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No futuro próximo, seja qual for o governo que estiver em funções em Portugal, não terá a sua vida facilitada. O tema da Austeridade que condicionou o discurso e a acção políticos dos últimos quatro anos será substituído por algo ainda mais dramático. Façamos a distinção entre a manutenção de um sistema a todo o custo, e o descalabro da ordem subjacente. Quando Cavaco Silva perfila o seu sucessor como alguém com experiência em relações externas, acerta nas qualificações, mas engana-se no posto. Quando escuto as palavras convenientes de António Costa sobre o fim dos tempos difíceis em Portugal, a reposição das pensões dos reformados, o crescimento económico e o emprego, vejo uma criança. Os grandes estrategas do Partido Socialista (PS) apresentam-se com ganas de vingar Portugal, mas omitem as dinâmicas do resto do mundo. Descuram cenários extremos que estão a acontecer além de Badajoz. O crescendo que se regista na opinião pública na Alemanha sobre a saída grega do Euro deve ser integrado na racionalidade política e de um modo expressivo. A agenda para a década do PS vendida como panaceia, incorpora ou não uma Europa radicalmente transformada ou assenta em premissas falidas? Mas acho que encontrei a explicação para o desprezo no que toca a condicionantes excêntricas. Se os socialistas chegarem ao poder, e quando começarem a falhar as suas receitas, sempre poderão atribuir a culpa a factores exógeneos. Mas existe uma contradição endémica nessa hipotética abordagem. O sistema europeu não irá explodir fruto de ameaças de Tsipras e da sua falange revanchista. A ordem da Zona Euro e da própria União Europeia sofre o desgaste no âmago da sua construção. E os sonhos acordados dos socialistas também sofrerão, por analogia, das mesmas contradições endémicas. A natureza ideológica da Europa assente na ideia de Seguranças Social e subvenções sem fim, está em profunda mutação. Os socialistas do Rato ainda não entenderam isso. As instituições europeias também parecem caminhar de um modo desalinhado. O lider do Eurogrupo fala de uma solução à Chipre, enquanto na Alemanha o Grexit parece estar a ganhar cada vez mais adeptos. António Costa, que se tem esquivado às questões que dizem respeito aos homens, vai ter de tomar decisões difíceis. E isso vai baralhar ainda mais as contas. Para além da complexidade que define todo este processo político-financeiro europeu, vamos ter de incluir juízos errados de futuros governantes nacionais. Preocupa-me a falta de visão do mundo daqueles que prometem salvá-lo.
Enquanto uns realizam testes primários, outros demonstram ao mundo o valor da ausência da palavra. Enquanto uns discutem IVAs e restaurantes, outros redesenham mapas de continentes. Enquantos uns estão à janela, outros organizam respostas concretas a ameaças substantivas. Enquanto uns falam de traições, outros dão facadas. Enquanto uns estão focados em si, outros sabem que deixaram de ter importância. Enquanto uns angariam simpatizantes, outros inscrevem combatentes. Enquanto uns pensam em tachos, outros aumentam a pressão da panela. Enquanto uns dormem, outros estão acordados. Enquantos uns são o que são, outros nem isso conseguem ser.
Ontem, caminhava pelas ruas em Vila Nogueira de Azeitão, ao lado de um dos poucos amigos, daqueles de Sempre, com quem a vida fez questão de me manter emaranhado. Anos separados, volvido um período em que ambas as nossas estradas se deram por satisfeitas com o calcorrear que delas fizemos, calhou que nos reencontrássemos.
Ao pensar na série de eventos, binários ou não, que terão feito com que aos 43 anos qualquer de nós se sentisse perante um espelho, tal a similitude na distribuição das prioridades que nos regem a vida, não posso senão divagar.
Aquando do II Forum da associação Abrigo, em conversa com os demais participantes, chegou-me uma frase reportadamente (e certamente consubstanciada algures) proferida por Laborinho Lúcio, com a seriedade e honradez que lhe são devidas, e que empalidecem quaisquer das personagens caricatas que hoje povoam o éter mediático. Terá dito, a propósito do adágio "o melhor do mundo são as crianças", que não; que o objectivo tem de ser outro, que todos devemos convergir na promoção de outra frase: o que é preciso (e subscrevo estas palavras, de cada vez, do alto da minha secura quarentona, com a voz mental embargada) é que possamos um dia ouvir as crianças dizer que o melhor do mundo são os adultos.
É ou não é verdade? É.
Sucede que este amigo com quem ontem passeei, à semelhança do que eu próprio tenho tentado fazer dos meus anos de Outono, enveredou por um projecto, para empregar terminologia sancionada, que se baseia em nada menos do que esta ideia genial: se os adultos perceberem que a infância é algo que não se marca num calendário e sim na vontade de cada um, estarão resolvidos vários dos problemas que hoje em dia assolam pais, filhos, alunos, professores e cidadãos desenraizados das suas tradições seculares.
