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Da sobrevalorização da comunicação na era do vazio

por Samuel de Paiva Pires, em 04.04.24

A sobrevalorização da forma sobre a matéria, do método sobre a teoria, da comunicação sobre a substância, é sintomática de sociedades permeadas pela superficialidade e efemeridade associadas à modernidade líquida. Nesta, com a relevância assumida pela “empresa” e pelo “mercado” em resultado da globalização económica a manifestar-se na forma como a governação política é encarada e exercida, o poder político vê-se na contingência de poder mudar, frequentemente de modo autoritário, sem uma discussão alargada, características identitárias patentes nas formas comunicacionais, como se um Estado ou um Governo fossem uma qualquer empresa privada. Tratando-se de alterações cosméticas a que subjazem disputas estéticas e políticas, não existe, neste ambiente social e cultural, qualquer possibilidade de arbitrar tais contendas por referência a critérios racionais e comunitariamente partilhados, com as preferências a residirem somente em gostos individuais. O que é feito encontra justificação apenas na força, na vontade de quem temporariamente exerce o poder político. Quem vier a seguir pode sempre fazer como quem veio antes, voltando a mudar a identidade visual, que com tantas variações acaba por erodir o seu próprio significado e, consequentemente, a identificação da comunidade política com o Governo. Nesta matéria, os diferentes governos têm-se comportado como um novo conselho de administração que opera um “rebranding” para se distinguir do anterior. Que as elites governantes não se apercebam do processo de desinstitucionalização do poder político associado a tal comportamento, não é surpreendente. Mas nem assim tudo isto deixa de ser lamentável.

publicado às 13:23

Saboroso

por John Wolf, em 14.12.17

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A culpa é de Luís de Camões, de Aquilino Ribeiro, e já agora, de José Saramago. Quando o primeiro-ministro escolhe mal as palavras ou tem dificuldade em se exprimir, o ónus da asneira é da língua portuguesa. António Costa nem se pode socorrer do acordo ortográfico para emendar o sabor do soneto que enuncia. Sentimos, neste executivo, a preocupação na poupança da ponderação e o exagero no improviso da comunicação. Não sei se o primeiro-ministro prepara o que vai dizer num guardanapo ou numa tablete, mas confirmamos o desempenho amador das tiradas de comunicação. No entanto, o seu estilo particular de "dizer" já contaminou o terço socialista - Vieira da Silva esteve prestes a deixar descair a palavra gostosa - a instituição Raríssima é gostosa (?). Os outros dois da geringonça são mais cuidadosos. Jerónimo de Sousa não se engana - a cassete é sempre a mesma. E Catarina Martins usa a mesma receita de blá blá blá com alto teor de moralismo. Sublinhemos porém que o primeiro-ministro é muito mais flexível, polivalente. A expressão saborosa tanto serve a travessa de arroz de pato, como serve para retratar um ano raríssimo. Por outro lado, o homem pode ser tão sofisticado ao apelar aos "pupilos gustativos" - aqueles que o seguem e que sabem que o bom comportamento geralmente resulta em bombons, como uma nomeação para uma secretaria de Estado ou direcção de um organismo de solidariedade social. Em suma, è a base de doçaria institucional que o país se governa. A disciplina austera da Direita bolorenta cedeu lugar às liberdades e estímulos pavlovianos da Esquerda iluminada. Eu acredito que eles acreditam que a educação política dos filiados se faz por via da recompensa açucarada. Este ano saboroso tem muito que se diga. Fica entranhado nos dentes. É um chupa-chupa.

publicado às 13:31

Comunicação Política para Totós

por John Wolf, em 22.09.17

 

Embora não vá votar porque não posso votar, e mesmo que pudesse votar provavelmente não votaria, não deixo de ser visado enquanto potencial-candidato-eleitor - o meu voto é desejado.  Recebi na caixa do correio (nas últimas semanas) missivas de toda a espécie e feitio de impressão. Foram cartas e brochuras, panfletos e desdobráveis de todas as hostes partidárias, apelando ao meu poder de encaixe autárquico. Tive, desse modo, a feliz oportunidade de pôr essa leitura em dia no decorrer de actividades sanitárias - sentado, entenda-se (com as mãos livres, sem cometer infracções). Lavei as mãos e posso afirmar que me encontro em condições de avaliar como a Comunicação Política é realizada pelas diversas forças partidárias em Portugal no festival eleitoral em curso. Devo dizer que as propostas apresentadas carecem todas de um enquadramento conceptual e de uma visão estruturante. Ora falam de parques de estacionamento, ora mencionam apoios sociais, ora congratulam-se pela obra feita, ora reclamam pela incúria dos outros...enfim, não passam todos da mesma chapa gasta vezes sem conta a cada campeonato autárquico. O formato foto-passe de todos partidos pretende confirmar o alto teor de democraticidade e convívio político entre as cabeças de lista - as estrelas da companhia -, e os pobres anónimos resgatados da paragem de autocarro para preencher as listas. A Comunicação Política simplesmente não existe. Existe uma forma de Comunicação, mas não preenche os requisitos da Política. São Políticos que se apresentam, mas não Comunicam eficazmente. Plagiam-se a torto e a direito. Chamam algo diverso à mesma coisa, mas não passa de embuste ideológico. Gastam rios de dinheiro em bandeirinhas e esferográficas, pastas e sacos para arremessar a tralha, mas não conseguem erradicar os vícios da classe política canonizada pelo mistério da promessa cumprida. Os textos que acompanham a vontade política são fracotes e encontram-se na fronteira do pueril, do dispensável. Desejariam, se soubessem, ou pudessem, a sofisticação subtil, a sugestão da genuína transformação filosófica que está na génese das aspirações da freguesia, do concelho, da região, da península, do mundo. Mas não conseguem. Estão presos, cativos num labirinto de inconsequências e desperdícios. Tanta coisa para tão pouco. Tantos. Bastava um(a) para fazer o frete a todos. Criatividade, inteligência ou originalidade não fazem parte de lista alguma. Triste. É triste. É tão triste.

