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Temos selecção nacional. Para quem ainda não percebeu - faz tudo parte da mesma fantasia: ganhar a qualquer custo. Falamos de instituições maiores (Sporting Clube de Portugal) e fenómenos globais (Cristiano Ronaldo e José Mourinho). Rolamos a bola, mas poderíamos rodar a chave e destrancar a matriz na sua íntegra - a falência ética que se estende de Sócrates a Pinho, de Fátima Felgueiras a Isaltino Morais, de Vale e Azevedo e, até ver, a Bruno de Carvalho. A ideia de enriquecimento fácil é quase sempre sinónimo do ilícito. Sabemos que clubes de futebol já fizeram ruir bancadas, mas a queda de um governo seria algo inédito. Quando o assanhado Ferro Rodrigues veste a camisola da Assembleia, não sabemos se está ao avesso - se é mais leão do que camaleão. Assistiremos porventura a um Dreyfoot affair que em última instância terá consequências políticas imprevisíveis. Como se pode admitir o duplo atentado de um Marta Soares? Um pé na bola e outro na Protecção Civil, a título de exemplo. Devemos ficar muito desconfiados, de pé atrás mesmo, quando enviam um estafeta para entregar a missiva de que: o "Governo afasta qualquer tipo de ajuda pública ao Sporting em caso de colapso". Se vêm com esta conversa é porque equacionam precisamente o oposto. E deve haver razões para tal. A cauda do leão deve ser tão comprida que se estende de São Bento a Belém e vice-versa. E o mesmo se pode dizer dos outros, invertebrados ou não, mascotes ou mascarilhas de outros grémios desportivos. A despromoção para ser efectiva deve não esquecer ninguém no banco. Já chega de fintas e fazer de parvo um país inteiro. Vai lá, Marcelo. Vai lá no Domingo.
A detenção de José Sócrates há muito que vinha sendo adiada - espero que levem isso em conta quando proferirem a sentença (e acrescentem uns anos de prisão). Esta notícia oferece-me alguma esperança em relação a Portugal. Chegou a hora daqueles que cometeram crimes que tanto lesaram o país, saírem pela porta pequena, da desonra total. A limpeza não deve ficar por aqui, nem deve obedecer a agendas políticas. Estes indivíduos devem ser tratados como cidadãos de segunda pela opinião pública, e com rigor penal pelo sistema de justiça. No entanto, iremos assistir ao esgrimir de razões da parte daqueles que certamente devem favores ao ex-primeiro ministro. Para se ter a arte de roubar centenas de milhões de euros, tem de se ter um esquema montado - uma equipa à "Ocean´s Eleven". Aguardo com expectativa para ver como António Costa vai descalçar esta bota. Fico à espera de palavras sábias de Ferro Rodrigues e de outros barões iluminados. Mas observaremos certamente um ainda maior número de socialistas com ganas de desmentir os factos, de provar o contrário. Esse é o padrão de comportamento que devemos esperar. Diz não. Nega. Diz que não sabes de nada. Não é verdade. Espero muito sinceramente que os cidadãos deste país possam sentir no seu espírito algo de inédito, algo marcante e com consequências devastadoras. Só assim é que se pode começar de novo. Com uma razia. Com inundações não vamos lá.
A Constituição da República Portuguesa (edição de 1976, com revisões subsequentes em 1982, 1989, 1992, 1997, 2001, 2004 e 2005) merece ganhar o prémio de livro do ano em 2013. Nunca uma obra política havia estado no centro da vida dos portugueses de um modo tão intenso e polémico. Por essa razão, convém proceder a uma leitura mais atenta da substância da sua narrativa. A mesma tem sido tratada como bíblia sagrada pelos trabalhadores de Portugal, por formular e eternizar a expressão consubstanciada em "direitos inalienáveis" ou ainda "liberdade de expressão". Contudo, os cidadãos do país parecem omitir convenientemente que a mesma magna carta também serviu de cobertura para as excedentárias práticas de transgressão, perpetradas por um sem número de agentes económicos, grupos de interesse, partidos políticos, indivíduos e colectividades. Foi no decurso da sua força constitucional, da sua existência efectiva e da sua vigência desde 1976, que todas as malfeitorias contemporâneas tiveram lugar e que derrearam Portugal, colocando o país na situação em que actualmente se encontra. Por esse facto, há que tirar ilações e também atribuir responsabilidades ao enquadramento jurídico concedido pela Constituição da República Portuguesa. Se a falência técnica, económica, social e moral que retrata o Portugal do presente aconteceu, a mesma decorreu ao abrigo dos valores alegadamente definidos e defendidos na carta constituinte de 1976 (e suas subsequentes alterações em sede de revisão constitucional). Ou seja, a própria constituição também "autorizou" os devaneios dos prevaricadores e fomentou a noção de impunidade jurídica. Deve ser, por isso, também considerada uma colaboradora do regime de descalabro, da demise nacional. Não foi uma outra constituição que serviu de pano de fundo para as ocorrências. Não foi uma distinta constituição, de cariz menos ideológica e mais utilitária, que gerou os desequilíbrios. Não foi uma constituição escrita sem fervor revolucionário que ditou a apropriação indevida por forças de bloqueio económico ou social. Não foi nada disso. Foi sob a batuta desta mesma constituição que os crimes económicos aconteceram, que o fosso entre poderosos e indigentes se cavou, que os sindicatos nasceram mas não evoluíram para avançar a sua missão de protecção de trabalhadores, que os partidos políticos se transformaram em lobbies-sombra para partilhar privilégios e favores e que a soberania foi posta em causa de um modo tão leviano com a assinatura do tratado de adesão às comunidades europeias. Ou seja, Portugal "aconteceu" debaixo da parábola da Constituição da República Portuguesa, e, por essa razão, torna-se urgente ajuízar se a mesma é ainda capaz de defender o país dos seus inimigos endémicos e das ameaças exteriores. Por estas razões, e outras que me escapam, mas que igualmente nos afligem, a Constituição da República também deve ser entendida como uma jangada de pedra. Com o naufrágio à vista, seria sensato analisar em detalhe a carta de marear. O mapa que também contribuiu para desviar Portugal da sua rota - destino malfadado, sina, sorte ou azar.