Quem não anseia, em boa sinceridade, pelo retorno aos momentos espremidos entre aulas e outros afazeres, quando para brincar, jogar, conviver e crescer nada mais era requerido do que o próprio corpo e vontade para tal? Jogar às escondidas; ao lenço; futebol humano; lá vai alho!; berlindes; a plétora mais imprevisível e irregular de instrumentos que nós mesmos, sem mestre, nos dávamos e através das quais nos fizemos.
Não havia dinheiro da Europa. Não havia três carros por casa, consolas, viagens a Bora Bora com vómito incluído, não havia esta demência instaurada a golpes de suborno que cindiu, quase irreparavelmente, umas gerações das outras. E porém, era-se feliz e foi sobre essa felicidade que se construiu, mal ou bem, a fundação de um futuro ainda em aberto - contrariamente ao que sucederá se não formos capazes de sobrepujar este envelhecimento precoce que "o sistema", ou se quiserem "a vida", nos tenta impor.
O projecto chama-se Espalha Magia, é ainda um zigoto pequenino e incipiente, mas considero-o uma ideia genialmente oportuna, e desejo ao João e à Ana a mais ampla e meteórica expansão abarcando cada vez mais adultos dispostos a rejuvenescer, ou pelo menos a recusar a senescência.
O título deste post é uma frase proferida pelo meu filho, à idade de seis anos, quando lhe perguntei qual considerava a coisa mais bela do Mundo.
Bem hajam.
Acabou de ser aprovada, na nossa câmara dos representantes, a proposta de referendo sobre a co-adopção e adopção por casais do mesmo sexo.
Confesso que, até há pouco, quis acreditar que isto não passava de uma brincadeira de mau gosto, mas agora o efeito perverso da intromissão da JSD no seio do Parlamento começa a sentir-se.
É de uma má-fé incrível que, quase um ano após a aprovação da proposta do PS para a coadopção por casais ou unidos de facto do mesmo sexo, com 99 votos a favor, 94 contra e 9 abstenções, se pretenda unir esta vitória (que não é apenas do PS mas sim das crianças e dos coadoptantes, que teriam um quadro jurídico adequado às suas especificidades) a uma questão que se apresenta distinta e que, ademais, já foi chumbada duas vezes pelo Parlamento, e submetê-las, como se de uma questão una se tratasse, a referendo.
Só mesmo uma pobre massa encefálica como a de Hugo Soares para propor isto.
Pior, só mesmo o PSD, impermeável ao voto de muitos dos seus deputados (veja-se a demissão de Teresa Leal Coelho, que iria votar contra a proposta e não o fez por motivos ligados não à sua convicção mas à “lealdade parlamentar”, das funções de vice-presidente da bancada), a impor uma disciplina de voto sob a batuta da JSD. Disciplina essa altamente contestada – note-se que vários dos deputados, nomeadamente, Mónica Ferro, Miguel Frasquilho, Mota Amaral, Cristóvão Norte, Paula Cardoso, Ana Oliveira, Ângela Guerra, Sérgio Azevedo e Conceição Caldeira, decidiram apresentar declarações de voto.
A conformação de um voto de forma a evitar a deslealdade parlamentar é um exercício de subversão daquilo que é a efectiva representatividade. Na realidade, o que se aprovou hoje na AR transcende quaisquer querelas ideológicas, teoremas conflituantes e métodos contrapostos. Hoje foi um dia de vergonha ao nível da representação, hoje foi um dia em que se deixaram inúmeras famílias reais, denominadas não convencionais, nas mãos de uma decisão popular, pouco esclarecida e, arrisco dizer, algo preconceituosa.
Num Estado de Direito, no plano do dever-ser, seria inconveniente e inaceitável a corrupção das normas legais que brotam dos regulamentos, dos estatutos, das leis orgânicas, enfim, de toda a panóplia de fontes legais que servem o interesse público e cujo teor é geral e abstracto. Isto vocês sabem. Eles não. Esperemos que o TC aprecie devidamente esta borga de mau gosto.
Ora, na lei orgânica do referendo é restringida a possibilidade de serem referendadas duas matérias distintas, de uma única vez. Cumpre acrescentar ainda que apenas uma destas matérias, a da coadopção, tem um processo legislativo em curso, uma vez que a relativa à adopção foi chumbada duas vezes. A proposta aprovada submete a referendo duas matérias que, não só são distintas, como não são, pela sua natureza, referendáveis. Não são, lamento. Trata-se, como diz Isabel Moreira (God forbid, estou mesmo a concordar com ela. Um dia teria de ser), de uma questão que envolve direitos fundamentais e que põe em causa uma série de instituições que zelam pelos mesmos. Não é relevante, para o caso, que o direito à coadopção seja um direito de minorias (adoptada a perspectiva dos casais homossexuais) ou respeite ao superior interesse das crianças. O que importa aqui é dar abrigo à realidade que vige acima das nossas crenças.
