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Portugal está a assistir a acontecimentos peculiares, com uma carga dramática intensa e com laivos de ironia histórica. Está a viver a descolonização daqueles que resultaram da descolonização dos anos sessenta e setenta. Parece que estamos a reviver a demise do império ultramarino sem ter de ir além-mar. O descalabro que está a acontecer, está à distância de um autocarro da Carris, à distância de um bairro cada vez menos de periferia. Os Portugueses, que foram enviados para o desterro, que emigraram, também foram descolonizados de sua casa. Tudo isto é trágico, e coloca numa mesma casa de desespero, nativos, colonos, e imigrantes. A séria crise que se nos atravessa, serve também para destapar as graves falhas de sucessivos governos, no que concerne à integração daqueles provenientes das ex-colónias. Por outro lado, os neo-colonizadores do norte da Europa ainda não perceberam que estão a criar um fenómeno que há alguns seria impensável nos territórios de uma Europa "civilizada". Em breve, a expressão que será empregue pela primeira vez na União Europeia, será refugiados europeus. Em cada um dos países afagados pela mão áspera da Troika, os cidadãos desses países já vivem a condição plena de refugiados. Procuram fugir da perseguição dos governos que elegeram. As comunidades provenientes de ex-colónias Portuguesas, que depositaram confiança na pátria de acolhimento, estão a braços com um dilema adicional. O regresso aos seus países de origem, se realizado em grande escala, decerto que esmagaria as parcas estruturas que começam a ser erguidas naqueles países emergentes que carregam passados históricos complexos, pejados de destruição e da falta de instituições democráticas, no seu sentido mais profundo e consolidado. A Austeridade já não é apenas Europeia. É já um fenómeno que se sente em diversos países Africanos, pelas ondas de choque que se fazem sentir na vida de cidadãos provenientes das ex-colónias Portuguesas. Essas comunidades não conheceram outra coisa senão Austeridade, mesmo quando a Austeridade ainda não tinha sido inventada. Sempre viveram com grandes dificuldades e marginalizados pelo mainstream político. Agora assistimos à africanização da Austeridade. Quando pensamos em Portugal, realizamos um exercício enorme. Portugal tem o mundo todo contido em si. E Portugal tem compatriotas espalhados pelos seus quatro cantos do mundo. A grande estratégia nacional tem obrigatoriamente de incorporar esse sentido universal. Pelas razões atrás referidas, e outras que não cabem nesta discussão, o papel de Portugal é importantíssimo no quadro Europeu, e por essa razão há que dar forma à sua voz, de modo a que possa condicionar o desenho dos anos futuros, da Europa e do Mundo. Temo, porém, que os lideres nacionais não sejam capazes de vislumbrar a mudança de paradigma a que estamos a assistir. Juntemos a esta equação Portuguesa, as matrizes contidas em França, na Alemanha, em Espanha, na Turquia e na Grécia, e verão que estamos a braços com um desafio de proporções incalculáveis. O Conselho de Estado a que (não!) assistimos demonstra a infantilidade e inconsciência dos nossos governantes. Algo muito mais profundo está em causa que torna irrelevante coligações e a fita-cola que desejam usar. O país fracturado não pode ser reparado com ligaduras, mas também não pode permanecer engessado em atavismos.