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Carlos César nunca teve pudor ou sentido de Estado. Foi sempre um socialista ferrenho que passou ao lado do interesse nacional. O excedente orçamental a que se refere, a grande glória do desgoverno do Partido Socialista (PS) — são dinheiros subtraídos aos portugueses ao longo dos últimos oito anos. São rosas de cativações, senhor. Nada mais. O excedente não resulta de uma visão estratégica da economia, da geração de valor ou do acréscimo na capacidade produtiva. César serve-se agora, sem surpresa, do orçamento de Estado como arma de arremesso. As contas certas, de que se orgulham os socialistas, não são nada mais do que uma manobra contabilista para poder acusar a Aliança Democrática (AD) de delapidação do erário público. Assistiremos a algo paradoxal. A AD, ao ser mais humanista e equitativa, com sentido de justiça económica e social mais apurado do que aquele que os socialistas venderam ao longo de décadas, será acossada pelos socialistas por fazer o que não fizeram. A Covid, a inflação, as Guerras da Ucrânia e de Gaza foram os argumentos-alibi dos socialistas para meterem a mão ao bolso dos portugueses. É muito feio o que Carlos César faz e diz ainda antes da AD começar a governar. O seu comportamento revela a sua infantilidade, o seu cinismo e um enorme défice democrático. Não sei como, mas César é outro que deveria ter ficado de fora do nosso campo de visão e consternações, como o seu grande camarada Augusto Santos Silva. Quanto a Pedro Nuno Santos, ando muito desconfiado com tanta bonomia e compreensão. E devemos estar mesmo muito preocupados. Os barões do Rato são mestres da ilusão e da elevação. E no momento seguinte, se for necessário, sacam o tapete ao recém-inaugurado secretário-geral do PS. Deixo Medina para outras considerações em post futuro. Para já concentremo-nos no défice político que representa este César.
Odeio quando contam apenas metade da história e o espectador é obrigado a preencher os buracos da narrativa. Mário Centeno parece insistir na ficção dos SMS, mas noutro domínio. O recorde Guinness do défice mais baixo das últimas quatro décadas esconde alguns factos relevantes. O mesmo é cozinhado à custa do superavit primário e não leva em conta a bengala colateral do Banco Central Europeu (BCE) que empresta o andarilho do programa de compra de títulos de tesouro. Mesmo assim a taxa de juro a 10 anos anda pelas ruas da amargura. Assim também eu bato marcas oficiais. A austeridade, traduzida em impostos e taxas do governo anterior, não foi enxotada nem de longe nem de perto. Ou seja, a geringonça deve agradecer aos que a antecederam e que foram obrigados a instituir as penalizações tributárias. Se fossem só ginjas, António Costa já tinha despachado a carga fiscal sentida por milhões de portugueses. Mas há mais. O investimento público, gerador de receitas, ou seja, os verdadeiros bens de capital, não se avistam - não se ouvem notícias de empresas a escolher Portugal como destino de investimento. A conversa do aeródromo Soares também é um erro de percepção mútua. Cria a falsa expectativa, já vivida antes, em torno de Otas e afins, e despoleta aquilo que os socialistas fazem com mestria - a especulação imobiliária dos terrenos circundantes e a concessão de favores a construtoras amigas. Existe aqui um padrão de comportamento claramente identificável. O turismo continua a servir de avalista para promessas políticas de perna curta. A dívida, que convenientemente tem sido ignorada, já ultrapassou a fasquia dos 130% do PIB, mas esse detalhe pode ser escamoteado com umas belas tricas de SMS. A geringonça deve agradecer a oposição pelo alarido em torno dos SMS, a CGD, e os actores Domingues e Centeno. Esse espectáculo encaixa bem no circo de distracções. Quando a torneira do BCE for fechada, quero ver como aguentam a tesouraria. Entretanto, temos Costa em campanha autárquica acompanhado por Marcelo Rebelo de Sousa que também terá culpas no cartório. Seria tão bom que o mundo fosse assim cor de rosa. E sem SMS desnecessários.