Hoje não se respeitaram os trabalhos que decorreram na especialidade pelos deputados do CDS, do PS, do PCP, do BE e do PSD. Hoje a AR fez tabula rasa dos trabalhos desenvolvidos no passado ano de modo a elucidar o voto dos deputados. Hoje foi olvidada a votação na generalidade que aprovou, a 17 de Maio de 2013, a possibilidade de coadopção por parte de casais do mesmo sexo. Hoje, um dia em que tanto se falou de lealdade, esta não foi observada.
O que aconteceu hoje foi uma demissão, por parte da AR, da discussão de um tema complexo que tem repercussões emocionais e práticas na vida real de muitos cidadãos.
Isto não é um exercício são de democracia, isto não é representar, isto não é nada.
Hoje foi um dia de vergonha para a democracia representativa.
Do centro da UE surge mais uma "novidade". No fundo mais do mesmo. A cultura de morte institucionalizada. O horror legalizado. A total ausência de princípios éticos e morais. A barbárie, em suma. Hitler, ao pé destes "senhores", é um aprendiz.
Quando o governo toma as decisões que toma ou pondera tomar, de um modo instintivo, ponho-me logo a pensar nas suas implicações, mas ainda antes de considerar os efeitos que se irão sentir, calço os sapatos dos ministros e das respectivas equipas técnicas, e tento reproduzir a caminhada conducente a estas brilhantes decisões. E chego à seguinte conclusão: o número está errado. A sapatilha da reflexão não serve o meu pé. O governo, ao anunciar a possibilidade de aplicar um IVA de 23% aos bares e aos sectores relacionados com a bebida, admite logo que nunca entrou numa cozinha, que nunca lavou um prato sujo na cantina. Será que estes cozinheiros administrativos não percebem os danos que vão causar. O que pensam que irá acontecer quando os clientes tentarem escapar à bebida porque houve um aumento brutal do preço final do penálti decorrente do aumento do IVA? Querem diferenciar os restaurantes dos bares, é isso? Ou seja, o cozido à portuguesa já não pode ser acompanhado nas calmas pelo tintol fresquinho porque o preço da litrada é proibitivo? Esta lei semi-seca é mesmo bruta, e vai fazer espumar pelos cantos da boca os chefes de cozinha e seus semelhantes. Por um lado, se a medida foi pensada para penalizar os alcoólicos, não me parece que vá funcionar como terapêutica adequada, e por outro lado, os "restauradores" para assegurar os níveis de consumo adequados, irão enveredar por soluções de recurso. Já estou a ver a D. Amélia, da cozinha da tasca da esquina, a salgar em demasia e de propósito a chanfana ou o rancho, só para obrigar os comilões a apagar o sabor a mar profundo com uma bebida destilada ou não, mas cara - com IVA a 23%. O governo fala em estímulo à economia, mas apenas me recordo daquele solicitador que se fez passar por juíz numa das comarcas da nação, e que bradou aos céus que os homens do lixo trabalhavam mais felizes sob o efeito etílico do sumo de uva. Será vingança do governo esta medida de sabor acrescentado? Não sei, estou excessivamente sóbrio para dar uma resposta de jeito. Pode parecer que não, mas a época das vindimas está quase aí e nada disto é inocente. Está tudo ligado, não sei é como. O governo porém, não fica por aqui. Tem uma frase fiscal de antologia a roçar a ironia, o sarcasmo - fala de um "contributo líquido negativo" e eu só penso nas pobres crianças que ainda correm o risco de ver a mama acabar - o leitinho escolar. E pergunto: é bebida, similar, ou coisa que o valha?
Uma notícia à atenção de Isabel Jonet e dos adiantados mentais que acham que os pais enviam as crianças para as escolas com fome propositadamente e que defendem o empobrecimento estrutural dos portugueses enquanto o estado se mantém na mesma. Isto só dá vontade de chorar de raiva.
Leitura complementar: O mito do viver acima das possibilidades; Marx a rir; Duas petições; Pobreza intelectual; Vamos brincar à caridadezinha; A indecorosa leveza da ideologia da caridadezinha.
João Pereira Coutinho, Mocidade Portuguesa:
«Todos os anos morrem mais crianças em acidentes de viação do que vítimas do fumo dos pais. Por que motivo o governo não está interessado em proibir a circulação de crianças no interior dos automóveis? No interior e, já agora, no exterior também: um estado verdadeiramente atento à saúde dos seus menores teria autoridade plena para afastá-los de todos os ambientes nefastos. Que o mesmo é dizer: interditar o acesso a bares (álcool), praias (afogamentos), restaurantes de fast food (obesidade) ou partidos de extrema-esquerda (drogas e debilidade cognitiva). O ideal, aliás, seria retirar as crianças da guarda dos pais e educá-las em ambientes rigorosamente esterilizados, onde vigorassem os princípios da abstinência, do vegetarianismo e, em dias de festa, do látex (reforçado). Depois, quando chegassem aos 18 anos, os petizes seriam novamente devolvidos à sociedade civil onde uma carreira política os esperaria, de preferência nas instituições europeias.»