momento.»
Se assim for, fará certamente sentido (e julgo que abrirá um precedente), embora duvide que se consiga “controlar” os media. Se nem na “ordem” se consegue, muito menos na “subversão”. Para além de que, dificilmente uma hipotética “segunda vaga" da revolução” seja mais moderada que a primeira o que só iria prejudicar as almas bem-intencionadas. Nesse caso a percepção (não partilhada por mim) de que, a mudança de poder, e tudo o que esta desencadeou se deveu à acção da extrema-direita, será demasiado forte para ser contrariada por qualquer gabinete de relações públicas. Mas boa sorte!
Passos é definitivamente uma nulidade política. Ponto. Fazendo um exercício comparativo com o maior parlapatão da III República, José Sócrates, o talento comunicacional da equipa passista fica a léguas de distância do socratismo. Sócrates foi exímio na arte da mentira e soube dourar a pílula como poucos. Foi, no fundo, um Afonso Costa moderno, sem o talante político deste símbolo da terrorista I República. Passos é um aluno da pré-primária no que toca a estes arranjos marqueteiros. Anuncia e retira, clama e nega logo a seguir. A acção comunicacional deste Governo é má, péssima, horrível. Não há adjectivos que a qualifiquem. E, como eu mencionei na posta anterior, o letargo da cidadania não é eterno. Fiem-se na virgem e não corram.
Uma "criativa" interveniente no Prós e Contras critica o governo por não ter uma estratégia de comunicação adequada, aconselhando o mesmo a contratar um director de marketing e a começar a dizer coisas claras às pessoas como "apaguem a luz mais vezes, andem de transportes públicos, etc." Portanto, o que lhe vem primeiro à cabeça são medidas que têm impacto apenas na vida dos indivíduos e como devem ser comunicadas, em vez daquilo que realmente tem de ser feito, que é pensar e reformar o Estado, o verdadeiro responsável pelo descalabro em que nos encontramos. Este é o problema de muitos marketeiros, reduzem a política à comunicação, não tendo qualquer mínima noção de metapolítica. Esquecem-se que já tivemos um expoente máximo desta visão, um actual aspirante a filósofo parisiense. Deu um bom resultado, não deu?
Adenda: o meu ponto neste post é o de mostrar a fragilidade de muitos marketeiros e da redução da política à comunicação sem metapolítica, o que não invalida o facto de este governo ter um grave défice ao nível da comunicação, que urge ser suprido.
João,
Já em resposta a outro post disse quais são, para mim, os propósitos desta iniciativa. Agora se tens uma solução para iniciativas que possam ser (1) patrocinadas por uma instituição como a Causa Real, (2) que possam ser realizadas dentro das suas limitações financeiras, e (3) que ainda tenham um efeito viral, então que tal partilhar connosco?
Talvez algo na linha do "evento" de homenagem a Steve Jobs? Afinal estamos a falar de um “evento” criado por uma agência de comunicação moderna e de sucesso, certo? Segue então a minha visão “cinzentona” de um caso de estudo de um modelo alternativo de comunicação:
A eventual adesão ao “evento” é fruto do mediatismo de Jobs, transformado recentemente em herói, de acordo com os padrões da nossa ditosa modernidade.
O “evento” não refere qualquer valor ou qualquer causa que se queira entaltecer, nem sequer simbolicamente, apelando a uma acção absolutamente irrelevante, que a agência de comunicação terá decidido ser a adequada homenagem a Jobs.
Jobs, para qualquer Português, tem ainda menos “valor sentimental” do que tem, por exemplo, um Angélico.
Jobs é cool. Angélico não. Ambos, no entanto, têm buzz – partindo do princípio que eu percebi o que é o buzz.
Sendo que o valor do “evento” é absolutamente nulo, tanto em termos emocionais como em termos objectivos, conclúo que o “evento” talvez não passe de uma mera manobra de propaganda da agência de comunicação que o promove, aproveitando-se do sensacionalismo da morte de Steve Jobs.
A jeito de curiosidade, Jobs sucumbiu vítima de cancro do pâncreas, mas isso é irrelevante.
Ora se é este o conceito de comunicação que se quer ver exportado para a Causa Real, da minha parte: não obrigado (mas se a minha conclusão está errada, e esta é afinal uma sentida homenagem de um grupo de Portugueses muito emocionados pela morte e vida de Steve Jobs, então peço desde já que perdoem a minha falta de sensibilidade, coisa que aliás não vos deve faltar lá pelos lados da BAR).
De volta ao seu post: concordo, não é assim que se mudam regimes. Aparentemente só com tiros pelas costas é que a coisa lá vai.
Em suma: há lugar para iniciativas cinzentonas e lugar para iniciativas coloridas, sendo ambas úteis e necessárias à causa. O que devia ser óbvio é que em algumas iniciativas, quer se queira quer não, simplesmente não cabe a Causa Real. Serão estas, porventura, as que terão maior impacto junto dos Portugueses, mas isso em nada diminui o papel (às vezes mais colorido, outras vezes menos) da Causa Real.