Marcelo Rebelo de Sousa tem razão. A geringonça é um arranjo inédito. O Partido Socialista, o Bloco de Esquerda e o Partido Comunista Português formaram governo, mas a criação teimosa de um executivo não é um objectivo político em si. Um governo que se preze não pode sobreviver à custa de validações endémicas, de justificações internas, de palmadinhas nas costas dos parceiros de ocasião. Existe muito mais para além das virtudes do narcisismo e das comendas presidenciais - a realidade. E a verdade nua e crua das limitações económicas e dos entraves financeiros não pode ser dissimulada por malabarismos de balancete. Portugal não padece de extremismos de Esquerda ou Direita que parecem retratar a Europa maior, por isso a geringonça nem sequer é salvadora ideológica - não pode invocar esse estatuto. Este governo é um esquema aritmético, um tabuleiro de somas parlamentares e pouco mais. Pensar-se-ia que o presidente da república fosse uma velha raposa política, sábia e experiente. Mas deste modo castelhano levanta sérias dúvidas sobre o seu sentido de Estado. Portugal não está tão distante da Grécia quanto possa parecer. Quando o país económico for esmurrado pelo declínio de investimento público, como modo de conter os deslizes orçamentais para cumprir os preceitos da Comissão Europeia, já será tarde demais. Quando olho para a geringonça e o marketeer Marcelo não sinto a reviravolta do país. Deparo-me com actores posicionados para preservar intactos os princípios da continuidade. A ruptura, que seria encabeçada por uma efectiva reforma estrutural, nunca acontecerá. Se abanarem as fundações do aparelho de um regime, onde encaixam os partidos deste acerto de ocasião, vão todos de carrinho. Como uma cenoura pendurada à frente do chanfro do burro, a descentralização serve apenas para incitar a passada mais larga. Mas o asno anda à volta da nora. E não sai do mesmo lugar.
É isto que interessa. E o resto são lérias - a competitividade da economia portuguesa. António Costa deve colocar de lado o circo das sanções e encarar a música. A tónica de Centeno tem sido o estímulo do consumo. Ou seja, começa pelo fim. Em vez de pensar em gerar riqueza e investimento (e depois o consumo), querem afagar o pêlo bronzeado dos portugueses, dando-lhes uns cupões para gastar na silly season. Atente-se no detalhe expresso pelo Fórum para a Competitividade: "os valores apresentados pela DGO não representam a verdade orçamental e que assistimos a uma repetição do que já se passou em 2001 e 2009“. Em suma, nada disto é novo. Que o diga José Sócrates que já se pôs de joelhos para ver se lhe continuam a dar de mamar vitaliciamente - as fotocópias já não são o que eram. Aliás, Sócrates é a perfeita imagem de um país destroçado pelos excessos. Se a crise fosse um país, Sócrates seria a mascote perfeita do desespero. Enquanto a bomba não rebentar, no leilão de resgate da Caixa Geral de Depósitos (CGD) discutem os milhares de milhões de euros como se de feijões inconsequentes se tratassem. Já que a pasta CGD está a ser discutida com o conhecimento (e aval) de entidades europeias, não vejo como tal colosso de berbicacho possa ser tratado à margem de considerações orçamentais genéricas. Por outras palavras, não acredito em sanções, mas que elas existem, existem. Têm outro nome - aumento de impostos, de IVA, de IMI, congelamento de salários, etc, etc. Em suma, anti-austeridade à moda antiga. 2011, não tarda nada.
