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Thomas Schelling e Grécia para totós

por John Wolf, em 09.02.15

Game-Theory-prisoners-dilemma

 

Vamos utilizar um pouco da Teoria do Jogo e prestar homenagem a Thomas Schelling.

Algumas hipóteses;

1. A Grécia recebe fundos adicionais, mas tem de continuar com as medidas de Austeridade - no dia seguinte dá-se um golpe de Estado, um regime de extrema-direita é instaurado e o país cai em conflito civil. Torna-se irrelevante se pertence ou não à zona Euro.

2. A Grécia não recebe mais fundos, cai em caos económico e social, e abandona o Euro - a Rússia aproveita a situação e encosta-se ainda mais ao país que abandona o Euro e a União Europeia.

3. A Grécia vê as suas demandas respondidas favoravelmente, e no dia seguinte Espanha, Portugal, Itália e Irlanda exigem semelhantes condições - em consequência dessa abertura de espírito financeiro, o Banco Central Europeu é obrigado a imprimir doses maciças adicionais de Euro que sofrerá o desgaste natural da inflação e mais tarde da hiperinflação. Ou seja, o Euro abandona-se a si mesmo.

4. Troika decide perdoar a dívida de todos os Estados-membro da União Europeia, deixando deste modo todo o espaço da zona Euro cair em depressão e desorganização monetária - facto esse que devalorizará o Euro a níveis de irrelevância, sendo que o investimento directo estrangeiro na União Europeia dispararia, mas a Europa efectivamente passaria a pertencer a entidades estrangeiras que substituiriam os centros de decisão política. Por outras palavras, o fim da União Europeia seria certo.

5. A Grécia aceita continuar com um regime de Austeridade parcial, mas os juros impostos sobre a dívida serão agravados. O país cai em conflito político, económico e social e o governo de Tsipras é obrigado a instaurar o recolher obrigatório e colocar militares na rua - ou seja, de regime libertário passa a regime repressivo, sem a ajuda da extrema-direita.

6. A Grécia abandona o Euro e a União Europeia e adopta um divisa que não será necessariamente a sua. Por exemplo, o dólar dos EUA, país esse que decide salvar os helénicos invertendo a lógica de aproximação à Rússia.

7. Devo continuar? Ou ficaram com uma ideia da complexidade da situação?...

publicado às 20:53

Crescimento e depressão de mãos dadas

por John Wolf, em 09.12.13

Já repararam que o termo desemprego já não faz parte do discurso dos que mandam? O Instituto Nacional de Estatística anuncia o fim da recessão, mas não é referido de que forma esse facto produz efeitos na geração de emprego. Os governos de Portugal, e dos demais países europeus, sabem que o pleno emprego jamais tornará a ser o que era. Os dias de desemprego na ordem dos 5% acabaram. Assistimos, deste modo, à residência definitiva de uma nova realidade dissimulada e por revelar nas palestras daqueles que estão no poder ou daqueles que sonham em lá chegar. Os "bons" resultados económicos são bons para o bottomline das empresas, para os fluxos de caixa, mas não para o trabalhador. Eu iria até mais longe. Há largos anos que os gestores de empresas aguardavam o momento certo para realizar o layoff, os despedimentos em massa e com justa causa. A pergunta que deve ser colocada aponta no sentido de saber quando haverá inversão da tendência no desemprego. Há escassas semanas foi divulgado que o desemprego em Portugal rondará os 17,4% em 2014, embora presentemente tenha caído para os 15,8%. Este anúncio de sucesso das exportações apresenta uma ligeira contradição, ou a corroboração da ideia de que há sérias dificuldades pela frente. A necessidade de emissão de dívida a 5, 10 ou 30 anos significa que a economia ainda não se aguenta nas suas pernas. O roll-over, o empurrar para a frente das obrigações de dívida, não altera a dinâmica económica substantiva, a geração de emprego. A demise dos estaleiros de Viana acaba por confirmar a ideia de desfalecimento, de que mais despedimentos seguir-se-ão. A situação económica e social, já de si incomportável pelos cidadãos, poderá agravar-se ainda mais se houver um processo simultâneo de declarações de insolvência ou inoperacionalidade. Temos os CTT e as Páginas Amarelas em pé de guerra. Temos professores na rua. Temos trabalhadores de todos os sectores económicos em profundo desconforto. Temos gente que caiu fora das estatísticas e que já não conta nas considerações governativas, porque não existe matematicamente. O fim da recessão é uma expressão muito desejada em termos económicos, mas uma nova figura conceptual nasceu com esta crise - a possibilidade de coexistência de depressão social e crescimento económico. Esta contradição, nunca como antes, desafiou todos os modelos e conceitos de desenvolvimento das nossas sociedades. O fosso entre os detentores de capital e os trabalhadores parece ser cada vez maior. Seria simpático se o INE apresentasse em tandem as duas partes da fórmula - o crescimento económico acompanhado pelo crescimento do emprego. 

