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A continuidade histórica foi retomada e um bom exemplo foi o simbólico desfraldar de todas as bandeiras que foram, são e para sempre serão portuguesas. Para despeito de alguns que ainda são demasiados, foi isso mesmo o que os mais altos órgãos do Estado finalmente assumiram. Portugal não surgiu em 1385, 1640, 1810, 1820, 1834, 1910, 1926 ou 1974. Assume assim integralmente todo o seu passado quase milenar.
Agora, falando ainda mais a sério, aqui fica a necessária opinião acerca da dupla que foi ao Brasil comemorar não uma mera festa nacional que nem sequer é o dia da independência do Estado, mas sim a Portugalidade em tudo o que o termo encerra no seu todo pluricontinental, como um quase esquecido comunicado um dia infelizmente rezou em vão.
O 10 de Junho estendeu-se a países extra-europeus e isso é positivo. Os portugueses e respectiva descendência que por lá vivem e trabalham têm sido olhados como meros utensílios arrecada-divisas e este aspecto não é apenas algo imputável a este regime que deles tem abusado, pois o abusivo costume verifica-se desde há muito. Na história dos nossos trisavós, foram evidentes os sobressaltos quando a Metrópole se viu atingida por esta ou aquela quebra da moeda ou crise económica e financeira além Atlântico. Já era tempo de vermos nos nossos compatriotas não apenas o que tradicionalmente a abstenção total que grassava nos gabinetes de Lisboa impediu de considerar, ou seja, valiosos agentes fora de portas, servindo não apenas os nossos interesses da exportação de produtos portugueses, mas sim como força de influência.
Antes que me acusem de ser insensível, desumano e uma pessoa desprovida de sentimentos de empatia para com o próximo, permitam-me a seguinte defesa preventiva: não fico feliz com o sofrimento de seja quem for - presidente da república ou não. Mas o que está em causa é determinar se estamos na presença de um facto político. Nesta casa (no blog Estado Sentido) existem especialistas muito mais avisados do que eu que podem auxiliar na explicação que decorre desse conceito de ciência política. De acordo com muitos autores, qualquer evento que envolva um orgão de soberania (ou uma figura de Estado) preenche os requisitos de facto político desde que seja passível de causar efeitos políticos. A queda de uma cadeira (Salazar) ou o engasgar (W. Bush) podem ser entendidos enquanto factos políticos. No primeiro caso, esse acontecimento do foro privado teve implicações na mudança de um regime de um país. No segundo exercício não passou de um caso de bola (sim, W. Bush estava a assistir a um jogo de futebol e atravessou o petisco na garganta). O que deve ser trazido à discussão, sem falsos sentimentalismos e um sentido de ética duvidoso, reporta-se ao estado-geral de saúde do chefe de Estado. Nessa medida, e desejando que tenha recuperado bem da indisposição que sentiu nas comemorações do dia de Portugal, será legítimo, que num estado de direito democrático, os cidadãos coloquem as questões que entenderem sobre o estado de saúde dos lideres que conduzem os destinos do país. Não me parece extravagante que os eleitores queiram saber com quem podem contar ou não na prossecução dos objectivos nacionais. Ontem (e provavelmente ainda hoje e nos dias que se seguem), vozes críticas se fizeram ouvir, invocando que o que sucedeu na cidade da Guarda não passou de um episódio natural, normal. Pode ser que assim seja, mas um presidente da república exige mais atenção do que os restantes no que diz respeito aos seus movimentos políticos ascendentes ou descendentes. Concentremo-nos nos factos e deixemos o ruído de fora da discussão. Estarei a ser desrespeitoso para com o presidente?
O Portugal que hoje celebro é o de todos os dias - o dos grandes Portugueses. Mas não são aqueles homenageados pela grandeza pública, arrastados para o palco da expressão política, a bel prazer dos governantes. Não me refiro a esses. Falo de algo pessoal e intransmissível. Saúdo todos aqueles que corporizam a alma Lusa. O número sem fim de cidadãos com quem tive o privilégio de privar, que no encontro fugaz ou duradouro honraram as grandes qualidades humanas, universais. Quantas vezes terei sido alvo da generosidade dos Portugueses? De que modos distintos fui eu surpreendido positivamente? E se faço tal declaração de reconhecimento é porque consigo realizar a destrinça entre o essencial e o efémero, entre o ruído e a melodia. Esqueçamos por um instante aqueles que passam pelo escaparate e concentremo-nos na grandeza do espírito. Paradoxalmente, faço este elogio porque fui agraciado tantas e tantas vezes mesmo sendo de outras paragens - eu vim de longe. Por vezes pergunto se a minha condição me concedeu essa prerrogativa, porque observo que muitas vezes sou melhor tratado do que os nativos. Recebi vezes sem conta, quando outros haviam mais necessitados. Fui ajudado em horas de aflição como se fosse um filho da casa, um parente mais que próximo. Fui alimentado por essa hospitalidade que atrai os do norte, mas também os lestos ou os de leste. É esse postal que temos de preservar. A broa repartida tantas vezes quantas necessárias para albergar mais um convidado - mais uma cadeira e mais um prato na mesa. Por vezes sonho com o país que conheci há mais de duas décadas, ausente da estrada que liga ou do telemóvel que toca. Fomos felizes com a sardinha e o ritual da matança do porco. Observei vezes sem conta a redenção a custo zero, a fadiga que valeu a pena sem se conseguir explicar porquê. Quem disse que a saudade é coisa do passado quando ela pode ser do futuro?Deixem Elvas a falar sozinho e regressem a casa com esse cheiro de mangerico que atravessa as tormentas, aquelas que abraçaremos para as tornar boas.
que Camões cantou, mas que nos tem abandonado demasiadas vezes.
Como refere aqui o Nuno, alguém sempre atento às desgraças que por cá vamos sentindo dá-nos os parabéns porque soubemos desviarmo-nos um pouco do abismo para onde caminhávamos alegremente. Tenhamos, todos, mas principalmente os políticos, a consciência de que o precipício ainda mora ao lado. Continuemos a mostrar a Raça que, vimos, não se perdeu totalmente, inspirando-nos nos que tornaram possível que este dia fosse por nós celebrado.
( Como bem disse António Barreto, em Castelo Branco,
"o povo falou, fez a sua parte, aos políticos cabe agora fazer a sua" ).
O que poderia ser mais indicado no Dia de Portugal?
dos nossos egrégios avós, para dar sentido ao dia que hoje se comemorou, e que, há muito deixou de o ter?
Olhem para este Grande, que, mais do que ninguém personifica o Portugal enquanto nação soberana, numa altura em que a soberania parece ser coisa de somenos.
É essa enormidade que estão a passar à geração que já nasceu.