Não existe dilema algum que possa afligir o governo de António Costa. Para poder ser um mãos largas, o homem de carteira farta, terá, inevitavelmente, de encontrar um modo de angariar fundos. A não ser que readmita a impressão de divisa própria, o cunhar de moeda, os socialistas vão ser obrigados a seguir o guião grego. A Austeridade não foi nem será exterminada pela máquina ideológica de Esquerda. De nada serve vir com essa conversa da almofada financeira. Para cumprir com as promessas de aumento de salário mínimo, reposição de pensões, fim da sobretaxa ou cancelamento de programas de privatizações, a balança terá de pender negativamente para o lado do défice e da dívida pública. Durante meses a fio, ao longo da campanha do PS, não se eximiram de apontar defeitos e acusar o governo anterior de falsear dados. Se essa era a situação "a lamentar", então o exercício da governação de António Costa deveria ser business as usual. Não se deveriam apresentar como damas ofendidas pela palavra dada e não honrada. Os testas socialistas, coadjuvados pelos bloquistas e comunistas, têm a faca e queijo na mão. Não precisam de governar em virtude de consensos parlamentares. São a tal maioria de que tanto se orgulham. O PSD e o CDS até nem precisariam de pôr os pés na freguesia da república.
A carroça ficou atolada? Não faz mal. Reinventa-se a roda. Catarina Martins e Jerónimo de Sousa demonstram que têm medo de voar, de governar de acordo como o firmado em contrato - honrar as obrigações de Portugal perante as instituições europeias. A regra dos 3% do défice do Produto Interno Bruto (PIB) não agrada? Não faz mal. Deita-se fora, mas apenas para alguns, para um governo de Esquerda. Será que Catarina Martins vai reformular o Tratado de Lisboa? Não me parece muito católico que sugira a alteração da regra orçamental sem pensar nos outros. Se a revolução da Esquerda é mesmo para ser, então o Bloco a e Coligação Democrática Unitária devem levar a sua água ao moinho de Bruxelas. Se não, parecerá que Catarina Martins procura tratamento privilegiado para um governo imaginado por si. Não leva muito a sério as metas da Comissão Europeia(?) - esta afirmação é particularmente grave e corrobora o que Cavaco Silva declara sobre estabilidade governativa. A União Europeia já tem motivos mais que suficientes para ficar de pé atrás. Muito atrás. Catarina Martins perdeu os três...porcento.
Há, hamletianamente falando, um método na loucura. Esse método é particularmente visível no debate económico sobre as grandes variáveis do Orçamento do Estado. Se os caríssimos leitores prestarem atenção ao que se vai escrevendo e dizendo sobre a política financeira do estadão, decerto repararão que, amiúde, o tema do socialismo bancário é chutado para um canto muito recôndito. A razão é simples de captar: não convém, de modo algum, incomodar o baronato bancário com perguntas dúbias. Vejamos, por exemplo, o seguinte dado: é sabido que o défice público comunicado pelas Finanças ao Instituto Nacional de Estatística no final de setembro, quantificado em 5,5% do produto interno bruto, não inclui os 700 milhões de euros dispendidos na "ajuda" ao Banif. Perante isto, o que é que a opinião publicada tem salientado nas suas croniquetas domingueiras? A resposta é sintomática e preocupante: as resmas de páginas escritas sobre este assunto versam exclusivamente sobre o incumprimento da meta acordada com a troika. Não há, como certamente já repararam, uma única página sobre o facto de o Estado continuar a entregar de bandeja os dinheiros públicos a meia dúzia de sátrapas bancários, cuja gestão obedece a critérios estranhos ao normal funcionamento de uma economia de mercado. Não há, pois, ninguém, com relevo, vá, que questione na praça pública o porquê de a banca continuar a ser bafejada pelos ventos quentes de um Estado absolutamente desrespeitador da propriedade privada. Como escrevi no início desta posta, há, efectivamente, um método nesta loucura. Os responsáveis deste monstro das bolachas obedecem, em primeira mão, ao sindicalismo financista, e aí quedarão até que um vento contrário os leve a procurar um novo porto de abrigo. A propriedade privada funciona, para esta gente, em circuito fechado. Se alguém cai, levando consigo as poupanças de milhões de aforradores, o poder público acorre imediatamente, qual Estado-providência dos Salgados e Roques necessitados. Quando o alvo é o zé povinho, a propriedade privada é uma asneirola a ser prontamente corrigida pelo bastão macerado da administração. É assim que a mundividência da República abrileira encara quem produz e empreende a expensas próprias. Portanto, o conselho que vos dou é que abram, o quanto antes, um banco. Se precisarem de ajuda, recorram aos Rendeiros e aos Oliveiras e Costa. Eles acederão sem demora.