publicado às 18:51

Um dia de desemprego de cada vez

por John Wolf, em 03.11.13

Eu sei que é mais fácil falar do que fazer. Eu sei que é mais fácil imaginar o fogo real do que queimar as mãos. Eu sei que provavelmente produzo reflexões de barriga cheia, corpo meio-cheio que mesmo assim transborda de reclamações, amparado pelo conforto da relativa segurança. Mas prossigo com o meu intento de escrutinar o guião do desemprego. Tento, sem grande aval, reproduzir os passos dessa condição de agrafo. O simulacro da abstinência laboral não passará disso mesmo, de um exercício incompleto -  a ficção mais distante que próxima, da substância, um dia na vida de um dispensado. Se a depressão atrasa os movimentos e retarda o despertador como pilha falida, a fala que não sai, anula o gosto dos outros e do café. E as horas, essas que custam mais, agora passam mais vagarosas e ostentam outra tarifa - encarregam-se de arrastar o calendário para um outro temporal. A cara, salpicada pela neblina ranhosa da noite, já não carece da lavagem porque ninguém verá a rosada, a bochecha - a barba áspera tratará do resto. Camufla o mal-estar e uma parte da comichão, do bicho que tomou a floresta como sua lua. E a mãe brada do corredor que já são horas de levantar. O café já abriu para os rotos enquanto o pão chegou de véspera, fermentado pela dureza, agrafado pelo dente que sobreviveu à mordedura de uma sobra. O matutino que sobeja serve para a descasca da batata, mas ainda se vislumbra o craque da bola, o brilho dos olhos que condiz com o brinco, o resultado da taça. A fila que rodopia o quarteirão é totalmente dele. É dele. É ele que é ela que é ele que já foi ele - agora mero elo. Como linhas. Como linhas cruzadas ao almoço. Esparguete que se contorce como engodo de si - morde-se. E há tardes também habilitadas a idêntico desfecho, alinhadas debaixo de um sexto do quadrante, a parte da bússola que aponta para uma alvorada anunciada em sessões contínuas de desavindos com o engano. A luz está ao virar da esquina - dizem eles. A luz aprendeu a dobrar as curvas - garimpam eles. E a conversa faz parte do desmaio, da ocasião tornada obesa, dominante. Escuto apenas gargarejos de palavras, oiço a proveniência duvidosa, vejo as naturezas quase mortas de um juízo acertado, acartado às costas para aquecer a noite ferida que se avizinha. Mas ainda fala sobre a força para a derradeira bomba de ar - quer encher os pneus da pedaleira para rumar, sem assentar os pés em terra. Quase voar, quase voltar a ter razões que chegam, sobressalentes. O pedido do outro passa a ser religião. A encomenda para durar uma época apenas.  Mais tarde chegará outro desejo, aquele foi adiado pelo freio - o travão de emergência onde a mão se enforca, a mão anónima que puxa a alavanca e trava o eléctrico, e o que escapa por entre o dia é mais um não igual ao anterior, semelhante ao não que se segue. Como mandar recados na volta do correio.