publicado às 15:35

O PS e o apelo ao medo

por John Wolf, em 09.08.15

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A agitação em torno da ficção dos cartazes do Partido Socialista faz parte da matriz política - deplorável. A comunicação ideológica em Portugal assenta em diversos pilares iconográficos rudimentares, e não se restringe àquele partido em particular. O futebol é um deles, mas não é o único. Se António Costa pudesse acumular ambições, e fosse simultaneamente presidente da Câmara Municipal de Lisboa e candidato a primeiro-ministro, poderia se servir da linguagem de alcatrão e mandava arranjar umas ruas de Lisboa - os fregueses amam os seus carros. Mas esses tempos já lá vão. Na bola as perspectivas também não são as melhores. As taças de Portugal erguidas nos Paços do Concelho são meros postais de um passado avistado com laivos de nostalgia.  E a igreja católica também já não pode dar uma mãozinha: António Costa não pode seguir o caminho de apelo à fé do eleitor. Não jogaria com o seu DNA ecuménico, universal, espelhado na inclinação de um Martim Moniz admitido para mitigar diferenças. Não esqueçamos que a própria instituição religiosa tem os seus próprios casos de falência ética. Por isso, e à falta de argumentos prospectivos assentes na construção política positiva, os socialistas escolhem o instinto primário enquanto veículo principal. Nomearam o medo enquanto mediador de vontades. Servem-se da imagem de caos laboral para semear pânico. Usam o desemprego para afugentar peregrinos, mas tropeçam nos raciocínios feitos à pressa, enganam-se na matemática. O papão já não mete medo, e, à medida que os índices de desespero aumentam, e a retoma económica se consolida, os socialistas procurarão sacar uma qualquer vantagem e embarcar num tuk-tuk político - algo pensado por outros, mas convenientemente aproveitado pelos marketeers do Largo do Rato. Um país político dependente de cartazes e outdoors não augura um futuro promissor. No fundo quem controla os conteúdos e as mensagens da oposição política em Portugal é a soma das partes - a coligação PSD-CDS. O governo de Portugal conseguiu pôr os partidos concorrentes a responder à letra. Levou os pensadores da alternativa e da confiança a morder o isco. Os socialistas, vendedores de utopias e detractores da realidade, ficaram cegos. Não são capazes de imaginar. Não são capazes de vislumbrar um país para além de uma coligação. Sinceramente esperava mais. Tinha expectativas que fossem capazes de saltar fora do seu rancor ideológico e abraçar a sociedade civil. Mas não. Em vez disso, fecham-se em copas. E esmagam-se em cartazes com gente que não existe - mal empregada.

publicado às 11:32

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Para além da crise económica e social que assola Portugal, agora temos de lidar com a intensa crise de cartazes da campanha eleitoral do Partido Socialista (PS). Lá para os lados do Largo do Rato existe mesmo um défice de soluções. É caso para dizer: "até eu faria melhor", e, na senda dessa ideia, talvez não fosse mal pensado os alegados profissionais de comunicação e marketing políticos instalarem ardósias, para que cada cidadão pudesse inventar o seu chavão de agravo, partilhar a sua consternação, chamar nomes aos que estão no governo, e com um mata-borrão apagar a memória de outros mandatos que tiveram desfecho em Évora. Isso sim seria a plena expressão de democracia participativa. Iria mais longe até. O cartaz e slogan mais criativos teriam direito a prémio de consternação: um lugar na lista eleitoral ou um posição numa empresa pública. O giz poderia ser distribuído gratuitamente com o patrocínio de um grupo económico qualquer ou uma ex-instituição financeira da praça. Acho muito bem que os discípulos de Seguro exerçam pressão sobre o chefe socialista. Afinal mandaram o Seguro às urtigas, mas não me recordo de algo tão sórdido quanto isto no reinado do Tozé. Contudo, existe uma outra possibilidade. O responsável pela comunicação política do PS ser um agente-duplo, uma toupeira plantada na estrutura partidária para arruinar os planos de Costa e companhia. Tudo é possível na política, não se esqueçam disso. Embora estejamos de vento em popa na silly season, o que vemos escrito em tamanho garrafal nesses cartazes infames, tem mais a ver com silly reasons. Ou seja, veneno destilado e cuspido da boca para fora, sem que houvesse um tempero de reflexão, a análise profunda que os slogans políticos exigem ainda antes de serem rejeitados. No PS sente-se essa vontade de partir a loiça toda, mas falta a tranquilidade e o bom-senso para pensar além-dor, para além do rigor de um inverno que foi imposto a Portugal, mas que não caiu de pára-quedas, assim sem mais nem menos.

publicado às 15:09






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