Há palavras que não devem ser utilizadas no jargão diário dos políticos. Uma dessas palavras é "garantia". A garantia pressupõe sempre a reparação do equipamento em caso de avaria. Ora a ministra das finanças garante que o défice não ultrapassará os 5,5%. Refere-se ao orçamento como se de um rádio se tratasse. Como se fosse fácil substituir o transístor queimado por outro e continuar a ouvir a música. Todos sabemos que em política, mais do que noutras disciplinas diletantes, o que é verdade hoje não significa que amanhã o seja. Já sabemos qual vai ser a justificação para a inesperada derrapagem dos números: o INE diz uma coisa e o Eurostat outra (e no meio não está a virtude). Porventura a garantia que refere com tanta convicção tenha uma validade de apenas 24 horas (não sei, é ler a letra miudinha). Realmente, devemos ficar com os cabelos em pé quando nos vêm com estas certezas absolutas. Há tantos factores endógenos e exógenos que podem fazer descarrilar as contas. Até uma criança seria capaz de elencar os riscos inerentes às previsões. Parece que a ministra das finanças não vive neste mundo de precalços e surpresas desagradáveis. Querem uma lista incompleta de catalizadores de escorregadelas? Cá vai: a impossibilidade do governo se financiar no curto e médio prazo por não conseguir regressar efectivamente aos mercados; a continuação do fortalecimento do euro face ao dólar, o que afectará o "bom ritmo" das exportações; uma escalada inesperada do preço do crude nos mercados internacionais decorrente de um evento excêntrico (uma guerra ou a escalada da situação na Síria); o agravamento dos juros de dívida nacional em consequência do mau comportamento das economias francesa ou italiana (ou seja, o efeito de contágio de outros países); o efeito das greves e manifestações nas receitas e em sede de IRS e IRC; as remessas de emigrantes que deixaram de ser repatriadas (porque afinal é melhor não regressar a Portugal); a possibilidade de uma catástrofre natural para juntar às políticas, e por último, a própria falência do avalista. A possibilidade do fabricante declarar insolvência e dar como nulas as claúsulas contidas na tal garantia. A hipótese do governo, e por arrasto o Estado, deixarem de funcionar numa lógica de último garante da nação. Pois é. Não sei se lêem com atenção aqueles certificados que geralmente acompanham a aparelhagem novinha em folha? Aquele documento que traz um selo prateado, a marca do fabricante e que se designa por garantia? O que diz, preto no branco? Diz que se mexerem no mecanismo interno a garantia vai à vida. Cá para mim o governo já mexeu vezes sem conta no mecanismo interno e já meteu os pés pelas mãos, que o cidadão nacional não pode dormir descansado com a cabeça encostada ao travesseiro da garantia. Decididamente, e há já muito tempo, as garantias políticas passaram a significar algo diverso - um sinónimo de falsa promessa.
Vítor Bento enuncia a questão fundamental que se coloca ao nosso futuro colectivo:
«Este modelo - gastar por conta do futuro - está pura e simplesmente esgotado e é inviável dentro do euro. Só o regresso a um regime inflacionário (com moeda própria), que possa voltar a espoliar os credores nacionais e os detentores de moeda, permitirá ao Estado continuar a gastar mais do que tem.
Para permanecer no euro, teremos, pois, que nos habituar a viver os próximos 25 anos, pelo menos, com excedentes primários. E a questão é esta: conseguirá o sistema político ajustar-se a esta necessidade (ou seja, conseguirão, políticos e eleitores, adaptar o seu "quadro mental" a esta nova realidade); ou acabar-se-á por optar pela saída do euro para poder tornar às "ilusionisses" da inflação?»