publicado às 21:14

Portugal, um país psicotropical

por John Wolf, em 24.09.13

O ser humano, quando exposto a níveis exagerados de adversidades, procura sempre compensar essa carga negativa de inputs e afastá-los do seu espectro, da sua visão. Numa primeira fase, que não deixa de ser crítica, a negação é a reacção natural. A melhor forma de não emprestar força a algo que está a acontecer diante dos nossos olhos, é fingir que não se vê - fazer de conta que não existe. Essa constitui a primeira fase de integração inconsciente da crise. O cidadão que lentamente se vê privado da sua condição material e social, procura seguir em frente fazendo uso de mecanismos de substituição que garantam a manutenção da sua aparência e configuração iniciais. Finda essa fase, contornada de maneira engenhosa, mas desprovida de sustento, entramos numa fase de efectivo abandono do estatuto. De repente o cidadão, consciente da sua mudança, rejeita a "nova" configuração existencial. O meio envolvente que havia sido subjugado pelas capacidades individuais ou colectivas, passa a deter uma posição dominante e a imprimir um curso de acção indesejado. O descalabro económico e social, intenso na sua expressão, já não pode ser compensado com artefactos, e se torna efectivamente algo físico, sentido na pele e pela alma das pessoas. Nesse estádio avançado de tomada de consciência da perda, a depressão é uma consequência natural e, o indivíduo diminuído procura um modo de desligamento do eco-sistema social e político, e da ordem afectiva e emocional. Quando uma nação se encontra nesse estado de decadência, a única solução parece ser acelerar o processo de afastamento da realidade. Lamentavelmente, julgo que um extenso número de cidadãos deste amargurado país, já se encontra em processo de abandono, assumindo a perda irreparável como destino final. O mais recente relatório sobre o consumo de psicotrópicos em Portugal indicia um problema muito mais grave que extravasa as noções convencionais de um serviço nacional de saúde, já de si em desfalecimento acelerado. Os utilizadores de substâncias promotoras de alheamento social e emocional, terão de ser entendidos de acordo com outro conceito, próximo da doença colectiva e da náusea de um povo. À falta de receitas médicas, os indivíduos procurarão diversos modos de auto-medicação, de auto-ajuda ou auto-destruição - os suicídios inscrevem-se nesta categoria. A administração de agentes de acalmia ou euforia escapam a uma tabela convencional. Por um lado, teremos os utentes diagnosticados que já percorreram um caminho receituário longo e, por outro lado, teremos camadas jovens da população, que sentindo um desalento precoce em relação ao futuro, enveredam por práticas que estão de acordo com o seu posicionamento cultural - é aqui que entra a marijuana, o haxixe e mais tarde as drogas mais duras. Não falei da bebida, esse perturbador crónico do equilíbrio das sociedades porque precede esta crise em particular, mas convém sublinhar que o problema do consumo do álcool se tem vindo a agravar e não o contrário. A "guerra" que esta crise representa e que arrastou os portugueses para o campo de batalha pela sobrevivência (entre outros povos da Europa e do Mundo), gerará situações pós-traumáticas que terão de ser tratadas sem mais demoras. Esta devastação que corrói a textura das mulheres e homens deste país, tem de ser tratada em sede de pensamento sobre o futuro de Portugal. O conceito tradicional de veterano de guerra está a ser destronado por outra maleita com expressão negativa equivalente - a colonização das doenças mentais e do foro psicológico. Os comprimidos que estão a ser ingeridos de um modo acelerado são um indicador de uma malaise muito mais grave, e cujos efeitos far-se-ão sentir nas décadas que se seguem. O preço a pagar é elevadíssimo e não existe uma receita simples de retoma económica que possa apagar os danos causados às pessoas. O resgate que Portugal vai requerer não se pode resumir a mais uma tranche avultada de dinheiros. Estamos a lidar com vidas humanas e algo que não pode ser reposto com facilidade - falo de esperança -, um bem cada vez mais raro. 

publicado às 20:39






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