Filipe Faria, Da dissidência...:
«Os que defendem a troika embarcaram nesta ilusão colectiva que perde o seu tempo a discutir se vamos ter um défice anual de 5.5% ou de 6.5%. Isto claro, ignora que mesmo que fossem aprovados limites ao défice, dificilmente iríamos ter superavits. Nunca tivemos um único superavit desde o 25 de Abril; como tal, o que é que faz os defensores da troika pensar que se no melhor dos cenários voltarmos aos mercados de endividamento (apenas porque o BCE compra a nossa dívida com dinheiro europeu), começamos a ter superavits para reduzir uma dívida pública que já ronda os 110% do PIB? Isto é tão provável como amanhã eu ganhar a lotaria; principalmente depois da década perdida do euro, onde Portugal apenas conseguiu um crescimento económico anémico e onde a generalidade da riqueza que atingiu deveu-se ao endividamento. Mesmo este governo que é obrigado a cortar na despesa, não sabe como nem onde cortar, preferindo a asfixia fiscal; e enquanto houver dinheiro da troika, continuará a não saber.
Outra dissonância argumentativa que se encontra nos defensores da troika e do pagamento integral da dívida é que muitos deles dizem-se eurocépticos ou contra a centralização europeia. Porém, ao defenderem a permanência no euro (que é um instrumento de centralização política), ao defenderem a entrega dos comandos do país ao supranacionalismo por um período que pode, em teoria, demorar décadas infindáveis, estão a aprovar de forma latente essa mesma centralização e formação do super Estado europeu. Assim, consciente ou não, a defesa do euro e da troika é uma forma encapotada de apoio à centralização de Bruxelas. Ao menos os euro-entusiastas assumidos como Paulo Rangel são coerentes quando defendem a troika.»
Qualitativamente, para um liberal, deverá sempre haver uma diferença entre corte de despesa e aumento de impostos. Ainda que, em termos líquidos, ambos tivessem o mesmo efeito estático sobre o défice. Só que o aumento de impostos é uma restrição à liberdade de escolha no mercado livre, de quem neste auferiu rendimentos. Uma coerciva restrição. O corte de despesa significa que o Estado gasta menos do nosso dinheiro. Não percebo, também eu, onde pode estar a hesitação do liberal?
Adicionalmente, em termos dinâmicos, a diferença é clara. Com o corte de despesa, a poupança é no sector público, deixando de se ir roubar um montante adicional aos privados. Assim, num processo de decisões descentralizadas e livres, em que o Estado nunca tem vantagem de informação, porque as oportunidades de negócio são percepções individuais e tácitas, muitas vezes não codificáveis, as possibilidades de crescimento da economia são potenciadas deixando os recursos no sector privado. Quando a via seguida é, alternativamente, tributar os privados para financiar a despesa pública, recursos estão a ser desviados do que seriam necessariamente melhores utilizações: porque consumos decididos pelos próprios, ou financiamento de oportunidades de investimento que o Estado não sabe escolher ou detectar são perdidos!
A ler: o Samuel, o Joaquim Sá Couto, o André Azevedo Alves, o Nélson Faustino e o José Meireles Graça.
Para início do repasto de folhas escritas, optaram por uma periquita de encomenda que tal como se previa, limitou-se à bem ensinada lição aprendidda nos tempos de funcionamento do gabinete do Dr. Goebbels. Cantarolada a propaganda acerca dos "idílicos" tempos das cacetadas do Costa, o "outro" que não é "este", seguiu-se o conduto.
Num razoável e decerto inconsciente exercício de autocrítica com laivos quase maoístas, o Mr. Deficit de serviço contabilizou as oportunidades colocadas em termos de empréstimos sobre as "nossas" mesas ministeriais. Sem proferir uma única palavra relativa à sua ruinosa gestão como primeiro-ministro, o já avançado avô do défice das contas públicas veio dizer-nos que ..."durante alguns anos foi possível iludir o que era óbvio" e viveram-se ..."tempos de ilusões". Num auto-bofetão, acrescentou ainda alguns anos perdidos na ..."letargia do consumo fácil e na ilusão do despesismo público e privado".
Num discurso normalmente escrito por um serviçal disponível entre as grosas de assessores pagos a expensas do contribuinte - eufemisticamente conhecido como Erário Público -, acaba por enterrar quase trinta anos de carreira intensa e exclusivamente política, liquidando de uma penada, as manigâncias pretensamente económicas que abusivamente asfaltaram o país de norte a sul, descalcificando os cofres que abarrotaram de verbas colocadas à disposição pela "Europa" (Alemanha). Coortes de futuros consagrados meliantes arrastados para os lugares chave do poder, centos de milhar de novos funcionários públicos entrando pela porta de serviço do(s) Partidos(s), uma inaudita emergência de yuppies de cabelos compridos e bem oleados de gel, a barulhenta jeepalhada que substituiu tractores e os tais dois pequenos apartamentos T3 de algarvios investimentos que refundiram em betão, aquela traineira da faina outrora familiar. A todo este ridente progresso, acrescente-se o bem cavaquista ímpeto demolidor dos centros urbanos à mercê da cupidez imobiliária, as digestivas brincadeiras bolsistas, os negócios explosivos das amizades escusas, a total e subserviente cedência diante da prepotência estrangeira e pior que tudo, a completa rendição perante os espanhóis. Esta ultrajante República, consegue a proeza de numa brisa de pouco mais de duas décadas, liquidar a presença económica portuguesa no antigo Ultramar e os dados oficiais hoje trauteados pela televisão estatal, remetem as nossas trocas comerciais com os PALOP, ao ínfimo patamar de 1%, ao qual acrescenta-se mais uma unidade no que se refere ao Brasil. É um desastre praticamente irreparável, um verdadeiro Alcácer Quibir sem o remédio que há 350 anos era possível para a ambicionada cura: a posse do conhecimento das redes do comércio internacional de então, a presença pluricontinental e sobretudo, a vontade do querer fazer e de garantir a independência, por muito improvável que ela parecesse.
O nosso Mr. Deficit carrancudamente nos avisa acerca do "vivermos acima das nossas possibilidades" e quase parafraseando Salazar - o reconhecidamente inatingível alter ego -, apela à "austeridade digna", rejeitando-se os "gastos desmesurados" e insistindo no patriótico dever de consumirmos aqueles produtos que ele próprio fez um dia desaparecer das prateleiras dos mercados.
"Valor republicano da austeridade digna", balbucia. Assim sendo, comece ele próprio a dar o exemplo, prescindindo de 50% da lista civil e da criadagem engravatada repescada nos recônditos clubísticos dos interesses de onde ele próprio um dia saiu para a ribalta que nos encadeia e exaure. Siga o exemplo do vizinho João Carlos e passe a consumir uns módicos 8 milhões anuais. Já é muito e chegam e sobejam para este desastroso marquisamento mental a que submeteu este país.
Pedro Passos Coelho bem poderia ter-se levantado e abandonado o palanque onde condescendeu co-responsabilizar-se pelo lavar de mãos ali presente.
A troika-regente exige o apuramento dos "valores efectivos e estáveis dos últimos anos", o que elevará o défice de 2010, para 9,1%. Conhecendo-se todo o processo que conduziu a este ponto e sabendo-se bem a total responsabilidade de uma certa instituição no contemporizar com a manipulação ou todas engenharias financeiras - nas quais o actual titular foi pioneiro - , apenas uma conclusão há a retirar.
Bem podem insistir os parvos "caçadores de assessorias", em ilibar a citada instituição de todo e qualquer vício. Viciada sempre esteve na política de auto-promoção, viciada sempre esteve na arte da dissimulação para proveito próprio. Sabemos que os peneireiros mentem deliberadamente, na esperança do presente lugar de engraxates de serviço, ser futuramente substituído por algo que dê uma pequenina ilusão de poder. Num gabinete, num comentório parlapateiro numa das estações de tv, tanto faz. Se já existem os "Abrantes", há que encontrar um denominador comum para estes émulos. Aceitam-se sugestões.
Custa-nos perto de Dezoito Milhões de Euros por ano, aos quais se somam todas as despesas inerentes aos seus antecessores vivos. Comitivas enormes e restante acessorizing on the rocks, são parte integrante do estafadíssimo Esquema a que nos habituámos. A tudo isto teremos ainda de somar Cimeiras, eventos festivos fora de Palácio, ajudas de custo para o servicismo permanente, viagens de Estado e consequentes imprevistos técnicos, ciclónicos, vulcânicos, etc, etc, etc.
E se Sua Excelência fizesse precisamente aquilo para que serve um Chefe do Estado, ou seja, representar de quando em vez o nosso país? Bem sabemos que um chefe de Partido - mais ou menos oculto mas nem por isso menos evidente - terá sempre dificuldades para encarnar a totalidade do povo de um país quase milenar.
Há uma semana, morreu em trágicas circunstâncias o seu homólogo de Varsóvia, acompanhado pela mulher e por dezenas de altos dignitários do Estado polaco. Viajavam num velho avião.
Cavaco Silva encontra-se a uma pequena distância de Cracóvia, onde se deslocarão personalidades tão insignificantes como os dirigentes da Rússia, EUA e Alemanha. Merkel dormiu esta noite em Lisboa e depois partiu para Roma, de onde seguirá por via terrestre até Cracóvia.
Mas afinal, quem é Cavaco Silva?!
A resposta é simples. Consiste num semi de difícil definição constitucional, mas isso não o impede minimamente de em tempos de contenção que o próprio não se cansa de alardear, fazer uma longa viagem em limusina fretada, com a respectiva escolta e segurança, coisa que até se compreende. Assim que com todos os luxos - também compreensíveis e igualmente aceitáveis - chegue a Barcelona, não regressará a Lisboa num voo low-cost - como sempre faz a Rainha Sofia de Espanha -, nem sequer numa viagem da TAP. Não senhor. O Exmo. Sr. Prof. Dr. Aníbal Cavaco Silva, Presidente da III República Portuguesa, Comandante-em-Chefe das Forças Armadas Portuguesas e Grão-Mestre das Ordens Honoríficas, terá, assim como a respectiva cônjuge, um exclusivo e despesista Falcon à espera. Isto, para que na próxima 2ª feira possa retomar a sua agenda de contactos, por sinal a ser preenchida pelo novo chefe do seu Partido político. Há assuntos que não podem esperar. Coisas dos tempos que se avizinham, os da reeleição.
Faça aquilo para que serve essencialmente o Chefe do Estado. Represente o país se souber ou puder, coisa altamente duvidosa, pelo que se viu e vê.
Longe vão os tempos em que o Chefe do Estado viajava de comboio, quase incógnito e com escasso séquito.
Quem quer repúblicas, que as pague!
No Hradschin de Praga, Vaclav Klaus teve a oportunidade de dizer na cara de Cavaco Silva, aquilo que como economista responsável, pensa acerca de países que assumiram a loucura do défice excessivo: "aqueles que aceitaram isso, agora terão de suportar as consequências do seu acto (...) inimaginável que alguns países europeus possam admitir determinados défices (...), como ministro das Finanças ou 1º ministro, nunca admitiria isso".
As desculpas do co-responsável pela política governamental portuguesa, pautaram-se por um balbuciar do optimismo da praxe, realçando tímidos sinais de retoma europeia e puxando o tema da "necessária ajuda" à Grécia. Cortes nas depesas? Nem uma palavra! Compreende-se também o que quis dizer com os "perigos de contágio" e já entendemos o que espera de um hipotético porvir. O republicano re-eleiçoeirismo semi-presidecialeiro assim o exige.
Pelo Gabriel Silva, no Blasfémias: